Diálogo com os Espíritos -- Capítulo 36 

Alicia afastou a boca para respirar, mas voltou a beijá-la em seguida, como se não pudesse suportar nem um minuto de separação.  

-- Eu também te amo -- disse Alicia entre vários beijos -- E esse amor faz vibrar a minha alma. O meu coração parece que quer sair do peito para se juntar ao seu. 

Fernanda lhe circulou o pescoço e a abraçou apertado, querendo absorver o calor e a segurança que aquela fusão proporcionava. 

Uma mão tocou cautelosamente o ombro de Alicia e mesmo contra a sua vontade ela se afastou um pouco de Fernanda. 

-- A cena é muito linda, realmente emocionante, mas se ficarmos mais um minuto aqui, seremos linchadas -- Suelen estava realmente preocupada com as amigas -- Esse povo está revoltado, principalmente a família do Salomão. 

Imediatamente, Alicia estendeu a mão, os dedos entrelaçando-se aos de Fernanda. 

-- Suelen tem razão. Melhor a gente sair correndo daqui -- Alicia sorriu -- Olha a cara de ódio dos seus convidados. 

Fernanda retribuiu o sorriso e puxou Alicia pela mão. 

-- Então vamos! -- elas saíram correndo e rindo. Fernanda não se aguentava de tanta felicidade. Sentia-se como uma criança arteira, feliz e protegida. 

Lá fora, Cléo esperava com a porta do carro aberta. Ao ver Fernanda e Alicia de mãos dadas, o rapaz deu chilique, bateu palminhas, deu pulinhos e gritinhos. 

-- Que máximo! -- Cléo comemorou -- Entrem, por favor! -- ele fez uma reverência em direção a elas -- Tem champanhe, whisky, pinga e chá verde. É só escolherem. 

-- Vem com a gente, Suelen? 

-- Não, Fernanda. A Ju está me esperando -- ela deu um beijo no rosto da amiga e se afastou -- Vai logo. 

Sem hesitar, elas entraram rapidamente no carro e Cléo pisou fundo no acelerador, para que pudessem desaparecer dali quanto antes. 

Alicia e Fernanda se abraçaram e se beijaram com desespero. 

-- Meu Deus! Como senti sua falta. Você não tem ideia -- Alicia ergueu a cabeça a fim de estudar o rosto de Fernanda -- Diga que também sentiu a minha falta -- ela sussurrou contra a orelha da morena, fazendo-a tremer de prazer -- Diz vai -- insistiu. 

-- Eu senti sua falta -- ela arqueou-se contra Alicia -- Muita, muita, muita -- disse entre beijinhos. 

Cléo que olhava para elas pelo retrovisor, fez várias caretas antes de perguntar: 

-- A partir de agora vai ser sempre esse melaço ou, vai ter alguns arranca rabo de vez em quando pra gente se divertir? 

-- Não enche, Cléo! -- Fernanda mudou de posição deitando a cabeça no ombro de Alicia -- Sonhei em fazer isso cada hora do dia e da noite. Agora quero mais é aproveitar. 

-- Entendam que para um relacionamento dar certo, você tem que amar a ponto de querer sair no soco com a pessoa -- afirmou o rapaz. 

Alicia inclinou a cabeça para depositar um beijo no canto da boca dela, depois a beijou no rosto, no queixo e, terminou na orelha. De súbito, Alicia parou as carícias e voltou a sua atenção para Cléo. 

-- Aonde você estava que apareceu do nada? 

-- Estava na Igreja. Gostei da parte que o Pastor falou que Jesus transformou água em vinho. Lembrei do meu pai.  

-- Ele gosta dessa passagem? -- perguntou Fernanda. 

-- Não é isso. É que meu pai vive transformando a pinga em caipirinha -- ele olhou sério para Fernanda -- Na Igreja de vocês não têm aquela bolsinha que sai fumaça? Acho show! 

-- Não. Nem sei o que é -- respondeu Fernanda, enterrando o rosto na fragrância deliciosa que imanava do pescoço de Alicia. Absorveu o perfume e fechou os olhos sorrindo. 

