Capitulo 20 - Suscitar
- Andrea… Digo, oficial Lopés. - Diana se corrigiu.
A xerife estava distraída observando Charlotte de longe, não desviava o olhar vigilante da mulher que estava sentada com os olhos molhados e sem nenhuma expressão. Ela encarava o copo plástico com água que Diana havia lhe servido mais cedo.
- Detetive?
Diana chegou mais perto da xerife e sussurrou:
- Acho que deveríamos encerrar essa sessão por hoje… - Alertou. - A mulher está claramente abalada, e agora que as evidências apontam para outro lado da investigação, nós poderíamos liberá-la.
- Ela não matou a Taylor Collins. - Andrea disse sem tirar os olhos de Charlie. - Mas ela é o nosso maior vínculo com a vítima, não podemos dispensá-la.
- Apenas por hoje. - Diana pediu.
Andrea pensou por alguns segundos e assentiu com a cabeça. Diana sorriu e fez menção de ir falar com a Charlie, mas as mãos da xerife a impediu.
- Charlotte. - Andrea se antecipou enquanto caminhava até a mulher cabisbaixa.
Ela não tirou os olhos do copo, estava abatida e tentava disfarçar as lágrimas que caiam soltas pelo seu rosto. A oficial puxou uma cadeira e se sentou de frente para a mulher.
- Vamos precisar da sua ajuda, Charlie. - Ela disse enquanto se sentava.
Pela primeira vez as orbes verdes cruzaram os olhos negros da mexicana. E ela jurou nunca ter visto tanta raiva e dor. Andrea sabia que Charlotte estava vivendo um verdadeiro tormento naquele momento, porém mais cedo ou mais tarde, ela teria que encarar a verdade.
- Você vai precisar cooperar com a polícia e com as investigações.
Um sorriso irônico brotou nos lábios da Sanders, e ela amassou o copo agora vazio com ira.
- Cooperar com a mesma polícia que ignorou a morte da Taylor? - Sua voz era fraca e embolada.
A xerife respirou fundo.
- Não é a mesma polícia. - Ela pontuou séria. - Eu estou no comando agora.
Andrea se aproximou de Charlie e levou as mãos até o seu queixo, lhe forçando a olhá-la nos olhos.
- Eu prometo, Charlie… Eu vou encontrar quem fez isso com a Taylor e essa pessoa vai pagar por tudo o que fez. - Ela prometeu entre dentes.
As lágrimas caíram sem resistência dos olhos da Sanders.
- Todos esses anos eu me culpei pela morte da Taylor…
- Por quê? - Andrea perguntou interessada.
Charlie limpou as lágrimas rapidamente e passou a mão pela testa.
- Na última noite em que nos falamos, antes da sua morte, nós tivemos uma briga… - Ela disse abatida. - E eu disse que não queria mais vê-la!
- Sinto muito… - Andrea sussurrou.
Diana assistia toda a cena emocionada e surpresa por conhecer esse novo lado humano da xerife.
- E-eu pensei esse tempo todo que o acidente tinha acontecido por minha causa!
Andrea afagou as costas de Charlie que agora parecia uma garotinha indefesa. Diana se apressou e capturou alguns lenços de papel e entregou para a Sanders.
- Vamos precisar da sua ajuda, Charlie. - A xerife voltou a dizer.
- Eu não sei como poderia ajudar.
- Primeiramente, seguiremos com as investigações em extremo sigilo. Apenas eu, a detetive Diana e um perito amigo meu que aceitou vir de Dallas para trabalhar exclusivamente nesse caso, são as únicas pessoas que estão a par de todas essas informações. - A oficial voltou a postura mais altiva. - E precisamos que continuem assim.
Charlie franziu a sobrancelha sem entender qual era o ponto da xerife.
- Então, para todos os efeitos, seguiremos deixando as pessoas acreditarem que você é a única e principal suspeita nesse caso. - Explicou.
- O que?!
