CapÃtulo 20 - Decepção - 3º Ato
Raquel voltava ao hospital para conversar com Carlos, não conseguiu falar com o rapaz sobre o procedimento que queria realizar em Carolina para tentar ajudar a médica a acordar do coma.
Encontrou com Izabel e Ângela e continuava dando em cima da residente que fugia de todas as investidas da neurologista.
Izabel com pena da médica, dispensou Ângela da ronda com ela e a designou para um atendimento com outro tutor.
-- Raquel, pelo amor de Deus, deixa a menina em paz. – Ria – Ela já está com medo de você.
-- Mas eu não mordo! – fingiu espanto – Só quando pedem. – Gargalhou –
-- Palhaça. – Balançou a cabeça – Olha o Carlos.
Carlos saía do elevador para alcançar a UTI e avistou Izabel com a outra médica, lembrou vagamente de Raquel, viu a moça com Carolina em algumas fotos e na formatura.
-- Oi Izabel. Tudo bem?
-- Oi Carlos, tudo bem, essa aqui é Raquel, amiga de Carolina, você a conhece?
Estendeu a mão para a médica. – Sim, a vi na formatura, mas de longe. – Sorriu – Prazer, Raquel.
-- Muito prazer Carlos. – Retribuiu o cumprimento --
-- Carlos, nós gostaríamos de conversar com você sobre Carol. Raquel é neurocirurgiã e tem um procedimento que pode reduzir a pressão intracraniana do traumatismo de Carolina.
-- E esse procedimento pode trazer Carol de volta? É seguro?
-- Carlos, eu tenho trabalhado nessa pesquisa a anos, já estou na fase de execução do procedimento e os que eu já executei foram com sucesso absoluto. Apesar de não sabermos as extensões das lesões que Carol pode estar, mas os pacientes conseguiram se recuperar do coma em um tempo três vezes mais curto.
-- É seguro? – Perguntou novamente –
-- É uma cirurgia como outra qualquer, se correr tudo bem, ela tem oitenta por cento de chances de se recuperar quase totalmente. Mas toda cirurgia tem seus riscos.
-- E qual é o risco dessa cirurgia? – Cruzou os braços –
-- Hemorragia cerebral e ela não resistir. – Raquel foi bem objetiva --
Carlos estava com uma decisão séria para tomar, o procedimento poderia trazer Carolina de volta, mas também poderia leva-la de vez. Ele não conseguiria carregar esse peso, além de perder sua irmã e ficar sozinho no mundo.
-- Eu não sei. – Passou a mão no rosto – Eu não sei. – Balançou a cabeça negativamente –
As duas médicas perceberam a reação do rapaz, já conversaram com vários familiares dos pacientes que operavam e cuidavam no hospital, mas dessa vez, era a vida de uma amiga, e isso também pesava, elas também tinham dúvidas e inseguranças.
-- Carlos, você pode pensar com calma, se você autorizar o procedimento, podemos fazer essa semana ainda, eu sei que é difícil tomar esse tipo de decisão, mas é uma boa chance para Carol.
-- Izabel, eu não sei o que fazer, sinceramente. – Balançou a cabeça negativamente --
Carlos estava cansado, abatido, preocupado, queria que sua irmã se recuperasse logo, mas estava com medo da cirurgia não dar certo e ter que se despedir dela tão cedo. Começou a chorar contidamente. Izabel o amparou.
-- Vamos ver Carol, depois conversamos sobre isso. – Izabel o confortava –
As médicas foram com Carlos até a UTI onde Carolina estava e o deixaram sozinho com a irmã.
-- Fique à vontade. Raquel, vamos tomar um café. – Fez um sinal com a cabeça --
-- Vamos, Carlos, se você concordar com o procedimento, eu prometo que farei de tudo para trazer Carol de volta. – Afagou o braço dele --
-- Ok, eu vou pensar. – Olhou para as duas médicas --
As duas saíram e deixaram Carlos com Carolina, o rapaz ficou conversando com a irmã, pedindo que ela desse um sinal a ele, em qual decisão tomar.
-- Carol, o que eu faço? Sua amiga quer te operar, mas você corre risco de não sobreviver. Seria tão fácil se você estivesse me ouvindo pra me dizer se confia nela a esse ponto.
Carlos segurava a mão gelada da irmã entre suas mãos.
-- Eu quero você de volta, mas não sei se quero pagar um preço muito alto pra isso. Eu não quero te perder também, volta pra mim. – Lágrimas caíram pelo seu rosto --
-- O que você faria se fosse o contrário?
