Capítulo 83 -- Voltas Que a Vida Dá
A ILHA DO FALCÃO -- CAPÍTULO 83
Voltas Que a Vida Dá
Andreia chorava. Não podia conter suas lágrimas de alegria. Os soluços que a sacudiam pareciam liberar toda a tensão passada nos longos minutos de desespero.
-- Meu Deus obrigada -- dizia entrecortada -- Obrigada.
A força dos soluços estremecia seu corpo, e seus grandes olhos castanho se inundaram de lágrimas.
Natasha a envolveu com os braços e a beijou carinhosamente.
-- Agora está tudo bem, meu amor -- disse Natasha numa voz controlada -- Tudo acabou bem! Nosso Marlon está de volta para nós.
Andreia pegou o filho no colo e apertou-o contra o corpo.
-- Não sei o que seria de mim se algo de ruim acontecesse com você meu filho.
Natasha apertou a orelha de Leozinho com força.
-- Aiiii...
-- Isso é por ter entregue o Marlon nas mãos daquele lunático -- Natasha franziu a testa, irritada.
-- Eu sei que não deveria tê-lo entregue a um estranho. Não deveria tê-lo deixado -- repetia Leozinho, reprovando-se amargamente -- Deveria ter dito não e não ter deixado que ele me convencesse, não devia.
Comovida e ainda assustada, Andreia abraçou e beijou seu pequeno garoto.
-- Está tudo bem, Leozinho. Graças a Deus tudo acabou bem -- a voz profunda de Andreia soou mais calma.
-- Sou tão azarado que se inventassem uma pílula da imortalidade, eu morreria engasgada com ela -- lamentou-se Leozinho -- Não devia ter sido tão estúpido a ponto de confiar em uma pessoa desconhecida -- disse ainda culpando a si mesmo.
-- Não precisa mais ficar se lamentando. Já passou -- Andreia estava claramente começando a se sentir mais tranquila, estava até sorrindo.
-- Abre a baga Leopoldo -- Natasha fez um gesto em direção a porta, pedindo a ele que saísse.
Leozinho apenas fez um ligeiro gesto de cabeça concordando e saiu.
Andreia meneou a cabeça de um lado para outro.
-- Não precisava ser tão dura com ele. Coitado. Estava só querendo ajudar.
-- Eu sei. É só para manter a minha fama de mal.
Andreia colocou o menino no berço, aproximou-se de Natasha e beijou-a.
-- Obrigada, querida, você foi maravilhosa hoje.
-- Só hoje amor? -- ela brincou.
-- Você é sempre maravilhosa, Nat, mas hoje você se superou.
Natasha segurou a mão de Andreia e sorriu amável. Inclinou-se e beijou-a levemente na face.
-- Tenho que ser justa. Todas foram maravilhosas, mas Carol foi perfeita. Ela arriscou a própria vida para salvar a do Marlon.
-- Não estranho a sua atitude. Desde o princípio acreditei que por trás daquela máscara de menina má, existia uma menina bondosa e meiga.
Natasha fez um gesto de enfado, revirando os olhos.
-- Menos né amor, bem menos. Ainda vou continuar de olho nela.
Natasha estava saindo do quarto quando seu celular tocou. Ela deu a volta foi até o balcão e atendeu a ligação em tom seco. Ao ouvir a voz fez uma careta.
-- Tudo bem. Já estou descendo -- respondeu -- O foda é quando você resolve 1 problema e aparecem mais 7.
-- Era ela? -- perguntou Andreia, sem esforçar-se por esconder a irritação.
-- Sim. E lá vamos nós de novo.
Isabel se deteve nas enormes janelas da suíte do penúltimo andar do Hotel Falcão, contemplando a vista maravilhosa. O calçadão vivia uma intensa atividade, com pessoas andando de um lado para outro, turistas brasileiros e estrangeiros, todos disputando espaço nas lanchonetes lotadas.
O rosto de Isabel se contraiu. Havia chegado a hora de ir embora. Se a escolha fosse sua jamais deixaria a ilha. Mas a escolha não era sua. Nem de Alexandra. Tinha certeza que seu desejo também era ficar.
Sua esposa era uma mulher importante, uma empresária de sucesso entre os ricos e famosos. Ela estava acostumada a lidar com poderosos homens de negócios, pessoas de vida agitada que se dividiam entre o trabalho champanhe e caviar.
