Capítulo 9
Capítulo 09
Giovanna desceu das pedras do Arpoador e pilotou a moto vagarosamente pela orla, vendo inúmeras pessoas felizes caminhando, casais andando abraçados, crianças correndo e brincando, pessoas na areia e no mar, outras caminhando apressadamente e andando de bicicleta, cães e seus donos e turistas tirando fotos.
Saiu de Ipanema, seguiu pela Avenida Atlântica, em Copacabana, depois resolveu visitar o parque da Quinta da Boa Vista em São Cristóvão. Parou a moto em um estacionamento e caminhou pelo parque. Viu aquele lago bonito, que refletia cores laranja, com o sol baixando no horizonte, cercado de grama por todos os lados, aquela construção imponente do tempo do império e famílias de patos e gansos na lagoa. Viu ao longe famílias sentadas aos pés das árvores e crianças correndo, com bicicletas, jogando bola e brincando com pipas, casais de namorados sentados, se abraçando e se beijando.
Sentou ao pé de uma árvore, se encostou e depois de alguns minutos sentiu outra pontada aguda no peito, suas mãos e olhos se fecharam fortemente, encolheu as pernas, abraçando os joelhos e pressionou a mão com o punho fechado no peito, soltou um gemido sufocado de dor e aos poucos foi recobrando o fôlego, sentia-se muito cansada.
Soltou as pernas e os braços em sinal de desgaste e lágrimas começaram a descer pela face, o choro e o soluço foram inevitáveis. Naquele instante ficou com medo de não ter tempo para aproveitar sua vida, ficou com medo de perder momentos como aqueles que acabara de ver as pessoas fazendo. Medo de nunca realizar seus sonhos mais simples, de se casar e dividir seus dias com uma mulher, de viajarem juntas, de planejarem a gravidez de sua mulher, de curtirem juntas a gravidez e um bebê, de passear com seu filho ou filha, de brincar com eles, de vê-los crescer, como todos aqueles que estavam a sua volta faziam. Neste momento ficou com medo de deixar Carolina se envolver com ela, caso seu caso clínico fosse grave e não tivesse muito tempo de vida. Não se permitiria fazer aquela mulher sofrer.
Resolveu que procuraria por Virginia na próxima semana e se não fosse possível melhorar, se afastaria de Carolina. Viveria só os seus últimos dias. Não gostaria de ver piedade no olhar de Carolina e a sensação dela se despedindo constantemente. Não queria piedade das pessoas e nem que ficassem perto dela, por ser uma doente terminal ou algo do gênero.
O fim da tarde chegou rápido e após se recuperar, foi para seu apartamento. Queria ficar um pouco sozinha. Ao entrar, sorriu ao ver os vestígios da noite anterior. Ligou o som e deitou na rede da varanda. Desejou muito ter Carolina ali naquele momento. Sorriu, ao perceber que as canções do rádio falavam de amor e ela só pensava em Carolina. Desejou que tudo ficasse bem, entendeu que a vida lhe deu outra chance para recomeçar, agora viveria cada dia como se fosse único e faria o que era certo fazer.
Resolveu afastar a tristeza e a melancolia. Nunca fora de ter pena de si mesma. Nem quando as mortes aconteceram. Levantou, colocou uma música agitada e alegre, arrumou a sala de jantar, comeu uma salada e arrumou a cozinha. Ao entrar no quarto, se deparou com a cama desarrumada, os lençóis no chão e os travesseiros ainda amassados e sentiu o cheiro de sex* que exalava no ambiente e sorriu, percebendo que aquilo lhe trazia felicidade.
Trocou os lençóis e arrumou a cama. Tomou banho e ligou o computador para trabalhar um pouco.
Precisava analisar as informações graves que recebera e ainda lhe incomodavam. Nestes dias com a internação abandonara o caso. Teria de se encontrar com Denise em breve, somente ela poderia confirmar todas as suas suspeitas.
Acessou seu e-mail fake e viu que possuía novos e-mails para serem lidos. Leu atentamente as informações que acabara de receber, realizou as pesquisas e buscou confirmar as informações que constavam nos relatórios. A cada momento se angustiava e a raiva aumentava mais com o que descobria. Levantou nervosa da cadeira, apertando a nuca e passando a mão pelos cabelos.
Voltou a sentar e com as mãos trêmulas e os olhos com lágrimas, abriu uma página em branco do bloco de notas e digitou. Sabia que ele monitorava seu computador e estava vendo tudo que ela via, era mais seguro assim que páginas de relacionamentos e troca me mensagens via internet.
- Você está aí? - Aguardou alguns segundos e recebeu a confirmação.
- Sim!
