Capítulo 16
Fernanda
Eu nunca gostei muito da Bruna, na verdade nem existia um motivo, era mais ciúmes mesmo, implicância. No entanto, toda aquela circunstância fazia com que eu me conectasse com a dançarina de alguma forma. Com desespero eu vi a morena ao meu lado iniciar um desmaio com o prenúncio de uma má notícia acerca da situação de saúde da melhor amiga.
A enfermeira rapidamente ajudou a Lívia a se recompor e a conduziu novamente para a maca. O médico avaliou silenciosamente a engenheira ao meu lado.
- Talvez seja melhor eu voltar depois – anunciou cauteloso enquanto endireitava os óculos no rosto levemente cansado.
- Não, por favor doutor. – pediu a Lívia, já agoniada – pior do que a má notícia é a ansiedade de esperar por ela.
- Tudo bem, mas procure ficar calma, se você ficar agitada vou ter que aplicar um sedativo.
A morena ao meu lado assentiu, o médico voltou os olhos para a ficha a sua frente deu um breve suspiro resignado.
- Olha, como você sabe a Bruna foi reiteradamente agredida pelo seu irmão. Nós conseguimos retirar o projétil do abdômen dela, que até o momento está estável, no entanto, o bebe não resistiu. – eu fitei a Lívia ao meu lado, esta parecia mais incrédula que eu, aparentemente nem ela sabia que a amiga estava grávida. O médico notou a surpresa nos olhos da morena – pela sua reação imagino que você não soubesse da gravidez. Bem, pelo tamanho do feto a Bruna devia estar com 7 a 9 semanas, de toda forma.
- Meu Deus, ele matou o próprio filho! – a engenheira ao meu lado passou as mãos pelos cabelos – quem sabe foi até melhor que tipo de monstro poderia sair com a carga genética daquele crápula?! – eu olhei pasma para a morena.
- Olha, o caráter da pessoa não provém só da genética, tem muito da criação e do ambiente também, enfim, a senhorita deve saber disso – falou o médico – inclusive, você e o agressor são irmãos né?! Se fosse só pela genética a senhora deveria ser igual a ele.
- Eu sei doutor, eu estou nervosa – respondeu baixinho.
O médico deu um sorriso complacente, colocou a mão no ombro esquerdo da minha morena.
- É difícil, mas vai passar. Queira que passe.
Após apertar calorosamente a minha mão, e dar mais uma olhada na Lívia o doutor saiu da sala e nos deixou a sós no quarto.
Avaliei a morena a minha frente preocupada, não apenas pelo que ocorreu, mas sobretudo pelas suas últimas palavras. A Lívia não sabia que o meu filho era fruto de uma relação com o seu irmão, mas será que seria justo eu segurar esse segredo pelo resto da vida? Como ela me veria depois disso? Ela amaria menos o nosso bebê por conta disso?
- Eu preciso ligar para o meu pai – quebrou minha linha de raciocínio – me empresta seu celular? O meu aquele demônio deu fim – falou com ódio.
- Claro, claro. – tirei o aparelho da bolsa e observei à distância a conversa dos dois, na verdade a parte dela do diálogo.
Alguns minutos se passaram desde o momento que eu emprestei o celular e o findar da ligação, mas sinceramente acabei por me distrair, o comportamento anterior da engenheira mexeu demasiadamente comigo, só voltei a realidade quando ouvi meu nome ser chamado reiteradas vezes por Lívia.
- Oxi, o que houve para você tá nessa viagem mental, Nanda?
- Nada, acho que é só cansaço mesmo.
A morena estreitou os olhos na minha direção, ela me conhecia muito bem. Dei um suspiro, não queria conversar sobre isso agora. Já me preparava para um breve debate, ou no mínimo um monólogo dela sobre “como nossa relação precisa de mais diálogo”, no entanto, para a minha surpresa os olhos cor de mel só me fitaram com carinho.
- Deve ter sido bem estressante para você essa situação mesmo, vai para casa descansar amor.
Eu me sentia cada vez mais culpada, não que eu me arrependesse de ter meu filho, não era isso, eu me arrependia das circunstâncias.
Já era tarde quando seu Oscar apareceu no quarto de hospital, estava visivelmente cabisbaixo, os olhos meio inchados e tristes. A engenheira fitou-o preocupada, eu já imaginava o que estava por vir. Me sentei na poltrona passando as mãos nos cabelos já bagunçados.
