Capítulo 38 - Baile, bistrô e bossa nova
Helena dava pequenos beijos que, em poucos segundos, tornaram-se impetuosos. O clima esquentava cada vez mais, até que Horácio, no quarto ao lado, começou a chorar, o que assustou Flávio, fazendo o segundo bebê chorar mais alto ainda.
“Acho melhor pararmos, essa não é a melhor trilha sonora para um momento como esse...” Helena se afasta lentamente.
“Mas logo eles param... tenho certeza que seu pai vai cuidar deles.” Pérola comenta, aproximando-se novamente.
“Meu pai é péssimo com isso. Mas acho que a Dona Alvina está vindo, ouvi passos na escada.” Helena completa.
“Então acho que podemos continuar de onde paramos...” Pérola dá alguns beijos provocantes próximo ao lóbulo da orelha de Helena.
“Espera... não. Melhor não. É estranho, é estranho. Bebês chorando quebram todo o meu tesão.” A estudante mais uma vez se afasta. “Acho melhor dormirmos, sei lá.”
“Tudo bem, então...” Pérola, um pouco decepcionada, finalmente se deita ao lado de Helena e aguarda o sono aparecer.
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Alguns dias se passaram, e Helena ainda auxiliava a cuidar dos irmãozinhos. Pérola retornou para o apartamento e ocupou seus dias editando novos vídeos, mas marcaram de se encontrar novamente no final da semana seguinte em um bar-bistrô conhecido na zona sul. Quando Pérola chegou, Helena já guardava um lugar em um dos bancos booths.
“Desculpe o atraso, estava terminando de upar um vídeo.” Pérola foi beijar a lateral do rosto de Helena, que sem querer desvia e acaba virando um selinho surpresa.
“O vídeo foi sobre o quê?” Helena questiona enquanto Pérola se ajeita à mesa.
“Sobre maneiras aleatórias de se conhecer alguém que hoje é importante na sua vida. Pedi para os meus seguidores me escreverem como conheceram os melhores amigos, ou também seus amores, e muitos deles contaram histórias dignas de livro. Selecionei as melhores e coloquei no vídeo. ”
“Parece interessante! Chegando em casa vou assistir. ”
“Achei que você iria para minha casa hoje...” Pérola faz bico.
“Pensa que sou fácil assim? ” Helena finge estar brava, mas logo cede com uma bela risada, que é então interrompida por um casal que pede para poder tirar foto com Pérola.
“Claro, meninos! ” Pérola fica no meio dos dois e tira uma selfie. Os garotos agradecem, abraçam-na e voltam para seus lugares.
“Isso acontece em literalmente qualquer lugar que você frequenta? ” Helena pergunta.
“Nem sempre... é que deu certo de todas as vezes que você me viu isso acabar acontecendo, mas nem sempre é a realidade. ” Pérola explica.
“Falando em realidade, eu me lembro de você ter me contado que fez Relações Internacionais... você ainda pretende seguir algo nessa linha de carreira ou vai focar unicamente no canal?”
“Não sei, porque ser influenciadora é uma montanha-russa. Hoje posso estar bem, mas amanhã a plataforma pode mudar e eu posso perder seguidores, então não é uma carreira que eu possa confiar. Por isso estou juntando dinheiro e logo pretendo investir no mercado, bolsa de valores, ou quem sabe fazer uma pós graduação e lecionar.”
“Parece um plano sólido.” Helena, a cada momento, descobre camadas mais profundas sobre a vida de Pérola e vai aumentando seu interesse pela pessoa, sua personalidade e história.
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O dia do baile beneficente também havia chegado, e, apesar da má vontade de Dante, Lívia estava bem empolgada.
“Vou mandar uma foto nossa para o Bento, garanto que ele vai amar ver você de smoking!” Lívia comenta enquanto ajeita seu vestido para tirar a foto na frente do espelho.
“Essa roupa está me sufocando.” Dante reclama. “Prefiro usar terno simples. Por que não posso só colocar uma gravata e uma camisa simples?”
“Você fica lindo de qualquer jeito, seu bobo. E sua mãe comprou esse smoking caríssimo para você com todo carinho.”
“Eu não disse que estou feio, disse que esse smoking está me sufocando.” O garoto continua a reclamar.
