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Linha Dubia por Nathy_milk

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Palavras: 5335
Acessos: 2611   |  Postado em: 27/04/2019

Capítulo 54

Capítulo 54 - Caroline

 

Eu detesto andar de avião, mas viajar em um jatinho particular, posso dizer que é bem menos desconfortável que naquelas poltronas apertadas e com alguem roncando do lado. Eu estava em casa quando uma moça muito educada me ligou, perguntando se eu queria agendar minha passagem no jato particular, é claro que eu estranhei, mas segundos depois eu lembrei e bem acertei que isso é coisa da Fer. A única coisa chata é que eu não consegui avisar ela que estou voltando, liguei mil vezes no celular dela, mas nada, ela deve estar em Urros, mas como lá não tem sinal fica difícil mesmo. Por sorte eu estou com a chave da casa de pedra, que ela me deu da última vez, ainda bem. Acho que em uns 10 ou 15 minutos o avião já vai pousar em Maçores, só tenho que pegar um táxi rápido até Urros, isso não deve demorar muito.

Esses últimos dia no Brasil foram super corridos, vendi o meu carro, me desliguei oficialmente dos hospitais onde eu trabalhava, me despedi das minhas pacientes, passei algumas responsabilidades para o meu irmão e consertei meu rosto. A cirurgia foi até que bem rápida, duas horas de centro cirúrgico e depois um dia de internação, no lugar que estava quebrado, uma colega minha colocou uma placa e quadro parafusos. Acho que chorei tanto para ela me liberar para viajar que consegui, com ressalvas de fazer algumas radiografias aqui e enviar, e a promessa que se precisar eu volto para ela arrumar. lembro bem das frases dela, chegou a ser engraçado:

- Caroline, eu preciso acompanhar você por pelo menos um mês, e se esses parafusos soltarem naquela terra de ninguém?

- Pega leve, tô em um hospital.

- Pega leve? Te conheço menina. Vai sair daqui e vai fazer 48 horas direto de plantão. Não vou te liberar não.

- Para com isso, prometo me cuidar. E tem a minha namorada, ela é bem mais brava que você, ela mesmo vai me colocar de castigo. Confia, pode me liberar para viajar. Eu vou ficar quietinha.

- Promete mesmo? Nada de carregar peso, de plantões longos por um mês. Seu rosto está frágil, se fizer isso vai inchar e você vai ficar desfigurada. - Ela me assustou tanto que aqui mesmo no avião, vindo do Brasil, eu fiz compressa de gelo o tempo todo. Deu uma inchadinha, mas nada que possa desfigurar o rosto, não é pra tanto. Depois do sequestro e por causa da cirurgia acabei ganhando uma cicatriz embaixo do olho. Por sorte, operar com amigas tem sua vantagem, ela foi super delicada nos pontos que me deu, vai ficar bem discreto mesmo, daqui uma semana vou só precisar tirá-los.

Quando o piloto finalmente avisou que chegamos a Maçores, meu coração gelou. Pior que turbulência é a decolagem e a aterrissagem, por sorte esse comandante é super bom no que faz, ele posou que eu só senti o desacelerar da aeronave, nem um pouco assustador como naqueles voos maiores, pelo menos no quesito medo e desconforto. Assim que as portas do jatinho foram abertas, o frio de portugal entrou pela porta, a princípio só esfriou um pouco, o avião já estava bem frio. mas quando eu coloquei meu rosto para fora daquela lataria toda, caramba o ar que saia dos pulmões não conseguiu voltar, que gelo, que frio, inverno, o termo que quiser. minhas mãos e pés engrunjaram na mesma hora e logo em seguida começaram a tremer. Eu estava agasalhada no avião, mas claro que nunca é o suficiente para essa groenlândia portuguesa.

