Capítulo 80 -- Renascendo das Cinzas
A ILHA DO FALCÃO -- CAPÍTULO 80
Renascendo das Cinzas
Andreia foi correndo pegar uma bolsa de gelo para colocar sobre o olho roxo e inchado de Natasha.
-- Eu tenho vontade de te espancar Alexandra -- ela resmungou irritada.
-- A culpa foi da sua irmã. Ela não tinha nada que se abaixar.
-- Minha culpa? Era só o que faltava -- reclamou Carolina -- Da próxima vez faço um x em cima do local que você quer bater.
-- Está doendo amor? -- perguntou Andreia, pressionando levemente a bolsa de gelo contra o olho dela -- Isso aqui está muito feio.
-- O gelo tem um efeito analgésico, mas também vasoconstritor, que vai acalmar e diminuir a contusão -- disse a doutora Talita.
-- Eu tenho uma receita melhor -- disse Alexandra -- Pegue uma batata crua. Corte em fatias grossas. Coloque essas fatias na geladeira. Quando estiverem frias, aplique-as na área dos olhos. Deixe por cerca de quinze minutos. A batata realmente contém uma enzima preciosa, a catalase, que ajuda a absorver o sangue da bolsa formada sob os olhos, desinchando-os. O bom dessa receita é que depois, você pode cortá-las em tiras finas, secar as batatas com um pano ou papel, passar as batatas na farinha de trigo e joga-las aos poucos no óleo quente. Colocar para secar em papel toalha e jogar sal ou queijo ralado. Está pronta a velha e boa batata frita.
Talita ergueu uma sobrancelha e comentou em tom zombeteiro:
-- Gostei da parte da batata frita.
Natasha afastou a bolsa de gelo que Andreia segurava e olhou com raiva para Carolina.
-- Ainda por aqui? -- perguntou com extrema frieza -- Pensei que já estivesse longe.
-- Resolvi ficar e te esperar.
-- Eu não me lembro de ter dito que você teria escolha.
Carolina corou e abaixou a cabeça. Por um momento, considerou seriamente a hipótese de levantar-se, sair dali e nunca mais voltar. Então, ela buscou forças e encontrou nos olhos de Talita tudo o que precisava para não desistir.
-- Preciso muito falar com você, Nat.
-- Mas, eu não quero falar com você. Tudo o que tínhamos para conversar, já conversamos. Você colocou em risco a vida da Andreia e do Márlon. Você é mal.
Carolina examinou a expressão sombria que a irmã ostentava e desanimou profundamente.
Num impulso, Andreia saiu de onde estava e foi até Carolina.
-- Você quer conhecer o seu sobrinho?
-- Andreia! -- Natasha a censurou -- A Carol está de saída.
A ruiva fingiu não ter ouvido e, continuou com os olhos fixos em Carolina.
-- Então? Você quer ou não quer conhecer o seu sobrinho?
Carolina olhou para Natasha.
-- Eu não sei... -- sua resposta soou hesitante -- Quero, mas...
Andreia estendeu a mão para ela.
-- Deixe de besteira. Vem comigo -- disse Andreia, pegando a mão dela e segurando-a com firmeza.
Dessa vez, Carolina foi capaz de ler a expressão no rosto de Natasha com extrema facilidade: desagrado.
Andreia gentilmente levou Carolina até o berço de Márlon. O bebê bocejou e começou a sugar o punho ruidosamente.
-- Já está querendo mamar novamente, seu guloso!
Carolina observava o bebê, atenta.
-- Ele é lindo. De verdade, Andreia. Seu garoto é muito lindo.
-- Obrigada, Carol.
Márlon começou a choramingar mais forte. Andreia o tomou nos braços e olhou para Carolina.
-- Quer segurar um pouco?
-- Sim -- sussurrou, estendendo os braços. Ela pegou no pequeno com as duas mãos e encostou-o contra o peito.
-- Não chore, garoto. Você é um menininho, muito lindo. Vamos, não chore.
Por fim a criança se aquietou. Levou o dedinho a boca e começou a sugá-lo. Aos poucos, seus olhos foram fechando.
-- Você leva jeito com criança -- comentou Andreia, com um leve sorriso nos lábios.
-- Onde eu morava havia um bebezinho. Eu gostava de cuidar dele enquanto a sua mãe saía para catar papelão -- Carolina observava Márlon e lhe acariciava a cabecinha -- Tinha muita pena daquele garoto. Gostaria de poder fazer algo por ele -- ela parou pensativa.
-- E por que não faz? Você é uma Falcão. Tem condições de fazer a diferença na vida dele.
Carolina, normalmente tão fria e insensível, naquele instante tinha os olhos rasos d'água. Antes que as lágrimas cortassem a voz, disse:
-- Sou uma pessoa má. A Natasha tem razão em me odiar.
-- Ela não te odeia. Tudo o que a Natasha falou foi da boca pra fora. Ela te ama, eu vejo no jeito que ela olha para você. Natasha está magoada, decepcionada, triste, mas continua te amando. Amor entre irmãos é eterno e supera até as piores brigas. Natasha é aquela pessoa que vai te defender de tudo e todos e, apesar das implicâncias, é ela quem estará do seu lado quando os outros implicarem com você.