- Você não pode contar nada do que sabe, Charlotte. Ou isso prejudicará as nossas investigações. - Andrea olhou para Diana. - O assassino ainda está a solta e pode ser qualquer pessoa que viveu aqui naquela época… - Explicou. - E por haver tantas omissões, tudo nos leva a crer que alguém daqui de dentro poderia estar envolvido também!
Charlie abriu a boca para protestar, mas não tinha o que falar. A xerife estava certa e aquela era uma decisão inteligente e audaciosa da sua parte.
- Precisamos de cautela nesse momento até as evidências comprovarem quem foi o possível assassino.
- E o sêmen? Você mesma disse que havia esperma… - Ela fez uma pausa para se recuperar da raiva que lhe surgiu, mas não conseguiu prosseguir.
- Foi o que alegou um dos relatórios da perícia na época, porém não achamos nenhum teste de DNA feito e nem as amostras! - Andrea informou. - Tudo que temos é a informação de que foi encontrado esperma na vítima.
- Merda! - Charlie levantou chutando a cadeira que foi ao chão causando um estrondo.
- Se acalme, Charlotte. - Diana que esteve calada esse tempo todo falou se aproximando.
- Como vou me acalmar? Um monstro tirou a vida da Taylor e ficou solto por todos esses anos e agora não temos nenhuma pista! - Ela falou alto demais.
- Estamos trabalhando nisso, senhorita Sanders. - Andrea disse calmamente. - E você precisa se acalmar.
- Você precisa ir para casa e absolver todas essas informações. - Diana se posicionou pausadamente. - Deixe que faremos o nosso trabalho. E você, faça o seu. Não conte nada do que ouviu aqui para ninguém.
- Deixem que achem que você é a única suspeita. Isso vai deixar o suposto assassino tranquilo e de guardas baixas.
Charlie suspirou e levou as mãos até os cabelos, estava completamente perdida. Tudo que queria era tirar aquele peso das costas e mostrar para todos a sua inocência, mas agora ela não podia fazer isso.
Não poderia mais provar sua inocência para a Claire. Ela continuaria com uma pulga atrás da orelha até tudo se estabilizar. Porque mais importante do que provar a sua inocência, era fazer justiça para a Taylor.
E naquela delegacia, ela fez uma promessa silenciosa com a xerife, que outrora havia pegado tanto no seu pé, mas que agora ela entendia que a mulher era apenas uma oficial obstinada com a sua profissão. Ela queria achar o assassino e ela estava disposta arriscar tudo.
- Tudo bem… - Charlie disse por fim. - Foram dez anos com esse peso, eu posso esperar mais alguns dias.
- Podem ser meses, Charlie. Mas eu preciso que você coopere.
A mulher suspirou e assentiu com a cabeça.
- Muito bem! - Andrea disse animada. - Creio que já podemos te liberar.
A Sanders levantou lentamente e quando ia se despedir das oficiais, ela se recordou do papel que tinha achado hoje mais cedo.
- Xerife… - Ela chamou a atenção da oficial que ajeitava a pilha de papeis e fotos.
- Pois não?
Charlie tirou o papel amassado, úmido do bolso do blusão marrom e entregou para a oficial.
- O que é isso? - Ela recebeu o papel e analisou minuciosamente.
- Estava no carro do meu cunhado hoje cedo, acredito que seja para mim.
Ela analisou o papel, evitando tocar muito nele.
- Detetive Diana?
- Sim? - Ela que observava tudo, se aproximou mais ainda.
- Preciso de luvas, por favor.
Diana rapidamente saiu da sala e em alguns segundos já estava de volta com uma caixa de luvas e um saco de isolamento transparente. A xerife capturou duas luvas e as vestiu nas mãos. E só depois começou a analisar o papel.
Ela leu em silêncio todo o conteúdo e depois entregou para Diana que fez o mesmo, a detetive não escondeu sua emoção de repulsa ao que estava escrito.