Por ser um voo privado, dá para pegar as malas direto do bagageiro, não direto direto, mas sem passar por todas aquelas esteiras. O ruim é que estou com quatro malas enormes. Da última vez que eu estive aqui a Fernanda teve que me emprestar roupa por causa do frio que estava, dessa vez resolvi me preparar bem mais. Antes de vir, eu fui as compras com a Clarinha, comprei alguns agasalhos e casacos bem quentes, sem contar que as roupas do dia a dia, que o Lucas foi um excelente irmão e pegou todas de volta, lá de casa, ex casa, ah .. sei lá, da casa que minha ex ainda mora. Por sorte um dos comissários me viu nessa situação deplorável, 2 mãos e 4 malas, e me ajudou a chegar ao salão de desembarque,  onde finalmente consegui posicioná-las no carrinho do aeroporto.

Por ser um aeroporto pequenininho, não tinha muita gente esperando alguém. Pensa, um aeroporto em uma vila quase deserta no norte de Portugal, mas mesmo assim eu tinha a esperança da Fer estar me esperando, sei lá, vai que a empresa do avião conseguiu avisar ela ou ela pegou uma das minhas várias ligações e mensagens. A esperança é a última que morre. Infelizmente ela não deve ter visto nada, porque nenhum sinal da minha namorada entre as 10 ou 15 pessoas que estão nesse grande aeroporto. Apesar de ser quase deserto, tem um rapaz que faz o serviço de táxi, ele estava terminando uma corrida e logo iria retornar ao aeroporto, o logo foi uma espera de 40 minutos, mas deu pra esperar.

Quando finalmente cheguei em Urros, já se passava das 15h do domingo. Como a Fer mora em uma viela estreita que não passa carro, o taxista me deixou o mais próximo que deu, mas para as 4 malas que eu levei isso era bem longe. Chegou a ser engraçado, eu andava meio um pouco deixava duas malas e voltava, pegava as outras duas e levava mais um tanto, como estava bem frio, não tinha uma criança perdida na rua para eu pedir ajuda. Quando enxerguei a casa de pedra meu coração se aqueceu de uma tal forma que eu me assustei, acho que nunca senti isso. Meus olhos até começaram a juntar uma lágrima, mas chorar em cima da cirurgia do  rosto não é uma boa coisa.

Eu até tenho a chave da casa, mas não acho legal invadir assim, achei melhor bater na porta. Toc toc 01, toc toc 02, toc toc 03, no toc toc 10 eu desisti de esperar, eu sei que não confirmei com a Fernanda que eu chegava esse final de semana, mas meio que estava já certo isso. OK, não vou me estressar, ela deve estar em Maçores, ela costuma ir pra lá aos finais de semana. Peguei a chave na lateral da mala, depois de uma boa dificuldade, e não me julguem pela quantidade de malas, eu estou mudando de país, trouxe várias coisas. Eu estava ouvindo ao fundo, provavelmente do quintal, os latidos do Pingo, o que faz isso ser mais estranho, toda vez que ela vai a Maçores passar o final de semana leva o cachorro. A muito custo consegui abrir a porta e colocar essas quatro malas gigantes para dentro, é que tem uma escadinha de uns 3 degraus entre a rua e a entrada da casa de Pedra.

Assim que entrei, larguei as malas ao lado da porta e fui direto no fundo da casa para soltar o Pingo. A porta dos fundos fica com a chave já colocada na fechadura. Ele estava em pé, com as patas na parte de cima do portãozinho, balançando o rabo, todo babando e querendo me lamber, na mesma hora eu puxei o portão e ele pulou em mim, me enchendo de lambidas. Meus olhos encheram de lágrima, sério, ver o Pingo é algo tão significativo pra mim, uma representação de uma vida nova que está se iniciando de modo definitivo. Eu sempre quis um cachorro, primeiro não podíamos porque meus pais trabalhavam muito, depois porque minha mãe tava doente, aí eu precisa cuidar de mim e do Lucas, não dava para ter um cachorro nisso, depois a Chris não queria, enfim, finalmente posso sentar no chão para brincar com um cachorro. Ele me lambeu, abanou o rabo, pulou, só parou mesmo quando estava cansado. Confesso que adorei isso, de verdade. Mesmo cansado, quando eu levantei do chão ele veio junto, com a língua de fora.