A única resposta que recebeu foram os bips cadenciados do monitor cardíaco, Carolina continuava imóvel, sem resposta, ele ficou perdido em seus próprios pensamentos tentando imaginar qual seria a decisão da irmã.
Janeiro de 2005
Carolina estava em casa, cansada pela rotina puxada que agora médica começou a exercer, o internato terminou, ainda fazia parte do grupo de pesquisa no Hospital Matriz e começou a dar plantões na emergência do hospital universitário. Por causa das greves, estava concluindo algumas aulas para cumprir a carga horária que faltava para se formar. Esperava pela colação de grau da universidade para ingressar na residência, já estava com o convite de Izabel para participar do programa de residência em cardiologia, que foi a área que ela escolheu, no Hospital Matriz. Carmem estava no centro comunitário fazendo sua aula de pintura quando Carlos chegou do trabalho abatido.
-- Oi irmão. Tudo bem? – Estava deitada no sofá --
-- Ai Carol, eu não estou me sentindo bem não. – Sentou no sofá –
-- O que você tem? – Levantou –
-- Sei lá, eu “tô” meio enjoado, com uma dor estranha aqui na barriga, acho que eu tive febre hoje.
-- Por que você não veio pra casa mais cedo?
-- Eu consegui ficar mesmo me arrastando. Mas a dor está aumentando. – Fazia uma careta --
Carolina foi até o irmão. -- Deita no sofá.
-- O que foi? Vai me examinar, doutora? – sorriu –
-- Sim, eu vou, e você está me saindo um paciente bem insolente. – Bateu no seu ombro –
-- Aí, eu estou doente, posso te denunciar por agressão.
-- Sei, agora deita aí e fecha a boca, ou eu te dou uma injeção.
Carlos riu e obedeceu, sentia um desconforto na região abdominal, e estava enjoado. Pensou na sorte de ter em casa uma médica formada.
Carolina começou a apertar sua barriga, examinando o abdome do irmão. Em um certo ponto, Carlos se contorceu inteiro gritando de dor.
-- AH! Caramba! Aí, bem aí. Ai. – Segurou a barriga – Aí.
-- Você consegue levantar a perna direita?
Carlos tentou levantar a perna, mas sentia a dor aumentar, Carolina pegou a perna do rapaz e empurrou devagar, mas ele não conseguia, voltou a reclamar da dor que estava sentindo.
-- Carlos, você precisa ir pro hospital agora, isso é apendicite. Você precisa de cirurgia.
-- O que? – O rapaz se assustou – Eu no hospital? Cirurgia?
-- Sim, agora! Seu apêndice está inflamado, e se esperarmos mais, pode romper, e espalhar a infecção pelo seu abdome, se isso acontecer você pode morrer.
-- Que isso, Carol, assim você me assusta. – Arregalou os olhos --
-- Mas é pra te assustar mesmo. Consegue tomar um banho? Eu vou chamar mamãe lá no Centro.
-- Acho que consigo.
-- Então vai, nós vamos sair assim que eu voltar com ela.
Carlos tomou um banho enquanto Carolina chegava com Carmem em casa, a estudante ligou para o hospital e pediu uma unidade de remoção para levar o irmão para o hospital, as duas o acompanharam.
Chegando no hospital universitário, Carolina agilizou a entrada de Carlos para fazer os exames preliminares para confirmar seu diagnóstico, o que foi confirmado. Ronaldo, seu antigo tutor que estava de plantão a parabenizou pelo rápido atendimento e pela atitude de levar o irmão para o hospital, constatou-se que o apêndice de Carlos estava prestes a romper e ele precisava da cirurgia imediatamente.
Ronaldo permitiu que Carolina assistisse a cirurgia do irmão e tudo correu muito bem. Carmem voltou para casa e Carolina ficou com o rapaz no hospital.
Carolina estava cochilando espremida em uma cadeira ao lado da cama do irmão. Quando Carlos acordou.
-- Carol.
A menina acordou assustada, olhou para o irmão e levantou prontamente.
-- Oi, você está bem? Está sentindo dor? – Olhou o soro --
-- Estou sim, mas é suportável.
-- Eu vou pedir pra aplicarem o analgésico.
-- Você já pode fazer isso? – Fechou os olhos –
-- Sim, eu posso. – Riu – Eu já sou médica, seu bobo. Só falta o diploma. – Piscou --Eu já volto.
