Tempestade por Ana Pizani
Capítulo 13 - Irresistível
O sonho encheu a noite
Extravasou pro meu dia
Encheu minha vida
E é dele que eu vou viver
Porque sonho não morre.
Adélia Prado
Rosa era uma mulher realizada. Do alto dos seus quase trinta anos, ela possuía um emprego dos sonhos e estava prestes a receber uma promoção sonhada há muito tempo. Com isso, poderia se considerar uma mulher de sorte.
Dentro do seio familiar era tida como uma mulher forte, empoderada e que servia de exemplo para todas as outras mulheres mais jovens da família Soares. Sim, ela fazia parte de uma das famílias mais tradicionais da cidade. Juntos, seus tios eram donos de uma grande rede de posto de combustível e ela poderia muito bem ter ido trabalhar dentro do seio familiar, mas preferira construir o seu próprio caminho. E estava conseguindo. Tudo perfeito, não fossem as tardes de domingo, sim, sempre as tardes de domingo onde a solidão parecia bater mais forte.
É claro que ela possuía muitos amigos e saía muito exatamente para não escutar a sua dor de saber-se só apesar de tudo que tinha. Dinheiro, casa, carro, uma família unida que a aceitava como ela era, ainda assim não conseguia entregar-se a ninguém de corpo e alma.
Era incrível como uma noite de amor, uma simples noite de amor, poderia tê-la marcado de forma tão profunda. Não importava com quantas garotas lindas ela se deitava, em quantas festas estonteantes e ambientes chiques ela freqüentava, sentia falta da simplicidade de Aline, das bebidas baratas e as baladas na parte pobre da cidade.
Foram poucos meses de convivência, mas aprendera tanto com a garota que não conseguia esquecê-las por mais que tentasse. Saber de sua volta de forma repentina, fez vir à tona todo o sentimento que estava adormecido. De repente, todas as noites que passou em claro imaginando este momento aconteceu e pior, saber que Débora disputaria com ela o amor dessa mulher a fazia se sentir com medo de perdê-la novamente.
Na verdade, Rosa sabia que Aline gostava mesmo era de Débora, porém não conseguia parar de gostar da professora que havia voltado mais linda do que nunca, mais decidida e mais segura de si. Era como se todas as qualidades a fizessem mais irresistível ainda. Sim, a palavra era irresistível, porque ela não conseguia ficar ao lado de Aline e não sentir vontade de beijá-la, abraçá-la, tocá-la. Tinha vontade de sentir o gosto dela novamente, de poder deliciar-se com o seu perfume, em senti-la em seus dedos, em poder amar Aline com toda a sua vontade e desejo.
A festa na casa de Luíza foi um fiasco, Aline foi embora com Débora e Rosa chorou por toda noite. Como poderia ser tão idiota em gostar tanto de uma pessoa que nem sequer olhava para ela? Tantas pessoas querendo a sua atenção e o seu carinho e ela só conseguia pensar em Aline.
Só uma pessoa havia chegado perto, tão perto a ponto de Rosa quase esquecer Aline e essa pessoa era Júlia Chaves, uma grande empresária do ramo hoteleiro, casada, mãe de dois filhos e com um marido quase perfeito. Quase. Elas se conheceram numa reunião e desde então viraram amigas.
Rosa admirava aquela mulher que dominava o mundo empresarial com punhos de ferro. Forte e incrivelmente decidida, ela era uma constante em sua vida. Até que descobriu a traição de seu marido, um casamento de quase vinte anos destruído. Quem estava ao lado dela no momento mais difícil? Sim, Rosa. Ela era a típica pessoa forte para se ter ao lado quando tudo parecia difícil. E em meio a toda essa aproximação elas acabaram se envolvendo. Júlia, uma mulher envolvente, mais velha e com uma grande dor. Rosa, uma mulher cheia de vida e ainda apaixonada por uma Aline distante.
O relacionamento não durou muito, na verdade elas nem chegaram a namorar. Ficaram alguns meses juntas, mas Rosa não conseguia se entregar totalmente enquanto que Júlia estava muito envolvida e apaixonada querendo assumir a relação por mais difícil que isso fosse.
Num momento de fraqueza, Júlia acabou voltando para o marido e o relacionamento e a amizade tiveram fim ao mesmo. Rosa já não se surpreendia com mais nada. Seguia sua vida normalmente apesar de sentir falta dos carinhos daquela mulher.
Numa manhã fria de segunda-feira, elas se encontraram a primeira vez desde que Júlia havia voltado para o marido. Numa reunião chata, dessas que se evita ao máximo, acabaram sentando-se cara a cara e não teve um momento sequer que Júlia parou de encarar a compenetrada Rosa.
Ao final da reunião, enquanto procurava o carro no enorme estacionamento da empresa, Rosa percebeu que alguém a seguia: uma estonteante Júlia.
_ Espero que não esteja me seguindo com todas essas câmeras por aqui. _ Rosa apontou para as câmeras do estacionamento enquanto abria o carro.
_ Rosa, eu queria conversar com você. Depois que voltei com o Marcos eu nem pude te explicar direito o que aconteceu.
_ Você não precisa me explicar nada. Não estávamos mais juntas e eu também não posso falar agora.
_ Liguei para a sua secretária e sei que você não tem nada marcado para a tarde.
Rosa quis entrar no carro e sair dali rapidamente. À tarde ela iria à casa de Luíza para ver como a amiga estava. Aline estaria por lá e ela não conseguia pensar em nada que a fizesse desistir de poder vê-la.
_ Tenho um compromisso pessoal esta tarde, mas é claro que você preferiu ligar para minha secretária em vez de me mandar uma mensagem. Você e o seu excesso de controle, sempre achando que as pessoas estão na palma da sua mão. _ Rosa entrou no carro, mas quando foi fechar a porta, Júlia a impediu.
_ Você está com alguém? _ havia um brilho estranho nos olhos de Júlia.
_ Não, apenas uma reunião de amigas na casa da Luíza. Aline estará por lá.
Rosa não se conteve. Do alto da sua vaidade, não poderia evitar pensar em como Júlia reagiria diante daquela informação.
_ Ela voltou? Quando? _ Júlia parecia sem chão. Sentiu uma onda de ciúmes que até então ela própria não se sentia capaz de sentir.
_ Algumas semanas. Agora, se não se importa eu preciso ir. _ Rosa fechou a porta e acelerou. Olhou pelo retrovisor e viu uma Júlia destruída. Seria o conto de fadas uma grande mentira?
Fim do capítulo
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