Capítulo 24 - Você fica bem de gravata!
Helena estudava em cima da cama, enquanto Isabel se arrumava para ser garçonete em uma festa de casamento.
“Eu fico parecendo um pinguim com essa gravata borboleta!” Ela reclama, ajustando a gravata logo após ter vestido a camisete branca e a saia preta.
“E desde quando isso é ruim?” Helena comenta, levantando-se e caminhando em direção à namorada. “Se isso é parecer um pinguim, então o polo norte é um lugar de sorte.” Ela abraça Isabel por trás e beija seu ombro, enquanto ambas se olham no espelho.
“Polo sul, amor, pinguins vivem na Antártica, polo sul.” Isabel a corrige e vira o rosto para um breve selinho.
“Uma vez eu li um artigo que falava sobre uma espécie de pinguim que vivia na Linha do Equador...e como foi que paramos nesse assunto?” Helena ri.
“Eu estava me comparando a um pinguim. Mas a certo modo, faz sentido porque eles são monogâmicos e ficam com o mesmo parceiro a vida toda, então segundo esse raciocínio fico feliz em ser sua pinguim.” Isabel fica de frente para Helena e acaricia o rosto de sua amada.
“Acho que essa foi a declaração mais original que já recebi.” Helena começa a desabotoar a camisete de Isabel, que logo a interrompe pois precisa chegar a tempo para o trabalho na festa.
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Dante dormia tranquilamente no sofá quando escutou um carro buzinar. Enquanto ele lutava para abrir os olhos, Lívia, já acordada, correu para a porta, e pulou nos braços de um jovem um pouco mais velho que ela, com os mesmos traços físicos, enquanto outro homem chegava com duas malas.
“Bê-Agá!” Lívia aperta o irmão com todas as forças.
“Liv! Calma, sem amassar, nos vimos as férias inteiras!” Seu irmão ri.
Dante se levanta com a cara toda amassada e ajusta o moicano.
“Dante, vem cá! Vem conhecer meu irmão! Bento Henrique, esse aqui é o Dante. E esse aqui é o marido do Bento, Cláudio.”
“Mas olha! Gente que menino lindo! Cláudio, olha esse olho azul piscina! Esse é seu namorado novo, Lívia?” Bento cumprimenta Dante.
“ Sou apenas amigo.” Dante responde por ela.
“Seu namorado não veio, Liv?” Cláudio pergunta.
“Quem, o Bruno? Já nem sei se estamos mais juntos...”
“Ai meu amor, o que houve?” Cláudio abraça a cunhada.
Lívia olha para Dante e Bento percebe algo diferente.
“Clau, vamos deixar as coisas lá no quarto e cumprimentar o papai e a mamãe?” Bento o interrompe.
“Que fofos.” Dante comenta com Lívia, enquanto o casal de rapazes sai de cena.
“São mesmo.” Lívia sorri.
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Já não sendo novidade, e para o desgosto de Isabel, o casamento realizado era de pessoas influentes na sociedade da pequena cidade, logo, Paula e sua família estavam lá.
“E não é que nos encontramos novamente?” Paula pega um dos petiscos servidos na bandeja por Isabel.
“Boa tarde, Paula.” Isabel, bem seca, responde.
“Ainda não entendo gente que começa casamento à tarde.” Paula ri. “Bom, deixa eu lhe apresentar. Essa daqui é Jussara, minha namorada. Jussara, essa aqui é a atual da minha ex. Mundo pequeno, não?”
“Sim, mundo pequeno.” Isabel responde e dá um passo atrás para tentar se retirar.
“Espera, eu gostaria de me desculpar por aquela vez na festa, eu não sabia que Helena não lhe contava as coisas...”
“Não tem problema, já conversamos a respeito. Aliás, aquele seu buldogue francês já fez a cirurgia? Ela me mostrou as fotos.” Isabel finalmente demonstra confiança. “Espera... você disse que o nome dela é Jussara? Não é ela que sua mãe praticamente forçava vocês a namorarem e ela ficava no seu pé grudando feito chiclete?”