Carolina saiu e voltou com a enfermeira e o prontuário de Carlos, as duas conversaram sobre os horários dos remédios e a moça aplicou uma injeção no soro que estava no braço dele.
-- Pronto, isso vai aliviar. Mamãe disse que já está vindo.
-- Por que você não vai pra casa descansar um pouco? Essa cadeira aí vai acabar com suas costas. – Se ajeitava na cama –
-- Eu estou acostumada às cadeiras do hospital. Depois daqui eu ainda tenho que ir para a pesquisa. Só vou pra casa de noite. – Deu de ombros --
-- Você não tinha que ir ver sua namorada?
-- Que namorada? Acho que nem amigas nós somos mais. – Disse desanimada –
-- Carol, como está o relacionamento de vocês? Não acho que esteja muito bom, depois do que você falou aí agora.
-- Ah, Samantha é muito cheia de manias, ela some, não me diz onde está, ou com quem está. Eu estou ocupada com tantas coisas da faculdade que eu não estou conseguindo acompanhar o que ela tem feito muito bem, então, eu nem sei o que te dizer.
-- Irmã, você sabia que seria assim, ela já te decepcionou duas vezes, por que você ainda insiste?
-- Eu não sei, devo ser muito idiota, sabe Carlos, acho que eu aceitei voltar por causa da pressão que ela fez comigo, só que eu não sinto mais a mesma paixão que eu sentia quando tudo começou, foram tantas mentiras que isso minou o sentimento.
Carlos estendeu a mão e segurou a dela.
-- Você merece uma pessoa melhor, Carol, você é tão linda! Inteligente, está prestes a conquistar o seu maior sonho, não precisa passar por isso.
-- Eu sei, eu não consigo mais, acho que eu errei em aceitar esse retorno, eu não a amo, nem sei se eu amei algum dia, tudo com ela foi intenso demais, talvez essa atração tenha sido por causa do perigo que é estar com ela, mas agora isso não me atrai mais, cada dia que passa Samantha está mais longe de mim, não dá mais pra mim.
-- E mamãe?
-- O que tem mamãe? – Levantou uma sobrancelha --
-- Quando você vai conversar com ela sobre isso?
-- Eu preciso conversar com ela sobre isso? – se ajeitou na cadeira --
-- Claro! Você acha que ela não tem suspeitas? Mamãe não é boba não, ela já sabe com certeza da sua preferência.
-- O que eu sei?
Carmem chegava na enfermaria onde os dois conversavam. Carolina deu um pulo da cadeira, Carlos ficou branco.
-- Nada, saber o que? – Carolina tentava disfarçar –
-- Ué, Carlos estava falando que eu já sei de alguma coisa. O que vocês estão me escondendo? – Aproximou-se do filho – Oi meu filho, como você está?
-- Eu estou bem, mãe. – Engoliu seco – Com um pouco de dor, mas Carol já aplicou um remédio.
-- Que bom que sua irmã cuidou bem de você. – Acariciou o rosto do rapaz – Mas agora vocês vão me dizer o que está acontecendo aqui?
-- Não tem nada acontecendo mamãe. – Carolina disfarçou – E eu preciso ir pro hospital.
-- Sei, depois nós conversamos com calma. – Recebeu um beijo da filha --
O horário de visitas terminou e Carolina foi pro Hospital Matriz trabalhar na pesquisa e depois foi para casa descansar, pois a semana seria puxada como sempre. Carlos ficou no hospital Universitário ainda em observação.
Em casa, Carmem observava a filha enquanto ela lanchava, e sabia que Carolina tinha algo a dizer, mas não conseguia. Ela já sabia a muito tempo sobre a relação de Carolina com Samantha, mas nunca disse nada para que a filha pudesse ter o tempo necessário para criar confiança e conversar com ela. Mas Carmem resolveu que já era hora de ter essa conversa com Carolina.
-- Filha, você tem um minuto? – Enxugava as mãos em uma toalha –
-- Sim, eu já acabei aqui. – Levantou da mesa –
Carolina foi lavar a louça do café enquanto Carmem a observava. Olhava a filha que estava ainda com a roupa branca que usou o dia inteiro no hospital, Carolina tornou-se uma mulher bonita, cheia de vida, honesta e muito simples, não se preocupava com coisas fúteis, bem humorada e muito carinhosa, mas Carmem também via aquela velha penumbra de tristeza em seu olhar, isso a incomodava, ela sabia que Carolina nunca encontrou a verdadeira felicidade ou o amor, e ela queria muito que a filha fosse feliz.