Me sentei no sofa, de frente para a lareira e respirei fundo. Essa sensação de casa é muito gostosa, daria qualquer coisa pra ela estar aqui comigo, me abraçando e me fazendo rir da cara de brava dela. O cheiro da casa está um pouco diferente do que eu me lembro, o cheiro não é o adocicado da Fer, mas tem cheiro de sal, posso estar viajando, pra mim é cheiro de azeite. eu até comi no avião, mas a fome reina na minha barriguinha. Levantei, acompanhada pelo Pingo, bati o olho na mesa, eu não tinha reparado antes, duas taças sujas de vinho, a Fer recebeu alguma visita, e eu não vou mexer em nada, as duas taças vão ficar aí.

Abri o armário, tinha alguns enlatados no fundo, perdido, mas nada que dava realmente para comer. A geladeira fica do lado de fora, onde um pequeno gerador garante energia para manter os alimentos, abri a velharia, não pude deixar de dar risada da maneira como somos iguais, tinha mais vinho que comida. Humm, uma caixa de padaria para levar pra casa bolo ou algo assim, meu pensamento foi certeiro, seja lá o que tiver nessa caixa, eu vou comer e com gosto. Peguei a caixinha, que era de Maçores, com cuidado coloquei na mesa da cozinha e levantei para pegar um prato e uma faca. Puxei a tampinha, mas ela não veio, ainda estava com fita adesiva “lacrando” o bolo. Primeiro eu fiquei meio arredia, é a casa da Fernanda, o bolo dela, mas a fome é minha, dormi a viagem toda nem comi nada. Com a faca fui delicadamente em cada lado da caixa e soltei a fita, depois puxei a tampa. Era um bolo dos reis, do mesmo que eu a Fer comemos na encosta do Douro, fiquei com dó de cortar, sério. Como hoje é domingo, ela deve estar voltando de maçores, vai querer ela cortar o bolo, não posso invadir assim a casa de alguém, por mais que eu tenha a chave e sair cortando o bolo.

Quando peguei a tampa para fechar e guardar de novo, um papel estava dobradinho debaixo de uma das abas, eu estiquei a mão e peguei. Era um pedaço de papel dobradinho em quatro, com uma letra delicada escrita nele. Eu sei bem quem escreveu, mas porque até agora eu esperava que não fosse? Estiquei o olho até o final do bilhete e lá estava a confirmação da minha resposta, “ Sempre sua, Mi”. O que me faz sempre trouxa é continuar a acreditar nas pessoas. Fui até o topo da folha e comecei a ler:

 

“Fefa, esse bolo é o jeito fofo e faminto de te agradecer por ter aceitado viajar comigo esse final de semana. Sei que você adora esse bolo, principalmente da padaria do Sr. Alvarenga, tem gosto de infância. Coimbra vai fazer muito bem a nos duas, vou adorar esse tempo juntas.

De quem te ama muito, sempre sua, Mi”

 

As vezes que eu falei com a Fernanda pelo telefone eu avisei que as coisas estavam erradas e que a única pessoa que poderia me afastar dela era ela mesmo, eu avisei. De raiva eu poderia cortar meio bolo e comer, mas por sorte quanto mais raiva eu tenho menos fome sinto. Tampei aquela porcaria e coloquei mais uma vez na geladeira, peguei um dos vinhos dela, que já estava aberto e dei uma virada de gole bem pesada, o Pingo tadinho, até se assustou. Voltei para a sala, minhas malas ainda estavam lá fechadas. Peguei duas delas, as que não farão falta agora, a de roupas de verão e a de livros e objetos médicos, puxei elas até o quarto que me foi oferecido da vez anterior que vim, coloquei elas no chão e empurrei para debaixo da cama, ficarão bem escondidas da Fernanda depois eu pego e vejo o que faço. Não imagino que ela tenha ficado com a Milena, nem algo assim, mas me incomoda o fato dela não cortar e ainda ser altamente manipulável por essa garota. Quantas vezes eu não falei que o embargo do hospital estava estranho? Era coisa mandada? O ruim é que eu não posso provar, não tenho como, mas meu coração e os fatos falam que isso é coisa da Milena. Eu sei que é.

