Esse capítulo é um breve Spin Off de Zara...
Capítulo 40 - Spin Off
O café que outrora estava fumegante, agora estava frio, tão parecido comigo: mórbido. Eu ainda segurava aquele copo descartável entre minhas mãos. O agarrava e vez ou outra encarava o seu conteúdo já completamente sem graça e sem gosto. Eu devia jogá-lo fora e me servir de outro, um mais quente, mais saboroso e mais cheio de “vida”. Mas aquele copo de café me representava tanto que eu não conseguia me desfazer dele ou ao menos parar de encará-lo como se ali fosse encontrar a resposta que eu mais fazia na minha vida: “Por quê?”.
A sala estava completamente silenciosa, mas o meu coração e a minha mente, ah, esses estavam em perfeito alvoroço. Minha mente sempre era agitada e inconstante, me fazendo constantemente mergulhar em ondas do meu passado, do meu presente, e inevitavelmente do meu futuro. Futuro. O meu não parecia ser nem um pouco promissor, não parecia que seria repleto de coisas boas, não tinha sonhos, desejos ou planos. Eu não tinha, e não era nada.
Suspirei e passei as mãos pelos fios de cabelo que estavam revoltos e caindo sobre os meus olhos, como bem entendiam. Meti a mão no bolso da calça e toquei o objeto que para mim, era o meu maior tesouro. Não precisava nem mirá-lo, precisava apenas tocá-lo. Com as pontas dos dedos conseguia sentir nitidamente o nome que permanecia gravado ali, e em meu coração. Fechei os olhos e o apartei na palma da mão, ainda dentro do bolso.
-- Ah Lígia...
********
Flashback On
-- Zara? Amor? – ouvi a voz doce me chamar do andar de cima da casa.
Sorri só por imaginar a carinha que ela fazia. Ela odiava acordar e não me encontrar na cama. E como uma criança que acorda em uma manhã fria para ir ao colégio, ela sentava na cama, coçava os olhos, olhava em volta, esticava o corpo, coçava a cabeça e depois saia trás de mim. Eu a conhecia tão bem!
-- Oi amor. Estou aqui embaixo.
Enxuguei as mãos no pano que havia acima da pia e coloquei sobre a mesa a tigela de frutas com iogurte que acabara de preparar. Os pães quentinhos que acabara de trazer da padaria e o café que acabara de passar eram tudo o que ela mais gostava em um café da manhã.
-- Esse cheiro de café fresco não me deixou mais dormir.
Sorri encarando a pequena loira que entrava na cozinha ainda vestida com o seu pijama. Me aproximei dela e enlacei a sua cintura, puxando-a contra meu corpo e em seguida capturando o seus lábios com os meus em um beijo lento e suave.
Aqueles lábios que eram sempre rosados eram macios e quentes, e despertavam em mim o mesmo frisson de quatro anos atrás, desde o nosso primeiro beijo. Cada beijo era como se fosse aquele primeiro.
-- Bom dia. – falei quando nos separamos.
-- Bom dia meu amor. – ela disse tocando meu rosto. – Não dormiu bem essa noite?
-- Dormi divinamente bem. Tirando o fato de ter saído no meio da madrugada para ir a quase todos os supermercados dessa cidade até encontrar doce de jaca, tudo bem. – falei com um sorriso.
-- Desculpa. – pediu com uma carinha linda.
-- Não me peça desculpas amor, estou brincando. E se quer saber, eu amo fazer as suas vontades, ou me virar em dez para suprir os seus desejos, porque quando eu chego a casa com o que você queria, o seu sorriso é capaz de iluminar o mundo. É gratificante e vale todo o esforço.
-- Já disse o quanto você é boba, Zara?
-- Já! Mas eu sou a boba mais feliz desse mundo. – roubei um selinho e me abaixei diante de seu ventre praticamente colando minha boca ali – E você, dormiu bem também essa noite? Deixou a mamãe dormir depois de sentir o gostinho do doce de jaca? Eu estou tão ansiosa pra te pegar no colo, sabia disso?