-- Pode falar mãe. – Lavava um copo –
-- Você tem alguma coisa pra me dizer? – Sentou em uma cadeira –
-- Tipo o que? – Carolina percebeu que era sobre o assunto no hospital –
-- Tipo sobre sua relação com Samantha. – Foi bem direta --
Carolina sentiu o corpo tremer, não esperava que sua mãe fosse ser tão direta, achava que tinha conseguido enganar a mais velha por um tempo, mas viu que não foi o que aconteceu.
-- Ela é uma amiga. – Hesitou –
-- Amiga?
-- Sim. – Olhou para a mãe –
-- Meu amor, não precisa fingir que não está acontecendo nada. Eu sou velha, mas não sou burra. Vocês têm um caso, não é?
-- Ai mãe, eu nunca pensei que a senhora fosse burra. Não foi isso. – Sentou perto da mãe –
-- Eu sei, mas você ficou com medo de conversar comigo.
-- Sim, não é fácil dizer pra minha mãe que eu sou lésbica. – Olhou para o chão –
Carmem levantou o rosto da filha pelo queixo e a olhou nos olhos.
-- Carolina, minha filha, nada nesse mundo me deixa mais orgulhosa do que você e seu irmão. – Dizia com sinceridade – Você superou muitos traumas, muitos abusos, perdas. – Lágrimas surgiram em seus olhos – E ainda assim, não desistiu de lutar pelo seu sonho, de buscar os seus ideais, você se tornou uma mulher forte, linda, inteligente, admirável.
Carolina escutava tudo atentamente, emocionada, deixou lágrimas escorrerem pelo seu rosto.
-- Não importa se você é lésbica, isso não mudou quem você é. Você continua sendo a minha garotinha, que eu amo e quero sempre proteger. – Sorriu --
Carolina abraçou a mãe chorando emocionada e assim ficaram por alguns momentos. Carmem continuou.
-- A única coisa que me preocupa é que a sua relação é com Samantha Monte Alto. Eu não confio nela.
-- Ai mamãe, isso é tão difícil pra mim, eu não sei o que acontece, mas ela parece que me tem nas mãos. – Disse chateada – São dois lados da mesma moeda, ela é doce e prestativa quando estamos juntas, mas consegue ser fria e distante quando eu saio de perto.
-- Ela não nasceu para relacionamentos, as pessoas não mudam Carolina, não espere que Samantha mude, com o passar do tempo, algumas pessoas amadurecem, outras apenas ficam mais difíceis.
Carolina observava a mãe conversando com ela, sabia que Carmem tinha razão, a aposentada já havia passado por dois casamentos, momentos difíceis, experiencias de vida que Carolina ainda passaria, e sabia o que estava falando.
-- A senhora tem razão mamãe, mas eu ainda não sei o que fazer.
-- Você está feliz?
-- Honestamente, eu não estou feliz, meu sentimento mudou e parece que a única coisa que eu preciso fazer é cuidar dela como eu cuido de uma paciente. Falta alguma coisa no nosso relacionamento, a confiança. Eu não consigo mais confiar nela totalmente.
-- Então é hora de repensar sobre essa relação. Não existe bons relacionamentos sem confiança. Se você não está feliz, é hora de virar a página, minha filha.
Carolina pensou no que a mãe havia dito, e sabia que ela tinha razão, seu namoro com Samantha não tinha futuro, as duas não conseguiam se entender, por mais que a estudante tentasse, ela não confiava em Samantha. Decidiu que tomaria uma atitude.
No dia seguinte, ao chegar ao hospital universitário, Carolina foi direto ver o irmão.
-- Bom dia Carlos, como você passou a noite? – Beijou a testa do irmão –
-- Bem, consegui dormir, foi tranquilo. – Sorriu –
Carolina pegou o prontuário do irmão e leu, viu as instruções deixadas pelos médicos do final de semana.
-- Você deve receber alta agora de manhã pra ir pra casa. Terá que ficar de repouso pelo menos uns quinze dias. segunda-feira que vem volta aqui para tirar os pontos da cirurgia e o dreno.
-- Você realmente é uma ótima médica, doutora Carolina! – Estendeu a mão para a irmã –
Carolina se aproximou e segurou a mão de Carlos. – Obrigada.
