Capítulo 28 Alguns dias
Carmen
Acordei num quarto de hospital sozinha. Lembrava confusamente do que havia acontecido. O médico logo que entrou no quarto, depois de fazer algumas perguntas, informou-me que eu teria que passar mais dois dias internada, para uma bateria de exames mais detalhados e também, porque que deveria ficar em observação.
No primeiro dia, mamãe foi visitar-me ainda pela manhã, emocionada beijava-me de cinco em cinco minutos. Disse que a polícia já estava investigando o caso, assim como meu detetive particular, aquele que Juliana havia me apresentado. Dado certo momento, dando vazão a inquietação e preocupação, perguntei por Elisandra, pois até então não a havia visto, e temia que algo tivesse acontecido a ela também.
--Mamãe?! E Lisa?
Mamãe calou-se por alguns instantes antes de responder, me deixando angustiada ainda mais com sua resposta vacilante.
--Está na fazenda com os irmãos... Eles estavam assustados.
--Ela está bem?
--Sim.
Mamãe nunca fora uma pessoa monossilábica, e estava sendo agora por quê?
--Poderia tê-los deixado com Maria e Joaquim.
--Mas me diga filha... Sente dor? Está confortável assim? Precisa de alguma coisa?
Ela mudara de assunto? Aquilo me irritava, se fosse qualquer outra pessoa isso teria me feito perder a paciência. Mas como era a pessoa que eu mais amava no mundo, respirei fundo e deixei que a conversa tomasse outro rumo.
No fim da tarde, convenci mamãe a ir pra casa, ela queria passar a noite ali comigo, mas não queria incomodá-la, e também achava que não havia necessidade. A convenci a ligar para que Joaquim viesse lhe buscar, e assim que ele chegou, pedi que mamãe nos desse licença e mesmo a contragosto, ela nos deixou as sós.
--Como se sente Carmen?
Ele perguntou aproximando-se da cama, pondo a mão sobre meu braço num claro gesto de amizade.
--Fraca, exausta e com uma grande dor de cabeça...
--Imagino que deva ser terrível pra você, que nunca pegou nenhuma gripe agora ter que ficar um bom tempo de cama.
Sorriu ternamente.
--Pois é... Joaquim, tem idéia de quem atirou? Viu alguma coisa?
--Não, ninguém viu nada, nem mesmo a polícia, mas suspeito de alguém.
--Quem?
--Fabrício.
Mais uma vez respirei fundo, também desconfiava dele, mas apesar de tudo, não podia acusá-lo sem provas.
--E... Elisandra? Mamãe foi evasiva quando perguntei sobre ela, ela está bem?
--Sim. Passou a noite com você, logo cedo ligou para que viesse buscá-la, pois estava cansada e precisava do apoio dos irmãos nesse momento.
Respirei aliviada, ela estivera ali comigo, estava bem fisicamente, mas me partia o coração, saber que estava passando por todo aquela pressão sozinha.
--Queria que tivesse esperado eu acordar...
--Imagino que sim. Ela me pareceu muito abalada, muito até mesmo pra essa situação...
--Como assim?
--Devo estar imaginando coisas. Mas enfim, fique bem ok? Vou levar sua mãe pra casa, ela deve estar cansada.
--Ok! Obrigada por cuidar deles.
-- É meu dever, e faço com prazer.
--Obrigada!
--Apenas fique bem. Tchau.
E assim ele saiu, me deixando sozinha até o dia seguinte, quando apenas mamãe, veio me visitar novamente, e esperar pela minha alta que saiu só no terceiro dia.
* * * *
Elisandra
Assim que o dia amanheceu, pedi que Joaquim fosse me buscar no hospital, não agüentaria olhar nos olhos que tanto amava, sabendo que teria que dar as costas a eles.
Passei o dia todo com meus irmãos, eles durante o tempo todo querendo saber de Carmen, e me dando apoio, mesmo sem saber. Dona Teresa que não era boba nem nada, percebeu logo que cheguei, que estava acontecendo algo e me deixando mais preocupada do que a situação de Carmen, ela questionou-me, e creio que minha resposta superficial, não a convenceu.