Lígia mexia em meus cabelos e sorria enquanto me assistia falar com o nosso bebê. Minha esposa acabara de entrar na 13ª semana de gravidez, e no final dessa semana, teríamos uma consulta com a nossa médica e faríamos o ultrassom, para então sabermos o sex* do pequeno ser que ela carregava no ventre. Eu apostava que seria uma menina, e ela, um menino. O que importava mesmo era que viesse com saúde, porque de qualquer maneira seria amado intensamente e verdadeiramente.
Há alguns meses vínhamos tentando engravidar. Com muito carinho e depois de muita conversa, escolhemos o doador, fomos a todas as consultas e fizemos todos os exames. Mas nem tudo era do modo como queríamos. Mas o que importava mesmo era que após duas tentativas e duas frustrações terríveis, finalmente completaríamos a nossa família.
Fiquei louca quando cheguei a casa depois do trabalho e ela me encarou de um jeito sério e depois me entregou os exames de sangue onde eu li: POSITIVO. Chorei tanto que achei que ia desidratar. Lígia ria e me enchia de beijos enquanto dizia inúmeras vezes que seríamos mamães.
A barriga dela não era tão evidente ainda, mas eu a conhecia como a palma da minha mão e já conseguia perceber, assim como percebia cada nova curva que gravidez trazia junto. Lígia estava radiante, estava cada vez mais linda e eu estava cada vez mais apaixonada por ela. Nós estávamos felizes como nunca. Fazendo planos para o futuro como nunca.
-- Vai trabalhar hoje? Justo em um sábado? – ela perguntou quando a puxei para a mesa.
-- Vou. Infelizmente.
-- Eu tenho tanto medo quando você coloca esse distintivo no pescoço e guarda essa arma no coldre.
-- Eu sou cuidadosa meu amor. E eu já pedi o meu afastamento, quero me dedicar integralmente e você e ao nosso filho.
Ela me lançou um olhar triste e um meio sorriso. Depositou a xícara sobre a mesa e mordeu o lábio inferior. Suas mãos passearam lentamente pelos cabelos, e aquilo era um sinal que ela emitia sem saber para quando estava incomodada com algo.
-- Zara eu sei que você ama o que faz, sei o quanto estudou e deu duro pra estar onde está e também sei que você nasceu pra isso. Casar com uma delegada, se tornou quase um fetiche. Mas em breve seremos uma família, e eu não posso correr o menor risco de te perder. Não só por ele – disse passando a mão sobre a barriga – mas por mim também. Não saberia viver sem você, amor.
Senti o peito aquecer ao ter certeza de que a sua última frase era completamente recíproca. Eu não saberia viver sem ela. Busquei sua mão sobre a mesa e entrelacei nossos dedos. Encarei os pequenos olhos azuis e sorri.
-- Falta pouco meu amor, logo eu estarei em casa só para vocês dois. E não se preocupe, hoje não sairei da minha mesa.
-- Tudo bem. Se você promete se comportar, eu fico mais tranquila.
Depois do café da manhã, deixei o máximo de coisas preparadas e prontas para que Lígia não tivesse que se esforçar. Ela sempre ficava contrariada, dizia que não estava doente, apenas grávida. Mas se fosse da minha vontade, ela ficaria o tempo inteiro quietinha, de preferência, deitada na cama. Só que isso não era nada fácil já que minha esposa era daquele tipo de gente que não consegue ficar quieta por muito tempo.
Quando deixei a nossa casa, Lígia tinha acabado de sair do banho e havia deitado em nossa cama para terminar de devorar o livro que dei a ela semana passada. Achava-a mulher mais sexy da face da terra quando a encontrava séria, compenetrada na sua leitura e tinha aqueles óculos de armação quadrada no rosto.
Despedi-me dela com alguns beijos e uma enorme vontade de ficar na cama junto com ela. Fui até a pequena saleta que mantínhamos na casa como uma forma de escritório e peguei a mochila que havia deixado sobre o sofá desde a semana passada – quando pedi uma semana de folga. Chequei as duas Glock, o pente de munições e as coloquei em meu coldre axilar, uma de cada lado. Depois me encaminhei para o carro estacionado na vaga detrás, logo após o carro de Lígia.
O trajeto até a delegacia não era longo, e se desse a sorte de não pegar nenhum congestionamento, se tornava ainda mais curto. Adentrei a delegacia puxando a alça da mochila para cima do ombro. Cumprimentei todos os meus colegas que avistei pelo caminho, até a minha sala.