-- Eu tenho que me apresentar pro plantão, eu venho te ver antes de você sair. – Beijou o irmão –
-- Sim senhora. – Sorriu –
-- Ah, eu conversei com mamãe ontem, e está tudo bem. – Piscou enquanto saía do quarto –
Carlos apenas sorriu, ele sabia que não haveria problemas entre Carmem e a filha, as duas se amavam muito e nada faria com que essa relação fosse abalada.
Carlos teve alta e Carolina o acompanhou em um taxi, ligou pra casa avisando que o irmão estava indo e Carmem ficou aguardando o filho com mimos e uma comida fresquinha.
Carolina estava pensativa naquele dia. Não viu Raquel no hospital na parte da manhã, no Hospital Matriz conversou com Izabel sobre sua decisão de terminar o relacionamento com Samantha.
-- Ai Bel, eu não consigo mais sustentar esse namoro, não aguento mais esse vai e volta e Samantha nunca melhora. Ela continua bebendo, e com certeza continua se drogando. Ela acha que me engana. – Segurava alguns papeis --
-- Amiga, essa mulher não te dá o valor que você merece, tem amores que são mais nocivos do que bons. – Afagou suas costas – Se você está decidida, então termina logo, será melhor pra vocês duas.
-- Eu sei, vou conversar com ela hoje à noite, se ela aparecer. – Deu de ombros –
-- Se ela não aparecer, você vai atrás dela, ué, você tem que ser firme, não ceder aos caprichos de Samantha. Senão você sabe que sempre volta atrás.
-- Pois é, mas dessa vez não tem mais essa de voltar atrás não, chega! – Balançou a cabeça – Parece uma missão muito ingrata, cuidar dela. – Riu –
-- Amiga, você não tem idade pra cuidar de ninguém não, e de você, quem é que cuida? Pensa nisso!
Carolina sorriu para a médica, ela tinha razão, passou tanto tempo construindo uma fortaleza que acabou se esquecendo que também precisa de cuidados e carinhos.
As duas voltaram aos seus trabalhos e Carolina ficou remoendo como faria para terminar com Samantha sem declinar. A noite encontrou Raquel na faculdade e conversou com a amiga sobre o mesmo assunto, parecia que precisava se convencer de que estava fazendo o certo.
-- Carol, nem te vi hoje de manhã, eu soube que seu irmão estava internado, o que houve?
-- Ele teve apendicite, teve que ser operado, mas já foi pra casa, está bem agora. – Sorriu –
-- Ah, que bom. As meninas falaram que ele é um gato! Você nem pra me apresentar hein! – Bateu no braço da amiga –
-- Ai Raquel, nem deu tempo, e depois, eu não vou te apresentar meu irmão pra você brincar com ele e depois “meter o pé” e deixar o cara lá apaixonado, ele é meu irmão, cara, eu que vou ter que consolar em casa depois dele ser atingido pelo furacão Raquel. – Brincou com a amiga –
-- Ai doida, que mané furacão, -- Acabou rindo -- já pensou que ele pode ser minha alma gêmea?
-- Raquel, fala sério! Só esse ano você já teve três almas gêmeas, e janeiro ainda nem terminou. O que aconteceu com eles?
-- Eram de virgem, leão e sagitário. – Deu de ombros – Nenhum era de gêmeos.
Carolina não se conteve e gargalhou junto com a amiga, Raquel sempre foi muito engraçada, não se apegava a ninguém, sempre levou a vida de maneira leve, gostava de festas, bebidas e sex*, mas nunca passou dos limites como Samantha, não usava drogas, era responsável com seus estudos e adorava o que fazia.
Ruiva, os cabelos encaracolados estavam grandes no meio das costas, Raquel tinha a mesma estatura de Carolina, a pele branca, magra, sempre saía com alguns rapazes e nunca se preocupou com o que os outros pensariam, não era do tipo que se apaixonava facilmente.
-- Mas me conta, como está sua namorada? – Sentou na cadeira – Ainda não sei o que deu em você pra aceitar essa mulher de volta, ela deve ter um borogodó dos bons!
Carolina riu da amiga e revirou os olhos -- Eu vou terminar com ela. – Disse casualmente –
-- Menina, mas que babado! Mas já? Ela aprontou de novo? Durou pouco dessa vez. – Raquel ia falando sem respirar --
-- Não, Raquel, mas eu não consigo mais viver em um relacionamento cheio de mistérios e mentiras, eu não posso mais, sabe. Eu tentei, por ter sido muito apaixonada por ela, mas Samantha não muda. O que mudou foi o meu sentimento, já não é mais o mesmo. Aquela paixão toda que eu sentia acabou, eu virei médica dela, e isso não é saudável.