No segundo dia que Carmen estava internada, sua mãe novamente foi visitá-la, perguntando se eu tinha algum recado para a filha, como minha resposta foi negativa, ela simplesmente balançou a cabeça num sinal negativo.
Estava deitada de costas na cama, quando meu celular começou a tocar, atendi sem olhar no visor.
--Alô?
--Oi meu amor!
Aquela voz me enojava, tinha repulsas por ela, e pelo dono dela.
--Então?! Já terminou com a fazendeira?
--Sim!
Não menti, afinal eu havia me afastado dela sem dar qualquer explicação, no momento que ela mais precisava de mim, isso era pior que um termino, era uma traição.
--Ótimo meu bem! Estou feliz com você agora.
Deixei que lágrimas silenciosas corressem por meu rosto, eu odiava aquele homem que um dia chamei de amor, mais do que qualquer coisa na vida.
--Já fiz o que queria, deixe Carmen em paz agora.
--Kkkkk Você não fez nem cinco por cento que eu quero.
--E o que quer?
--Tudo que é seu, ou melhor. Tudo que é do seu papai mortinho, afinal, você nem gostava do cara mesmo não é? Tão feio gostar do dinheiro dele agora.
Me calei, não podia acreditar que ele estava destruindo tantas vidas por dinheiro, confesso que ainda acreditava que Fabrício me amasse possessivamente como sempre amou, ou dizia amar, mas jamais suspeitei que pudesse querer o meu dinheiro, ou como ele mesmo disse, do meu pai.
--Não posso acreditar que atentou contra a vida de uma pessoa por dinheiro, que monstro você se tornou?
--Acha mesmo que é só pelo dinheiro? Kkkk tola. Teria o maior prazer de matar aquela filha da puta, que comeu a minha noiva, mas não sujarei minhas mãos com ela. No entanto, outras pessoas sujaram, caso você não faça exatamente o que eu quiser.
--Quem mais está nessa com você?
--Kkk não se preocupe com isso, preocupe-se com o que eu vou te mandar fazer.
-- É a piranha da Juliana não é?
--Não importa. Quero o seu dinheiro, mais que isso, quero a sua fazenda, quero tudo que aquela sapatão conhece e se orgulha, quero que afaste ela dos seus irmãos, quero que afaste ela de você, quero ela na rua, sem emprego, sem nada.
--Está louco? Não posso fazer isso.
--Pode sim, e fará.
--Não posso, Carmen é tão herdeira do que era do meu pai, quanto eu.
Ele se calou alguns segundos, e então prosseguiu.
--Darei um jeito nisso. Mandarei alguns documentos até você para que assine.
--Que documentos.
--kkkkk você verá. Passar bem meu amor.
A chamada foi encerrada e eu continuei ali, atônita com o celular na mão. Aquilo não podia estar acontecendo.
No terceiro dia, acordei mais tarde, pois havia demorado muito pra conseguir dormir, estava cansada física e emocionalmente. Desci as escadas com um pulsar acelerado no peito, não sabia qual o motivo, mas assim que cheguei no pé da escada, entendi.
Carmen entrava pela porta, apoiada em Joaquim, estava com uma tipóia no braço, com uma aparência abatida, mas nada tirava a selvageria que via no seu olhar, aqueles olhos verdes com ares predadores, jamais perdiam seu brilho. Parei, emocionada, preocupada, com remorso, com saudades, com paixão, mais que isso, com amor. Involuntariamente meus olhos se encheram de lágrimas, via a mesma angustia que me tomava, nos olhos de Carmen, não podia viver sem ela e não podia obrigá-la a viver sem mim. Aceitara a chantagem de Fabrício, no entanto, deixá-la mataria não só a mim, mas a ela também, e sei que num futuro se Carmen soubesse o que eu fiz por ela, ela jamais me perdoaria. E essa possibilidade, me atormentava.
Fim do capítulo
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