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Onde Deus possa me ouvir - Vander Lee
Onde Deus possa me ouvir - Capítulo 25
Melissa dirigia em alta velocidade e pouco depois estavam na delegacia que Jaqueline havia falado. Entraram e viram um homem sentado na recepção com a blusa suja de sangue, estava com as mãos no rosto e visivelmente angustiado.
- Então foi esse desgraçado! – Melissa partiu para cima do homem com toda raiva – Vou te matar se algo acontecer a ela!
- Calma Mel – Jaqueline passou na frente do homem – Calma! As coisas não são assim.
- Seu desgraçado! O que você fez? Estava bêbado não foi? Farei de tudo para você apodrecer na cadeia.
- Eu não... não... – o homem estava desorientado e assustado.
- Vou acabar com você!
- Calma Melissa! – Jaqueline tentava segurar a amiga – Vou te levar de volta.
-O que está acontecendo aqui? – o delegado saiu da sala com o barulho que fazia no corredor – Que bagunça é essa?
- A Melissa está muito alterada Rubens – Jaqueline falou tentando manter a amiga distante.
- Melissa o que aconteceu?
- Foi ele quem atropelou a Annie Rubens! Por causa dele a minha esposa e meus filhos estão morrendo – chorou.
- Vamos acalmar os ânimos! Leve-a para a minha sala e procure acalmá-la.
- Eu... eu não ultrapassei o sinal... eu já disse isso – o homem repetia mais uma vez a sua versão – Eu estava dirigindo normalmente, o sinal estava verde e eu acelerei para poder passar pelo cruzamento.
- Como você não ultrapassou o sinal? Se atropelou a minha esposa?
- Senhora, eu não ultrapassei o sinal – estava nervoso – Eu acelerei...não nego.... não queria pegar o sinal fechado... e todo...todo mundo faz isso... só que eu...eu não imaginei que ela iria aparecer ali... eu não tinha visto ela saindo de nenhum lugar e... e... – levou as mãos aos cabelos – Tentei frear, mas não sei o que aconteceu... que....que não pisei no freio... e...
- Acelerou – Jaqueline completou a frase.
- Não...sei... não sei como aconteceu... ela surgiu na frente e tentei desviar... tentei subir na calçada...mas... mas... – chorou – Acabei atingindo e a levando junto... eu não... nunca aconteceu... eu... perdão.
- Ela é cega – Melissa disse levantando – E naquele semáforo tem um sinal sonoro que ela se orienta quando pode atravessar.
- Eu lembro...lembro que tinha uma obra perto... caminhões... barulhos e talvez ela tenha confundido os sinais sonoros... não sei...mas eu...eu não tive culpa... foi uma fatalidade.
- Pode sair senhor Marcos e espere lá fora – Rubens pediu que o motorista saísse.
- Não acredito! – Melissa disse após ele sair – Ele atropelou a Annie!
- Melissa, nós ouvimos ele e mais outras pessoas que estavam no momento e as histórias batem... aconteceu alguma coisa antes da Annie atravessar a via... Ele estava com a velocidade acima do permitido sim, mas não estava alcoolizado e não ultrapassou nenhum sinal... E você sabe que o que ele fez é uma prática comum...
- Mas que pode levar a minha esposa embora! – disse com raiva – Ele tem que ser punido!
- Estamos fazendo de tudo Melissa... ele não fugiu, prestou socorro a ela, manteve-se no local o tempo todo e apresentou-se à polícia... agora é com a gente.
- E ele será liberado?
- Sim...
- Mel, deixe que a polícia faça o trabalho dela... não adianta você ficar nesse estado... Vá em casa tome um banho e te levo ao hospital.
- Não se preocupe Melissa, iremos averiguar tudo e faremos o possível.
Melissa não disse nada apenas acenou um gesto de agradecimento a saiu acompanhada por Jaqueline. Fez todo o percurso até a casa sem pronunciar uma única palavra, sentia-se cansada e desanimada. Não raciocinava direito e a única vontade que tinha era chorar, estava vivendo um terrível pesadelo, mas dessa vez ao acordar nada estaria diferente.