-- Viver assim, não é pra qualquer um mesmo, e faz tempo que você fica se desdobrando para não receber a atenção que você merece. – Acariciou o braço da amiga –
-- Pois é, eu conversei com minha mãe esse fim de semana e ela me disse que as pessoas não mudam porque nós queremos, não adianta forçar.
-- Sua mãe sabe de vocês?
-- Sim, ela já sabia, eu que tinha medo de enfrentar, achando que ela teria alguma reação diferente, mas minha mãe é meu orgulho, ela é tudo o que eu tenho de mais sagrado. Eu não podia esperar nada diferente. Foi muito tranquilo.
-- Que bom, amiga, eu fico feliz por você, mas quanto a sua namorada. Se é o que você quer fazer, então faz logo, pra não sofrer mais, eu estou do seu lado pro que você precisar.
-- Obrigada.
-- Vou te ser sincera, estou dando Graças a Deus que você resolveu se livrar desse encosto, essa mulher não é pra você.
-- Pois é, agora eu sei disso.
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Carolina não viu Samantha na saída da faculdade, ligou para o celular da namorada, mas ela não atendeu. Resolveu ir até a casa de Samantha para conversar. Ao chegar no prédio, já eram quase dez da noite, cumprimentou o porteiro e perguntou se Samantha estava em casa.
-- Oi boa noite, tudo bem?
-- Boa noite, tudo bem, senhora.
-- Samantha está em casa?
-- Está sim, inclusive um amigo dela acabou de subir também.
-- Obrigada, eu vou até lá.
Carolina achou estranho, Samantha receber alguém àquela hora da noite, mas imaginou que seria mais uma festa com os amigos da agência, o que não agradou a estudante, precisava conversar com a modelo e não queria nada que atrapalhasse essa conversa. Chegando na porta do apartamento, encontrou com um rapaz saindo, ele tinha dinheiro nas mãos, estava colocando no bolso, ela nunca o tinha visto.
-- Pode deixar aberto, eu vim ver Samantha.
Ao ouvir o nome da dona do apartamento, o rapaz deixou a porta aberta e saiu para pegar o elevador, Carolina sabia que algo estava acontecendo de errado.
Encostou a mão na porta e hesitou por um momento, respirou fundo, se encheu de coragem e abriu a porta do apartamento. Para sua surpresa, estava vazio, os amigos de Samantha não estavam lá.
Sobre a mesa de centro, estavam vários papelotes de cocaína, cigarros e maconha. Uma garrafa de whisky aberta e dois copos sujos de batom de cores diferentes, Carolina sabia que Samantha estava com alguém em casa, pensou logo em Savana, balançou a cabeça negativamente, e se viu em um Dejà vu. Caminhou lentamente pela escada e ouviu risadas vindo do quarto.
Sentiu o peito apertar novamente, caminhou hesitante pelo corredor que parecia não ter fim, segurou a maçaneta e sem perceber prendeu a respiração, ela já sabia que ia encontrar Samantha com outra mulher, mas nada poderia tê-la preparado para o que encontrou ao abrir a porta do quarto, encontrou Samantha seminua sentada no colo de Lucia, a antiga colega de escola tinha uma das mãos dentro da calcinha da loira enquanto Samantha rebol*va e gemia, entre beijos e abraços.
Carolina dessa vez ficou sem reação, Samantha continuava mentindo, nem se deu ao trabalho de inventar nenhuma desculpa para a namorada. E agora Lucia estava de volta em suas vidas. Realmente era uma relação tóxica para Carolina.
Samantha parecia ter sentido a presença da namorada no quarto, abriu os olhos e olhou para a porta encontrando a estudante parada observando as duas. Samantha sabia que seu comportamento não era correto, mas sempre repetia, e mais uma vez ela viu Carolina escorrer pelos seus dedos, aquele olhar decepcionado estava lá novamente, mas Samantha percebeu algo diferente na médica.
-- Carol! – Parou de se mexer – Carol.
-- Eu não acredito! A filha da merendeira! – Lucia exclamou – O que ela está fazendo aqui Samantha?