-- O utensílio é o incensório ou turíbulo. O que queima é o incenso, feito de resinas ou madeiras. "O turíbulo é utilizado pelos católicos principalmente nas missas solenes. É um objeto que queima o incenso com a simbologia de que as orações subam aos céus, assim como a fumaça do turíbulo, que também sobe aos céus" -- Alicia acariciou o rosto da morena e sorriu de modo tranquilizador -- Você teve um dia muito agitado e cheio de fortes emoções, deve estar cansada. Por que não dorme um pouco? 

Fernanda concordou sorrindo. 

-- Para onde estamos indo? 

-- Nós vamos para um lugar bem bonito e tranquilo. Você precisa ficar um tempo longe da sua família e das pessoas da congregação.  

-- A docteur tem razão. Aquela igreja parecia o Instituto Butantã -- Cléo diminuiu a marcha para entrar na grande avenida -- Precisava ver a sua mãe, ela parecia uma panela de pressão com a válvula danificada. Pensei que a qualquer momento ela fosse explodir, sem se importar com quem estivesse por perto. 

Fernanda suspirou fundo e comentou com tristeza: 

-- As pessoas de coração ruim, sempre se autodestroem -- ela voltou a se aconchegar em Alicia e de olhos fechados, fez todo o trajeto. Em parte, para descansar, em parte para curtir o prazer de ter a loira pertinho dela. Ela era segura, forte e atenciosa.  

Cristina subiu correndo as escadarias e entrou no saguão do hospital. Fazia uma semana que não visitava o pai e ele já devia estar chateado. O neurologista era muito exigente nesse sentido. 

-- Doutora Cristina! -- a voz amigável da recepcionista interrompeu seus pensamentos. 

-- Olá, Gabriela! -- ela cumprimentou com um sorriso amigável. 

-- Deixe-me ver... veio visitar o doutor Paulo! 

-- Acertou -- concordou Cristina, sorrindo. 

-- Ele está com visita. O doutor Daniel do Hospital do Coração está com ele.  

-- Será que posso entrar? 

-- Lógico que pode. Vai lá -- disse, a simpática recepcionista. 

Cristina entrou no elevador e apertou o botão do quarto andar. 

Cléo entrou por uma avenida bem larga, dividida ao meio por uma interminável fileira de frondosas árvores. Reduziu a velocidade e aspirou o ar puro.  

-- Já chegamos? -- Fernanda abriu os olhos ainda sonolenta, levantou a cabeça e olhou pela janela do carro -- Que lindo! Onde estamos? 

-- Estamos em Itatiaia, na fazenda dos meus pais. 

Cléo entrou na rua da casa, da enorme Fazenda Becker, nas proximidades da divisa com Minas Gerais. 

-- Tudo isso pertence aos seus pais, docteur? 

-- Sim, além do que os seus olhos possam alcançar -- Alicia suspirou. Apesar de toda a beleza da fazenda, sempre desejara morar na cidade. Desde menina, sonhava em ir morar na capital, a cidade do Rio a encantava e a instigava a novas descobertas. Então, depois que conheceu Thais, não pensou duas vezes. 

Fernanda olhava tudo maravilhada. Da janela do carro podia contemplar a imensidão de terras que os Becker possuíam. A psicóloga adorou a grande casa branca da fazenda, as largas varandas em volta e o jardim bem cuidado que começava a florir. 

-- Conhecia Itatiaia, Fernanda? 

-- Parece um absurdo morar tão perto e nunca ter vindo a Itatiaia. O pouco que conheço é o que pode ser visto da Rodovia Presidente Dutra. 

-- Eu nasci aqui, nessa fazenda.  

-- Você é uma sortuda -- comentou, Fernanda. 

-- Esse lugar é propício para quem quer fugir do agito e se refugiar em pequenas cidades do interior onde a tranquilidade predomina.  

Itatiaia, localizada as margens da Rodovia Presidente Dutra fica a aproximadamente 150 km do Rio de Janeiro e a 250 km de São Paulo, possui três destinos turísticos de destaque nacional e internacional: Parque Nacional do Itatiaia, Colônia Finlandesa de Penedo e as Vilas de Maringá e Maromba, na região turística de Visconde de Mauá. 