Paula acabou se assustando e recebeu o olhar indignado de Jussara, enquanto Isabel pediu licença e rapidamente se retirou da situação.
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Helena percorria a linha do tempo de sua rede social pelo celular enquanto deveria estar estudando, mas ela estava tão acostumada a estudar com Isabel que decidiu fazer uma pausa. Foi então que ela viu uma foto de seu pai com uma garota que ela nunca tinha ouvido falar. Embaixo, havia uma legenda anunciando a gravidez da moça. Helena fechou seu semblante na hora. Passou rapidamente pelos comentários parabenizando o casal e voltou novamente para a foto. A garota parecia ser poucos anos mais velha que Helena. Ainda com uma expressão de raiva, digitou rapidamente os números do celular de Heveraldo, mas os apagou rapidamente. Ligaria para falar o quê? Eles não tinham assunto há meses. Voltando à foto pela terceira vez, Helena acabou curtindo sem querer. No mesmo instante descurtiu, apesar de saber que seu pai veria a notificação. Ela então resolveu bisbilhotar o perfil da moça. Boa aparência. Estudada, já havia se graduado em administração. Pelo próprio perfil Helena descobriu que a moça havia estagiado em uma empresa de marketing diretamente ligada aos negócios de seu pai. E agora grávida. Analisando a linha do tempo e as postagens da moça, viu uma foto de um exame de imagem. Arregalou os olhos e voltou à foto original. Leu a legenda mais uma vez e viu que não havia prestado atenção em uma informação: gravidez gem*lar. Ao invés de ser filha única, Helena passaria a ter dois irmãos mais novos. Irmãos. Agora seu pai deveria estar orgulhoso, teria o filho que sempre quis ter. Um não, dois. Helena resolveu desligar o celular, seus pensamentos já beiravam certa raiva tóxica que ela não queria voltar a lidar.
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Dante, no quarto de Lívia, tentava colocar a gravata que o cunhado de Lívia havia emprestado, enquanto ela assistia encostada no batente da porta.
“Vai continuar sofrendo ou posso tentar ajudar?” Lívia ri.
“Eu consigo.” Dante fecha a cara, complicando-se ainda mais no nó.
“Minha nossa, como você está linda, irmãzinha!” Bento se aproxima e admira Lívia, já arrumada e maquiada para a festa. “Dante, podemos ir?”
“Espera um pouco...estou quase lá.” O garoto pensa que conseguiu finalizar o nó da gravata, mas só piorou sua situação.
“Eu tentei oferecer ajuda.” Lívia dá de ombros.
“Okay. Eu desisto.” Dante suspira e Lívia se aproxima, enquanto é a vez de Bento observar a cena.
“É assim que se faz. Você puxa aqui, passa uma ponta em cima da outra, pega aqui as duas extremidades bem no cruzamento, depois passa aqui de novo pela frente. Viu como é fácil?” Lívia pisca e dá uma risadinha.
“Já sei, tu aprendestes por causa do teu pai e teu irmão?” Dante conclui precipitadamente.
“Lógico que não, o Thales era um preguiçoso que nem você e nunca se deu ao trabalho de olhar um vídeo sequer na internet a respeito disso, então acabei aprendendo por ele.”
“Ai, nem me lembre daquele Thales, maninha. Que cara de bocó.” Bento se intromete e revira os olhos.
“Hey, eu só comentei porque ele perguntou!” Lívia responde jocosamente, esquecendo-se do fato de que suas mãos ainda seguravam a gravata.
Dante colocou suas mãos sobre as dela para que ela parasse de apertar o nó, e quando as mãos se tocaram, ela olhou para ele e subitamente sentiu um calor subir por seu dorso até sua nuca. Ela umedeceu os lábios enquanto ele lentamente retirava as mãos dela da gravata.