- Pai, por que o senhor está assim? Eu tô bem! – segurou as mãos grossas do homem.
- Eu sei minha princesa, eu sei – engoliu o choro e voltou a falar – graças a Deus você tá bem, eu não aguentaria perder dois filhos de uma vez.
- Han? Como assim, pai?
O homem colocou as mãos no rosto, o nervosismo era latente. A engenheira fez menção de levantar, mas eu não deixei. Me encaminhei até o senhor choroso e o direcionei para uma das poltronas do quarto, e dei-lhe um copo de água.
Minha morena angustiada esperava uma manifestação do senhor a sua frente, o qual demorou alguns minutos até se recompor.
- Se o senhor quiser lavar o rosto tem um banheiro ali.
- Ah, obrigada Fernanda! Mas já estou melhor, me desculpem esse excesso – terminou de limpar os olhos com o lencinho branco que trazia no bolso da camisa.
- Então pai o que aconteceu? – perguntou ansiosamente a morena.
- Seu irmão, o Marcos, foi encontrado morto na beira da praia do sul, próximo a uma das cabanas. Eu demorei pra vir porque fui reconhecer o corpo, mas quase não reconheci meu filho, o rosto estava desfigurado, os braços e pernas foram separados do tronco. – respirou fundo segurando mais uma vez o choro – ele foi torturado minha filha, eu só o reconheci por conta dessa marca de nascença de vocês, porém mesmo assim o delegado achou melhor fazer um exame de DNA.
A Lívia ficou calada por alguns estantes, sinceramente eu não sabia o que viria por ali. Particularmente, não dá para dizer que era uma surpresa o Marcos ser assassinado, ele devia para gente muito perigosa, e quando a pessoa se envolve com a criminalidade sabe que existe uma chance muito grande de ter esse destino.
- Bem, sinceramente para mim não é uma perda – ela olhou para o pai a sua frente e tentou suavizar as palavras – o senhor sabe que eu e o Marcos sempre nos detestamos e agora mais ainda, entretanto eu sinto muito pela sua dor meu pai! De toda forma perder um filho deve ser muito difícil.
- Eu ainda nem dei a notícia a sua mãe, o único que sabe é o Nicolas. Ele vai contar para sua irmã amanhã de manhã, eu pedi para ele levar a Júlia para a casa dele, porque eu sei que a reação de sua mãe não vai ser das melhores.
- Eu sinto muito seu Oscar – abracei o senhor choroso a minha frente – se o senhor ou sua família precisarem de alguma coisa pode contar com a minha ajuda.
- Oh minha nora, obrigada! Você já faz tanto cuidando dessa geniosa ai – brincou com a engenheira que estava séria, meio pensativa.
Eu sorri para o homem que apesar de triste se esforçava para cuidar da família. Sem muita demora seu Oscar nos deixou, e foi para casa contar para a mulher sobre a morte do filho.
- Como você tá? – perguntei a morena a minha frente que fitava um ponto qualquer no chão.
- Você acha horrível eu ter ficado de certa forma feliz e aliviada com essa notícia? – ela me olhou com intensidade. Eu engoli em seco, só imaginava a reação dela quando soubesse...
- Não, eu acho que você passou por um estresse muito grande, ainda que seja seu irmão era também seu agressor – passei os dedos pelo rosto tão feminino e delicado, ela deu um suspiro manhoso.
- Você é incrível sabia, Nanda?! – vocês já receberam um olhar de gratidão enquanto por dentro está se correndo em culpa? Pois é, uma sensação horrível! – eu te amo tanto! Sabe que eu nunca pensei que a gente daria certo como casal, ou que sei lá você pudesse cuidar de mim como está fazendo.
Eu não sabia mais o que fazer então a beijei, eu precisava cala-la. Era muito bom ouvir aquelas coisas, porém essa sensação de a ter traído, não por estar grávida, mas por gerar um filho da pessoa que ela mais odeia no mundo, era aterradora.
- Obrigada, mas nem sou tudo isso. – selei os lábios novamente aos dela antes que a engenheira me contestasse – agora vá dormir.