Chamei o Pingo até o quintal, o menino sabia bem que iria ficar sozinho lá fora, não que lá fora seja frio ou aberto, não, o “lá fora” é só um pedaço da casa mais aberto, como um quintal protegido.  Coloquei água fresca e mais um pouco de comida pra ele, fechei o portãozinho e deixei ele lá, mas quase chorando com a carinha de desolado que o cachorro fez. Peguei as duas malas que estavam na sala, abri a porta e uma de cada vez coloquei de volta na rua de pedra da pequena vila de urros. É por coisas como essa que nos próximos dias eu vou providenciar o aluguel de um casebre pra mim e posteriormente um carro, já tinha falado isso pra Fernanda, ela ficou super brava, mas a questão é que preciso. Assim que coloquei a segunda mala na rua, uma senhora que estava do outro lado, olhando cada movimento meu abriu a boca, naquele sotaque português bem raiz que eu preciso de muita atenção para conseguir entender.

- Oh “dotora”, tá procurando a “ota dotora”?

- Sim, mas ela não está em casa, depois eu volto.

- Ela saiu com a dona “dos azeite tudo”, aquela loira bonitona. “Sairu” na sexta, dando risada de tudo. Oh “dotora” acho que elas tão fornicando hein?! - Era só isso que me faltava, escutar vizinha chata e perdida, diga-se de passagem que eu nunca vi por perto, falando merd*. Quem não me garante que isso não é coisa da própria Milena, fiz questão de ouvir por um lado e deixar ir embora por outro.

Deve ser uns dois ou três quarteirões entre a casa de pedra e o alojamento do projeto, um caminho bem pequeno e fácil,  se não fosse essas duas toneladas que estou carregando na forma de mala. O que normalmente não gasto nem 15 minutos, dessa vez foi uns 45 quase, mala que virou, que tombou, que arranhou, meu único desejo era chegar logo no alojamento, banho, comida e cama,  afinal amanhã cedo eu tenho paciente já.

Quando eu cheguei, finalmente, até pensei que estava no lugar errado. Tinha 4 vans com o símbolo do projeto parado lá na frente, sem contar umas 50 pessoas em pé na porta, desembarcando malas, caixas, um monte de coisas. Cheguei mais perto, quase que esbarrando em todos. Meu coração se acalmou completamente quando eu vi minha baixinha de estimação, lá estava ela, no auge do seu 1,50 ou 1,45, cabelos platinados, praticamente brancos, curtos, com o megafone na mão, prestes a gritar alguma coisa. Por sorte ela olhou para o lado antes e me enxergou, juro que o olhar da Marcela brilhou quando me viu. Ela abaixou o megafone na mesma hora e me veio até mim.

- Graças a Deus você está aqui! Cadê a corna da sua namorada?

- Hahahaha - não aguentamos, rimos juntas - poxa, eu nem trai ela e ela já é corna?

- A filha da puta pediu para todos os médicos, enfermeiros e  criadores de cabra viessem pra cá e própria não está aqui. Onde ela está?

- Na casa dela que não é? -  olhei pra ela com uma cara que ela entendeu na hora.

- Com a Milena! Puta merd*! - eu concordei. Ela tentou falar mais alguma coisa mas eu cortei.

- No que precisa de ajuda?

- Preciso dividir eles no alojamento e mostrar o refeitorio por enquanto.

- Dá aqui o megafone, que daqui a pouco você está sem voz. - peguei o megafone, ela agradeceu rouca. Levantei o aparelho e comecei a falar -  Senhores, boa tarde. Um pouquinho de silêncio de todos. Peço uma certa organização de vocês. Em uma ou duas horas no máximo o dia terá terminado, nesse momento cai o frio e precisamos estar alojados. Inicialmente vou com todos vocês para o refeitório, tem espaço para todos ficarem sentados enquanto vemos as divisões de alojamento.  Evitem se perder nesse caminho, peguem suas malas. Aqueles que têm poucas malas ajudem os que estão com mais. Vamos indo? - olhei para a Marcela que sorria aliviada com alguém colocando ordem. Caminhei até onde estavam as minhas malas, mas ela falou que cuidava. Depois disso fui ao refeitório, pedi para que eles sentassem e se dividissem em grupos de 6 pessoas, para cada quarto. Quando o primeiro grupos e organizou chamei eles e pedi para os próximos aguardarem. Levei cada pequeno grupo a um dos quartos e mostrei as acomodações pedi que nos encontrarmos no refeitório as 20 horas, para uma conversa rápida.  Fiz isso com cada um dos grupos seguintes, confesso que foi bom essa atividade toda, não fez eu pensar em como estou brava com a Fernanda.

