Entre Lambidas e Mordidas -- Capítulo 67  

Yasmin abriu a porta do apartamento, cheia de apreensão. O silêncio àquela hora não era normal. Sempre que chegava, logo do corredor ouvia os berros de Danielzinho. Ela atravessou a sala do enorme apartamento, caminhando na direção da porta do quarto do menino. Abriu a porta com as mãos trêmulas e viu que o silêncio de Danielzinho tinha um motivo bem plausível. Ele estava no colo de sua mãe preferida.  

-- Que safado, vendido! -- Yasmin disse, sorrindo. Todo seu corpo começou a tremer, sua pulsação chegou a mil. Toda a sua animosidade evaporou-se e foi embora pela janela.  

Daniela se virou rapidamente. O cabelo ainda molhado, como se tivesse acabado de sair do banho. Ela parecia perfeitamente calma, até relaxada, e deu-lhe um sorriso absolutamente maravilhoso.  

-- Olá, meu amor! -- falou para Yasmin -- Estou tentando fazer o garotão dormir, mas acho que ele tem outras prioridades em mente.  

-- Não sei como você ainda não quebrou ele no meio -- ela disse, olhando com carinho para o filho. 

-- Ele gosta. Quando eu paro de balançar, ele reclama -- ela deu um sorriso de convencimento.  

-- Eu que sei -- Yasmin ficou um tempo olhando para Daniela. Depois se aproximou e tocou o rosto dela com as pontas dos dedos -- Eu senti muito a sua falta -- disse com sinceridade. 

Daniela deu um beijo na cabeça de Danielzinho e colocou-o no berço. Com um sorriso carinhoso voltou-se para Yasmin.  

-- Eu também senti a sua falta, meu amor -- ela inclinou-se e roçou os lábios nos de Yasmin -- Eu amo vocês mais que tudo na vida.  

Yasmin sentiu-se mergulhando nas profundezas daqueles olhos azuis.  

-- Nossos destinos estão firmemente presos uma a outra -- Yasmin inclinou a cabeça e beijou a mão que segurava entre as suas -- Você já jantou?  

-- Assim que cheguei pedi uma pizza e comi algumas fatias.  

-- Então, vem comigo. Me espera enquanto eu tomo um banho?  

-- Claro. A babá foi colocar a Dara no berço e logo volta para cuidar do Danielzinho.  

Yasmin apressou-se em puxar Daniela pela mão e levá-la até o quarto.  

-- Eu já volto -- ela deu um beijo rápido em Daniela e entrou no banheiro.  

Daniela sorriu, a sua Yasmin ainda estava ali. Aquela Yasmin que comia strogonoff e tomava cerveja sentada no chão, que subia em sua moto de vestido, que topava comer cachorro quente na rua e dividir um sanduiche de queijo. Não tinham dinheiro, mas eram felizes.  

Deitou a cabeça no travesseiro, fechou os olhos e deu um suspiro profundo. Muita coisa mudou. A Daniela entregadora de pizza, matadora de aula e que vivia roubando o carro da coitada da Paula, com certeza não se importaria em continuar vivendo em São Paulo. Aquela Daniela era imatura e rebelde. Será que estava exigindo de Yasmin algo que ela mesma havia deixado no passado?  

-- Confessa que estava pensando em mim.  

A voz rouca sussurrou em seu ouvido, enviando calafrios, pescoço abaixo.  

-- Confesso -- Daniela passou a mão pelos cabelos ruivos, para tirá-los da testa -- Estava pensando, que sou uma sortuda em ter comigo a mulher mais linda do mundo.  

-- Isso não é sorte, meu amor. É competência -- disse Yasmin, dando um tapinha carinhoso no rosto dela.  

-- Quer dizer que você me acha competente? -- ela deu um sorriso sensual, com um brilho malicioso nos olhos.  