Entrou em casa e não segurou mais o choro que estava preso, ao abrir a porta e ver a casa vazia desmoronou. Chorou compulsivamente. Precisava de Annie novamente em sua casa, precisava do amor, dos abraços, do sorriso sincero, do perfume, não estava preparada para perdê-la e não suportaria viver outra vez toda aquela dor. A água molhava seus cabelos e limpava as lágrimas que caiam sem parar, naquele momento sentia-se sozinha e com medo, medo de perder tudo e de sofrer novamente. Apoiou as mãos no azulejo e chorou enquanto sentia a água molhando seu corpo.
Desejava mais do que tudo voltar o tempo e fazer tudo diferente. Não brigaria com Annie e ao sair a abraçaria, a beijaria e diria que a amava mais do que qualquer outra coisa... precisava de uma chance de dizer mais uma vez o quanto a ama. Mais uma chance. Só uma única chance de fazer tudo diferente. Uma única chance para amá-la mais uma vez. Uma única chance de ver mais uma vez o seu sorriso. Uma única chance de tê-la em seus braços. Uma única chance de dizer “eu te amo”.
Chegou ao hospital e soube por Márcia que nada havia mudado e as notícias não eram nada animadoras. Os médicos ainda estavam na sala de cirurgia e o quadro de Annie não havia estabilizado. Ela havia perdido muito sangue e estava muito machucada por causa da batida e a cesariana estava sendo muito difícil, era uma corrida contra o tempo e o desejo de todos era que a vida saísse vitoriosa nessa batalha tão acirrada.
Após quase 08 horas sem nenhuma notícia a obstetra foi até a recepção e encontrou Melissa que não parava de andar de um lado para o outro.
- Doutora, não aguento mais ficar sem notícias – disse chorando.
- Melissa, serei sincera com você, o estado de Annie é gravíssimo... Terminamos de realizar a cesariana e conseguimos manter os bebês estáveis – deu um leve sorriso – Estão bem em relação ao período e foram levados para a UTI neonatal.
- E a Annie? – Melissa não deixou a médica terminar – Você disse que...que talvez... talvez fosse preciso escolher...e...e ela? Como?
- Melissa, o estado é grave... ela perdeu muito sangue, teve muitos ferimentos, algumas fraturas... a equipe está fazendo de tudo, mas não irei te iludir é grave e até o momento não conseguimos estabilizar.
- Eu posso vê-la? Só...só um pouco...
-Ainda não Melissa.... a equipe está fazendo de tudo e ela está passando por cirurgias, estão tentando conter as hemorragias... não poderá vê-la, mas você pode ir ver os bebês não poderá segurá-los, mas pode vê-los pelo vidro.
- Por favor doutora, faça tudo... até o impossível para trazer a Annie de volta....
- Os médicos farão de tudo Melissa.... agora preciso ir ver como estão os bebês.... Você quer me acompanhar?
- Não... preciso ficar um pouco só... a irmã da Annie irá...
Melissa ficou em uma área afastada e não conseguia parar de chorar, não conseguia alegrar-se pelo fato dos bebês estarem bem e se culpava por isso. A única coisa que importava naquele momento era Annie e nada mais. Não iria conseguir ver os bebês e não iria fingir uma alegria que naquele momento não existia.
- Mel – Jaqueline aproximou-se – Estava te procurando.
- Preciso ficar sozinha – disse com a cabeça baixa.
- Como você está?
- Como acha que estou? A minha esposa está morrendo Jaqueline e eu não posso fazer nada!
- Você precisa ter fé... acreditar.
- ...
- E seus filhos estão bem Mel... e são lindos.
- Não existe recém-nascido lindo Jaqueline.... todos têm a mesma cara.
- Mel, vamos lá vê-los.
- Não quero.
- Porque Mel? Eles precisam de você.