O ponto crucial nisso tudo era que Alexandra sempre sentira um certo desprezo pelas pessoas que se entregavam por fadiga, por exaustão ao trabalho. Ela gostava de sempre que possível fugir para as suas operações supersecretas. E Isabel sabia que para ela isso era uma forma de se distanciar do desgaste que o mundo dos negócios causava.
Alexandra se aproximou dela com o celular na mão.
-- Vendo as fotos de algumas pessoas no Facebook, concluí que a feiura é hereditária.
-- Credo Xanda! Que maldade.
-- Olha o André. A mãe, é a única pessoa que coloca a reação do coração na foto dele.
-- Falar nele, onde será que se met*u?
-- Foi se despedir do Leandro e Leonardo.
-- Leandro e Leozinho -- corrigiu Isabel.
-- Foi o que eu disse -- Alexandra olhou para ela, franzindo a testa -- Há algum problema? Você parece chateada.
-- Estou triste por termos que voltar para a agitação do Rio -- respondeu virando-se e abraçando a loira -- Mas, eu entendo. Também tem a minha mãe que está nos esperando ansiosamente.
-- Ainda está lá aquele ogro?
-- O que foi que você disse? -- Isabel preparou o bote.
-- Eu perguntei se o meu sogro também está lá nos esperando.
-- Hum -- Isabel levantou uma sobrancelha -- Meu padrasto só vai para o réveillon.
-- Que maravilhoso! Eu tenho sorte em ter a sua mãe como sogra, Isa.
-- Que fofa.
-- Porque tem sogra que é tão ruim, mas tão ruim, que se colocar num liquidificador e bater, não dá um copo.
-- Que bom que você gosta da minha mãe, amor.
-- Fiz até um versinho: Gosto da rosa branca, porque nasceu no jardim. Gosto da minha sogra, porque criou você pra mim.
-- Que linda!
-- Outro versinho: Batatinha quando frita, se esparrama na marmita, minha sogra quando grita, mais parece uma cabrita.
-- Chega Xanda. Já está se passando.
-- Desculpa amor. Me deixei levar pela emoção.
-- Xanda querida -- Isabel sussurrou, quando suas bocas se encontraram -- Que tal uma festinha de despedida na banheira de hidromassagem da suíte?
-- Hummm... Sexo: o motivo e a solução de todos os meus problemas.
-- Quero que faça daquele jeitinho bem gostoso que só você faz.
-- Agradeça a minha babá que me ensinou a comer Danoninho somente com a língua.
Um ruído, então, separou-as e ambas se viraram, surpresas ao verem André bem atrás delas.
-- Sabe aquela pessoa chata que dá vontade de jogar pela janela? Pois é, André! -- Alexandra sentiu-se profundamente irritada com o rapaz que havia interrompido um momento tão íntimo, pois ela e Isabel dificilmente ficavam só --Você é mais chato que cabelo no sabonete.
-- Pensei que as beldades soubessem que temos um horário a cumprir.
Alexandra e Isabel entreolharam-se e, depois de alguns segundos, caíram na gargalhada.
-- Tá muito macho pro meu gosto -- brincou Alexandra.
-- Ele está certo Xanda. Vamos deixar a nossa festinha pra quando chegarmos em casa. O pessoal já deve estar esperando a gente.
-- Verdade, meu mel -- disse Alexandra, mordendo o lábio enquanto caminhava até a janela.
Pela primeira vez ela deixava transparecer em seu rosto o sentimento de tristeza por ir embora.
-- Vou sentir saudade dessa gente. Dessa ilha e de tudo que vivemos aqui.
Isabel olhou novamente as palmeiras e as árvores frondosas, que protegiam a ilha. Sorriu para Alexandra, segurou a mão dela e juntas caminharam em direção à porta.
-- Quem sabe um dia a gente volte.
-- Quem sabe -- respondeu Alexandra, dando uma piscadinha matreira.
Natasha nunca pensara que pudesse ser possível que seus caminhos se cruzassem novamente. No entanto, lá estava ela, como uma assombração vinda do além para torturá-la com mais problemas. Natasha engoliu em seco, balançou a cabeça, balbuciou alguma coisa, como: Eu mereço e sentou-se atrás de sua enorme mesa, coberta de papéis.
-- Sente-se. Como está se sentindo depois de sua estadia como cliente de nossa pousada? -- perguntou nitidamente desinteressada.
-- Muito bem -- ela respondeu, olhando ao redor -- O atendimento aos clientes, como sempre impecável.
-- Um bom atendimento é essencial para manter a satisfação e a fidelidade do cliente.
-- Você sempre foi boa nisso -- por um momento, aqueles olhos perturbadores de Natasha pousaram sobre ela. Mariana sentiu alguma coisa pegar fogo dentro dela.