No início, assumir aquilo ali foi difícil, precisei de um tempo, mas agora, todos me respeitavam. Não digo que gostavam de mim, mas ao menos levavam em consideração o meu papel dentro daquela delegacia. Se pelo menos me reconhecessem dessa forma, para mim estava ótimo.
Como prometido, permaneci na minha mesa durante toda a manhã e parte da tarde. Em momento algum intentei aceitar algum chamado ou alguma ocorrência, me dediquei a tarefas internas e administrativas. Tinham muitos relatórios, inquéritos e alvarás que precisavam da minha assinatura.
No fundo, eu sentia medo de que algo acontecesse comigo, tinha medo de deixar minha esposa desamparada, e o peso disso aumentou ainda mais com o resultado da última inseminação, então nesse momento tudo o que eu queria, era viver uma vida pacata ao lado deles. Faltava tão pouco pra isso. Fagundes, o meu superior, acreditava que no mais tardar no final do mês eu receberia o meu afastamento.
Liguei para Lígia algumas vezes durante o dia, mas no meio da tarde eu já não aguentava mais a vontade de ir pra casa encontrar a minha pequena. A vontade era tanta que eu não conseguia sequer ler uma frase, simplesmente por não conseguir manter a minha foco. Meu corpo estava aqui, mas a minha cabeça estava em casa.
Meu relógio marcava 18hs quando comecei a me despedir de todos. Joguei meus pertences no banco de trás do carro e dei partida, rumando para casa. Estava quase entrando na avenida que me levaria para casa quando ouvi pelo rádio da polícia o relato de uma operação que resultou em uma perseguição.
Eu tinha conhecimento dessa investigação. Havia alguns meses que estávamos investigando um cassino clandestino. Essa operação não estava mais sob meus comandos já que eu pedi meu afastamento em definitivo da Polícia Civil. Mas ao estourarem o cassino, descobriram mais do que apostadores e roletas, descobriram uma operação de venda de drogas de todos os tipos, e em grandes quantidades, ou seja, tráfico. E agora alguns dos sujeitos estavam em fuga, sendo perseguidos, e estavam vindo praticamente na mesma direção que eu.
Pensei em ignorar, mas ao falarem o meu nome, o meu senso acabou me fazendo agir. Puxei o volante bruscamente e dei a volta. Segui o que diziam pelo rádio e comecei a me direcionar para lá. Do modo que eu estava seguindo e que eles vinham, ficariam encurralados entre os outros policiais e eu. Ainda pelo rádio dei a minha localização e pedi ajuda para não dar de cara com os sujeitos sozinha.
Quanto mais eu me aproximava, mais frequente e mais alto ficava o som dos estampidos, estavam trocando tiros. O celular que jazia no banco do passageiro começou a tocar, exibindo a foto de Lígia na tela. Hesitei por alguns segundos e quando pensei em atender, um carro passou diante de mim furando o sinal vermelho. Pela placa, era o carro de um dos suspeitos. Puxei o volante, cantando pneu, e comecei a segui-lo. Olhei de relance para o meu celular que havia começado a tocar novamente.
Ao entrarmos em uma rua mais estreita e menos movimentada, um dos ocupantes do veículo colocou parte do corpo para fora e começou a disparar contra o meu carro. Alvejando o parabrisa e o capô. Abaixei e quando vi uma brecha, onde ele provavelmente estava carregando a arma, coloquei o braço para fora, e atirei, acertando um dos pneus do carro. Mesmo assim o cara acelerou e passou o sinal vermelho em um cruzamento, acertando em cheio outro carro.
Freei bruscamente parando a alguns metros de distância. A pancada foi forte, assim como o barulho. Fumaça começou a sair do carro em que os suspeitos estavam. Rapidamente um aglomerado de curiosos começou a se aproximar do carro, e foi nesse instante que eu reconheci aquele SUV vermelho. Levei às mãos à cabeça.
Instantaneamente minhas mãos começaram a tremer. Não pode ser! Peguei o celular esquecido no banco ao lado e disquei o número de Lígia. Chamou até cair na caixa postal. Desci do meu veículo sentindo minhas pernas bambas e minha cabeça pesar. Voltei a discar o número de minha esposa enquanto caminhava na direção exata do acidente. A distância começava a diminuir lentamente e de dentro daquele carro consegui ouvir o toque do celular, era o toque do celular dela. Não!