“Vem aqui. Abrace-me como aquela famosa foto das duas iguanas se agarrando para eu poder mandar para o Bento.” Lívia ordena e Dante assim o faz. Eles tiram a foto e ela manda. “Agora vou terminar minha maquiagem e escolher um par de brincos, quer ficar aqui para me ajudar? ”
“Acho que vou te esperar na sala. ” Dante aproveita a primeira oportunidade para fugir dali. Na sala, ele pega o celular e lê uma mensagem escrita por Anna cerca de meia hora antes:
‘Bernardo me chamou para uma apresentação de bossa nova de um dos amigos da start up que ele trabalha, vamos com alguns colegas dele... você considera isso uma desculpa dele para me apresentar para a turma?’
‘Não necessariamente, Anna, às vezes ele só queria passar um tempo contigo mesmo então aproveitou para te chamar. ’
‘Não sei... era para ser só mais uma amizade, mas agora a gente trans* quase todo dia. E hoje vou sair com a turma dele. Parece que está ficando sério e estou com medo disso.’
‘Medo de quê? De se envolver? ’
‘É, não sei, de me envolver, talvez. A gente demorou para pegar aquela química, mas agora que eu sei que a gente tem, estou com medo de ser só fogo de palha da minha parte e ele querer algo sério, ou vice-versa.’
‘Não fica pensando muito nisso. Só continues a curtir. Vai no evento, conheça os amigos dele, aproveite. Queria eu estar indo em um rolê desses agora. Tenho um baile beneficente para ir e estou usando um smoking que parece amassar minhas entranhas.’
‘Você de smoking? Essa eu quero ver! Manda foto!’
Dante então tira uma selfie mostrando a parte superior das vestimentas, com cara de bravo. ‘Pronto.’
‘Ah, você está fofinho! Desculpa, você está a cara do meu ex no dia que fomos padrinhos de um casamento...’
‘E isso é bom ou é ruim? ’
‘É bom! Significa que você está lindo! Não se preocupe. ’
‘Ah, obrigado. E tu? Já estás pronta para o concerto?’
‘Quase pronta! Quer ver?’
‘Manda aí. Vamos avaliar. ’
Anna Júlia então também manda uma selfie, que acaba enaltecendo seu decote. ‘Desculpa a indecência, já que é para o Bernardo se exibir para os amigos, decidi me atrever um pouco...’
‘Uau.’ Dante acaba se assustando, mas dentro de si, confessa para sua consciência que gostou da foto.
‘Esse uau foi bom ou ruim? ’
‘Foi bom... acho que foi bom até demais, ou pelo menos mais do que deveria hahahah. Desculpa a falta de decoro, mas não posso deixar de elogiar... teu... digo, teus...’
‘Creio que entendi... hahahah... obrigada, eu acho?’ Anna Júlia responde, com uma mistura de orgulho e vergonha.
‘Estamos aqui para isso hahahaha. Tenho que ir agora, Lívia finalmente terminou de se arrumar. Beijos. Nos falamos mais tarde? ’
‘Mal posso esperar! ’ Anna Júlia responde e vai esperar Bernardo na portaria do prédio.
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Já no baile, Dante evitava contato com as pessoas. Ficou em um canto tomando ponche de frutas, enquanto Lívia ajudava os senhores e senhoras a se ajeitarem nas mesas. Quando ela terminou, foi de encontro ao namorado.
“Mostra pelo menos um sorriso, Dante. O trabalho dos seus pais é maravilhoso ao conseguir fazer isso, você não precisa ficar de cara amarrada.”
“Eu não gosto de ficar aqui, Lívia.” Dante responde, segurando seu ponche e evitando erguer o olhar.
“Por quê? É só um evento, tem música, tem bebida, para de ser antissocial!! ”
“Porque todas as outras vezes que eu vim, alguém foi transfóbico comigo. Todos eles conhecem meus pais e também me conhecem há anos. Eu sei que são idosos e que tiveram uma criação diferente, mas as vezes eu só quero ficar na minha sem escutar nenhum comentário.”
“Dante, você vai ser médico, pode acontecer de você encontrar no futuro um paciente que tenha lhe conhecido antes da transição e faça algum comentário transfóbico, você tem que se preparar psicologicamente para isso e saber corrigir a pessoa e não ficar no canto com ódio do mundo!”
“Se no futuro acontecer isso no trabalho, eu vou saber lidar, mas aqui é diferente! Tu não me entendes. ” Dante suspira e, ao ver que uma senhorinha caminha em sua direção, corre para o banheiro masculino.
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Anna Júlia conheceu os colegas de trabalho de Bernardo e, enquanto aguardava pelo início da apresentação, seu celular tocou.
“Dante? Está tudo bem? ” Anna Júlia se afasta da plateia para poder ouvir melhor.