- Isso é realmente verdade? Tem certeza absoluta? - Ela não queria acreditar no que lera nos relatórios.
- Tudo confirmado!
- Não posso acreditar! Porque não descobrimos antes?
- Somente com as amostras que colhemos no hospital conseguimos descobrir!
- E a outra informação? Não me parece condizer com a pessoa! - Estava com o peito sufocado pela decepção que acabara de descobrir.
- Você viu as informações! Nada mais precisa ser dito! Afaste-se!
- Não vou me afastar! Quero descobrir tudo agora! Não consigo acreditar no envolvimento dela nisso!
- Não se envolva! E você não está em condições físicas para isso!
- Tarde demais, já me envolvi e agora é uma questão de honra saber! E você mesmo me mostrou que o problema é externo! Basta interrromper e estarei melhor e pronta fisicamente quando chegar a hora; sabe que retornei os ensinamentos.
- Você sabe que se confirmarmos que ela tem envolvimento e você estiver envolvida, você será afastada.
- Estou no comando! Eu criei e desenvolvi esta equipe, não venha me subjugar!
- Não estou subjugando-a e respeito a hierarquia, mas eles podem pensar que você tem participação nisso!
- Vou descobrir! Não quero me afastar até ter certeza! Deixe que com eles eu me entendo!
- Quando descobrir pode ser tarde demais!
- Saberei ponderar e sairei se achar que ela realmente está envolvida! Mas preciso de mais tempo!
- O prazo está acabando e você sabe que depois não conseguiremos mais detê-los.
- Eu sei! Estarei pronta até lá!
- O helicóptero chegará segunda às vinte e duas horas no mesmo local.
- Ela continua infiltrada? Ninguém desconfiou?
- Não! Mas pelo que acabamos de descobrir, você está na mira! Precisa ter cautela!
- E terei! Não vou mais deixar que façam isso!
- Eles podem desconfiar, você precisa ser discreta, ou podem usar de táticas mais violentas!
- Acredito que são capazes de tudo, mesmo! Mas serei discreta!
- São capazes mesmo e já tivemos provas disso!
- Nunca me esquecerei! Eles não ficarão impunes, faremos justiça!
- É o que me move, sabe que não descansarei enquanto não pegarmos eles, amiga!
- Eu sei meu amigo! Prometo que as mortes deles não foram em vão! E nem tudo o que eles te causaram será esquecido.
- Assim eu espero! Nunca me esquecerei do que você fez por mim e por isso aceitei quando você me chamou!
- Eu sei! Te prometi uma vez e lhe prometerei outra. Eles pagarão por tudo que fizeram!
- Eu sempre acreditei e continuo acreditando em você minha amiga! Cuidado e boa noite!
- Obrigada, terei cuidado sim! Boa noite!
Como nos dias anteriores, ligou a impressora e imprimiu as informações que recebeu e os e-mails, anexou as informações em um novo e-mail e o enviou, sabia que ela sempre estava atenta e compreenderia o que ela queria. Passou as mãos pelos cabelos e inclinou a cadeira para trás. Sabia que no momento que revelasse tudo de que tinha conhecimento, muitas mudanças aconteceriam. Mas não imaginava que eles tivessem coragem de ir tão longe. E agora precisaria saber se ela está envolvida. Seu coração se angustiou com essa possibilidade.
- Espero que não! Ai Deus, não posso acreditar!
Levantou, retirou a última gaveta do lado direito do guarda-roupa, pegou a maleta que estava escondida sob o fundo falso e colocou os documentos no envelope, pegou o pen drive e o microchip com o adaptador USB, e salvou também as novas informações neles. Colocou o pen drive no bolso e retirou o microchip do adaptador, abriu a tampa do fundo do relógio de mergulho e colocou o microchip dentro, travou e despressurizou a tampa para ficar bem vedado e guardou o relógio no bolso também. Guardou o adaptador e pegou o celular que estava dentro da maleta, ligou o aparelho e discou. Ouviu a voz do outro lado confirmando que havia recebido as informações, providenciaria tudo e estaria no local, no dia e hora marcados.
Desligou o celular e trancou a maleta, acomodou-a no fundo falso e recolocou a gaveta no lugar. Retirou a outra gaveta e o outro fundo falso e buscou os estojos, checou tudo e guardou. Havia treinado muito, mas desejava que nunca mais precisasse usá-las. Desligou o computador e olhou no relógio, vinte horas.
Ficou um tempo ainda parada pensando, soltou um suspiro e resolveu ligar para saber se Carolina estava liberada do hospital e em condições de fazer alguma coisa. Precisava se apressar e não poderia perder nenhum dia. Ouviu a ligação ser completada.