Carolina levou a mão à boca para conter um soluço.
-- Como pode ainda falar comigo depois de tudo o que eu fiz? Eu te acusei, ameacei, coloquei em risco a sua vida e a do Márlon -- disse Carolina, e essas palavras provocaram muitas lágrimas -- Não mereço a sua compreensão, a sua amizade. Você está piorando mais ainda o meu sentimento de culpa, falando dessa forma -- disse, encostando-se desanimada à parede.
-- Ah, Carol. Se você soubesse o quanto guardar ressentimento faz mal ao coração. Gandhi disse certa vez: "O perdão é atributo dos fortes". É preciso muita coragem para deixar para trás uma experiência dolorosa que outra pessoa lhe impôs. Mas, se você deixar a raiva ir embora, fará bem a você mesma -- por um momento, Andreia olhou para o filho que dormia no colo da cunhada. Por fim, balançou a cabeça -- Eu amo a Natasha e, quem ama quer ver a outra pessoa feliz -- Andreia meneou a cabeça de um lado para outro -- Ela nunca será feliz completamente sem a sua amada irmã ao seu lado.
-- Me perdoa Andreia -- Carolina pediu, com sinceridade -- Você é uma pessoa maravilhosa -- falou com carinho e, num impulso, deu um beijo no rosto de Andreia.
Andreia se afastou para olhá-la nos olhos, o seu olhar dizia tudo.
-- Deixe de se auto recriminar e pare de ser severa demais com você mesma. Todos nós temos o direito de errar uma vez ou outra. Você não é a primeira e nem será a última -- disse afetuosamente -- Seremos uma família feliz. Eu, Natasha, Márlon e você. Um cuidando do outro.
A porta do quarto se abriu e Natasha, uniu-se a elas. Observou a cena e balançou a cabeça indignada.
-- Pelo visto Andreia, você caiu no papinho dela. Cuidado. Judas também beijou Jesus na face.
Carolina respirou fundo, soltou o ar e baixou a cabeça com tristeza.
Andreia pegou Márlon do colo de Carolina e colocou-o no berço com cuidado para não o acordar.
-- Quem sou eu para julgar a Carolina? Menti, trapaceei, enganei, fui desonesta, fria, medíocre e mesmo assim você me perdoou. "Não julguem os outros para que vocês também não sejam julgados" -- Andreia cobriu o bebê e beijou a sua testa -- Eu aprendi com os meus erros, Nat. Agora, se você se considera perfeita, nunca errou e nunca precisará do perdão de alguém, então, continue a carregar esses sentimentos negativos no seu coração. Só tenho a lamentar.
Andreia deu mais uma olhada em Márlon e saiu do quarto. Suas palavras pairaram no ar por um momento, causando desconforto em Natasha.
Carolina sentou em uma poltrona, ao lado da cama, abraçada aos joelhos e com os cabelos ruivos caindo sobre o rosto delicado, ela parecia lamentavelmente vulnerável.
Ela estava com a cabeça baixa e os ombros levemente curvados. A aparência de alguém que está passando por um sofrimento ou alguma dor.
Ainda assim, Natasha não se convencia de seu arrependimento. Num impulso, ela deu um passo na direção da irmã. Não queria decepcionar Andreia por nem ao menos ter dado a oportunidade de Carolina se explicar.
-- Você disse que queria conversar. Então, pode começar.
Carolina, ansiosa por poder conversar com a irmã, sentiu o desejo irresistível de ser honesta. Aqueles meses de mentiras e discussões a deixara muito mal.
-- Obrigada por me ouvir -- disse com sinceridade.
-- Agradeça a Andreia. Ela é boa demais e, por ser boa demais, sempre a envolvem em confusão.
-- Andreia é uma pessoa maravilhosa. Oh, Nat, sinto muito! -- Carolina murmurou, secando a lágrima que corria por seu rosto -- Eu estou morrendo de vergonha. Você deve estar muito magoada com tudo o que falei. Não sei o que fazer para apagar as bobagens que disse contra a Andreia. Seria tão bom se eu pudesse voltar atrás no tempo. Eu me sinto culpada por ter sido insensível, preconceituosa, mesquinha, acho mesmo que até um pouco invejosa.
-- Invejosa? Por que diz isso? -- Natasha perguntou intrigada.
Carolina resolveu contar tudo o que acontecera, desde o início. Todos os motivos que a levaram a odiar tanto Andreia.
-- Eu nunca tive uma família, Nat. Ao menos, não da forma como havia contado para você. Tenho certeza de que se lembra da nossa conversa.
Natasha examinou-a, curiosa.
-- Sim.
-- Depois do acidente fui encontrada por uma mulher dependente de crack. Ela me usava para pedir dinheiro a motoristas em sinais de trânsito. Fui explorada por ela que me mandava às ruas, para pedir esmolas ou sensibilizar as pessoas para comprarem balas, água. Muitas vezes dentro dos ônibus.