Sentindo minha boca seca e o peso do mundo inteiro sobre a minha cabeça eu encurtei a distância que ainda me mantinha longe, correndo até lá. Era ela!
-- Lígia! Lígia? Não!
Quando coloquei a cabeça para dentro da janela do motorista, me assustei com o que vi. Era mesmo ela, era a minha esposa. Entrei em desespero e a proporção disso aumentou quando vi a grande quantidade de sangue que vertia de um corte na sua cabeça. Ela estava desacordada, e sua cabeça repousava sobre o air bag do volante.
-- Alguém chama uma ambulância! Por favor, uma ambulância. – gritei chorando em desespero – Amor? Amor olha pra mim. Abre esses olhinhos pra mim.
Como se ouvisse a minha voz, lentamente ela abre os olhos, fazendo uma careta e levando as mãos ao ventre. Meu Deus! De longe eu já podia ouvir o som da sirene se aproximando. Com um pouco de esforço consegui abrir a porta que havia emperrado com o impacto. Dentro do carro eu avistei algumas sacolas de lojas para bebê, e dentro delas havia algumas roupinhas rosa...
-- O que você está fazendo aqui amor?
Perguntei tentando esconder no tom de minha voz o meu próprio estado de nervos. Vê-la daquela maneira, machucada, sangrando e com o olhar assustado estava me partindo o coração. Mais que isso, estava me deixando sem chão.
-- Queria te fazer uma surpresa. A nossa médica... – parou para tossir – adiantou o ultra, e eu só queria te fazer uma surpresa. – no final da frase ela começou a chorar.
-- Tudo bem meu amor. Vai ficar tudo bem. – falei passando a mão sobre seus cabelos e encontrando cacos de vidro no meio dos fios.
-- Minha barriga dói Zara.
-- Aguenta firme meu amor, a ambulância está chegando. Nós vamos ficar bem.
Lígia assentiu e me deu um sorriso em meio às lágrimas que desciam silenciosamente por seu delicado rosto, depois voltou a recostar a cabeça sobre o volante. Ela fechou os olhos e eu me assustei, chamando o seu nome nervosamente, mas ela não me respondia mais, estava inerte. Ainda respirava, eu podia ver, mas, era lentamente, quase imperceptível.
No meu completo desespero, me preparei para tirá-la do carro e eu mesma a levaria para o hospital, ela não podia mais esperar. O que eu não vi foi que a ambulância com os paramédicos havia chegado. Eles se aproximaram, fazendo com que eu me afastasse e a retiraram do carro após uma contagem sincronizada.
Minha esposa estava imobilizada em uma maca e eles faziam os primeiros procedimentos. Eu assistia a cena sentindo meu coração apertar, e garganta quase fechar. Não conseguia mais controlar minhas lágrimas. Minha visão estava turva. Eu queria me aproximar, queria tocá-la e fazê-la sentir que eu estava por perto, mas eles me afastavam.
-- Ela está tendo uma parada. – uma socorrista falou.
Logo toda a equipe começou a se movimentar rapidamente, colocando Lígia na ambulância e tentando a reanimação.
-- Não! Ajudem ela! Ajudem a minha mulher, por favor. Ela está grávida. – eu gritava e tentava me aproximar enquanto um homem da mesma equipe me impedia.
-- Se acalme senhora. – pediu me segurando.
-- É a minha mulher, a minha mulher e o meu filho! – urrei tentando mais uma vez me soltar de seus braços.
Quando conseguiram estabilizar minha esposa, anunciaram que se dirigiriam para o Hospital Geral. Tentei me recompor e me controlar para que eles me deixassem acompanhá-la dentro da ambulância.
Senti o frio me abraçar quando sentei ao lado da sua maca. O barulho dos aparelhos dentro daquele pequeno espaço se misturava às batidas do meu próprio coração que parecia galopar dentro do peito. Com um cuidado extremo, segurei a sua mão que estava inerte ao lado do corpo.