- Oi Gio!
- Oi anjo! Já saiu do hospital?
- Sim, cheguei em casa há pouco. O parto foi bem difícil, mas no final deu tudo certo! Os dois ficaram bem!
- Fico feliz em saber! Está muito cansada?
- Muito! Acabei de tomar um banho e comer um lanchinho!
- Quer uma massagem para relaxar?
- Jura? Seria maravilhoso!
- Quer que eu vá aí?
- Ai Gio eu adoraria, estou muito cansada para dirigir mais hoje!
- Tudo bem minha linda, vou aí então!
- Você poderia passar a noite aqui comigo!
- Não quero te incomodar!
- Muito pelo contrário, eu estou precisando de você!
- Humm... que linda! Então eu passo a noite sim!
- Aproveita e traz suas coisas para irmos para o sítio amanhã, assim não precisamos perder tempo e vamos direto daqui, com meu carro!
- Tudo bem, mas o que eu levo?
- Bom, vamos ficar até segunda já que é feriado. Lá tem piscina e por ser Petrópolis à noite faz um pouco de frio. Leva biquíni e algumas roupas para o dia e a noite. Toalhas, cobertores e travesseiros eu levo daqui.
- Está certo! Daqui a pouco estou aí! Beijos.
- Beijos.
Giovanna encerrou a ligação. Foi até a sala, acionou os botões no alto do quadro de árvore e a estante de livros se moveu. Apertou o pino no rodapé e soltou a tampa que acoplava na parede e camuflava o cofre, depois retirou a tampa, digitou os códigos e abriu o cofre. Retirou alguns aparelhos que teria que usar, o dinheiro e colocou o relógio de mergulho e o pen drive lá dentro. Fechou o cofre, limpou as teclas do painel com o spray e um pano e encaixou a tampa novamente, travou o pino e voltou a estante no lugar.
Arrumou a mochila com os equipamentos, com o biquíni e as trocas de roupa para o domingo e a segunda. Colocou uma calça jeans, camiseta, o sapato e a jaqueta de couro. Antes de sair do apartamento, acionou o alarme e o botão do infravermelho sobre o batente da porta.
Carolina
Assim que saiu do prédio e se despediu de Giovanna, Carolina ligou o rádio do carro e um sorriso surgiu involuntariamente em sua face ao ouvir Don't Know Why. Lembrou-se dos momentos que teve com Giovanna e verdadeiramente se sentia surpresa pelas sensações que sentiu enquanto Giovanna a tocava, nunca imaginou que pudesse sentir tanto prazer e de uma forma tão delicada e sensual.
Com os homens que teve antes e depois de Roberto até era agradável, algumas vezes teve orgasmos, mas eles eram brutos, só pensavam em seu prazer e eram alheios as necessidades dela. O que sentiu com Giovanna era completamente o oposto, era tão intenso, tão incrível, um prazer constante e ela era carinhosa e sensível ao que Carolina desejava. Como uma mulher podia despertar tudo isso em seu corpo? Sentia-se maravilhada e ao mesmo tempo temerosa, sabia que estava apaixonada por Giovanna desde que começou a vê-la na praia, mas ainda achava cedo para lhe dizer tudo o que sentia. Via no olhar de Giovanna mágoas, talvez causadas pela sua última relação e sabia que para Giovanna era tudo muito novo, ela não se sentia atraída como Carolina por ela durante meses, e por isso não queria se precipitar.
Chegou ao hospital e se encontrou com Jéssica, sua sócia e amiga há anos. Tomou conhecimento dos procedimentos e exames que a paciente delas havia feito e se preparou para a cirurgia cesariana. Iniciaram a cirurgia com o auxílio do pediatra neonatologista, procedimento comum para partos de prematuros.
A cirurgia foi difícil, uma vez que a mãe estava de 34 semanas e a pressão arterial muito elevada. Felizmente a mãe e o bebê estavam bem. O recém-nascido foi encaminhado para a UTI Neonatal onde ficaria pelos próximos dias sendo monitorado até ganhar peso para ser liberado e a mãe se encontrava bem e se restabelecendo no quarto. Teriam nos próximos dias o acompanhamento do doutor Fragoso, o obstetra do hospital e Carolina reavaliaria mãe e filho na terça-feira.
Assim que saiu do centro cirúrgico com Jéssica e foram para o vestiário se trocar, Carolina sorriu ao lembrar-se de Giovanna, quando ela disse que ela teria muito trabalho por causa do parto e acertou em cheio. Jéssica percebeu o sorriso da amiga.
- Hummm... vejo que a noite foi boa hein?
- Ai Jé, foi maravilhosa!