“Não querendo atrapalhar o clímax da comédia romântica aí, mas temos que ir.” Bento brinca.
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Quando Isabel chegou, Helena usava o livro de travesseiro, enquanto relaxava em um sono profundo. Cuidadosamente, ela retirou o livro e cobriu Helena, beijando sua testa, o que fez a namorada acordar.
“Que horas são?” Helena balbucia lentamente, ainda sonolenta.
“Já é madrugada. Você estava dormindo, meu amor.”
Helena boceja e liga novamente o celular. “O casório durou até agora?”
“Os convidados mais jovens foram para o Pub daí meu chefe precisou da gente lá. Pelo menos ganhei extra.” Isabel responde, enquanto pega roupas intimas e vai tomar banho.
Helena cochilou novamente, e foi acordada por um beijo no pescoço, com sua namorada vestindo apenas um conjunto de lingerie preto.
“Amor...” Isabel chama a namorada entre pequenos beijos entre o pescoço e o queixo.
“Que foi, Isabel...” Helena responde resmungando, sem abrir os olhos.
“Está tudo bem?” Isabel se afasta, estranhando a atitude da namorada.
Helena suspira profundamente e abre os olhos. “Eu não consigo esconder nada de você, né?”
“Eu fiz alguma coisa?” Ela pergunta, preocupada.
“Não, não tem nada a ver com você, Bel. É com meu pai.”
“O que tem seu pai? Você falou com ele?”
“Não...mas descobri que ele vai ser pai novamente.”
“Como assim? Ele engravidou alguma guria?”
“Sim, uma menina aleatória aí. Parece que vai parir gêmeos.”
“E por que isso parece lhe entristecer?”
“Não sei... estou com um pouco de raiva, não sei lhe explicar.”
“Será que você não sente falta do seu pai? Pelo que você me conta, vocês eram bem amigos antes do divórcio.”
“Acho que sim. Em outros tempos, quando ele recebia alguma grande notícia, eu era a primeira a saber. Agora fico sabendo apenas por postagens online.”
“E por que não conversa com ele? Pensei que na terapia você tivesse acertado isso, Lena.”
“Acertei quase tudo, eu acho, pelo menos melhorei bastante. Mas tem algo ainda que parece persistir.”
“Acho que isso que ainda persiste é o amor que você sente por ele, não é?”
“Mas ele iria se expressar dessa forma pejorativa?”
“Como forma de um ódio reprimido? É uma das maneiras mais comuns de se expressar, não acha?”
Mesmo a contragosto, Helena acabou concordando.
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Cláudio, já no fim da festa, dirigia de volta para a casa dos sogros, enquanto seu marido, sua cunhada e Dante encontravam-se embriagados. Ao chegar, ele colocou o marido para dormir, enquanto Dante ajeitava os travesseiros no sofá da sala. Por último, foi checar a cunhada.
“Precisa de algum remédio para o estômago? ” Cláudio questiona.
“Preciso não, Clau-clau. A última vez que eu bebi com vocês e passei mal foi porque eu estava meio nervosa...” Lívia confessa.
“Pois é, você nem tinha contado para nós que suspeitava de uma gravidez e se encheu de cerveja... responsável a senhora, né?” Cláudio ri.
“Eu sei, pelo menos no fim das contas deu tudo certo... mas vamos falar sobre a festa e dos micos do Bento completamente fora de si! Senta aí.” Lívia aponta para a cadeira em frente a sua antiga escrivaninha.
“Nem me fale. Seu irmão me faz passar cada vergonha... aquela tia conservadora de vocês fechou a cara quando ele conseguiu colocar indiretas sobre o governo no meio do discurso do aniversário do seu pai...” Cláudio coloca a mão sobre o rosto, mas não consegue esconder a risada.