“Está sim, está sim... Tu estás na apresentação?” Ele responde, um pouco incomodado.
“Estou, mas pode falar... tem certeza que está bem?”
“Eu só detesto esse baile, só isso. Nunca gostei. Não é só por causa da transfobia alheia.” Ele confessa.
“Por quê?”
“Antes da minha transição, eu vivia indo para esses bailes beneficentes dos meus pais.” O garoto vai se acalmando conforme conta. “Tinha que colocar vestidos caros, todas aquelas coisas que me traziam gatilhos para a disforia, gatilhos que eu mal sabia que existiam mas estavam ali, fazendo mal. ”
“Poxa, Dante... não tem como falar isso para os seus pais? Se lhe faz mal, você tem que sair daí!”
“Não quero estragar a noite deles, eles adoram esses eventos, no fim das contas sempre acabo vindo e fazendo meu papel...”
“E tem algo que eu possa fazer para ajudar?” Anna Júlia indaga.
“Não, não...digo, conversar contigo já foi suficiente.” Dante se despede e guarda o celular. Quando abre a porta do banheiro, depara-se com Lívia, olhando para ele sem reação.
“Por que você não me falou o real motivo desse evento lhe trazer tanta infelicidade?” Lívia pergunta, olhando nos olhos do namorado, com certa pena.
“Não queria estragar a tua noite nem a noite dos meus pais falando sobre disforia.” Dante suspira. “Tu escutaste a conversa? ”
“Quando você fica conturbado, costuma falar alto.” Lívia justifica. “Mas se você não quer ficar aqui, vamos dar um jeito de ir embora, amor.”
“Sério? Mas não estás curtindo a festa?”
“Se você não se sente bem eu também não vou me sentir confortável, Dante. A gente vai embora agora e aproveita para usar o resto dos seus brinquedinhos, o que acha?!” Lívia pisca astutamente e Dante, como sempre, não consegue resistir.
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Após muita conversa fiada, comida de qualidade e certa paciência para selfies, Helena e Pérola foram para o apartamento da influenciadora. Ao entrar, deparou-se com um mini estúdio na sala, com diversos equipamentos de filmagem e fotografia. A estudante colocou seu casaco em uma cabideira de madeira ao lado da porta – bem típico de filme. Aliás, toda decoração parecia uma grande cena desses filmes conceituais que ganham prêmios com nomes esquisitos.
“Quer beber alguma coisa? Acho que tenho cerveja na gelad-” Antes de Pérola terminar a frase, Helena a puxa pelo braço e agarra pela cintura.
“Eu quero saber onde fica seu quarto.” A estudante encara Pérola nos olhos e pede, com astúcia.
“Por quê? Quer tirar uma soneca lá?” Pérola pisca e dá uma risadinha, provocando enquanto cola sua cintura agarrada na de Helena.
“Se tem uma coisa que eu quero tirar é sua roupa, e não soneca.” A garota, por sua vez, parte para um beijo de língua, que vai ficando mais intenso e se transforma em blusas desabotoadas e calças com zíper aberto pelo caminho até o quarto, em que Pérola vai guiando.
“Acredita que lá na casa do seu pai achei que estava levando um fora seu?” Pérola, por baixo de Helena, comenta entre beijos.
“Sério? Como assim?” Helena interrompe o beijo na região cérvico lateral para perguntar.
“Quando seus irmãos estavam chorando, eu jurava que você os tinha usado como desculpa para me dar um fora... naquela hora eu só queria apagar aquele dia e fingir que nada nunca aconteceu...” Pérola acaba rindo.
“Eu não fazia ideia que você tinha se sentido assim... caramba! Realmente eu nunca havia passado por essa situação de haver dois recém-nascidos no quarto ao lado, eu estava meio sem saber o que fazer, mas me perdoa, não quis lhe trazer essa impressão...”
“Só vou lhe perdoar se essa mão que está no meu peito descer um pouquinho mais...” Pérola abre outro sorriso, dessa vez um pouco mais devasso.
“Assim?” Helena corresponde com o mesmo sorriso, agora com a mão em cima da calcinha de Pérola, massageando suavemente sobre o tecido, logo puxando-o para o lado a fim de deixar a vulva parcialmente livre para ser explorada.
“Uh-hum.” Pérola consente com a cabeça e, ao sentir os dedos de Helena vasculhando a região, com direção ao púbis para então poder encontrar o clit*ris, arqueia o corpo e não consegue se conter, ergue a perna e a coloca em volta do quadril de Helena, enquanto uma corrente de prazer lhe corre pelo corpo.