Passeei os olhos por todo seu corpo, identificando inúmeros machucados. Eu olhava para a loirinha desacordada, cheia de arranhões e hematomas e eu não conseguia parar de chorar, de me culpar.
No meio do caminho Lígia teve mais uma parada cardíaca. Conseguiram novamente trazê-la de volta, e eu orei incontáveis vezes durante o percurso para que ele não tivesse mais nenhuma parada. E ela não teve. Chegamos às pressas ao hospital e ela logo sumiu por entre aquelas portas.
Avisei na delegacia e a quem eu podia. Pedi ajuda à minha irmã para que ela desse algum jeito de pegar meu carro que deixei parado de qualquer jeito no meio da rua. Sophie apesar de preocupada e horrorizada com a situação, disse que faria o possível e logo estaria comigo.
Meu relógio marcava quase 22hs quando um médico apareceu diante de mim, perguntando se eu era familiar de Lígia Albuquerque. Senti novamente o frio me abraçar. Quando afirmei, ele fechou os olhos e depois tocou o meu ombro para dizer:
-- Eu sinto muito, mas a Lígia teve uma terceira parada cardíaca e o coração dela dessa vez não aguentou. Nós fizemos tudo para salvar ela, e o bebê, mas infelizmente não conseguimos.
O tom calmo e ameno não foi capaz de diminuir o que eu senti. Eu tinha tudo, e agora eu não tinha nada, apenas um vazio enorme que se alastrava em meu coração em todo o meu ser, feito rastro de pólvora. O chão sumiu debaixo dos meus pés.
-- Minha Lígia morreu? – perguntei não querendo acreditar no que acabara de ouvir.
Tudo ficou em silêncio e foi escurecendo aos poucos.
Flashback Off
**********
Não parece, mas já fazem cinco anos que eu perdi Lígia. O tempo não foi capaz de apagar nada, nem o amor que eu sentia por ela e nosso filho, e menos ainda a dor. Até parece que foi ontem, e essa dor continua a dilacerar meu peito, constantemente, incessantemente. Não me deixa em paz nem mesmo quando durmo.
A culpa ainda está aqui, não diminui, não camuflou, continua latente. A saudade que eu sinto é monstruosa, assustadora e intensa. Meus dias só parecem ficar tranquilos em duas situações: quando estou com a minha sobrinha e quando estou trabalhando.
Este momento é atípico, porque apesar de estar trabalhando, a dor veio, veio com força, assim como as memórias. Fechei os olhos e tentei me concentrar no que eu estava fazendo. Eu estava trabalhando, e fiz uma pausa apenas para um lanche, um café. Não podia me dar ao luxo de distrações. Meu foco e a minha atenção precisavam estar sempre intactos. Nesse momento, duas pessoas precisavam de mim, e eu não podia falhar.
Me estiquei para me servir de outro café, mas não consegui concluir o ato. A porta da copa foi aberta de forma abrupta, fazendo o barulho do choque contra a parede ecoar e me dispersar de meus devaneios e memórias nada reconfortantes. Levantei depressa, em alerta e em sentinela. Instintivamente levei a mão para dentro do blazer que usava, mais necessariamente, para a arma presa no coldre escondido perfeitamente debaixo da roupa.
Um gemido chamou a minha atenção. Caminhei lentamente na direção do som que vinha do outro lado da mesa e me abaixei para avistar uma mulher caída ainda junto à porta. Retirei a mão da arma e me aproximei lentamente da mulher que mantinha as duas mãos sobre o tornozelo, enquanto franzia o nariz em uma pequena careta, provavelmente dor.
Caminhei até ela sem que ela percebesse a minha presença. Me abaixei ao seu lado e toquei o seu ombro chamando a sua atenção. Ela esbugalhou os olhos e me encarou com espanto. Tive a impressão de ter visto suas bochechas corarem, mas não consegui examinar muito o seu rosto porque ela tratou de baixa-lo, impedindo que eu a visse.
-- Você está bem?
-- Estou...acho que...acho que torci o tornozelo.
-- Posso dar uma olhada?
Ela assentiu e meio sem jeito eu levantei a barra da sua calça para ver o tornozelo que já começava a inchar. Quando toquei sem querer na pele desnuda ela retraiu-se, e como consequência emitiu mais um pequeno gemido.