Quando finalmente organizei todos o novo pessoal, fui procurar a Marcela e as minhas malas, quem precisa de um quarto agora sou eu, e acho que todos estão lotados. Ela estava sentada na frente do alojamento, em um banquinho de madeira, com uma xícara de café na mão.

- De onde vem esse café aí? Tem mais?  - quase assustei ela, mas depois que ouviu minha voz, voltou a plenitude de sempre.

- Senta, tem uma caneca aí pra você e café na garrafa. Você quer que eu segure ela pra você bater?  - ela começou a falar se referindo a Fernanda, enquanto eu me serviço de cafe esfumaçante

- Por enquanto ainda não. Deixa ela voltar e eu vou conversar primeiro. Confio muito na minha intuição, não sinto que tenha acontecido nada de mais, mas mesmo assim vou ter uma conversa bem séria com ela. Sem contar que sei que tem o dedo da Milena em cada uma das coisas que aconteceu, o embargo do hospital, ela voltar correndo, ela não estar aqui esse final de semana. Só não tenho como provar, mas sei que ela está envolvida nisso.

- Carol, isso eu não tenho dúvida alguma. Você não viu esses dias, mas todas as formas de liberar o embargo do hospital levava até a milena, pedir favor pra ela, ajuda dela. É que sua namorada, além de irresponsável é idiota demais, eu falei mil vezes pra ela que a Milena estava envolvida nisso, mas ouvi todas as vezes que eu, você e a Antonia somos loucas, pensamos mal de todo mundo.

- Ela realmente é muito cabeça dura, como é. Infelizmente ela vai ter que ver o lixo que a amiguinha dela é. Enquanto isso, eu não sei de nada, vou ficar na minha.

- Você não vai embora ne?! Eu falei pra cabeça dura que se ela perder você, perde eu tambem. Eu não vou puxar esse hospital sozinha, não dá não.

- Claro que não, organizei minha vida toda pra vir morar aqui. E vim pelo hospital, pela Fer tambem, mas não deixaria voces na mão assim.

- Ainda bem doutora, e como você está?

- Cansada, eu não parei um segundo nesses ultimos dois ou tres meses. Preciso de pelo menos um final de semana em paz.

- Um dia quero ter essa plenitude sua, olha o que você passou nesses últimos três meses. Precisa de férias, nem de final de semana. Você está bem?  - ela me olhou com uma carinha mais séria, eu percebi que ela estava falando do sequestro especificamente.

- Bem eu não sei se é o melhor termo. Eu estou assustada ainda Ma, pegar o avião pra vir pra cá foi bem complicado. Entrar no aeroporto na verdade, agora eu estou mais calma, mas os primeiros dias foram bem difíceis. Sair na rua gerava um pânico descomunal.

- Gente, que pesadelo. Eles queriam o que com você?

- Não sei. Um dos caras que me sequestrou fez faculdade comigo. Era uma quadrilha de tráfico de órgãos, ele precisava que eu fizesse o parto de uma garota lá, a mulher do chefe da quadrilha. Pensa o desespero, eu no meio do nada, com medo, toda aquela tortura psicológica, física, tendo que fazer um parto arriscado, sem recurso nenhum e com um cirurgião péssimo junto. Por Deus essa menina não morreu, nem sei como eu não morri.

- A polícia do Brasil descobriu alguma coisa? Quem passou informação, sei la´, qualquer coisa?

- Nada, a única coisa que é uma quadrilha que age em vários estados brasileiros e acreditam que fora do país também. Mas prenderam só esses caras, um morreu quando a polícia invadiu o cativeiro. Ficou em investigação aberta.

