Após o encontro inesperado Laura retornou para casa sorrindo, distraída olhava o céu e os postes atraindo as formigas voadoras, costumeiras daquela época, o verão, dançavam ao redor da luz. Lembrou sorriso de Viviane, gostaria de dançar diante do seu sorriso iluminado, por mais efêmera que fosse essa situação. Chega a casa, alimenta sua gata, fala com o cacto que mora em sua mesa de estudos, única planta que já resistiu aos seus cuidados, ao redor da mesa, pilhas de livros, anotações, cadernos velhos e canecas de café para todo lado.

- Tá na hora de fazer uma faxina nesse quarto, como você quer trazer seu amor aqui com a casa toda bagunçada? – Disse, Janaína zombeteira.

De certo, organização não era um dos maiores talentos de Laura.

- Encontrei Viviane, novamente.

- Conta! Janaína pula na cama de Laura com um sorriso estampado no rosto:

- Tomamos um café e ela me convidou para ir até a casa dela, assistir um filme.

- Vamos com calma! Assistir um filme ainda significa trans*r ou no calendário de vocês a lua o sol, saturno e Júpiter precisam se alinhar? Só perguntando mesmo...

Laura corou. Janaína gargalhava em sua cama.

Quando o celular de Laura vibrou, era uma mensagem de Viviane.

“O convite está feito, que tal próxima quarta ás 19:00?”

As pupilas de Laura cresceram ao ver a mensagem, “perfeito”, respondeu.

Todas as quartas-feiras Viviane sentia certa magia no ar, era seu dia favorito da semana, e agora iria compartilhar a noite com Laura, não conseguia evitar o sorriso ao lembrar-se dela, olhos enormes a encarando com uma permanente cara de surpresa, quando tivessem mais intimidade perguntaria sobre a cara de boba, mas no momento, sabe que possivelmente Laura se esconderia em baixo de uma pedra, caso fosse questionada.

Viviane se admirou no espelho, se achava sim, uma mulher linda, havia lutado por isso, e superado estigmas como muitas mulheres negras. Questionava-se se Laura sabia o quanto era bonita, ela mesma não sabia há alguns anos sobre sua real beleza. Sabia que os padrões da sociedade destruía a autoestima das mulheres negras desde a infância, ora objetificando, ora bestializando. Mas o padrão era um absurdo, fotografando muitas mulheres, Viviane percebeu as muitas formas da maneira de podar as mulheres.

Olha-se mais uma vez no espelho, seu cabelo crespo e alto, como uma coroa, seus lábios grossos, seu nariz ressaltando seu rosto, sua pele negra. Sim! Era linda, e por um momento vacilou nos pensamentos, se perguntando: “Laura me acha linda? Se não, ela certamente tem algum problema de visão”. Concluiu e foi tomar seu banho.

No banho demorado, revivera parte de seu dia, quem diria que ia dar e cara com Laura, tudo bem, estava atravessando o campus dela, mas com tantas e tantas pessoas em Letras, era possível que elas estivessem no mesmo lugar e não se encontrassem. Viviane sorriu sozinha, gosta quando o destino sopra as direções, são quando as coisas mais preciosas lhe acontecem.

Saindo do banho estende a toalha na área e atravessa metade do apartamento nua, como de costume, em sua sala, seus livros perfeitamente arrumados na estante, muito organizada, em cima de sua mesa só havia caneta, agenda, o notebook e sua câmera, preciosidades, e também material de trabalho.

Jogou-se no sofá, passeando os olhos pelo teto, havia muito que fazer, mas não conseguia abandonar sua furtiva tentação, sempre que se distraía voltava a lembrar de Laura. Seu sorriso muitas vezes tímido e ás vezes surpreendentemente escandaloso, os três sinais que ela possuiu no pescoço, formando as Três Marias, sua pele bronzeada, olhos castanhos, cabelos cacheados, suas mãos distraídas. “Deveria ter tirado uma foto” pensou Viviane, “Sobre qualquer pretexto, afinal eu sou fotografa”, ela leu uma poesia para mim. Sim, faltava apenas dois dias para a quarta e Viviane resolvera que tiraria uma foto de Laura durante a visita. De repente em um salto lembrou: “O que prepararia para o jantar?” Apenas pipoca, pediria uma pizza, era Laura vegetariana? Cansada de tanto especular, enviou outra mensagem:

“O que gosta de comer?”

Laura prontamente respondeu: “Não tenho alergias ou restrições alimentares. Você gosta de cozinhar?”.

Não, Viviane, não gostava.

“Ás vezes, quando dá vontade, e você?”

“Amo. Se preferir passo no mercado na quarta e cozinhamos juntas.”

Viviane ficou feliz, pois Laura era mais aberta na internet, diferente dela pessoalmente. Até então...

“Seria ótimo, quanto mais rápido nos encontrarmos melhor” – Viviane não sabia como Laura interpretaria essa indireta, aguardou:

Digitando...

Digitando...

Digitando...

-AHHHHHH maldita função, só aumenta nossa expectativa! – Larga Viviane em voz alta.

Enquanto isso do outro lado da tela, Laura ainda estava sem reação.

- Janaínaaaaaaaaaa....

- Diz algo fofo para ela – disse Janaína desinteressada – segura essas expectativas, faltam só dois dias para o encontro.

“Também mal posso esperar para te encontrar”.

Viviane respondeu com um coração e enceraram a conversa.

Levantou colou sua playlist para tocar no aleatório, foi até a varanda regar suas plantas quando “At last”, pensou:

“O aleatório sempre acerta”.

Fim do capítulo