-- Obrigada. Mas a respeito das informações que você me passou.
-- A chantagem que César pretende fazer? Ah, sim, trouxe o que prometi.
-- O delegado Edvar já está lá fora.
-- Como? Fazendo o quê?
-- Esperando a minha autorização para prendê-lo.
-- Mas... Assim... tão rápido?
-- Quero que seja pego com a mão na massa -- respondeu Natasha, não dando a menor atenção aos seus protestos.
-- Pelo que entendi, ele será preso em flagrante?
-- É isso mesmo -- Natasha parecia deliciar-se -- Você quer voltar para a Europa, não quer?
-- Não consigo pensar em nada melhor do que ir embora daqui o quanto antes!
-- Pois esta é a sua chance. Você quer dinheiro e estabilidade, e eu estou lhe dando. Mas, em troca quero que acabe com o César. Seu depoimento vale milhões. Portanto, seja o mais convincente possível.
O dinheiro falou mais alto e Mariana respondeu:
-- Está bem, eu aceito.
-- Ótimo. É assim que se fala. Bem, preciso saber mais detalhes.
-- Sim, é claro, vou colocá-la a par de tudo -- Mariana abriu a bolsa e retirou um Pen drive -- Aqui está a confissão dele. Inclusive da tentativa de estupro contra Andreia.
O sorriso branco de Natasha revelava a sua satisfação.
-- Você é uma cobra, Mariana. Fuja para bem longe. Um dia César será solto e irá atrás de você. Espero sinceramente que use bem todo esse dinheiro que estou transferindo para a sua conta e garanta ao menos a sua segurança.
-- Não se preocupe. Como você disse: sou uma cobra.
Natasha pegou o Pen drive e guardou na gaveta. Depois, ligou para o delegado.
-- Delegado Edvar, pode prendê-lo. Já estou com as provas -- disse Natasha, com satisfação na voz -- Obrigada delegado.
Natasha desligou o telefone e olhou fixamente para Mariana com o maior par de olhos verdes que ela já havia visto.
-- Agora vá, Mariana. O delegado a está esperando na delegacia. Dê o seu depoimento e desapareça no mundo.
Mariana assentiu com a cabeça, logo ficou em pé lentamente e se dirigiu a porta. Depois deteve-se durante um momento e virou-se para observar Natasha.
Natasha era linda, aquela açoriana cujos cabelos castanhos rebeldes a diferenciavam das outras. Seus olhos verdes, hipnotizavam. Era uma magnífica mulher, briosa, companheira e fiel. Pena que precisou perder para dar valor.
-- Adeus Natasha. A vida lhe deu alguém muito melhor que eu, e o amor venceu todas as dificuldades... seja feliz!!!
-- Viva em paz, Mariana.
Ela sorriu e foi embora. Natasha ficou pensando nas voltas que a vida dá. Odiamos quem jurávamos amar o resto de nossas vidas, amamos quem jurávamos odiar, viramos melhores amigos de quem um dia foi nosso inimigo e fazemos coisas que jamais um dia pensaríamos em fazer. Nessas voltas da vida ela só quis mostrar que o impossível pode sim acontecer, basta apenas abrir o coração. A vida é feita pra viver, se arrepender, pedir perdão, rir, chorar, brincar, cair, levantar. Ser feliz.
Bruna e Victória já estavam no heliporto aguardando por Alexandra, Isabel e André.
-- Até que enfim! -- Victória levantou as mãos -- Já estava com sono.
-- Se hoje Vic está com sono, então ela está com uma sonância, se amanhã Vic continuar com sono, será uma ressonância.
-- Quanta besteira Alexandra -- resmungou Bruna -- No mínimo se atrasaram porque você estava aprontando alguma.
-- A culpa não foi dela Bruna. Eu que me atrasei.
-- Ah tá. Deixa que eu acredito, Isa -- Bruna fez um gesto de enfado, revirando os olhos -- Não basta ser apaixonada tem que assumir o peido da esposa.
Natasha e Andreia chegaram apressadas.
-- Ai pessoal, que bom que chegamos a tempo -- Andreia abraçou os amigos e deu um beijo no rosto de cada um -- Não vou dizer adeus, apenas um até logo. Quero que saibam que já sinto saudades de vocês.
-- Acho que você disse tudo Andreia -- falou Victória com uma graça impecável -- Nós compartilhamos do mesmo sentimento.
O coração de Natasha estava aos pedaços. Ela se aproximou dos amigos visivelmente emocionada.
