Capítulo 27 - Histórias e presentes de trabalho
Mais um final de semana. Ou melhor dizendo, finalmente, outro final de semana! Lívia colocou um lanche do tipo hot pocket no micro-ondas, enquanto Helena assistia a um documentário sobre doenças raras. Anna Júlia chegou do serviço com sua bolsa e uma caixa pequena.
“Andou ganhando presentes?” Lívia brinca com a colega de apartamento, enquanto retira o lanche do forno de micro-ondas.
“Ah, eu ganhei esse vinho de uma cliente.” Anna ri. “Vocês querem?”
“Opa! Eu quero!” Helena se prontifica.
“Eu também! Não tenho nada programado para essa noite mesmo.” Lívia dá de ombros.
“Não vai sair com o Dante?” Helena pergunta, enquanto pega três taças do armário.
“Não, ele tem prova na segunda, está todo focado. Qualquer dúvida ele disse que liga para mim. Mas duvido, as notas dele andam mais altas que as minhas de quando eu estava naquele semestre.” Lívia explica, pegando uma das taças. “A Bel está trabalhando?”
“Como sempre.” Helena confirma. “E você, Anna? Nenhum plano?”
“Minha vida social está o próprio deserto do Saara.” Anna Júlia ri.
“E por que a gente não sai hoje?” Lívia sugere.
“Ou a gente poderia ficar, aproveitar esse vinho e pedir um yakissoba, o que acham?” Anna faz uma contra proposta. “A última coisa que eu quero hoje é escutar música alta e ficar em pé dançando por aí, trabalhei feito condenada.”
“Vou ter que concordar, essa ideia de vinho e yakissoba parece bem mais atraente.” Helena pondera e pega o celular. “Conheço um restaurante japonês ótimo que entregam rápido.”
“Ótimo. Então vai fazendo o pedido enquanto eu tomo um banho para tirar toda essa carga de processos e petições do dia.” Anna responde.
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Risadas altas. Cheiro de comida japonesa quentinha e aroma de vinho tinto.
“...e teve aquele dia também que eu escutei você e a Paula fazendo algum tipo de roleplay de médico! Desculpa Helena, mas eu ri demais!!” Lívia comenta, enquanto as garotas degustam o jantar.
“Não creio! Você ouviu aquilo! Isso foi quando? Nem eu lembro, cara.” Helena ri de boca cheia.
“Ah, já faz tempo, acho que eu fui pedir ajuda para o Otávio em algum trabalho e passei a noite lá, daí escutamos vocês.”
“Que vergonha, socorro.” Helena esconde o rosto.
“Mas agora vamos focar na Anninha. Diga-me, como anda seu coraçãozinho?” Lívia olha para a colega.
“No momento, vazio...” Anna Júlia faz biquinho e logo cai na risada com as outras duas.
“Ninguém lá da firma do seu amigo lhe atrai? Nem a tal cliente que lhe deu o vinho?” Helena pergunta.
“Não, não...” Anna ri. “Ela é uma senhorinha extremamente fofa. Ajudei o filho dela em um processo e ela quis demonstrar gratidão.”
“E o grupo LGBT da rede social que você nos encontrou, não pensa em arranjar alguém de lá? Se quiser a gente ajuda!” Em Lívia só faltavam as asinhas e a flecha no quesito procurar parceiros ou parceiras para seus amigos.
“Não conversei com ninguém de lá para falar a verdade. Exceto vocês, é claro. Mas não sou muito fã de meios virtuais para encontrar um grande amor...”
“Por que não? Já encontrei ex namoradas por aplicativos.” Helena contra argumenta.
“E você ainda está com alguma dessas ex namoradas?” Anna ergue uma sobrancelha.
“Bem apontado.” Helena ri.
“Já que você não curte meios virtuais, eu tenho uma amiga para lhe apresentar.” Lívia comenta, logo após um belo gole de vinho. “Ela é irmã do meu cunhado, faz Relações Internacionais aqui na faculdade, se não me engano.”
“A irmã do Cláudio é lésbica?” Helena indaga.
“Espera, como você os conhece?” Lívia arqueia uma sobrancelha.
“Pode não parecer, mas Dante e eu somos amigos e ele conta sobre o que acontece.” Helena responde indignada.
“Então quer dizer que o Dante fica fofocando sobre a minha família?”
“A irmã do Cláudio não é tecnicamente sua família, Liv.”
“Ok, gente, quem é essa menina e por favor me digam que ela é interessante.” Anna as interrompe.
“Ah sim, o nome dela é Nádia, ela tem mais ou menos sua idade e eu só falei com ela uma vez, mas ela está sempre no bar da faculdade.” Lívia explica.
“Espera...” Helena raciocina. “Você e o Bento são LGBT, e o Claudio e a Nádia também? Estou realmente começando a achar que genética é um fator intrínseco, porque olha....”
“Sim, mas no caso eu sou pansexual e o Bento é gay.” Lívia continua a explicar.