- E seu rosto? Tá inchado.

- Operei essa semana, na terça feira. Estou fazendo gelo, fiz o caminho todo pra cá. Semana que vem preciso de um raio X pra ver se fixou a fratura e repassar pra colega que me operou.

- Ficou bem feita a sutura, a cicatriz vai ficar bem bonitinha.

- Sim, ela foi bem generosa, fez bem delicado. Ficou bonitinho. Olha como estava meu rosto.  - mostrei pra ela uma foto que a Fernanda tinha tirado, mostrando meu rosto todo roxo, sem o olho abrir, inchado, preto quase.

- Nossa, como um ser humano consegue fazer isso com alguem?

- E foi de maldade Marcela, isso tudo foi depois do parto, pra colocar medo. Ou era pra me matar mesmo, eu não sei ainda. Nem sei se um dia vou querer saber. Talvez eu só não tenha morrido porque o cara que estudou comigo e que me sequestrou, de alguma maneira me protegeu.

- Ou porque não era sua hora mesmo. A Fernanda ficou desesperada quando soube, estávamos lá em Trás os montes, não tem ideia, achei que ela fosse infartar, chorava igual uma louca.

- Eu encontrei ela quando sai da delegacia, ela tava num hotel, eu fui da delegacia direto pra lá. Ela foi tão fofa, cuidou de mim, ajudou eu a tomar banho, fazer os curativos. Cuidou de mim muito bem.

- Ela é um amor de pessoa Carol, só é inocente e desligada demais. Quando ela perceber a merd* que a Milena é e como ela está maleavel a isso, vai se machucar bem. Eu vou dar um susto nela amanha, sempre falei que ela poderia abrir o hospital, que eu poderia ajudar, mas que eu precisava do comprometimento e responsabilidade dela. Imagina eu quando descobri essas vans chegando, cheio de gente? Ainda bem que você me ajudou. Eu já estaria jogada aqui em posição fetal.

- Que nada, você sempre dá conta disso, e eu voltei agora, vou conseguir te ajudar bastante. Pra quando está a inauguração?

- Vai ser essa quinta feira. Eu já pedi para alguns pacientes virem, para começarmos os atendimentos segunda e as cirurgias na terça. Falando em cirurgia, amanha quero te passar um caso, sua area, ver quando você quer operar.

- Amanhã você me passa isso. Hoje eu preciso achar uma cama pra dormir, pelo menos.

- Não vai ficar na Fernanda?

- Eu não, passei lá a casa vazia, coloquei água pro cachorro e vim embora. Foi quando eu descobri que ela estava em Coimbra com a Milena. Abri a geladeira pra comer alguma coisa, tinha um bolo, na capa do bolo tinha um bilhete agradecendo pela Fer ter aceitado ir para Coimbra com ela esse final de semana. Ai vim pra cá.

- Nem se estressa com isso, amanhã você fala com ela, com mais calma.  - ficamos conversando mais um tempo, até dar às 20 horas, quando eu levantei e voltei para o refeitório, onde tinha que conversar com os novos funcionários. Repassei algumas orientações gerais quanto a horário das atividades do dia seguinte e informei quem deveria estar no hospital amanhã a tarde, coisas simples, quase que só repassando as informações da Marcela.

Quando toda essa orientação acabou, eu deixei algumas pessoas conversando no refeitório e segui em direção ao alojamento, a Marcela falou que tinha uma vaga no quarto dela, que eu poderia ficar. Fui direto pra lá, minhas bolsas já tinham sido guardadas. O quarto era o mesmo modelo de trás os montes, beliches com armarios para cada pessoa. Eu nem desmontei minha mala, só peguei mesmo o que eu precisava para tomar banho e me arrumar, estou tao cansada que se eu não fosse limpinha dormiria sem banho mesmo, isso me lembra quando conheci a Fernanda, eu brigando que ela não tomava banho, sem nem conhecê-la. O banheiro é coletivo, mas com varias cabines, umas dez, estava consideravelmente cheio, mas eu esperei. Em uns 40 minutos eu já estava limpa, trocada e indo dormir, o fuso horário acaba comigo sempre.

