Saudades e Confusões - Capítulo 10
- Estou tentando entender como o seu nome veio parar na lista dos procurados por tráfico de drogas – Melissa falava tranquilamente para a mulher que tentava em vão fazê-la aceitar que era inocente.
- Eu não sei, não sei – estava assustada – Eu juro que não tenho nada com isso doutora. Não sei como meu nome consta aí nesse negócio.
- Aqui diz – disse dando uma olhada no computador – que é você é procurada há 3 anos por porte ilegal de armas, formação de quadrilha e tráfico de drogas.
- Eu já lhe disse que não faço a mínima ideia de como isso é possível. Deve ser daquelas histórias em que duas pessoas com o mesmo nome e sobrenome são confundidas.
- Aqui trabalhos com fatos e não com histórias – disse séria.
- Mas eu estou falando a verdade.
- Todo mundo que vem aqui diz que está falando a verdade e é inocente – sorriu.
- Eu sou inocente – disse com lágrimas nos olhos – Só estava no lugar errado e na hora errada.
- Ou no lugar certo e na hora certa – acomodou-se na cadeira – Ok Luana, vamos ver se você é inocente mesmo, me diz o que estava fazendo naquele bar. Me fala quem é você.
- Bem – disse nervosa- Eu não moro aqui.
- Mora aonde?
- Eu sou do interior e estou passando uns dias aqui.
- Você sabia que a tática agora é montar um esquema de drogas nas cidades menores onde o policiamento é pouco? As concentrações não estão exclusivamente nos grandes centros, mas você deve saber disso, não é? Quem me garante que você não veio resolver certos “assuntos” de distribuição de drogas?
- Por favor! – disse alterada – Eu não sou traficante! Nunca cheguei perto de drogas – as mãos tremiam – Eu não sei nada disso que você está falando delegada.
- O que veio fazer aqui?
- Eu irei fazer uma prova de um curso.
- Essa semana?
- Sim, é amanhã e depois.
- E está em algum hotel?
- Não, eu estou na casa daquela moça que estava comigo.
- Então ela é sua cúmplice? Parceira?
- Você está maluca? – mostrou indignação.
- Interessante essa sua reação – sorriu – Se irritou tanto quando me referi a sua amiga.
- Você não tem o direito de falar assim da Annie, ela não está aqui para se defender e mesmo que estivesse ela é incapaz de fazer algo errado.
- Porque é cega? Ela mesmo disse que a cegueira não a torna diferente de ninguém e isso inclui fazer coisas erradas.
- Eu não acredito que isso esteja acontecendo! Eu sou amiga de infância da Annie, éramos vizinhas e eu passava praticamente o dia todo na casa dela. Os meus pais assim como os dela passavam muito tempo fora de casa e nós ficávamos com a governanta da família da Annie. Estudávamos na mesma escola e eu a ajudava bastante. Saia com ela, ajudava nas lições, aprendi o braile para que a Annie não se sentisse sozinha e diferente. Eu era como os olhos da Annie, mas o tempo passou ela veio morar aqui e eu continuei lá. Sou formada em gastronomia tenho um restaurante muito bom na minha cidade e estou abrindo filial em mais dois lugares. Quero me aperfeiçoar e aqui vai abrir uma turma para um curso voltado para a minha área. Eu não sabia se iria ficar na casa de Annie até a irmã dela me telefonar.
- E o que ela queria?
- Pediu para que eu viesse passar uns dias com Annie, segundo ela, a irmã não estava bem. Estava muito triste e um pouco depressiva, perguntou se eu não podia passar alguns dias com ela. Como estava vindo para cá não havia porque ficar em um hotel.
- Porque será que eu não acredito em nenhuma palavra sua? – mentiu – Vocês pareciam bem íntimas, se é que me entende.
- Não entendi – falou séria.
- Vocês pareciam um casal.
- Eu e a Annie? Um casal? – sorriu – Não, não. A Annie estava me pedindo para descrever o lugar, a iluminação, a arrumação, as pessoas. Se você não percebeu a música estava muito alta e para que Annie entendesse com detalhes eu tinha que ficar muito próxima a ela, não foi nada demais.