- Não consigo Jaqueline... eu não consigo vê-los... não consigo... Não vou vê-los... Eu...eu sinto...sinto uma...rejeição...
- Mel... você precisa se preparar caso...
- Não termine essa frase! A Annie não vai me deixar – chorou – Não irá me abandonar.
- Mel... você sabe...
- Não! Não sei e não quero saber!
- Mel, você não pode agir como se seus filhos não estivessem nascido! Eu não estou pedindo para que você fique feliz, pois isso é algo impossível, mas que perceba que há um motivo para ser forte. Aqueles dois bebezinhos precisam de você.
- Não irei conseguir sem a Annie.... sem a Annie não consigo... Era o sonho dela e não o meu... foi a vontade dela... e a apoiei... me alegrei com a possibilidade de filhos, fiz de tudo para tornar realidade o sonho dela... não posso e não consigo sozinha ser a mãe deles – chorou.
- Você precisa ser forte minha amiga...
- Cansei de ser forte... de ter que superar tudo... cansei de tudo.
- Mel, eu sei que..
- Você não sabe Jaqueline... nem imagina – disse de forma áspera.
- Não esqueça que eu perdi uma irmã Melissa e que acompanhei todo esse processo, tive que ser forte ao ver todos ao meu redor desmoronando, tive que ser mais forte ainda e engolir a minha dor quando você saiu do coma e tive que dar a noticia. Eu sei muito que dor é essa!
- Desculpe Jaque.... é que...eu... é...
- Vou deixá-la sozinha um pouco.... eu sei que é difícil, mas procure manter a calma.
Melissa ainda ficou um tempo encostada a uma das pilastras queria tirar aquela angústia que estava sentindo, aquela dor tão conhecida que voltara com força. Desceu às escadas e andou sem rumo sentindo a brisa fria tocar o seu rosto. Estava difícil respirar. O clima estava frio e o céu sem estrelas deixava a noite mais escura. Melissa caminhava devagar e uma fina garoa molhava seus cabelos.
Andou mais um pouco e viu uma capela aberta passou direito, mas sentiu vontade de entrar e colocar para fora todo peso e dor que sentia naquele momento. Entrou um pouco sem jeito, não era acostumada àquele ambiente, sentou-se no segundo banco da frente. A capela era pequena e humilde, mas muito aconchegante provavelmente a missa acabara há pouco tempo e estava vazia. Olhou ao redor e aquele silêncio todo a perturbou e uma angústia enorme apertou o seu coração.
- Sabe – disse com voz trêmula – Nunca tivemos uma boa relação não é mesmo? Se tu és o pai que todos falam eu sou a “ovelha negra”. Desde nova ouvia minha avó dizer que quem não te procurava por amor vinha por dor.... e ironicamente aqui estou eu! Nunca acreditei nas verdades defendidas pelos teus fiéis e sempre procurei formas de mostrar o quanto tu estavas errado, o quanto ti escondia por trás dessa onipotência e poder – balançou a cabeça negativamente – Nunca acreditei em ti, nunca fiz nenhum esforço para te entender ou te amar. Para mim o que existe são as coisas visíveis, a ciência que tudo explica, os fatos concretos e reais. Mas estou chegando a conclusão que tu existe e que usas da pior forma para me convencer. Estamos travando uma guerra de convencimento não é mesmo? Tento a todo custo provar que tu não existes e tu me mostras o quanto eu sou impotente e fraca. O teu problema é comigo! – disse com raiva – Comigo e não com as pessoas que eu amo! Se tu és tão poderoso e dono de tudo porque tirou de mim alguém que eu tanto amava? E depois de ter superado voltas a repetir a dose? Porque queres tanto me atingir? Se o teu problema é comigo resolva comigo! A Annie é maravilhosa! Muito melhor que eu... não merece.... não a tire de mim – chorou – Sou eu quem tentou a todo tempo te desacreditar.... Tu sempre quis dobrar o meu orgulho! Sempre quis mostrar que eu estava errada! Sempre quis mostrar que existe... Pois então Deus aqui estou eu! Tu venceste! Não tenho mais a quem ou o que recorrer... não há mais esperança apenas uma corrida desenfreada contra o tempo e minha Annie indo embora a cada segundo. Não era isso o que tanto tu querias? Não era esse momento que tanto esperavas? Olhe para mim e dessa vez não desvie o teu olhar – gritava – Se tu podes....se tu podes... salvas a Annie... Não a leve, por favor.... não a leve agora... eu...eu preciso tanto dela... eu preciso do amor dela.... Por favor Deus, eu sei que não tenho o direito de te pedir nada, mas não há mais nada em mim nem mesmo o meu orgulho.... Me... me ajude – sentia-se sem força – Eu... eu.... preciso de ti.