 

Acordei por volta das 6 horas da manhã, com o corpo completamente dolorido e sentindo o rosto bem inchado ainda. A noite foi até que tranquila para dormir, só fui interrompida em algum momento da noite, que as outras duas meninas que estavam no quarto entraram dando risada e fazendo zona, fora isso deu pra dormir bem. Levantei rapidinho e fui ao banheiro me ajeitar, passei a pomada para reduzir um pouco do inchaço no rosto. Coloquei uma calça social e uma camisa, como sempre me visto para atender minhas pacientes. Sai com o jaleco nas costas e minha maletinha para o refeitório, que estava começando a encher. Alguns dos novos funcionários já tinham acordado e estavam se alimentando.

Depois que peguei meu pequeno almoço procurei uma mesa vazia e me sentei. O inchaço do rosto está fazendo eu levar um tempo enorme de vida para poder comer, já que tudo que encosta faz doer. Eu olhei duas meninas ao fundo, procurando  mesa para sentar, o gaydar rapidamente apitou para as duas e por cortesia do arco-íris e pela educação que tenho, quando perguntaram se poderiam se sentar eu concordei.

- Podemos sentar doutora?

- Claro meninas, fiquem a vontade. Estão gostando de Portugal? - tentei puxar algum assunto com elas - ou já estão sofrendo com o frio?

- Nossa, ontem quando chegamos o frio estava cortando a pele. É sempre assim aqui? - uma delas respondeu. As duas devem ter estourando uns 25, 26 anos.

- Eu estou aqui há uns dois ou tres meses, já peguei frio pior. Depende muito , voces são de onde?

- Brasileira -  eu concordei, com um “ah tá, nem imaginava” e a menina completou -  Goiás.

- Minas, de BH mesmo. - a outra falou.

- Ah, eu vivi a maior parte da minha vida em São Paulo, mas meus pais são cariocas, então cresci na praia e sol, quase morri nas primeiras semanas aqui, depois vocês acabam se acostumando. - Elas deram uma risadinha entre elas, como uma piada interna, apenas olhei, como se falasse “Qual a graça?”

- Ah, estávamos falando ontem, cidade nova, lugar novo. Vai que descolamos alguém pra nos esquentar. - ela estava com vergonha de falar, mas querendo conversar, como se eu fosse nativa de Urros e pudesse dar muitas informações.

- Sim meninas, lugar novo. Tem bastante gente nova na cidade, dá pra descolar alguém. Já viram alguém interessante? Vamos ver se eu conheço.

- Eu estou bem tranquila, gosto de olhar primeiro, ver o que acontece. Já a desesperada aqui bate o olho e se apaixona.  - a garota 01 voltou a falar

- Fica quieta boca aberta, ela é sua chefe. Desculpa doutora, a Joana aqui fala de mais.  - Eu estava me divertindo com a conversa, me lembrava meu 20 anos, começo da faculdade.

- “Que isso”, não conheço muito nem quem é da vila a muito tempo, nem os novos do projeto. Estou aqui a pouco tempo. To curiosa agora, conta em quem você está de olho.  - continuei a conversa.

- Ah, eu nem sei se ela namora, deve namorar. No treinamento ela naõ tava com aliança, mas não sei.

- Você sabe o nome pelo menos? Como ela é? -  Perguntei para a menina 2

- Ah, ela é muita areia pra mim, é a Fernanda, acho que ela é diretora clínica ou alguma coisa assim, mas sem chance, sem contar que ela deve ser casada -

Eu poderia ficar bem puta por ela estar falando da Fernanda, mas era uma coisa tão juvenil, tão sem malícia que eu achei até engraçado, vou entrar na brincadeira delas.

- Putz a Fer? O pior é que ela namora mesmo, e eu conheço a mulher dela, melhor você nem chegar perto, ela é super brava.

- Ai cacete, eu sabia. Também só sendo bem brava pra conseguir amenizar a Dra Fernanda.