-- Ela é minha namorada! – Saiu de cima da outra –
-- Ela que é a sua namorada? – Gargalhou – Isso não poderia ficar melhor! – Levantou nua --
Samantha levantou e caminhou até a porta, onde Carolina ainda estava parada. Estava apenas de calcinha, a blusa com os botões abertos abaixo dos seios e os cabelos bagunçados. Carolina não falava, não reagia, apenas olhava para as duas dentro daquele quarto, Lucia estava se sentindo vitoriosa, descobriu finalmente quem era a namorada misteriosa de Samantha e entendeu porque a amante nunca havia revelado quem ela era. Tinha Samantha nas mãos ali naquele momento, mas preferiu apenas provocar Carolina ao invés de entregar todas as mentiras que ela conhecia sobre a loira.
-- O que foi fedelha, o gato comeu a sua língua? Vai ficar aí me admirando? Pelo visto não aprendeu nada naquele dia no banheiro da escola. – Riu --
Carolina lembrou-se de Lúcia, no dia da formatura do segundo grau. Já estava cansada das humilhações que sempre passava por causa de Samantha, que estava apavorada com medo de Lúcia contar tudo o que ela sabia para Carolina.
-- Fica quieta Lucia! Carol. Me desculpa. – Segurou a menina pelos braços –
Carolina olhou para a modelo com muita mágoa, e a encarou. Já estava disposta a terminar aquela tortura, mas depois do que viu teve mais certeza ainda. Era a confirmação de que aquele relacionamento se estendeu demais, e se arrependeu mais uma vez por ter cedido às vontades de Samantha.
-- Samantha, dessa vez acabou de verdade, nunca mais me procure. – Estreitou os olhos – Você não merece o amor que eu te dei, você nunca vai mudar.
-- Carol. Não faz isso. Eu te amo.
Carolina riu de nervoso. – Ama, mesmo? Você não consegue nem amar a você mesma. Que dirá a mim. Divirta-se Samantha.
-- Samantha Monte Alto, amando? Essa foi boa! – Lucia debochou --
Carolina saiu pelo corredor. A estudante estava determinada, não mais entraria nos jogos de Samantha.
Lucia andava atrás das duas observando a briga e sorrindo vitoriosa. Não se deu ao trabalho de se vestir, caminhou até a escada e ficou parada olhando as duas andando pela sala, Carolina indo embora e Samantha atrás dela.
-- Carol, espera, eu posso mudar. – Tentava abotoar a blusa --
Parou no meio da sala -- Não Samantha, você não pode, e quem está mudando sou eu, eu que não vou mais permitir que ninguém me faça de idiota. Eu te dei inúmeras chances, eu te avisei que Carlos tinha operado e você nem se interessou em perguntar se ele estava bem. Não me ligou nem pra inventar uma desculpa e garantir que eu não fosse aparecer aqui. Nem isso você se deu ao trabalho de pensar. – Apontou o dedo para a cabeça --
-- Carol, eu não tenho nada pra dizer em minha defesa. – Abraçou o próprio corpo – Eu só posso pedir desculpas.
-- Eu sei, e dizer que não vai mais acontecer, que foi um deslize, e que não vai me decepcionar. – Respirou fundo – Samantha, tem pessoas que não mudam, e você é uma delas. Eu posso fazer o que for, e nunca será suficiente. – Olhou para o chão – Sabe o que eu vim fazer aqui? Eu vim conversar com você e estava decidida a terminar esse relacionamento, porque eu não te amo mais, você e seu comportamento destrutivo minou o meu sentimento.
-- Não faz isso, por favor. – Lágrimas desciam descontroladas --
-- Chega. Acabou, e eu vou te pedir um favor, nunca mais me procure, de verdade!
-- Deixa-a ir Samantha, ela nunca foi mulher pra você, você precisa de uma mulher como eu. – Lucia descia as escadas --
-- Pela primeira vez eu vou concordar com Lucia, vocês duas se merecem.
Carolina saiu do apartamento sentindo a mesma dor de antes, com um gosto mais amargo, pois permitiu que tudo se repetisse, tinha se prometido que nunca mais voltaria a namorar Samantha, mas acabou cedendo aos caprichos da namorada, e mais uma vez se decepcionou. Colocou na cabeça que precisava se afastar da modelo definitivamente. E nunca mais voltaria a ficar com Samantha. Essa foi a última vez que Carolina se envolveu amorosamente com Samantha Monte Alto.
Fim do capítulo
Oi meninas.
Capítulo postado, espero que vocês gostem.
Último ato entre Samantha e Carolina?
Carol finalmente conversou com dona Carmem, o amor sempre é a melhor escolha.
Raquel doida pra conhecer o Carlos no passado, já pensou?