Melissa chorou tudo o que estava preso e de alguma forma sentiu-se mais leve, ficou mais um tempo sentada e voltou para o hospital. Ao aproximar-se sentiu o coração acelerar e a angústia que havia passado voltou a dar os sinais que ainda estava ali. Passou pela recepção e foi até onde estava Jaqueline e parte da família de Annie.
- Estava preocupada com você – Jaqueline disse ao ver a amiga aproximar – Você está gelada Mel.
- Alguma notícia Jaque? – a voz saiu cansada.
- Ainda não....
- Estou tão cansada – as lágrimas voltaram.
- Eu sei – Jaqueline afagou os cabelos de Melissa – Mas acredite que tudo irá melhorar.
- Mel – Jaqueline tocou suavemente no ombro de Melissa – a médica está ali falando com uma enfermeira... pergunte a ela se há alguma novidade.
- Doutora – aproximou-se da médica – Alguma novidade?
- Estava indo falar com você Melissa... os médicos conseguiram estabilizar a Annie e deu tudo certo nas cirurgias.... o estado continua grave, mas está estável... ela está em coma induzido e aos poucos dependendo do grau de recuperação dela iremos trazendo-a de volta... estamos fazendo o possível Melissa agora é esperar.
- Mas ela corre risco de vida?
- Sim... está estável, mas o estado é grave.
- Quando poderei vê-la?
- Posso te levar até ela, mas você não poderá demorar...
- Fico o tempo que puder doutora.... eu preciso vê-la mesmo que por um minuto.
Melissa não pode entrar no quarto em que Annie estava, mas pode vê-la através do vidro o que não diminuiu em nada a angústia que sentia. Vê-la inconsciente naquela cama e cheia de tubos partiu o seu coração. Precisava tocar em Annie e passar forças para ela voltar.
- Não posso ir lá?
- Ainda não.
- Vai demorar?
- Acredito que não, mas nesse momento isso é necessário. Vou deixá-la sozinha – tocou suavemente no ombro de Melissa.
A vontade que sentiu foi de passar por aquele vidro e ficar ao lado de Annie até ela abrir os olhos. Não iria conseguir continuar sem ela, não conseguiria viver sem seu amor, sem seus carinhos. E agora tinha os bebês.... sabia que sozinha não iria conseguir.
- Ow meu amor – apoiou as mãos no vidro frio – Volte para mim... eu preciso tanto de você... não me deixe meu amor.... os nossos bebês precisam de você. Não irei te deixar sozinha... eu te amo Annie... te amo mais do que qualquer outra coisa.Volte logo meu amor... volte para mim.
Fim do capítulo
Olá minhas queridas, boa noite!
Muito obrigada pela leitura e comentários de vocês, é muito importante! Esse capítulo é muito especial para mim sempre fico mexida quando o leio. Estamos na reta final e meu coração está ficando apertado, mas espero que em breve eu posso postar outra história.
Até quinta ^ ^
Comentar este capítulo:
HelOliveira
Em: 23/04/2019
Nossa esse capitulo sem dúvida é muito forte, dor, desespero a sensação de que não somos nada, onde a Fé é tudo que resta.
Reta final ...Ah já fiquei triste
Bjo
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