- Vocês pareciam muito mais que simples amigas e estavam se divertindo muito.
- E você queria que estivéssemos chorando? Por um acaso estávamos em um enterro? São isso que as pessoas fazem quando saem para divertir, elas dão risada, brincam, bebem. Parece que você não sabe muito sobre isso não é mesmo? E porque tanto interesse em saber se eu e Annie estamos juntas? O que isso tem a ver com a sua investigação?
- Como você é procurada pela polícia a sua namoradinha pode ser sua cúmplice – olhou friamente para Luana - Podemos chamá-la aqui para algumas perguntas....
- Eu não admito que você fale dessa forma da Annie! Eu até posso está com o nome nessa maldita lista, mas a sua desconfiança deve parar aí. A Annie é uma pessoa maravilhosa, uma mulher forte que superou muitos obstáculos para poder ser quem é hoje e não admito que qualquer pessoa fale dela dessa forma tão cruel. Você não a conhece!
- Você é apaixonada por ela, não é?
- Isso não é da sua conta! O problema é comigo!
- Sim, você é apaixonada por ela.
- E se for verdade, o que você tem com isso?
- Por que a irmã dela lhe chamou?
- Porque segundo ela uma idiota qualquer teve a grande ideia de ferir os sentimentos da Annie.
Melissa sentiu um baque forte não esperava que aquela conversa tomasse aquele caminho, Annie estava sofrendo por sua causa e aquela mulher veio lhe confortar.
- Preciso conferir os seus documentos.
Luana entregou os documentos a Melissa enquanto aguardava a delegada verificar os seus dados.
- Eu preciso confirmar as suas informações. Comprovante de inscrição, endereço do curso, local em que está hospedada. Enfim, a certeza de que não está mentindo e que não irá tomar chá de sumiço ao sair por aquela porta.
- Tudo o que você precisar – disse irritada – Não tenho nada a esconder.
-Acho bom.
Melissa inclinou-se um pouco para pegar um formulário e nesse momento a corrente que estava usando ficou por cima da blusa deixando à mostra o pingente da clave de sol.
- Ei! O que é isso? – Luana aproximou-se rapidamente de Melissa.
- Você está maluca? Afaste-se de mim.
- Não, é isso – tocou no pingente – Eu conheço esse pingente... eu conheço essa clave de sol.
- Não mesmo – disse um pouco nervosa – Há tantos pingentes de claves de sol.
- Mas em nenhum está gravado essa frase ao longo da clave “O meu coração está na música”. Essa corrente é da Annie! Você a roubou quando mexeu nas coisas dela?
- Você surtou?
- E como explica o fato dela está em seu pescoço?
- Isso não é da sua conta – disse com desprezo – Mas como está tão interessada em saber foi a própria Annie quem me deu.
- Lhe deu? A corrente?
- Sim, porquê o espanto? Por um acaso pensou que seria você a ganhar o pingente que ela tanto gostava?
- Não pode ser – disse irritada – Essa corrente foi o pai da Annie que deu a ela. Ela o amava e não deixava ninguém tocar e dizia que só daria a quem...- fez uma pausa – Eu nunca imaginei que ela daria a alguém, e se um dia chegasse a entregar seria para um homem e não uma mulher. E uma mulher tão arrogante e fria como você – disse com raiva.
- Bom, o importante é que está comigo – sorriu.
-Calma aí! Então você... você é a idiota! A sacana que magoou a Annie?
- Cuidado com os termos que usa para referir-se a mim ou lhe darei voz de prisão por desacato a autoridade!
- Eu não acredito que você foi capaz de ferir uma pessoa tão especial como a Annie.
- Pelo menos eu não sou foragida da polícia... o que será que a Annie achará quando souber que a amiga querida é uma traficante.
- Eu não sou isso! – disse com raiva – Já disse que sou inocente.
- Bom, estou de olho em você e acho bom não ter mentido em nenhuma dessas informações. Pode ir embora, mas irei saber se realmente está falando a verdade. Está liberada pode ir. E não esqueça que estou de olho em você – sorriu.
Luana saiu sem falar nada estava visivelmente irritada e quase empurrou Jaqueline quando passou por ela. Melissa estava arrumando a bolsa para ir embora quando Jaqueline entrou em sua sala extremamente séria.