-- Vem, se apoia em mim, e não põe o pé no chão. Vou te ajudar a levantar e vamos até a enfermaria aqui embaixo. Você precisa pôr algo ai ou vai ficar feio.
Ela apoiou o braço em meu ombro e juntas, nos levantamos. Agora que ela estava muito próxima, o perfume que ela usava chegava às minhas narinas. Era uma mistura de fragrâncias, nada exagerado ou enjoativo, pelo contrário, era gostoso, e eu quase inspirei fundo para trazer junto aquele cheiro agradável.
Nossos corpos estavam muito próximos, e assim não foi difícil perceber que seu corpo tremia levemente e ela praticamente prendia a respiração. Caminhamos assim até o elevador que nos levaria até o andar debaixo.
-- Você trabalha aqui? – ela perguntou.
-- Sim e não. Eu trabalho com segurança pessoal, e ultimamente eu tenho feito a segurança de Adele.
-- Ah! Você tem porte de quem trabalha com algo do tipo mesmo.
-- E como seria esse porte?
-- Bom, não sei explicar...
Sorri da frase e da sua colocação. Por acaso eu tinha escrito na testa com o quê eu trabalhava? Ou aquilo era só uma forma de puxar assunto?
-- E você, trabalha aqui? Trabalha com o quê? – perguntei interessada genuinamente.
-- Sou estagiária daqui, quer dizer, eu era até semana passada, agora sou efetiva. Fui contratada – ela disse com um sorriso encantador nos lábios - Sou arquiteta paisagista.
-- Não me lembro de ter te visto por aqui, e pode apostar, eu sei o nome e sobrenome de cada um daqui. – ela me olhou espantada e eu continue, sem conseguir conter um sorriso – Faz parte do meu trabalho. Portanto, é melhor você me dizer que não trabalhava aqui antes, ou eu terei que rever todo o meu trabalho, porque há uma brecha nele.
Ela deu uma risadinha baixa e examinou o meu rosto.
-- Eu trabalhava em outra sede do escritório, só vim para cá ontem. E eu tenho que dizer que nunca te encontrei por esses corredores, do contrário, eu me lembraria, não esqueceria um rosto como o seu assim tão fácil.
Mirei o fundo daqueles olhos castanhos mel e ela desviou voltando o rosto para o piso do elevador. Sorri de lado e com a mão que estava em sua cintura a puxei para mais junto de mim, mantendo-a firme.
Depois disso nos mantivemos em silêncio. E assim permanecemos até entrarmos na sala da enfermaria, onde ela passou a relatar o que aconteceu. Fiquei mais distante, apenas observando o modo como ela gesticulava ao falar e o jeito como ela prendia atrás da orelha uma mecha do cabelo que fugia e parava no seu rosto.
Senti o aparelho celular institucional tocar no bolso da minha calça e só ai eu desviei o olhar. Atendi rapidamente ao ver que o nome de Ciro aparecia na tela do aparelho.
-- Algum problema? – perguntei assumindo o meu lado mais sério – A Beatriz quer falar comigo? Claro, pode passar.
Arquei uma sobrancelha estranhando a situação, afinal, e tinha certeza e que Beatriz não gostava muito de mim. O que ela poderia querer comigo? Demorou alguns segundos até que eu pudesse finalmente ouvir a sua voz do outro lado da linha.
-- Algum problema Beatriz?
-- Na verdade não Zara. O que eu quero mesmo é te pedir um favor.
-- Favor?
-- Sim! Estou planejando algo para Adele, e é claro que ela não pode saber de todos os detalhes. É uma surpresa, e para que isso dê certo, eu preciso que você me ajude.
-- Como posso ajudar?
Ela passou a relatar com detalhes o seu plano. Eu não teria que fazer muito, e mesmo que tivesse, algo naquelas duas havia conseguido capturar a minha admiração e meu respeito, portanto, não me negaria em ajudar. A menos que ela me pedisse ajuda para cometer um homicídio, o que não é o caso.
Quando Beatriz desligou não consegui evitar um sorriso. Voltei a olhar para a mulher que ainda era examinada sobre a maca, e ela também me encarava, o que mais uma vez não durou já que ela desviou.