Foi assim que por muitos anos em situação de risco e vulnerabilidade social. Exposta ao estupro, trabalho forçado, drogas, agressão e assassinatos, não tendo oportunidade de usufruir dos meus direitos mais básicos, com estudar, brincar ou viver num ambiente familiar saudável para o meu desenvolvimento social e psicológico. Para o dependente só existe a droga. Uma pessoa que disposta a tudo para saciar seu vício. Acabam os amigos, a consciência, a casa, o amor. Como, então, cuidar de uma criança? -- Carolina olhou para Natasha com os olhos marejados -- Um dia, uma equipe do Comissariado da Infância e Juventude me resgatou das ruas e fui encaminhada para um abrigo pelo Conselho Tutelar.
Natasha a observava cuidadosamente. Era difícil acreditar que alguém conseguisse ser equilibrada psicologicamente e emocionalmente depois de passar por tantos percalços na vida.
-- Passei mais de dois anos em lares provisórios. Então, não aguentei mais e fugi. Fugi para viver nas ruas. Era melhor que viver sendo jogada de um lado para outro como um empecilho.
-- Por que você não me contou a verdade?
-- Fiquei com medo que você fizesse comigo o mesmo que todos fizeram.
-- Jamais faria isso, Carol. Você é a minha família.
-- Quando percebi que você estava apaixonada pela Andreia, meu mundo desabou. Ela era uma ameaça que deveria ser eliminada. Como todas que tive que enfrentar em minha vida. Nas ruas é uma guerra e, usamos todas as armas possíveis.
-- Você não está mais nas ruas.
-- Agora eu sei. E sei também que Andreia não é uma ameaça e nunca será. Ela é uma pessoa linda que exorcizou os demônios que me dominavam -- Carolina chorou desconsoladamente até que os olhos incharam -- Me dá mais uma chance, Nat. Eu quero te mostrar que mudei. Me deixa ficar perto do Márlon, da Andreia e de você. Eu quero ter a família que nunca tive.
Natasha sorriu.
-- Vem cá sua enferrujada bobinha -- Natasha abriu os braços -- Me dá um abraço.
O olhar de Carolina se iluminou de repente e ela caiu nos braços de sua irmã, chorando.
-- Você é sangue do meu sangue, um pedaço de mim. Quero estar em paz com você, minha irmã -- tranquilizou-a Natasha -- Agora seca essas lágrimas e vamos beber para comemorar.
-- Obrigada, Nat.
-- Não agradeça. Apenas viva. Não precisa esquecer o passado. Pois é com ele que aprendemos a fazer um presente e um futuro melhor -- Natasha deu um beijo carinhoso na cabeça da irmã mais nova -- Você é uma Falcão garota e, Falcão renasce das suas próprias cinzas.
-- Não seria a fênix?
-- Como diz a Girani: "Foi o que eu disse"
E as duas saíram do quarto rindo. Finalmente a paz voltou a reinar entre as irmãs.
-- Natasha!
Ainda rindo, ela virou-se para Andreia.
-- O que foi meu amor?
-- Estou maravilhada em ver vocês duas juntas e felizes! -- Andreia passou o olhar por todos na sala antes de continuar -- Mas, a doutora Talita tem algo muito importante para te contar.
No mesmo instante Natasha ficou séria.
-- O que foi doutora. Pode falar.
Talita esfregou as mãos com nervosismo.
-- Eu sei quem tentou te matar!
Natal, tempo de amor, tempo de perdoar, tempo de rever o que foi feito, e o que não foi feito. Tempo de ressurreição. Tempo de novos sentimentos. Vamos saudar nosso amado aniversariante que é único em nossas vidas, Jesus Cristo.
Feliz Natal, minha querida leitora. Que você possa viver esta época natalina em plena alegria, e na companhia da sua família. Que o amor e todos os bons sentimentos prevaleçam sobre o materialismo dos presentes. E que Deus conceda a você e toda sua família muita felicidade e saúde.
Tenha um Natal abençoado!
Beijos da Vandinha.
Fim do capítulo
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jupirema
Em: 25/12/2018
Feliz Natal, que o amor prevaleça sempre.
Resposta do autor:
Há mais, muito mais, para o Natal do que luz de vela e alegria. É o espírito de doce amizade que brilha todo o ano. É consideração e bondade, é a esperança renascida novamente, para paz, para entendimento, e para benevolência dos homens.
Feliz Natal jupirema!
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Mille
Em: 25/12/2018
Oi Vandinha
Andreia dando um empurrão para que a Carol e Nat para se entenderem. Gostei da Andreia incentivando e mais que isso deu a Carol uma chance de se abrir.
E agora com a informação que a Talita vai passar logo um inimigo será preso. Falta só o César.
Bjus e até o próximo capítulo
Um feliz Natal repleto de muita paz, saúde e muito amor.
Parabéns Vandinha
Resposta do autor:
Desejo que o seu Natal seja brilhante de alegria, iluminado de amor, paz e harmonia. Feliz Natal Mille! Para você e toda a sua família.
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