-- Obrigada por estarem comigo até o fim. Foram situações difíceis e vocês em nenhum momento pensaram em desistir. Vocês são pessoas maravilhosas e encantadoras. Eu transbordo de orgulho, alegria e gratidão por tê-los como amigos. Serei grata eternamente -- sua voz estava embargada -- Por favor, voltem em breve.
Inclinando-se para ela, Bruna pegou suas mãos e apertou-as com firmeza.
-- Pode ter certeza que voltaremos.
Alexandra puxou Natasha e cochichou em seu ouvido:
-- Se prepara. Quando elas virem, os Minions virão junto. Será o apocalipse.
Victória ouviu e esbravejou:
-- Alexandra! Eu perdi a paciência.
-- Se eu for aí e achar, vou esfregar na sua cara -- ela respondeu na mesma altura.
-- Chega Xanda! -- berrou Isabel.
-- Credo. Vic é pior do que o iceberg do Poseidon.
-- Titanic.
-- Foi o que eu disse.
-- Ai meu Deus -- Victória bufou -- Desisto.
Elisa e Pedrita chegaram esbaforidas.
-- Doutora Bruna -- a senhora parou uns instantes para recuperar o fôlego -- Desculpa, sei que não é o momento, mas, preciso muito ouvir uma palavra que acalme a minha alma. Sou espírita e estou um pouco abalada devido aos últimos acontecimentos.
Bruna sorriu para ela e para Pedrita.
-- Entendo. Primeiro quero esclarecer o papel de um médium. Segundo o espiritismo, o médium é um ser humano comum e qualquer pessoa tem mediunidade. "Basta desenvolvê-la de maneira adequada", o problema é quando se confundem "os valores materiais com o dom espiritual". A mediunidade pode ser perdida, principalmente se ela estiver relacionada ao personalismo e a vaidade. Não devemos confundir o sagrado com o profano. O trabalho nas casas espíritas deve ser realizado em benefício do semelhante e sem interesse de recompensa. É um trabalho de caridade. Não temos direito de julgar ou condenar, mas não podemos passar a mão na cabeça por nossos erros ou pelos erros dos outros. Todos somos seres humanos, ninguém está livre de uma queda, mas é preciso deixar que coisas passageiras, temporárias, não interfiram na nossa conduta.
-- Obrigada doutora.
-- Fiquem com Deus.
-- Ninguém tem coragem de falar, mas eu falo: A Pedrita é tão magra, que pra tirar raio-X o médico só precisa acender um isqueiro atrás dela.
Isabel a puxou pelo braço.
-- Coitada da mulher.
-- Disse alguma mentira?
Nesse momento o comandante Edvar ligou o motor do helicóptero e levantou uma fina poeira de areia. Os cabelos voavam ao vento forte provocado pelas pás que começavam a girar.
Todos se entreolharam. Era o momento. Não tinha jeito.
-- Até logo pessoal -- disse Bruna acenando da porta do aparelho -- E obrigada por nos terem dado oportunidade de pertencer a esta verdadeira família!
O vento ergueu a saia de Andreia quando o helicóptero levando seus amigos levantou voo. Elas ficaram olhando em silêncio até que a aeronave ficasse além do alcance da vista.
Natasha passou os braços em volta da cintura de Andreia.
-- É como eu sempre digo Deia: vão-se os dedos e ficam os anéis.
-- Não seria: vão-se os anéis e ficam os dedos?
-- Foi o que eu disse.
Créditos:
Nota:
"No espiritismo não há ritos, vestimentas, hierarquia ou sacerdócio. O serviço espiritual não ocorre isoladamente, apenas com a presença do médium e da pessoa assistida. Não recomenda, portanto, a atividade de médiuns que atuem em trabalho individual, por conta própria. Estes não estão vinculados ao Movimento Espírita, nem seguindo sua orientação".
Por isso, para a FEDERAÇÃO ESPIRITA BRASILEIRA a Casa Dom Inácio de Loyola, em Abadiânia, onde João de Deus fazia os atendimentos espirituais não é uma casa espírita.
Geraldo Campetti, vice-presidente da FEB.
Fim do capítulo
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Mille
Em: 07/01/2019
Ola Vandinha
A Mariana deu uma rasteira no César e eu pensando que ela ajudaria sem pedir nada em troca.
Entao acho que estamos quase no final né, vou sentir saudases destas turminhas.
Uma perguntinha:
Depois teremos a volta da Dani e cia???
Bjus e até o próximo capítulo
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