Velei o sono da Lívia a noite inteira. Enquanto eu via seu peito subir e descer eu relembrava da gente ainda adolescente nos agarrando pelos cantos da escola. A engenheira sempre foi aquela menina dedicada, toda certinha, com o olhar envergonhado, ainda não era esse mulherão.
No início, eu tentava seduzir a Lívia por diversão mesmo, mas definitivamente ela não era uma mulher fácil. A maioria das pessoas não resistiam mais que alguns dias, sempre tive um charme natural, porém a morena era diferente, não bastava um sorriso, um convite, ou uma dança para conquistá-la. Na verdade, eu não sei bem em qual momento ela começou a se interessar por mim, sempre séria comigo, para outras pessoas ela distribuía sorrisos, comigo a testa franzida e os lábios crispados.
O primeiro beijo foi roubado! Sim, roubado! O que na época eu considerava um absurdo, audácia daquela nerdzinha sem sal não me dar bola. É até engraçado pensar nisso agora.
Eu me recordo da cena como se fosse hoje:
“A escola organizou um passeio, desses de final de ano, para um hotel estilo fazenda. Obviamente, a engenheira não iria ficar no meu quarto, até porque ela tinha as amigas dela, que não se misturavam com as minhas, coisa boba de adolescente!
Eu já perturbava a morena a meses, me jogava para ela, mandava mensagem, e nada. Sempre odiei ser ignorada, não aceitava um despautério desse! Os quartos das meninas ficavam do lado oposto ao dos meninos, mas sinceramente? Não me importava com isso, inclusive, as meninas já haviam bolado um plano para burlar a vigia dos professores e ir para o cômodo dos rapazes.
Lembro claramente de estar confortavelmente deitada em uma espreguiçadeira com um suco batizado com uma das vodcas que trouxemos escondida na mochila, enquanto pensava em como fazer para beijar a nerdzinha, mas estava tão alheia ao mundo que uma das meninas me cutucou ante o meu total desinteresse no plano para acessar o quarto do Érico, o novato com o qual eu tinha um negocinho, e demais garotos.
Sorri, e fingi interesse, no entanto meus olhos não saíram da morena com o biquíni discreto com florezinhas brancas. Por várias vezes eu tentei me aproximar dela na piscina, só que a danada fugia de mim. Cheguei a pensar em batizar o suquinho dela, porém eu sempre achei desrespeitoso e sem graça ficar com alguém sem plena consciência dos seus atos.
Na época eu achava que era só pelo desafio, hoje eu percebo a existência de um sentimento maior.
Já passava das 23 horas quando a boate organizada pela direção da escola acabou. Nós, alunos, erámos praticamente escoltados pelos professores para nossos quartos. O Érico passou por mim e piscou o olho, na esperança d’eu bater na porta dele nessa madrugada, apesar de sorrir para o rapaz no fundo eu revirei os olhos, tinha interesse nenhum nele naquele momento.
Olhei mais para trás na trilha e vi que minha morena tinha se distraído com um chiclete no tênis, sim tínhamos colegas mal-educados! Sabe aqueles momentos em que você precisa fazer algo, mesmo que sem noção? Pois é. Eu no ápice da minha perspicácia tirei minha sandália e propositalmente cortei meu pé com a latinha de refrigerante, doeu muito, mas paciência.
- Lívia, me ajuda aqui! – a menina me olhou com desconfiança. Ao se aproximar de mim, analisou meu pé ferido.
- Como você se cortou dessa maneira? – sangrou bastante. Acho que exagerei! – calma não chora, eu vou te ajudar. – As lágrimas eram reais. Acreditem!
A moça foi em direção ao quarto dela, mas eu parei.
- Vamos para o meu, é mais perto – ela me olhou ressabiada.
- Tá doendo – eu me abracei mais a morena, um cheiro gostoso de colônia de laranja.
- Tudo bem, calma. Vem cá!
A morena me pegou no colo, apesar da pouca idade Lívia já apresentava proporções e curvas de mulher. Eu suspirei, foi a primeira vez que eu estive nos braços da engenheira.
Ao chegar em meu quarto Lívia estranhou o fato de estar vazio, apesar das luzes acesas e a porta levemente encostada. Claro que as meninas já haviam saído.
- Ué, cadê as meninas que estavam com você aqui? – perguntou inocente. De início eu achava meio tosco esse jeito sem malícia dela, depois de um tempo eu percebi a raridade dessa ingenuidade da morena. Era tão difícil encontrar pessoas tão honestas e transparentes, mesmo na nossa adolescência.