- Aqui o pessoal chama ela de Ganate, pelo sobrenome, só pra voces saberem. Mas ela não é brava não, é super gente boa. Logo loga ela chama todo mundo pra ir no bar, alguma coisa do gênero, ela só finge ser bravona.

- A namorada dela é daqui  doutora? Digo aqui do projeto.

- É sim, é uma das diretoras clínicas.  - eu não iria mentir, mas vou marcar território de modo engraçado pelo menos. Vontade de colocar uma aliança na mão dela, não que salve alguma coisa, mas pelo menos mostra de longe que ela tem compromisso.

- Mas quem é? Tem você, a doutora Marcela. Tem mais alguma?

- Não, não, só nos duas?

- Ela namorada a Marcela? -  a menina perguntou com os olhos arregalados, engraçados. A amiga dela já tinha entendido, já estava olhando de um jeito estranho para a menina, que continuava viajando.

- Não não, não é a Marcela.  - ela abaixou a cabeça por um segundo, como se pensasse seriamente sobre o tema, quando entendeu que a namorada da Fernanda sou eu, ela levantou a cabeça de volta, branca, pálida.

- Desculpa doutora, sério, desculpa. Eu sou lerda. Não tinha entendido.

- Eu to aqui te chutando a três horas sua idiota  - a amiga dela falou, eu queria rir na cara dela.

- Fica tranquila, isso acontece, eu mesma já dei várias. Dá licença meninas que eu tenho ambulatório hoje, não esqueçam, anfiteatro as 8 horas - A amiga da menina respondeu “ sim senhora”, enquanto a outra menina continuava querendo abrir um buraco no chão para se enfiar. Foi maldade o que eu fiz, mas achei tão engraçado o jeitinho dela, me fez eu lembrar mesmo dos meus 20 anos, que eu dava um fora pior que o outro, com professor, médico mais velho, colega de turma, mulher, eu era a rainha do fora.

O ambulatório da manhã passou como um raio.Tive mais de 15 pacientes, no padrão Urros, ou seja, sem nenhuma consulta de pre natal, sem tratamento algum de ginecologista, que veio de birinboca lusitana, sem médico há 20 anos, essas coisas que aprendi que acontecem aqui a muito tempo. Quando eu bati os olhos no relógio já se passava das 12h30 e eu estava, pra variar, completamente sem fome. Peguei meu material e segui para o alojamento, a minha ideia era usar essa horinha de almoço para descansar mais um pouco, meu sono está completamente desregulado e eu absurdamente cansada. Entrei no quarto, que estava vazio, sentei na minha cama, arrumei o travesseiro e me acomodei, coloquei o celular para despertar daqui a cinquenta minutos. Antes mesmo de dar tempo, meus olhos já tinham fechado.

Acordei com um carinho delicioso no meu cabelo e rosto, fazendo com que eu nem abrisse os olhos por alguns segundos. Eu até poderia me assustar, mas eu sei bem de quem é esse carinho e por mais que eu esteja brava com ela, é o melhor cafune do mundo, sem contar que saber que ela está aqui  me tras uma segurança do tamanho do universo. Eu continuei fingindo que estava dormindo por um tempinho a mais.

 

 

Fim do capítulo


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Comentários para 54 - Capítulo 54:
rhina
rhina

Em: 29/02/2020

 

Sim Autora.

Vc é uma delícia de lê.....sua escrita 

Eu viajo nas syas palavras.

Delícia.

Rhina

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josi08
josi08

Em: 27/04/2019

No Review

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Bee20
Bee20

Em: 27/04/2019

Vontade de bater tanto na Fernanda pra parar de ser lerda 

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Brescia
Brescia

Em: 27/04/2019

      Bom dia mocinha. 

Primeiramente peço mil desculpas por não ter comentado antes,  mas leio avidamente todos os capítulos . Amo o modo como vc escreve, se fosse um livro , eu ja o teria terminado.

Capítulo ótimo , vc conseguiu fazer com que eu sentisse os mesmos sentimentos , a mesma vontade de esganar alguem,mas vc  fez melhor, a fez superior e foi lindo.

P. S: espero que vc continue escrevendo, pois é uma delicia lê-la. Parabéns!!

     Baci piccola .

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