-- Muito! -- o coração de Yasmin disparou. Daniela era uma mulher desejável. Uma mulher tão poderosa, e ainda assim tão simples. Tão forte e orgulhosa, e ainda assim de profunda honestidade. Como podia existir uma pessoa assim na vida real? -- O que faremos agora? -- Yasmin perguntou sem tirar os olhos dos olhos de Daniela.  

Daniela ficou pensativa durante um momento. Ao fim de alguns instantes, anunciou:  

-- Vamos brincar de: De volta ao passado?  

Yasmin franziu a testa, subitamente confusa.  

-- Não sei que brincadeira é essa, mas topo -- concordou ela sorrindo.  

Era tudo que Daniela precisava ouvir. Pulou da cama, pegou o cobertor e estendeu no chão. Depois, para finalizar, espalhou algumas almofadas grandes sobre ele. Yasmin olhava para ela sem entender.  

-- Espera um pouquinho, eu já volto -- Daniela saiu apressada e voltou trazendo pizza e cerveja -- A pizza está fria, tudo bem?  

-- Eu adoro pizza fria.  

-- Eu também -- ela disse, colocando a embalagem com pizza e a cerveja no chão -- Daniela tomou Yasmin nos braços, a ruiva deu um gritinho de medo.  

-- Vai me derrubar, Dani -- ela disse, entre risos.  

-- Está duvidando da minha vitalidade?  

-- Não, não... -- Yasmin, continuava rindo.  

Daniela a colocou sobre o cobertor com toda ternura. Abaixou-se para beijá-la nos lábios, acariciando seus braços nus.  

-- Vamos começar a brincadeira: De volta ao passado -- Daniela se sentou ao lado dela no chão e a olhou com carinho -- Quando eu cheguei em São Paulo para estudar, não tinha muita grana, por isso fui trabalhar como entregadora em um restaurante com delivery. Em uma noite qualquer fui fazer uma entrega na Bela Vista... -- Daniela parou de falar para Yasmin continuar. 

Yasmin se sentou e encarou Daniela.  

-- Uma noite qualquer -- Yasmin continuou -- após deixar o Matito em seu apartamento, eu guiava o meu carro em direção à Bela Vista. Parei no sinal fechado e ouvi uma batida na janela do carro. As coisas aconteceram muito rápido, em segundos me vi na mira de uma arma. Eu fiquei apavorada. O bandido berrava para que eu abrisse a porta. Não é fácil raciocinar com uma arma apontada para a cabeça.  

-- E você destravou a porta traseira do carro...  

-- Pensei em arrancar com o carro, mas mudei de ideia, com certeza seria alvejada e provavelmente morta antes mesmo de mudar a marcha -- as lembranças fizeram Yasmin tremer da cabeça aos pés.  

-- Eu seguia no sentido contrário, e percebi que algo estava errado. Parei a moto, desliguei o motor e fiquei observando -- Daniela tocou o rosto de Yasmin -- Percebi que era um assalto quando vi a arma na mão do bandido.  

-- Tudo o que a gente pensa nesse momento, é que vai morrer.  

-- Confesso que no momento fiquei sem saber o que fazer -- Daniela respirou fundo -- Não tinha uma arma e, não tinha tempo. Tinha que agir rapidamente.  

Do nada, Yasmin caiu na gargalhada.  

-- Quando eu a vi com aquela embalagem de comida na mão, não sabia se ria ou chorava.  

-- Eu abri a caixa de transporte da moto, peguei uma das embalagens e olhei o que tinha dentro. Farofa, opa é isso mesmo. Pensei.  

-- Que tal uma farofinha? Você perguntou e ele se virou assustado -- Yasmin ria muito.  

-- E joguei toda a farofa no rosto dele. Cada um usa as armas que tem.  

As duas riam muito.  

-- O que é isso? Ele perguntava esfregando as mãos no rosto -- Daniela imitava os gestos do bandido -- Meu olho! Meu olho! O babaca berrava com o cabelo cheio de bacon. 