“Pior que ele estava certo, eu adorei, a tia Sílvia fecha a cara até se você der bom dia para ela, nada de novidade até aí...”
“Verdade... agora me conta, eu vi você e Dante trocarem vários olhares, o que está acontecendo? Bruno é o oficial e ele o amante? ” Cláudio resolve abordar mais diretamente.
“O quê?” Lívia arregala os olhos. “Não, digo... eu não sei o que acontece entre Dante e eu. O Bruno nem sabe que estou aqui com ele, e o Dante parece insistir que somos apenas amigos. ”
“Ou ele diz isso para tirar a pressão de você. ”
“Como assim? ”
“Para parecer que ele está tranquilo com a situação ele disfarça anunciando que vocês são só amigos. Mas na festa do papai ele lhe secava tanto que achei que você fosse desidratar!”
“Sério?!”
“Sim, menina! Nem nas vezes que vi você com o Bruno, não era assim.”
“Mas é dessa intensidade que eu mais tenho medo.”
“Bom, Lívia... você sabe que sou bi, e pouco antes de namorar seu irmão, eu estava bem estável com uma garota conhecida da família dos meus pais. Daí eu conheci seu irmão na faculdade, e cada vez que eu falava com ele, meu coração disparava. Na primeira festa que eu fui e que ele estava lá, foi só vê-lo que minha mão tremeu e eu quase derrubei a bebida. Eu também amava a minha namorada naquela época, amava de verdade mesmo, mas o que eu sentia pelo seu irmão era intenso, era diferente... e tenho certeza que se eu tivesse casado com aquela garota, até hoje estaria me perguntando como teria sido a vida com o Bento. ”
“Moral da história: devo ficar com o Dante porque senão estaria vivendo uma vida de ‘e se’? Mas e se eu ficar com ele e ficar me perguntando como seria com o Bruno?”
“Você consegue prever sua vida com o Bruno?”
“Consigo, facilmente.”
“E com Dante?”
Lívia pondera. “Consigo imaginar, mas prever não.”
“E o mistério não lhe excita?”
“Cláudio, você acabou de bagunçar mais ainda minha cabeça!” Ambos dão risada, mas a mensagem do cunhado a deixa reflexiva. Vale mais uma vida amorosa previsível com arrependimentos pelo caminho ou um amor com desafios regado de surpresas?
Fim do capítulo
Comentar este capítulo:
Kelle Souza
Em: 14/04/2019
Ansiedade recíproca!! Amo o tom de desconstrução que vc dá a sua estória.
Eu quero sempre mais!!!
Bjuss
Resposta do autor:
Não tem noção do quanto isso me alegra!!!!!
E vai ter mais, tudo o que vc comenta eu levo em consideração na hora de escrever hahahhahahaha
Bjão!
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Kelle Souza
Em: 13/04/2019
Livia e Isabel são bem parecidas nessa coisa de se resguardar enquanto estão inseguras.
Por isso fiquei um tempo sem saber ou sentir se os sentimentos de Isabel eram realmente reais. Depois percebi que era apenas uma prevençao de sua parte. Não tiro a razão dela, Helena deixa até a mim insegura. Rs..
Acho que Livia por mais que esteja com incertezas deveria pensar que esse é o momento que ela pode e deve se aventurar e correr os riscos.
Estou na torcida pela felicidade de ambas.
bjuus..
Resposta do autor:
Sabia que você fez uma observação tão importante que eu fui até revisar alguns capítulos para realmente concordar contigo! Consegui deixar Lívia e Isabel mais parecidas do que eu havia construído em minha mente! Hahahaha
E sim, Helena é um mistério hahaahahah é uma personagem divertida de se desenvolver porque é uma caixinha de surpresas, bem tridimensional.
Obrigada por continuar comentando, Anaiis, quando vi que era seu user comentando até me bateu uma ansiedade/curiosidade de ler logo para ver sua opinião! ahahahahahah
beijoooo
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