Capitulo 12
Entrei na garagem do meu apartamento estacionando o carro. Desliguei os faróis e recostei a cabeça para trás. Desci com a bolsa e o celular na mão, somente isso, mais tarde buscaria o restante. Encostei-me à parede interna do elevador colocando o celular no bolso e levei as duas mãos na cabeça. Sai para o corredor, abrindo a porta da sala e fechei todas as cortinas ficando inteiramente no breu e fui a passos lentos para o meu quarto. Andar não era uma boa para quem tinha tomado todas durante a madrugada inteira.
Meu celular estava com mil chamadas perdidas e a primeira coisa que fiz foi ligar para o escritório cancelando todos os meus compromissos para aquele dia e ordens expressas para não ser incomodada.
Olhava para o teto e via o sorriso de Ive. Era uma pessoa muito carismática, mas pouco sabia a seu respeito. Agora conseguia me lembrar dela no dia do acidente, mas já estava escuro e eu estava tão atordoada com o que tinha acontecido. Que jeito mais apropriado de se conhecer alguém: À beira da morte!
Sacudi a cabeça com intenção de afastar esse pensamento horrível e ela latejou.
- Puts! – e levei a mão na gaveta do criado mudo retirando uma dipirona da cartela. – Pronto, logo logo você estará pronta para outra! – gemi de dor.
Ouvi um barulho na sala, mas não me mexi.
- Quem está ai? – disse com o travesseiro no rosto.
- Srta Sartori? Está em casa?
- No quarto!
- Não se sente bem menina?
A voz era de uma senhora de meia idade.
- Não. Sente- se aqui comigo só um pouquinho minha Ismália. – e estendi a mão.
- Oh o que se passa. Conte-me! - e a segurou junto do peito retirando o travesseiro da minha cabeça. – Está com febre minha pequena? – disse colocando o torso da mão sobre a minha testa.
- Ressaca... – murmurei.
Ismália era uma senhora negra de cabelos grisalhos, com um coração imenso e bondoso a que eu tinha como um anjo na minha vida. Dedicou-se parte da vida na criação dos filhos e quando todos eles se casaram ela pode dedicar-se mais a si. Era governanta quando ainda tínhamos a casa de campo, mas quando foi vendida, ela ficou meio que desamparada e meu pai pediu-lhe que me cuidasse desde então.
- Vou passar um café para você, ou prefere um chá?
- O chá, por favor, obrigada. – e beijei-lhe a mão. – Tome comigo...
- Sim pequena, já volto.
Minutos depois ela voltou com uma bandeja, com o bule de chá, as duas xícaras, pão na chapa, frutas e uma margarida ao lado.
- Ah que coisa mais linda! - disse acendendo o abajur e sentando na cama.
- Com amor para a menina. – ela sorriu.
Pedi que colocasse sobre a cama e que ela se sentasse também.
Servi as duas xícaras com o chá fumegante.
- De hibisco?
- Sim menina, é o melhor para você. – disse passando geléia no pão.
- Poderia preparar um almoço bem gostoso? – sorvi um gole do chá.
- Que tal uma canja? Trouxe uma galinha caipira.
E lembrei que não havia nem uma folha de alface na geladeira.
- Seria maravilhoso!
- Você tem roupas para por lavar?
- Algumas. Iria levar hoje. Mas penso deixar para amanha, não sei se consigo sair assim.
- A menina fique de repouso! Levo comigo e trago amanha de tardezinha. Não se preocupe.
- Não sei o que seria de mim sem você.
- Vou pedir à Ema para fazer umas compras também e trazer para você.
- Deus que vergonha! – corei.
- Não tenha menina, estamos aqui para cuidarmos uns dos outros não é mesmo?
- Minha Ismália é um amor! – disse ao envolver a sua mão na minha.
Acabamos de tomar o chá e ela saiu para preparar um banho para mim. Diz que faria bem.
Coloquei uma música ambiente e tirei a roupa, vestindo um robe. Ismália estava na cozinha preparando o almoço. Arrumei a cama e respirei fundo, eu já me sentia muito melhor. A dor de cabeça já não era tão forte quanto antes. Abri as cortinas do quarto e me lembrei de Ive. Peguei o seu cartão dentro da bolsa e olhei dos dois lados ensaiando se ligaria ou não. Faltava intimidade e sobre qual assunto teria com ela? Que tal falarmos sobre coma alcoólico? – sorri.
E depois deveria estar trabalhando e acabei desistindo.
- Menina o banho está pronto.
- Obrigada! Muito obrigada! – dei um beijo no rosto dela e fui descalça para o banheiro.
- Daqui a pouco o almoço está servido. – disse fechando a porta.
Entrei na banheira, fechei os meus olhos e só os abri com duas batidas na porta. Olhei para o relógio. Estava ali há vinte e oito minutos. Sai me enrolando na toalha e olhei de soslaio no espelho coberto pelo vapor. Passei os dedos e fiz um sorriso no meu rosto apagando logo em seguida. A minha palidez era de meter medo, parecia me faltar sangue na veia de tão branca que eu estava.