- Pode sentar nessa cadeira e escutar tudo o que eu tenho para lhe falar –disse espalmando as mãos na mesa.
- Estou cansada Jaque, conversaremos depois.
- Não, teremos essa conversa hoje e agora. O que você pensa que está fazendo ao me envolver nessa maluquice toda? Você faz ideia do que acabou de fazer?
- Não seja dramática Jaque.
- Não é questão de ser dramática Melissa você sabe do que estou falando. Como iremos justificar essa operação? O que constará nos relatórios? O que faremos com todas aquelas testemunhas? A própria equipe pode provar que não havia nada.
- Quantas denúncias não procedem? Quantas vezes somos chamados e chegando ao local não há nada? Não é para tanto Jaque.
- Acontece que não teve denúncia nem telefonema Melissa! Não constará nada no sistema e aquele local não consta na lista de lugares que merecem atenção. O que você fez foi errado foi abuso de autoridade, meu Deus, você não percebe isso? Destruir uma carreira impecável como a sua!
- Não se preocupe Jaque, iremos resolver tudo.
- “Iremos”? Você irá resolver tudo, eu gosto de você Mel, muito e você sabe disso, mas não conte comigo para acobertar suas burradas! Não seria bem mais fácil ter ido até lá e conversado civilizadamente? Não teria sido mais tranquilo agir de forma natural? Eu teria ido com você, poderíamos sentar juntas e conversar de forma tranquila e normal.
- Jaque, eu não sei...
- Será que você não percebe o que está acontecendo? Porque mentir? Tudo bem que você não quer ter nada com ela, mas assuma que está envolvida e apaixonada.
- Apaixonada? – falou irônica – Você está exagerando.
- Só uma pessoa completamente apaixonada faz o que você fez essa noite Melissa, você não percebe isso? Eu nunca te vi agindo de forma tão irresponsável e leviana como hoje se isso não é paixão o que mais seria? Você tem a real dimensão do que aconteceu naquele bar? - Não sei o que aconteceu comigo – abaixou a cabeça.
- Eu sei... foi ciúmes, o mais forte e cego ciúmes que você já sentiu. Melissa você tratou aquela moça como uma criminosa e o nome dela não se encontra em nenhuma lista, você sabe que isso foi abuso de poder. Mel, isso é gravíssimo, se ela por algum segundo suspeitar de algo e contratar um bom advogado sua carreira vai pro ralo. Tudo o que você conquistou desmoronar por causa de uma atitude impensada! – disse irritada – Droga Mel! Assume de uma vez por todas e pare de se torturar dessa forma.
- Eu..eu... não posso...
- Pode e deve! Você está agindo de forma leviana e emocional demais. Mel, admita de uma vez por todas que essa moça mexe com você e que você está gostando dela.
- E se for verdade? Que diferença fará hein? Eu não quero e não posso me envolver com ninguém Jaqueline!
- Será que a minha irmã terá que voltar de onde ela está para poder te libertar? Coloque na sua cabeça que por mais que queira a Liz não voltará nunca mais, ela está morta Melissa, quando morre acaba tudo – disse alterada – Isso não faz bem para você nem para ela.
-Esse assunto está encerrado!
- Mel, vamos esquecer por um minuto a Liz certo? Só por um minuto... me responda uma coisa: Se não fosse o seu amor e a promessa que fez para a Liz o que lhe impediria de ficar com a Annie? A cegueira dela?
- Não, não, não Jaqueline – disse irritada – Isso não seria nenhum problema! Claro que não. A Annie é maravilhosa o fato dela ser cega não impediria em nada.
- Então qual seria o impedimento?
- Se não fosse a Liz?
- Sim Melissa! – disse irritada.
- Jaque... A Annie é linda... jovem... cheia de vida...
- E?
- E eu sou mais velha... tenho uma história de vida... tenho meus pesos... ela merece alguém mais leve, mais jovem e que a fará feliz de verdade.
- Eu não acredito que estou ouvindo isso Melissa! Idade? Mesmo? Essa é a desculpa mais esfarrapada que já escutei, essa coisa de diferença de idade é besteira e vocês não são tão distantes assim.