Balancei a cabeça em sinal negativo ao me dar conta de que eu nunca fui tão receptiva com alguém. Não negaria ajuda, isso é óbvio, mas acho que gastei com aquela mulher toda a minha cota de palavras e isso realmente não era algo comum. Pode até ser que eu baixei um pouco o meu escudo, porque eu costumava ser o mais evasiva possível, evitava aproximações e odiava perguntas desnecessárias. Eu era seca, e com ela, não fui...
Continua...
Fim do capítulo
Oi meninas. Tudo bem?
Trago hoje um breve Spin Off de Zara, pra que a gente entenda um pouco da mulher que só tem cara de durona. Este não é o capítulo da semana, portanto, o tomem como um EXTRA, antes mesmo do capítulo oficial.
Música do Capítulo: All Of The Stars - Ed Sheran
https://www.youtube.com/watch?v=srhR6qtkgbo
----- PAUSA PARA DESABAFO -----
Meninas vocês sabem que eu sou carente e muito sentimental, não é? Fiquei um pouco triste com o capítulo passado. Quase não houve interação de vocês, e fui salva por dois coméntarios (Obrigada por eles meus amores!). Cada comentário vale muito, muito mesmo, e é por cada um deles que a gente sabe como está a história. É imporante saber a opinião de vocês, saber como estou me saindo. Quando acontece de vocês "sumirem" em um capítulo, a primeira ideia que me vem à cabeça, é que não agradou, que algo está errado. Comentem até mesmo quando não gostarem, eu prometo tentar melhorar, sempre.
------ FIM DA PAUSA PARA DESABAFO -----
Então é isso amores. Ainda hoje volto com o outro capítulo. Acho que vocês vão gostar.
Beijos e até o próximo!
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jake
Em: 01/02/2019
Aí que triste o que houve com a Zara ...Querida autora achei lindo vc nos permite saber um pouco mais da Zara...Ha eu andei sumida pq a ansiedade e MTA e gosto de maratonas ...
Resposta do autor:
Olá Jake!
Pois é, muito triste mesmo o que aconteceu com ela. É uma perda irreperável, uma dor e uma saudade que jamais vai passar.
Ah, mas é claro que eu vou adorar ter vocês mais um pouquinho aqui comigo, então é claro que vai ter uma história só da Zara pra vocês comentarem bem muintão e eu cobrar bem muntão a atenção de vocês. Porque vocês sabem, eu sou carente...kkk
Em breve amore, muito em breve veremos Zara com outra perspectiva.
Eu senti mesmo sua falta! Mas o que importa é que você voltou. Só espero que não suma de novo, né? Bem vinda d evolta!
Beijos amore, até o próximo!
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LeticiaFed
Em: 31/01/2019
Querida autora carente mega master!
Desculpa a ausência de comentários no cap anterior. A gente (eu pelo menos) le de uma vez o capítulo e as vezes não da tempo de comentar na hora, ou quero pensar antes de dizer algo. E daí...puf, me esqueço completamente até vir outro cap. Como podes pensar que a gente vai oarar de gostar da história assim de repente? Até parece...hahaha
Gostei MUITO deste capítulo da Zara. Pode vir como outra história sim, ja vai pensando na proxima pra não deixar a gente muito tempo sem te ler. Tens direito a uma mini férias de um mês no maximo, mas volta logo. Veja como suas leitoras são fofas e queridas. Ate te deixamos tirar ferias! ;)
Beijo!
Resposta do autor:
Ah sim, carente mega master mesmo, eu assumo *_*
Oh, eu só vou desculpar, porque você sempre aparece de volta, tá certo? Brincadeira! Tudo bem, eu entendo que as vezes a gente lê e por algum motivo a gente não consegue comentar, tem problema não. Mas mesmo assim, eu digo que sinto falta, vou nem mentir pra morrer preta! ¬¬
Vai que eu escrevi algo que vocês não gostaram, ai todo mundo se reuniu e decidiram não ler mais a minha história? Tudo pode acontecer ué!
Que bom que você gostou, vou investir mais nela. Na história, certo? Nem te conto que eu tenho três enredos martelando aqui na minha cabeça e não sei qual deles vai ser o próximo que eu vou postar...
