Tempestade por Ana Pizani
Capítulo 14 - Mentiras
A vida de ninguém fica parada por tantos anos assim. Aline sabia que Débora estava mentindo quando dizia que não havia se envolvido com ninguém de forma séria. Ela mesma estava mentindo quando disse que não havia tido ninguém sério pelos países que passou. Sempre tem alguém. A não ser que a pessoa esteja presa ou num convento, ainda assim várias coisas acontecem. A maioria das histórias interessantes nunca sequer foram contadas! Por isso quando Luíza marcou uma ‘tarde da paz’, como ela costumava nomear esses eventos, ela precisou ir. Precisava arrancar alguma coisa de Luíza, qualquer informação que fosse e ela sabia que a amiga sabia de algo e não queria contar.
Aline não contava com a presença de uma Rosa de biquíni passeando pela casa, ainda assim manteve o pensamento firme no propósito: descobrir se havia alguém na vida de Débora.
Enquanto Aline descansava no enorme sofá de Luíza, Débora estava atolada até o pescoço de trabalho. Milhares de casos para apreciação, outros tantos mandados a serem analisados, a delegacia parecia um espiral sem fim e ela sentia que estava sendo engolida.
Quem queria realmente engolir a delegada era a policial iniciante Samira, uma japonesa que chamava a atenção de todos os policiais da repartição. Débora fingia não ligar para a presença da menina sempre vindo atrás dela, mas era difícil não notar aqueles olhos pequenos a observando nos mínimos detalhes.
Débora sabia o que a garota queria, só que há tempos não se sentia desejada daquela forma, com toda aquela força. E com tudo ainda tão confuso com Aline, a tentação parecia cada dia maior.
E foi exatamente naquela segunda à tarde, quando elas saíram para uma diligência que o desejo dominou as duas e elas trans*ram no apartamento de Samira.
Enquanto elas trans*vam, Aline e Rosa conversavam animadamente sobre o cotidiano e Luíza preparava drinks e mais drinks que ela, grávida, não poderia tomar:
_ Acho que vou dar um mergulho. Você vem, Aline? _ Aline, já um pouco bêbada, resolveu aceitar. Mesmo sem estar de biquíni, vestiu um short emprestado de Luíza e caiu na piscina.
_ E você, Rosa, o que tem feito da vida além de ganhar rios de dinheiro?
As duas riram. Rosa estava sentada na beirada da piscina enquanto Aline boiava.
_ Nada muito interessante. Na verdade, quase não me tem sobrado tempo para nada além de ganhar rios de dinheiro.
_ AH, pelo amor de Deus! Todo mundo com esse papinho de que nada aconteceu. Gente,foram muitos anos! Vocês deveriam ter feito um diário para me atualizar. Ou então estão caducas e não se lembram de nada mesmo...
Luíza ouviu a indireta. Aline a estava atazanando para saber o que Débora havia feito nos últimos anos.
_ Que isso, Aline, você está bêbada, só pode.
_ Sério, me conta. Essa pinta toda de empresária de sucesso deve arrastar um caminhão de mulheres e homens, não é mesmo?
Aline agora estava sentada ao lado de Rosa, uma Rosa que ao simples roçar de peles sentiu os pelos do corpo inteiro se arrepiar.
_ Que nada! Na verdade eu me envolvi com algumas pessoas sim, mas nada sério. Essas ficadas de balada que não resultam em nada. Agora, teve uma pessoa.
_ Sempre tem uma pessoa... _ Aline gritou de forma que Luíza conseguisse ouvir.
_ Eu me envolvi com uma mulher hetero, casada e com filhos.
_ Um clássico sapatão. _ Luíza disse se aproximando das amigas e trazendo mais uma caipirinha.
_ Cala a boca, Luíza. _ disse brincando Rosa. _ Ela é uma grande empresária, havia se separado do marido e nós nos envolvemos. Mas acabamos terminando e ela voltou para o marido. Nós nos vimos hoje em uma reunião, mas nada aconteceu. E nem vai! Não suportaria viver uma história de mentira. Se for para ter alguém, que seja alguém só meu.