Será que Carlos vai autorizar a cirurgia?
Muitas perguntas, quem arrisca um palpite?
Obrigada pelo carinho, Lis, Mille, Patty_321, NovaAqui e bem vinda Lunna Maria.
Espero por vocês no próximo capítulo!
Beijos
Cris Lane
Comentar este capítulo:
Leidigoncalves
Em: 29/11/2018
Nossa, bem q vc disse q minha pergunta seria respondida em breve, mas não achei q seria tão rápido assim kkk.
Ainda bem q a Dona Carmen aceitou de boa a condição da Carolina, tinha muito medo dela sofrer com isso.
Graças a Deus Carolina deu um ponto final nesse relacionamento destrutivo q ela tinha com Samantha, sei q ainda tem mais coisas pra rolar, mas pelo menos não vai ser mais amorosa.
Espero q Carlos autorize a cirurgia, tenho certeza q a Raquel é competente suficiente pra realizar esse procedimento e assim trazer a Carolina de volta pra gente
Ansiosa para o próximo capítulo, não demora não!
Bjs????
Resposta do autor:
Oi Lunna
Pois é, viu como eu sou legal? kkkkk
Carol e Carmem tem uma relação maravilhosa, pelo menos isso ela não precisava sofrer, né, preconceito em sua própria casa, talvez se o pai estivesse vivo seria um problema.
Pois é, última relação amorosa entre as duas, Carolina agora terá que virar essa página.
Carlos está com muitas dúvidas, quem não estaria né, mas vamos aguardar, ele tomará essa decisão nos próximos caítulos.
Sábado tem mais, pode aguardar!
Beijos
Cris Lane
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patty-321
Em: 29/11/2018
Que pessoa desprezível essas Samantha.
Resposta do autor:
Oi Patty
Você pegou ranço mesmo da Samantha não é? kkkkkk
Ela vai aprontar muito ainda, pode esperar, mas Carol não vai mais voltar pra ela, isso eu garanto.
Obrigada pelo carinho.
Beijos
Cris Lane
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Carol The M
Em: 28/11/2018
Abençoadas sejam essas autoras que não romantizam relacionamentos abusivos. Confesso que andava meio de saco cheio de ler histórias de mulheres cafajestes/sádicas que faziam o "amor da vida delas" de gato e sapato, pra depois tudo terminar numa grande, repentina e "mágica" mudança de caráter, e a abusadora se torna uma princesa encantada no final. Parece essas histórias héteros que a gente tanto vê, na ficção e na vida real (essas em que o cara promete mudar depois da milésima surra, a coitada dá mais uma chance pra ele, e acaba morta, tá ligada?). Esse recurso narrativo de "ela é má assim por fora, mas lá no fundinho é uma boa pessoa" não cola mais, já ficou batido, e não condiz com a realidade. Eu sei, porque passei por várias relações tóxicas/abusivas, e ver essas coisas escritas como se fossem a coisa mais linda do mundo me revoltam demais. Obrigada mesmo, Cris!
Resposta do autor:
Oi Carol
Então, não vou nunca romantizar algo assim, concordo que as pessoas podem mudar, mas tudo tem seu limite, tem pessoas que não mudam, simples assim.
Samantha e Carolina, acabou o envolvimento amoroso, mesmo depois de tentar muito, Carol percebeu que não adianta insistir, Samantha perdeu.
Fico feliz que esteja gostando.
Aguardo por você no próximo capítulo.
Beijos
Cris Lane
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Pryscylla
Em: 28/11/2018
De novo a mesma decepção, eu espero que a Carol ainda de o troco nessa Lúcia eu vou amar kkk. Bjus ;)
Resposta do autor:
Oi Pryscylla
Pois é, mas dessa vez Carol aprendeu e não voltará mais a namorar Samantha, e quanto a Lucia, temos algo guardado para ela, rsrs, mas não conta pra ninguém.
Obrigada pelo carinho.
Beijos
Cris Lane
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NovaAqui
Em: 28/11/2018
Espero que Carolina tenha aprendido e nunca mais volte para essa louca
Acho que Carlos precisa autorizar sim. Não há outra solução
Abraços fraternos procês aí!
Resposta do autor:
Oi NovaAqui
Acho que agora Carol aprendeu sim, por favor né, rs.
Carlos vai pensar, vamos ver o que ele resolve. Nos próximos capítulos.
Obrigada pelo carinho.
Beijos
Cris Lane
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