- Se sente melhor?
Ismália disse ao que entrei na cozinha me sentando a mesa.
- Já passou, graças a Deus. Hum que delícia! – e me servi da canja.
- Que bom, vou arrumar o banheiro e...
- Não, almoce comigo!
Há muito tempo eu não tinha companhia a minha mesa.
- Almoço menina. – ela sorriu já se servindo. – Você se sente muito só aqui, não é mesmo?
- Muito... – sorvi outra colher do ensopado.
- Tem que arrumar outra alma par para a sua! – sorriu com um piscar de olhos.
E pensei na Mel.
Enquanto eu tirava os pratos e arrumava a mesa, Ismália saiu para arrumar o banheiro. Desenrolei a toalha e a coloquei para lavar junto das outras roupas, e subi as escadas para o 2°piso completamente nua. Coloquei a minha digital abrindo a porta e fechando atrás de mim.
Pus o celular sobre a mesa de ferro, depois peguei duas toalhas na sauna. Levantei os braços preguiçosamente para o alto. Respirei fundo. Nas pontas dos pés, impulsionei-me num salto submergindo dentro da piscina. Estava na superfície segundos depois. Fui de uma borda a outra e apoiei os braços na beirada.
Projetei a piscina coberta e aquecida. Em toda a minha vida era um prazer que eu não abria mão de desfrutar. As paredes eram brancas e a parte oposta inteiramente de vidro. A visão era privilegiada para todo o horizonte.
Alguma coisa vibrava dentro do meu peito. Nadava de costa e me veio um ímpeto de voltar no bar à noite. Abri um sorriso no rosto, realmente queria saber quem era o dono daqueles bilhetes. Excitava-me saber que alguém estava me observando. E bem de perto por sinal.
Sai da piscina, cobri a espreguiçadeira com a toalha e deitei. Acordei de sobressalto com o chamado do celular.
- Atender. – disse sonolenta.
- Oi Giulia.
E me arrepiei ao ouvir a voz da Ive.
- Oi... tudo bem?
- Sim e com você? Está melhor?
- Bem melhor e você como está?
- Estou bem, então. Você irá hoje?
- Estava pensando em ir sim.
- Prometo não te deixar beber tanto como ontem.
- Melhor não. - sorri me lembrando da dor de cabeça pela manhã.
- Te vejo lá então.
- Até a noite!
- Até.
***
Ergui os olhos para o espelho e lembrei-me ter sonhado com a Mel esta noite. Ou teria sido com a Ive? Foi sonho? - e sacudi a cabeça novamente. Tinha a leve sensação que não parecia ter sido um sonho, mas meus sonhos, na maioria das vezes, eram assim.
Ismália tinha saído logo depois de ter arrumado o quarto e o banheiro, deixando um bilhete em cima da estante: “Passarei amanhã para deixar as roupas, beijo minha menina”.
Vesti as botas de cano alto. A calça jeans era desbotada e bem justa. Voltei a olhar novamente para o blazer preto e sorri. O decote era bem acentuado na altura do umbigo e boa parte dos seios ficavam a mostra. Sartori com certeza teria dito para tirar na mesma hora ou nem sair. Arrumei os cabelos num rabo alto e o telefone fixo tocou.
- Alô. - e estranhei aquele telefone tocar.
Era raríssimo atender chamadas nesse número. Só em casos realmente urgentes.
- Posso saber por que tem me evitado? Estou na lista negra novamente?
- Está sim Rui desculpe. - fui sincera. - Nós já falamos sobre isso e eu quero privacidade.
- Como queira.
- E por falar nisso, como conseguiu esse número?
E desligou abruptamente.
Ele estava bloqueado desde a última vez que havia falado com ele, sem remorso nenhum.
Fiz uma maquiagem bem suave, queria estar bem ao natural. Acabei de me arrumar, fui para o escritório e digitei uma dúzia de palavras no corpo do e-mail anexando um arquivo de uma planta baixa residencial. Dei outra conferida e enviei.
Olhei para fora da janela o sol acabava de se pôr.
Peguei a bolsa e as chaves do BMW em cima da mesa, olhei para a sala e fechei a porta atrás de mim.
Fim do capítulo
Comentar este capítulo:
Brescia
Em: 03/05/2020
Boa noite mocinha.
Essa bebedeira rendeu, pelo menos ela se divertiu e arrumou uma amiga (será só isso ?). Acho que o coração dela ainda e da Mel, mas já que ela não está, vamos viver um pouco.
Baci piccola.
Resposta do autor:
Ciao!
Será? A essa altura o coraçao de Giulia está muito confuso com todos esses acontecimentos. mas nada que que o tempo não resolva!
Beijos!
Deixe seu comentário sobre a capitulo usando seu Facebook:
[Faça o login para poder comentar]