- Tem ideia de quem pode ter feito isso? - Andrea perguntou.
- Eu não sei… - Charlie respondeu pensativa. - As pessoas dessa cidade são bem preconceituosas, e a maioria seria capaz de escrever essas barbaridades.
- A Taylor também recebia esse tipo de animosidade?
- Sim, quando todos descobriram sobre o nosso relacionamento, nós duas recebíamos mensagens nesse teor.
Andrea assentiu e se virou para uma Diana pensativa.
- Detetive, mande esse bilhete para analise e veja se existem impressões digitais ou amostras de DNA.
- Sim, xerife! - Diana falou enquanto guardava o bilhete.
- Quem tocou nesse bilhete não vai escapar dessa vez, Charlie. - Andrea prometeu. - Agora eu quero que você vá para casa e reúna todas as informações relevantes que você deixou de contar no seu primeiro depoimento. Nesse tipo de caso, toda informação conta e o diabo mora nos detalhes.
A Sanders confirmou com um aceno e foi levada para fora da sala pela Diana. Depois de enfrentar algumas poucas formalidades, ela se viu do lado de fora da delegacia, o vento frio balançou seus cabelos e ela andou até o carro.
Aquelas horas na delegacia haviam sido exaustivas, era como se toneladas fossem descarregadas nas suas costas, e por mais que tentasse disfarçar, a raiva ainda lhe consumia como um fogo ardente dentro do seu peito que nem aquela nevasca conseguia apagar. A raiva por imaginar tudo que a Taylor teve que passar no dia da sua morte, na crueldade do que fizeram com a mulher que um dia ela amou tanto. E ainda amava.
Ela ainda amava a Taylor, não tinha como esquecê-la, mas agora era um sentimento diferente. Não era nada mais carnal, e sim um amor puro, guardado para a eternidade.
Desculpa, Taylor…
Desculpe, meu amor… Eu não consegui te defender. Eu sinto muito.
As lágrimas escorreram pelo seu rosto novamente, e ela tentou enxugar o mais rápido possível seus olhos.
A neve caía fortemente fora do carro quando ela deu partida no veículo. Seus pensamentos estavam confusos e seus olhos estavam cegos de raiva e dor. Charlie sabia que precisava respirar e se centrar. Não podia se desestabilizar agora.
E no meio de todo aquele furacão de sentimentos, bem no centro, ela viu o rosto de Claire Griffin e lembrou do gosto doce dos seus lábios. O seu avó Will sempre lhe disse que quando Deus fechava uma porta, ele abria, logo em seguida, uma janela… E por alguns instantes, ela teve a intuição de que Claire poderia ser essa nova ventana.
Durante esses dez anos, ela sempre achou que seu coração tinha sido enterrado junto com a Taylor. Mas foi um grande engano, ele esteve vivo esse tempo todo e foi ela, Charlotte Sanders que tinha calado a sua própria capacidade de sentir.
Mas a pequena garçonete lhe pegou desprevenida demais, e quando menos esperou, o cheiro adocicado de peônias estavam espalhados pela sua memória. E não havia escapatória. Porque dentro daquele furacão, ela encontrou um ponto de calmaria nos olhos castanhos.
Tomada por uma coragem que nunca teve, Charlie se dirigiu até a floricultura mais proxima da Delegacia e comprou algumas orquídeas. E sem saber direito o que faria com aquelas flores, ela dirigiu até o apartamento de Claire Griffin.
******
* Suscitar: Encorajar, provocar, fazer surgir.
Fim do capítulo
Comentar este capítulo:
Brescia
Em: 17/04/2020
Boa noite mocinha
.
Essa delegada é fogo, mas com tantas evidências claras não teria como negar que realmente foi um assassinato e como Charlotte já havia prometido, tem a possibilidade agora de elucidar esse tormento que a consumiu por todos esses anos.
Bravissima piccola.
Marta Andrade dos Santos
Em: 17/04/2020
Vamis descobrir o assassino de Taylor
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