- E qual é o nome desse gato que está fazendo a minha amiga sorrir assim, mesmo depois de ter enfrentado três horas de cirurgia?
- Bom Jé, já que você é irmã da Vi e sei que é uma pessoa super mente aberta, vou te contar uma coisa!
- O que? Não me diga que você está... está... saindo com a Virginia? Ela é casada com a Marta!
Carolina gargalhou da pergunta da amiga, só de se imaginar com Virginia. Não que ela fosse uma mulher feia, muito pelo contrário, sua amiga doidinha era uma pessoa bonita e atraente. Era esguia, brilhantes olhos cor de mel e cabelos negros ondulados, e sempre estava com um sorriso de moleca no rosto atraindo olhares para ela. Mas era uma grande amiga, não se sentia atraída por ela.
- Claro que não estou saindo com a Virginia, tá doida?
- Ufa! Que susto! - Jéssica levou a mão ao peito e fez uma expressão de alívio, que fez Carolina sorrir.
- Em partes você acertou, estou saindo com uma mulher, mesmo!
- Uma mulher? Você está saindo com uma mulher Carol?
- Sim!
- Será que o mundo todo virou lésbico e só eu que não?
Carolina e Jéssica riram muito.
- Para! Você adora a "coisa" - Carolina fez uma expressão com as mãos - e é uma coelha, tem quatro filhos! Nunca será lésbica!
- Sou coelha mesmo e adoro a "coisa" amiga, ainda pretendo ter mais uns dois, pelo menos.
- Aff... você quer aumentar a população mundial sozinha?
- Adoro crianças! Sempre quis ter família grande. Amo meus bebês, não são lindos?
- Eles são lindos mesmo! Principalmente a minha princesinha Amandinha!
- Minha princesa é linda, né?
- Ai que mãe coruja! É, é linda e você sabe! Sua boba!
- Mas me fala Carol, quem é essa mulher? Não me diga que é alguma amiga maluca da Virginia? Ela tem cada amiga maluca, que eu não acho que são legais para você!
- Bom... ela conhece a Virginia, mas não é bem amiga dela. É uma paciente dela.
- Paciente?
- Sim!
- E foi a Virginia que apresentou vocês?
- Não. A conheci da praia.
- Puxa que coincidência! E o que faz essa moça?
- Ela é advogada... mas... me esqueci de perguntar em qual empresa ela trabalha, ou se tem seu próprio escritório. Bom, mas não importa, eu estou adorando sair com ela, Jé!
- Nossa esse negócio de mulher deve ser bom mesmo, cada dia que passa mais amigas minhas, sem falar da minha irmã gêmea, estão virando adeptas!
- Ai amiga, nem te conto o quanto é bom!
- Nem conta mesmo, não quero saber de detalhes sórdidos, sai pra lá!
- Bom Jé... preciso ir! Manda um beijo para o Bernardo, o Juninho, o Rafinha, o Lukinha e a minha princesa linda. Fala que a madrinha dela está com saudade.
- Amanhã é aniversário da Marta, você vai?
- Vou sim!
- Ah, então amanhã você mata a saudade da sua afilhada e dos meus três rapazinhos.
- Ai que maravilha! Não vejo a hora! Um beijo e bom sábado Jé! E até amanhã!
- Bom sábado! Até amanhã Carol!
Se despediram e Carolina foi para um shopping comprar o presente de Marta e aproveitou para comprar alguns presentes para os filhos de Jéssica. Era madrinha de Amanda, mas sempre presenteava os outros meninos para não ficarem com ciúmes.
Chegou em casa, tomou banho e fez um lanche. Sentou na varanda e lembrou novamente de Giovanna ao ver o mar. Pegou o telefone para telefonar para ela, e neste momento o telefone tocou e ao ver no identificador de chamadas o nome dela, sorriu, pela coincidência.
Assim que desligaram resolveu arrumar a casa para receber Giovanna. Queria surpreendê-la.
Fim do capítulo
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Andreia
Em: 16/09/2024
Eu desconfio que Gio não diz ser quem é tem uita coisa por traz e será que vai ter haver com Carol pelo que foi dito na msg este segredo Gio esconde vai ter a ver com empresa onde trabalha que ela está investigando eu acho que sobre drogas e tomara que não coloque td a perder com Carol o que será que vai ser este mistério todo vamos ler p descobrir abraços.
Vanderly
Em: 10/10/2019
Mistério no ar! Então a Giovana não é quem diz ser, e está mentindo para Carolina isso não vai ser bom.
Acho que a Geovana, que na verdade se chama Beatriz, está investigando um caso de tráfico de órgãos, pelo que entendi aqui. Ou são bebês?
Fiquei super curiosa.
Beijos.
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