O município, além de áreas riquíssimas em fauna, flora e formações rochosas, oferece uma vasta e variada rede hoteleira, com mais de cinco mil leitos, além de variados restaurantes, lojas de artesanato, ateliês e locais paradisíacos e muito tranquilos, bem ao gosto de quem procura fugir da agitação das grandes cidades. 

O centro de Itatiaia é típico de interior, onde se destacam a Praça Mariana Rocha Leão com seu coreto, a Igreja de São José e o Paço Municipal Campo Belo, sede da prefeitura. 

O Parque Nacional do Itatiaia é a mais famosa atração turística do município e foi fundado em 1937, caracterizando-se assim como a mais antiga reserva ambiental brasileira. 

-- Obrigada! -- murmurou Fernanda com incrível suavidade -- Obrigada por me tirar do inferno e me trazer para o céu. Você é um anjo! 

Alicia olhou-a durante longo tempo, com ar de felicidade. Ela sentiu claramente o alívio na voz de Fernanda. 

-- Você também -- Alicia sorriu. 

-- Assim não vale, doutora. Você tem que fazer seus próprios elogios, não roubar os meus. 

Os olhos de Alicia brilharam. 

-- Você é linda! -- disse ela, corando em seguida -- Está bom assim? 

-- Perfeito! -- ela afastou os cabelos do rosto de Alicia, beijando-a com carinho na face e na ponta do nariz. 

-- Tô vendo que segunda-feira estaremos nas Casas Bahia, escolhendo móveis novos para o apartamento -- Cléo parou o carro diante da casa e saiu. Alguns pássaros que voavam por ali gritaram estridentes quando o rapaz se aproximou da varanda da casa. 

-- Ele estava quieto demais -- comentou Alicia, saindo do carro -- Ainda bem que o trânsito estava tranquilo. Minha mãe já deve estar angustiada a nossa espera. Ela não vê a hora de te conhecer. 

Fernanda travou, o sangue subiu ao rosto dela.  

-- Ela sabe de tudo? Tudinho? -- ela olhou para Alicia, espantada. 

-- Querida, a dona Olivia não é o estado do Tocantins, mas merece Palmas. Ela atura todas as safadezas de sua pequena cria. 

-- Cala a boca, Cléo -- Alicia pegou a mão dela e esfregou suavemente os dedos -- Meus pais são maravilhosos, mas prefiro que você mesma descubra isso. Vamos entrar. 

Doutor Daniel se levantou da cadeira onde estava sentado e foi ao encontro da filha do amigo. 

-- Doutora Cristina -- ele disse. 

-- Doutor Daniel -- ela declarou, e estendeu uma das mãos a fim de cumprimentá-lo -- Quanto tempo, hein? 

-- Pois, é, faz tempo que você não aparece no hospital. 

-- É meu amigo, acho que minha filha se cansou desse velho neurologista. 

Cristina deu uma gargalhada. 

-- Meu velho pai está cada vez mais chorão. Não faz nem uma semana que estive aqui. 

-- E você acha pouco? -- ele indagou, observando a filha -- Estou pasmo. 

Eles riram. 

-- Bem, vou indo -- Daniel dirigiu um rápido olhar para Cristina -- Estou a frente de uma campanha de doação de órgãos.  

-- Que maravilha! -- afirmou a médica -- Esse trabalho é muito importante. 

-- Estamos passando por tempos difíceis. Para você ter uma ideia, nosso último transplante de coração foi realizado há dois meses. Temos uma fila que não para de crescer. 

Doutor Paulo suspirou. 

-- Eu me lembro desse caso. A Fernanda Brandão, inclusive o órgão saiu aqui do nosso hospital. 

Ao ouvir o que os dois médicos falaram, Cristina paralisou. Todos os músculos de seu corpo ficaram imóveis, em choque.  

Imediatamente a cardiologista ligou os fatos. 

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Créditos: 

https://diariodovale.com.br/lazer/as-belezas-e-a-tranquilidade-de-itatiaia/ 

Fim do capítulo