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Lívia entrou no carro com Dante e, ao invés de se dirigirem para a casa dos pais do garoto, ele os levou para um drive-thru meio distante dali.
“Esses caras tem as melhores batatas e o melhor milk shake de morango do estado.” Dante coloca a embalagem com as fritas e o porta-copos ao lado, enquanto volta a dirigir.
“Só você mesmo para querer tomar milk shake nesse frio e ainda misturar com batata frita.” Lívia retira o copo de chocolate quente do porta-copos e toma um gole. “Qual vai ser a próxima parada?”
“Podemos ir a um parque que fica do lado da quadra esportiva que eu jogava basquete pelo time municipal, queria te mostrar aquela região, fiz muitos amigos por lá.” Ele responde, enquanto dirige e casualmente come uma batata frita por vez.
“Vou conhecer um pouco mais dos pontos turísticos da vida de Dante Kohler Simmel…” Lívia sorri, enquanto Dante para em um sinal vermelho. Poucos segundos depois, repentinamente surgem dois rapazes de capuz e abordam o casal, um de cada lado da janela.
“Sai do carro! Sai do carro, porr*! ” Um dos rapazes abre o carro do lado de Dante e aponta uma arma para o garoto, que imediatamente ergue as mãos e se rende, completamente tomado pelo susto e pelo medo de qualquer reação.
“Passa o celular!” De um lado, um dos rapazes faz Dante entregar o celular, e do outro, o assaltante toma da mão de Lívia o aparelho. Ambos entram no carro e deixam o jovem casal à deriva.
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Várias horas após o infeliz incidente, Dante e Lívia já estavam de volta na casa dos pais do moço. Lívia ainda enxugando as lágrimas do pranto, assustada, e Dante extremamente irritado.
“Eu ainda não estou acreditando que você não tinha feito seguro daquela merd*.” O pai de Dante joga as chaves do seu carro na mesa de café da sala, após ter buscado o casal na delegacia.
“Como eu ia fazer seguro se eu dependo inteiramente de ti e ainda por cima tu me cobras as parcelas desse carro?”
“Eu não cobrei nada! Só pedi para que fosse trabalhar na minha clínica esse mês, Dante, é o mínimo!”
“Cobraste sim! Se tu tivesses me dado o teu outro carro que está parado na garagem teríamos pelo menos recebido algo do seguro!”
“Vamos nos acalmar, por favor...Ricardo, agora não é hora de discutir com o garoto, ele está nervoso…” Adelheid tenta apaziguar.
“Se eu tivesse dado o carro, você teria dado um jeito de acabar com ele por aí! Quanta irresponsabilidade! Se não tivesse saído da festa mais cedo, nada disso teria acontecido!”
“Eu saí porque não aguentava mais ficar lá! Porque durante anos tenho sofrido transfobia e tenho ficado calado!”
“Lá vem de novo. Nós sempre demos apoio a você, filho, agora você vem me cobrar apoio de um asilo e quer que as coisas mudem da noite para o dia!” Dr. Ricardo perde a paciência. “Para mim já chega, vou dormir.” O pai do garoto se retira, deixando a mãe com o casal.
“Consegui perder meu carro e meu celular na mesma noite.” Dante cobre o rosto com as mãos e se senta no sofá. “Ainda faço minha namorada perder o celular também.”
“Não se preocupa amor, são coisas materiais…” Lívia se senta ao lado do namorado para consolá-lo.
“A polícia já tem a placa e as características do carro, meu filho, logo vão recuperá-lo, não te preocupes. Quanto aos celulares, podemos comprar outros, não tem problema. Podemos pedir online hoje mesmo.” Adelheid também tenta consolar o menino, inconformado com tamanho infortúnio.
Fim do capítulo
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Brescia
Em: 26/07/2019
Boa madrugada mocinha.
Parece que os casais estão se formando, mas eu ainda vejo a Lívia com a Helena, sei lá, rs.
Baci piccola.
Resposta do autor:
Boa noite querida!
Hmmm será?
Teve uma outra leitora que comentou a respeito da intensidade de ambas. O que você acha em relação a isso?
Beijão, meu anjo, aguardo mais feedbacks :*
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nany cristina
Em: 23/07/2019
Oi autora eu não tô gostando dessa aproximação da Ana Júlia com Dante por favor não complica
Resposta do autor:
poxa nany :/
os próximos capítulos tendem a voltar um pouco o foco para o plot da protagonista, acho que você vai gostar!
e continue mandando sugestões e opiniões, saiba que seu feedback é extremamente importante, beijão <3
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