“Achei que você fosse bi.” Anna Júlia finaliza seu yakissoba e se levanta para jogar a embalagem fora.
“Não, acabei me identificando em um espectro mais amplo, mesmo.” Lívia dá de ombros.
“Para quem se dizia super heterossexual algum tempo atrás...” Helena ri.
“É sério? Contem mais sobre isso que fiquei curiosa!” Anna Júlia retorna ao tapete.
“Essa daí me deu fora quando entrei na faculdade.” Helena aponta para a amiga.
“Porque eu namorava o Thales na época, né.” Lívia revira os olhos.
“E também porque ficava se auto afirmando heterossexual.” Helena continua rindo.
“Sua boba. Eu nem tinha experimentado ainda. E se você tivesse sido um pouquinho mais esperta teríamos trans*do logo quando terminei com ele.” Lívia faz uma cara séria e Helena quase engasga com o vinho que havia tomado.
“Revelações...” Anna não deixa de comentar.
“Lógico que não, Lívia, você está falando bobagem.” Helena fecha a cara.
“Que foi? Eu só disse que eu lhe dei um monte de oportunidades no passado e você simplesmente não viu.” Lívia ri da raiva da amiga.
“Que oportunidades?!” Helena fica confusa.
“Pelo amor, Helena!” A risada de Lívia pende a um tom de indignação. “Quando eu estava bêbada, quando a gente dormiu uma do lado da outra, quando por várias e várias ocasiões eu disse que queria uma experiência...”
“Em primeiro lugar, você estava bêbada em um nível deplorável. Sem condições, Lívia.”
“Hey! Aquele dia eu confesso que estava mesmo em um estado deplorável, mas há ocasiões em que fico bêbada e sei exatamente o que estou fazendo, não tem essa não, você simplesmente perdeu a oportunidade, bebê, só aceita!”
“Cadê minha pipoca para assistir a isso?” Anna brinca.
“Eu achei que você estava falando de modo genérico, sei lá!” A tonalidade da voz de ambas já parecia uma discussão.
“Está vendo? É porque você é ingênua!”
“E você quer que eu leia mentes?”
“Eu só quero que você aprenda a interpretar o contexto!”
“Você falava mas parecia tom de piada! Como eu ia entender?”
“Ah, primeiro é modo genérico, depois piada! Decida-se!”
“Gente!” Anna exclama.
“Que foi?” Helena e Lívia questionam, já bravas, em uníssono.
“Vocês não estão com outras pessoas? Então por que estão brigando por isso?”
Helena e Lívia se calaram.
“Vamos mudar de assunto. Não quero discussões por aqui. Falem algo sobre vocês, sobre o curso, sei lá.” Anna Júlia redireciona a conversa, enquanto as outras duas se acalmam.
“Sobre o curso, assim como todos os outros: muito café e olheiras!” Lívia comenta e as três dão risada.
“Tanto eu quanto Lívia ainda estamos no ciclo básico, então são matérias mais gerais.” Helena explica.
“Sim. Semestre que vem começa o ciclo clinico para mim, e, como diz o Dr. Moisés, é aí que o filho chora e a mãe não vê.” Lívia comenta, ainda rindo.
“E como funciona essa história de ciclo básico e clínico?” Anna parece curiosa.
“Bem, pelo menos na nossa faculdade é assim, são quatro semestres de ciclo básico, depois mais quatro de ciclo clínico, e os últimos quatro semestres são de internato.” Helena elucida.
“E residência?” Anna continua a perguntar. “Não é junto?”
“Não, não...quanto você termina o internato você se forma como médico generalista...” Lívia pausa para encher a taça de vinho.
“E não como clínico geral, tal qual a maioria pensa.” Helena continua enquanto Lívia degusta o resto do vinho. “Aí você vai escolher, se quiser, uma especialidade, é aí que vem a residência. Você é remunerado como médico residente. Já como interno, é apenas um estudante de medicina, pelo menos aqui no Brasil.”
“Vocês combinaram essa explicação?” Anna ri.
“Pareceu ensaiada mesmo!” Lívia também ri. “Gente, eu estou bêbada? Porque estou começando a pensar em voltar à cor natural do meu cabelo, o que acham?”
“Mas esse rosado fica tão bonito! Por que quer mudar?” Anna Júlia indaga.
“Estou desde o começo da faculdade com essa cor, está na hora de mudar, ou é o álcool falando.” Lívia dá de ombros. “O que acha, Helena?”
“Acho que é o álcool falando somado à vontade que você já tinha inconscientemente.”
“Ok, Freudlina, entendi.” Lívia dá aquela risada largada e ébria.
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Isabel, retornando do trabalho encontrou as meninas conversando, ou melhor, Lívia tombada no sofá quase babando enquanto Helena e Anna Júlia batiam papo.
“Amor!” Helena recepciona a namorada com um selinho. “O que você trouxe aí?” Ela pega a sacola que a namorada carregava para abrir.