Aline balançou a cabeça concordando com a amiga, Luíza tomava um pouco de suco de goiaba encarando o copo quase vazio de Rosa. A amiga não estava bem, ela sabia disso e o que era para ser uma tarde de filme, resultou numa tarde na piscina.
_ Meninas, o que vocês acham de irmos para a sala? Posso fazer uma pipoca e a gente assiste a um filme.
Aline estava quase que totalmente bêbada. Nadava pela piscina enquanto Rosa a devorava com os olhos. Luíza agradecia aos deuses por Débora não estar ali, podia imaginar uma briga bem na sua sala.
_ Eu faço a pipoca! _ gritou Aline.
_ Não senhora, você vá se trocar para não gripar.
_ Eu te ajudo, Aline. _ disse Rosa a puxando para um quarto.
Aline entrou no chuveiro do banheiro de Luíza. Rosa entrou junto e elas tomaram um rápido banho. Apesar de bêbada, Aline entendia bem o que estava acontecendo. Quando ia sair para se enxugar, sentiu uma mão no seu antebraço.
_ Você sabe que eu... durante todo esse tempo... eu...
_ Não, eu não sei, só sei que estamos bêbadas e a casa está cheirando a pipoca.
_ Não é justo você dar uma chance para a Débora que foi um lixo com você e eu não merecer sequer um abraço seu.
Aline conhecia aquela história, sabia bem o quanto Rosa era uma pessoa envolvente e que tê-la na sua frente seminua era muito difícil, ainda mais estando as coisas tão confusas com Débora.
Ela nem fazia ideia que àquela hora Débora estava na cama com outra enquanto ela evitava Rosa.
Saíram do banheiro e Luíza estava escolhendo um filme. O sorriso de Rosa havia sumido. Ela estava cansada de se humilhar, de amar e não ser amada. Os olhos cheios de lágrima ela disfarçou dizendo que era por causa da história do filme que nem era tão emocionante assim. Ela estava sentada no sofá enquanto Aline estava esparramada no tapete. Luíza descansava numa imensa poltrona.
O telefone de Luíza vibrou no meio do filme. Uma mensagem apenas de uma Débora desesperada:
“Fiquei com a Samira.”
Pasma, ela tentou não fingir surpresa. Aline a encarou desconfiada, mas logo voltou-se para o filme. Rosa estava tão distante que nem sequer reparou em nada.
Calada, Luíza não sabia o que pensar da amiga. Quem ela era para julgar quem quer que seja?
O que ela sabia era que Aline não perdoaria Débora, não após toda a história que elas tiveram no passado, toda a raiva e tristeza que Aline havia sentido.
E agora Rosa parecia ter voltado a estaca zero, todo o sentimento de volta como se uma bomba estivesse devastando seu coração. Luíza pela primeira vez desejou que Aline fosse mais esperta, pelo menos um pouco mais ligada.
Débora parecia incapaz de melhorar por elas enquanto Rosa estava ali, engolindo lágrimas por não conseguir se aproximar de Aline. O filme não demorou muito a acabar, Aline ainda estava bêbada e Luíza insistiu para que Rosa a levasse para casa.
_ Por favor, Rosa. _ insistiu Luíza enquanto as duas estavam sozinhas na cozinha lavando alguns copos.
Aline tentava vestir uma blusa, mas não conseguia.
Luíza a ajudou a se vestir e a colocou no carro com Rosa que guiou por todo o caminho em silêncio. Quando chegaram na porta, Aline desceu do carro e ficou no vácuo quando tentou se despedir com um beijo no rosto.
Ferida, Rosa estava devastada e nem percebeu que do outro lado da rua alguém as observava. Com os vidros fechados, nem notou uma Débora que de longe observava a bêbada Aline abrir a porta com dificuldade enquanto Rosa já ia longe.
Fim do capítulo
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