- 12 anos é muita coisa Jaque.
- Quando se quer de verdade isso é o de menos, minha querida. Sim, pode não dar certo com a convivência, com o passar de anos, mas não é o suficiente para não tentar. E pode parar com essa modéstia toda que você nunca foi assim, é claro que você é uma mulher linda, atraente, segura, determinada e muito gostosa!
- Jaque? Você está bem? – sorriu.
- Não estou mudando de lado, ta! Mas sei admitir quando uma mulher é atraente e gostosa – sorriu – Não precisa ser lésbica para isso! Mas voltando ao que estávamos falando, você é uma mulher maravilhosa e tenho plena certeza que a sua pianista linda também acha isso.
- Jaque! – sorriu – Seria melhor se tudo fosse mais tranquilo.
- Você é quem complica tudo! Agora vamos embora porque preciso descansar e você precisa arrumar uma boa desculpa para justificar essa atrapalhada de hoje.
- Você não vai me ajudar mesmo?
- Não! Se pelo menos fosse para aproximar vocês duas até que eu pensaria na possibilidade, então, não espere ajuda dessa sua amiga aqui.
- Vou colocar na lista – gargalhou.
- Mel – segurou as mãos da amiga – Por favor, dê uma chance a você. Não deixe ir embora algo tão lindo que a vida está lhe dando e não quero que a minha amiga fique uma coroa encalhada – sorriu.
- Vamos embora Jaque – disse levantando e abraçando a amiga – Eu te deixo em casa!
Quando Melissa entrou achou a casa escura demais e não era apenas a sua casa que estava assim, na verdade a sua vida estava escura demais. Desde que Liz morreu foi como se levasse com ela toda a sua cor, luz e felicidade. Aquela casa que antes era tão alegre hoje estava fria e sem vida. Após um banho demorado Melissa deitou e pegou o celular, ficou uns minutos olhando para a tela até que teve coragem e discou.
- Alô – a voz soou sonolenta – Quem é?
- Oi Annie – disse tímida – É a Melissa.
- Melissa? Aconteceu algo? Está tão tarde...
- Eu sei... me desculpe... não foi uma boa ideia...
-Você está bem? – perguntou preocupada.
- Estou muito cansada... dia muito difícil... liguei para saber se você está bem... se chegou bem.
- Seu policial foi muito gentil – disse com ironia – Melissa, aconteceu algo? Estava dormindo...
- Desculpe Annie... eu estava querendo te... falar um pouco com você. Será que poderia ir aí amanhã.... conversar um pouco ou ir lá na praça....
- Acho melhor não Melissa, estou com visita em casa e amanhã meu dia será corrido. Outro dia a gente se fala – disse sem interesse – Procure dormir e descansar, afinal, seu trabalho é muito cansativo. Boa noite. Xau Melissa.
- Xau Annie... fica bem.
Melissa não escutou a resposta apenas o barulho da ligação sendo encerrada, a Annie foi tão fria e distante e isso a machucou mesmo não querendo sentir. Respirou fundo. Passou o dedo no pingente e fechou os olhos. Precisava dormir, mas quando fechou os olhos foi o sorriso de Annie que surgiu em seus pensamentos. E uma lágrima de saudade escorreu pelo seu rosto.
Fim do capítulo
Comentar este capítulo:
annagh
Em: 05/03/2019
Oi Ninne...tudo em paz?
O capítulo anterior e esse são uns dos meus preferidos!!! Adoro cenas de ciúme...kkkk...e Melissa fica simplesmente uma lindeza com ciúmes...kkkkkkk...cara, ela ficou possuída...que doideira isso que ela fez...kkkkk...
Adoro os conselhos da Jaque e acho que agora tá na hora de Melissa despertar...ela não vai aguentar a frieza de Annie...
Beijo e até mais...
Resposta do autor:
Olá Annag, tudo na paz, e você?
Cenas de ciumes são sempre boas não é mesmo? kkkkk Confesso que me diverti escrevendo! Imagino a Mel possuída pela raiva, praticamente um trator kkkk. A Jaque é uma lindeza, sou fã dela ^ ^
Obrigada pela leitura.
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