Eu olhei para ela e por incrível que pareça eu senti um certo constrangimento. Sim, um constrangimento. Não por ela, e sim porque comecei a perceber que a errada naquela situação toda era eu, porque não via o fato de as meninas enganarem os funcionários da escola como uma coisa inadequada, inclusive, se não fosse a Lívia, uma hora dessas eu estaria com um dos garotos do colégio também.
A morena continuo me olhando no aguardo de uma resposta plausível. De fato, eu não tinha uma justificativa para dar, então eu simplesmente fugi da pergunta.
- Meu pé tá doendo muito Lív, me ajuda a estanca o sangue. – falei enquanto segurava o calcanhar com uma das mãos, dei até uma apertada para sair um pouco mais de sangue.
Lívia ao ver aquela cena correu para o banheiro, sempre foi muito astuta minha morena, voltou com uma caixinha branca com a cruz vermelha em cima, primeiros socorros. Eu nem sabia que tinha.
- Olha o ideal é lavar isso – olhou mais de perto para o meu pé – vem eu te ajudo a chegar ao banheiro.
Bem, sinceramente, por um momento eu titubeei, imaginei a dor. Porém, já estava ali mesmo, né?! O que era um peido para quem já estava cagado. Eu sei, a frase é horrorosa, mas me veio na mente na hora.
O chuveiro estava configurado para água morna, a Lívia se abaixou um pouco para segurar meu pé. Apesar d’eu ter feito aulas de dança, sobre tudo ballet, desde a mais tenra infância, com dor eu perdia o equilíbrio. E doeu, viu?! Eu me arrependia da hora que inventei aquele plano.
Eu puxei meu pé, Lívia também se desequilibrou, apesar da gente não ter caído a água nos molhou por completo. Até comecei a me preparar para a discussão, no entanto, para minha surpresa a menina começou a rir, realmente a cena foi engraçada.
A Lívia parou de rir quando eu comecei a me despir. Olha, não foi proposital o acidente, mas veio bem a calhar. Quando eu observei o olhar da morena eu percebi pela primeira vez que ela também me desejava. Comecei a tirar a roupa mais lentamente, o olhar dela atravessava meu corpo, e eu já desfilava pelo quarto seminua, enquanto ela se sentava na pontinha da cama.
- Não vai tirar a roupa? Você tá toda molhada, o ar condicionado está na potência máxima.
- Não, eu não tenho outra roupa.
- Eu te empresto uma roupa minha – cheguei bem perto dela, só de calcinha. Sim, estava sem sutiã. – deixa eu te ajudar.
Eu puxei a camisa da morena para cima. Meu joelho estava entre as pernas dela, e meu peito ficou bem no rosto. A engenheira não apresentou nenhuma resistência, senti os olhos dela queimarem o meu corpo, me aproximei mais e comecei a deitar por cima.
Aspirei e senti o aroma gostoso da colônia cítrica, as mãos dela já passeavam pelas minhas costas, eu beijei o pescoço da morena, o roçar dos nossos rostos era o sinal que eu precisava para delicadamente sobrepor meus lábios aos da engenheira.
O beijo começou tenro, há muito eu já não experimentava essa sensação gostosa de excitação, desse friozinho na barriga. Com os meninos a coisa era mais seca, “pá pum”.
A engenheira puxou meu queixo para aprofundar o beijo, e eu rocei levemente meu quadril no dela, ao ouvir um gemido baixinho meu corpo todo estremeceu de tesão. Eu sorri quando senti as mãos de Lívia pressionarem minha bunda, que pegada gostosa, meu Deus!
O beijo delicado, mas forte, e o gosto de refrigerante da boca dela marcaram minha memória.”
Fim do capítulo
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zilla
Em: 24/04/2019
Até que fim voltou né moça sumida!
Pensei que tinhas desistido da história snif...
Agora vou reler ela novamente hehe!!!
Ver se ñ some moça poooor favor tá!?
Resposta do autor:
Olá! Pois é, consegui um pouco de inspiração e tempo para retornar a escrita! Eu não gosto de deixar nada pela metade, então pretendo concluir a história sim!
Um grande abraço, Zilla!
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