-- E enquanto ele tentava se livrar da farofa, você deu uma joelhada certeira bem no saco do infeliz -- Yasmin, olhou para ela com admiração -- Você foi muito corajosa.  

-- Você também. Correr equilibrando-se em cima de um salto 15 cm, não é para qualquer uma -- Daniela ficou parada, olhando-a sem disfarçar a admiração que sentia por ela -- Você se apresentou como Jéssica.  

-- Eu a vi beijando a Lavínia. Pensei que fossem namoradas, não queria arrumar confusão com uma funcionária da empresa.  

-- Eu não dei importância a sua mentira. Jéssica ou Yasmin, para mim não fazia diferença.   

-- Também menti que era solteira.  

-- Também não dei importância. Eu te amei desde o primeiro minuto que te conheci. Não! -- Daniela balançou a cabeça sorrindo -- Desde o primeiro segundo. Amei a Jéssica, a Yasmin...  

Yasmin olhou para os olhos azuis de Daniela e sorriu.  

-- Eu nunca tinha visto um sorriso tão lindo. Fiquei maravilhada desde o primeiro olhar, tanto por sua beleza, como pela simpatia e delicadeza. Sua natureza aventureira, impetuosa, e ao mesmo tempo calma e paciente.  

Daniela entregou uma fatia de pizza para Yasmin e pegou uma para si, abriu a cerveja e ofereceu para ela.  

-- Naquele dia tínhamos para comer: Gran strogonoff de filet, peito de frango à parmigiana, salada tropical e para sobremesa mousse dois amores. Hoje temos apenas pizza, mas está boa, né?  

Yasmin deu uma mordida na fatia, depois respondeu de boca cheia:  

-- Muito boa.  

Daniela tomou um gole da cerveja e entregou a latinha para Yasmin.  

-- Muito tempo passou desde aquele dia, eu mudei você mudou, nós mudamos. Mas, o meu amor continua aqui, intacto, forte como nunca.  

-- Naquela noite, quando eu te vi tão linda, o amor nasceu em mim, desde então não consegui mais te esquecer.  

Daniela beijou o pescoço de Yasmin e acariciou seu rosto com as pontas dos dedos.   

-- Não me arrependo das coisas que fiz no passado, mas me arrependo de algo que não fiz.  

Yasmin retribuiu as carícias.  

-- E o que foi?  

-- Foi não termos feito amor naquela noite, no chão da sala do seu apartamento da Bela Vista.  

Yasmin chegou bem perto dela e segurou o seu rosto entre as mãos.  

-- A brincadeira não é: De volta ao passado? -- Yasmin a beijou com força e Daniela correspondeu com paixão.  

Daniela foi deitando lentamente e cobriu o corpo dela com o seu. Yasmin se afastou um pouco do beijo e olhou para ela.  

-- "O Passado não pode ser mudado, o futuro não pode ser previsto, mas o hoje pode ser desenhado". (Jordan Rocha). Vamos desenhar? 

Naquele momento a lua saiu de trás das nuvens iluminando o lindo rosto de Daniela. Ela acariciou e beijou os ombros de sua amada calmamente.  

Hoje não tinham nem pressa, nem medo. Fariam amor no chão, na cama, no chuveiro, de forma tão romântica como se fosse a primeira vez.  

Teve carinho, teve olhos nos olhos, teve aquele toque gostoso pelo corpo inteiro, teve beijo na boca suave, que foi se apressando aos poucos até chegarem no clímax. Teve sensibilidade de perceber o que a outra desejava.  

Daniela jogou o cabelo de Yasmin para trás. O olhar suave como veludo.  

-- Eu te amo, minha rainha! - disse Daniela, que fechou os olhos e, logo elas caíram em um sono profundo. 

A frase ficou soando no ar como uma linda canção de amor. 

Fim do capítulo