Mas nem se preocupe que não ficaram muito tempo sem a autora carente aqui, até porque, eu sou carente, né? kkkk Olha só, ganhei até direito a mini férias, gostei disso. Concordo, são muito fofas e queridas mesmo. Não retirem as minhas férias, tá bom?
Beijos amore, até o próximo!
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Aurelia
Em: 30/01/2019
OMG! Pessoa carente, o capítulo anterior estava maravilhoso. Só fiquei triste em saber que só seria toda quarta. Uma semana inteira sem é muita maldade com a gente, mas ta valendo. Adorando todos os capítulos. Bjos
Resposta do autor:
Oi Aurelia!
Ah eu sou carente mesmo, não escondo. Sou a carência em pessoa! Pensei em combinar na quarta pra ter um modo de me organizar e não me sentir tão em falta com vocês, mas não é uma regra, e capítulos em outros dias da semana podem rolar. Não fique triste...
Beijos amore, até já já!
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NayGomez
Em: 30/01/2019
Gosti de cap de saber mais sobre a Zara mesmo que o passado dela fosse triste, quase chorei com a morte da Lígia , pelo que percebi ela era uma mulher incrivel. Bom zara encontrou outra mulher e que pelo vi é. Incrivel tb, chegou a hora dela ser feliz tb , a pergunta que nao quer calar é quem é essa nova Arquiteta que nao vi chegando, e pelo visto ela ja deve ter topado com a Zara em algum momento. Adorei o cap espero ter mais POV da zara e da Arquiteta misteriosa ... Bjs Bruh até mais tarde .
Resposta do autor:
Oi NayGomes!
Eu mesma quase chorei ao escrever. Realmente não são memórias boas, e a saudade quando não pode ser sanada, quando é impossível, traz uma dor imensurável. Não consegui não entrar um pouquinho na história, então quase chorei também.
Lígia era sim uma mulher incrível, admirável. Zara também é, apesar de agora ela tentar se esconder atrás de uma muralha após a sua perda prematura da mulher e do filho que nem nascera.
O que posso dizer é que o encontro com a arquiteta vai mudar muita coisa, muita mesmo...
Talvez tenhamos uma história só de Zara, então terão muitos outros POV e muita coisa pra rolar. Vamos ver no que vai dar.
Beijos Nay! Até mais tarde.
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preguicella
Em: 30/01/2019
Aff, que capítulo triste, tadinha de Zara!
Esse capítulo significa que teremos a história de Zara depois?!
Acho que nem respondi que amei Bia dando um super chega pra lá na inglesa bandida né.
Só pra não perder o momento da zoeira, nós, leitoras TB tem uma vidinha corrida, talvez por isso tenha faltado comentários! hahaha Tô rindo pq esse é o argumento mais usado pelas escritoras para justificar a ausência. Desculpaê, mas não podia perder essa oportunidade tá. É só zoeira mesmo, até pq sei o quanto escrever dá trabalho! Aí perdoo as ausências, desde que a história um dia tenha fim. Eita, me alonguei nessa zoeira, já ficou até chato! hahaha
Mas e aí, vai rolar outra história ou vai ser dentro de blind que vc vai desenvolver a história de Zara?!
Bjão, desculpaê se a brincadeira foi ruim, tá! ;)
Resposta do autor:
Oi Preguicella!
Realmente foi um capítulo triste, tive que parar em alguns momentos porque fiquei meio balançada. Me perguntei algumas vezes se devia dar realmente esse rumo ao capítulo, mas era necessário.
No início eu não pensava em dar uma história para Zara, mas aos poucos a ideia foi ganhando proporção, e agora que escreve esse spin off, estou pensando seriamente nisso.
kkkk Realmente esse é um argumento muito usado, e tu aproveitou que eu já usei ele, né? kkkk Tudo bem, a zoeira é válida. E nem se preocupe que essa história aqui vai ter um final. Não sei ainda em quantos capítulos isso vai acontecer, ainda tem muita ideia rolando na cachola, mas teremos um FINAL FELIZ em Blid. Ficou chato nada, pode zoar!
Caso eu desenvolva mesmo a ideia de dar a Zara uma história, ela será SÓ DELA. Provavelmente quando Blind chegar ao fim.
Beijão amore. Não há o que desculpar. Até o próximo.
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