“Ah, o Jason voltou de uma viagem ao Canadá por esses dias e comprou algumas coisas para o pessoal.” Isabel explica.
“Isso é chocolate? Chocolate canadense? Parece bom.” Helena abre a embalagem como se estivesse morta de fome. “Jason é aquele filho do seu Heitor, né?”
“Enteado, Lena. Ele é filho da dona Mary só.”
“O dono do Pub é canadense?” Anna Júlia pergunta, aproximando-se.
“Não, ele é brasileiro mas se casou com uma canadense. Quer provar um chocolate?” Isabel pega a sacola da mão de Helena e oferece a Júlia, que aceita prontamente.
“O Jason foi visitar a família lá?” Helena pergunta, de boca cheia.
“Foi ver a avó, se não me engano.” Isabel pega de volta a sacola.
“Mudando de assunto, Anna, você que é advogada, pode me responder uma coisa? Por exemplo, se um casal homoafetivo se casasse no papel, e um deles tivesse filhos, a pessoa que casou poderia adotar essas crianças para si?” Helena questiona enquanto Isabel presta atenção ao detalhe da pergunta.
“Você está perguntando da co-adoção de filho biológico do companheiro ou companheira? Se sim, isso é permitido, só não se fala muito por causa da própria sociedade mas é completamente permitido. Um pouco burocrático, mas completamente dentro da lei.” Anna explica.
“Está querendo casar, Helena?” Isabel pergunta, provocando, e a cara da namorada se torna tão vermelha de vergonha que faz as garotas gargalharem, acordando Lívia.
“Eu só estava fazendo uma pergunta para um futuro remoto.” Helena continua franzindo a testa.
“Pois saiba que esse foi o pedido de casamento indireto mais fofo que já ouvi.” Isabel dá um selinho rápido em Helena.
“Pedido de casamento? Vai ter casamento?” Lívia pergunta, perdida e sonolenta.
“É esse pessoal que adora me zoar só porque eu fiz uma pergunta que parecia mais uma indireta.” Helena justifica. “Sorte que o assunto já está encerrado. Mas Lívia, diz aí, como é namorar um garoto transgênero?” Helena dá um jeito de focar a atenção da conversa na amiga.
“Espera, o Dante...?” Anna Júlia arqueia uma sobrancelha.
“Sim, ele está há alguns meses na testosterona e já mudou quase que completamente.” Lívia explica. “Gente, é como namorar qualquer outra pessoa, não tem diferença para mim.” Ela dá de ombros.
“Então você admite que estão namorando!” Helena aponta o dedo para a amiga.
“Você fez essa pergunta só para eu cair no ato falho, né sua vagabunda...” Lívia revira os olhos e boceja. “Dante e eu temos um acordo complexo. Agora eu preciso pegar um gole de água que parece ter areia na minha boca.”
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“Amor, eu não estava lhe pedindo em casamento naquela hora não, tá?” Helena comenta, já deitada na cama, enquanto Isabel passa um creme hidratante antes de dormir. “Vai que você se assusta e foge.”
“Eu sei, amor, mas ver você se irritar por achar que foi mal compreendida é um barato.” Isabel explica, enquanto passa o creme hidratante pelas pernas antes de dormir.
“Mas eu achei legal o que a Anna respondeu. É bom saber que existe esse respaldo na lei.”
“Você estava falando sério em adotar o Rafa?” Isabel pergunta, tentando esconder o sorriso no rosto, e se deita ao lado da namorada.
“Um dia quando estivermos estabilizadas, quem sabe?” Helena puxa a coberta para se cobrir.
“Cada dia você fica mais linda e eu nem sei como fui tão sortuda em lhe encontrar!” Isabel beija a bochecha da namorada, que, aproveitando o momento carinhoso, vira o rosto em direção aos lábios da amada, logo passando para o pescoço.
“A gente vai acabar trans*ndo, né?” Isabel pergunta enquanto os lábios de Helena já partiram para a base do pescoço, em direção aos peitos... pois é.
Fim do capítulo
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Kelle Souza
Em: 19/04/2019
Gente, Lívia e Helana. Será?
esse cap serviu para que eu pudesse ver além da imeadissidade das coisas.. Mas isso não significa que eu não estou confusa! Rs.. ta me enlouquecendo bem aqui kk
#Helena muito fofa!!
Resposta do autor:
'Será só imaginação?
Será que nada vai acontecer? '
(você fez um outro comentário a respeito de uma música, então respondo com outra!)
hahahahahahaahah
E sim, estou tentando trazer pendências de capítulos passados para aumentar o drama hahahahaha
Beijão!
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nany cristina
Em: 18/04/2019
Oi autora eu estou ansiosa para ler o capitulo da entrega de Lívia a Dante bjs
Resposta do autor:
Pois você não vai acreditar que eu estava acabando de fazer uma última leitura nele para finalizar e postar! hahahaahahaha
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