Capítulo 75 - O Pequeno Falcão
A ILHA DO FALCÃO -- CAPÍTULO 75
O Pequeno Falcão
Marcela tomou um banho de banheira, vestiu um short e uma camiseta para então ir à varanda. Enviou uma mensagem para o celular de Sidney, dizendo que estavam bem, e sentou-se com uma toalha sobre os ombros para secar o cabelo antes de penteá-lo.
Recostou na cadeira, feliz por não ter nada o que fazer naquela manhã. Dez chalés já estavam praticamente finalizados e no dia seguinte iniciariam as obras de drenagem e asfaltamento em toda a orla.
O começo foi difícil. A herança cultural que designa a mulher coadjuvante em sua própria história por submissão ao homem, parece incrustada no DNA da sociedade e teima em extinguir-se. Os trabalhadores contratados para as obras na Ilha Carolina, ofereceram grande resistência a presença de Marcela e Sibele entre eles.
No dia a dia, elas sofreram com os comentários maldosos, como forma de intimidá-las a não participarem da construção da Ilha, afinal de contas, numa sociedade machista, isto é "receber ordens", é "estar abaixo" da mulher, algo inadmissível. Atitude orgulhosa e irracional do sex* oposto.
Felizmente essa fase havia passado e elas, através de muito trabalho e competência, conquistaram o respeito dos trabalhadores.
Não tinham nenhuma experiência ou vivência na construção civil, mas em compensação elas carregavam algo valioso que era o bom gosto e ideias inovadoras. E esse foi o principal combustível para que em pouquíssimo tempo os engenheiros as consultassem para tudo.
Ficou ali distraída, e quando percebeu já era dez horas. Espreguiçou-se e resolveu comer o pão e o queijo que havia no chalé, pois era tarde demais para preparar um café da manhã mais reforçado.
Mal ela tinha acabado de colocar as canecas na mesa, Sibele entrou na cozinha.
-- Bom dia, dorminhoca -- ela deu um beijo no rosto de Marcela, e sentou à mesa.
-- Quer comer alguma coisa? -- ela perguntou -- Só temos pão e queijo.
-- Eu como até papel e sabão. Se não comer alguma coisa, sou capaz de morrer de fome -- brincou ela -- Descansou bem?
Marcela caminhou até a geladeira e tirou o queijo. Depois abriu um armário e pegou o pão. Quando voltou para a mesa, Marcela já tinha colocado café nas canecas.
-- Dormi como um anjo. Foi o primeiro dia da semana que não precisei levantar antes das cinco.
-- Agora que os chalés estão prontos, quem sabe podemos diminuir um pouco o ritmo de trabalho -- ela pegou uma fatia do enorme pão caseiro e colocou queijo.
-- De jeito algum -- Marcela exaltou-se -- Não vejo a hora de ver a avenida principal asfaltada.
-- E depois a Marina... E depois a praça... E depois... E depois... -- Sibele riu divertida -- Você pegou jeito pra coisa.
-- Estou amando o nosso trabalho. Apesar do estado de minhas mãos -- Marcela estendeu uma das mãos e mostrou um calo -- É maravilhoso contribuir para a construção de um lugar onde pessoas de todo o país e até do mundo, virão para descansar e se divertir. Isso é uma conquista. É a verdadeira realização pessoal.
-- Sidney disse que a Natasha foi atrás da Andreia. Isso significa que ela pode estar voltando a Ilha.
Marcela colocou o queijo entre as fatias de pão que tinha cortado e deu uma mordida no sanduíche. Olhou séria para Sibele, estudando-a enquanto mastigava.
-- Você acha que a Natasha vai querer nos tirar daqui? -- perguntou preocupada.
-- Penso que sim -- Sibele replicou, na hora.
-- Daqui ninguém me tira -- Marcela falou, encolhendo os ombros -- Pode ir ou ficar, você é quem sabe. Eu vou ficar.
-- Certo -- Sibele concordou -- Também quero ficar. Não é justo depois de tudo o que construímos nessa ilha, simplesmente irmos embora sem vermos o resultado do nosso trabalho.
Virando-lhe as costas, Marcela foi até a geladeira e pegou uma jarra com suco.
-- Estou pensando em ir até o continente...
Um barulho do lado de fora fez com que ambas olhassem para a janela.
-- Deve ser a princesa -- Disse Marcela, sorrindo -- Vou pegar uma banana para ela.
Marcela pegou uma banana da fruteira e foi até a janela.
-- Princesa! Vem cá menina! -- ao ver a fruta, a elefanta esticou a tromba e pego-a da mão de Marcela -- Isso menina. Volte sempre -- Marcela fechou a janela e voltou para a mesa -- Eu não troco essa vida por nada. Em qual outro lugar teremos elefante, girafa e leão como animais de estimação?
O jipe atravessou o portão em forma de arco e entrou na propriedade enlameada. Alexandra estacionou o veículo bem em frente à casa e se virou para Natasha.
-- Chegamos ao destino. Agora é só correr para o abraço.
Bruna tocou de leve o ombro da empresária e sorriu.
-- Vai lá, Natasha.
-- Vocês não vão entrar?
-- A gente vai ficar aqui, por enquanto -- disse Alexandra -- Esse momento é de vocês. Depois a gente mata um daqueles bois que estão no pasto e fazemos um belo churrasco.
-- Boa ideia, poderosa -- concordou André.
-- Churrasco gaúcho. Que delícia! -- exclamou Isabel, entusiasmada.
-- Vocês são loucos. Fazem planos sem consultar o dono do boi -- Victória balançou a cabeça -- Vai logo, Natasha.
-- Eu vou. Não saiam daqui.
-- Sei não, acho que vou sair. Tô louca pra brincar na chuva e cair de boca na lama -- Alexandra fez um gesto de enfado, revirando os olhos.
Andreia colocou Márlon no carrinho e desviou o olhar até a janela. A chuva insistia em cair, não dava trégua. Apesar de ser quase meio-dia, parecia que estava prestes a anoitecer.
Um raio iluminou a sala e um trovão ameaçador ressoou pela casa. Ela engoliu em seco, olhou para se certificar que Márlon ainda dormia e andou pela pequena sala, até a cozinha.
-- Que escuridão! -- passou o dedo pelo interruptor de luz na parede e continuou andando até a geladeira.
-- Essa chuva já encheu o saco -- Sofia entrou logo após ela reclamando do mal tempo -- Estou virando sapo.
-- Estou pensando em sair daqui assim mesmo.
-- É muito perigoso nos aventurarmos com um bebezinho recém-nascido dentro do carro. Vamos esperar ao menos a chuva passar.
Andreia não estava convencida e Sofia subitamente começou a ficar impaciente.
-- Não me diga que vai se arriscar mesmo assim?
-- Cansei de ficar só esperando. Preciso ir à luta.
-- Quem precisa ir à luta? -- Leandro entrou na cozinha, expressão denotando curiosidade e certa desconfiança.
-- A Andreia -- Sofia respondeu à pergunta dando de ombros -- Ela sempre diz isso. Até parece que vou deixá-la sair com o meu afilhado nessa chuvarada -- enfiou um pedaço de pão na boca, mastigando calmamente.
Nesse instante, ouviram batidas na porta da frente. Eles se entreolharam admirados.
-- Eu hein -- disse Sofia, de boca cheia -- Quem será o louco?
As batidas eram tão fortes que pareciam querer colocá-la abaixo. Andreia olhou para a amiga embuchada e balançou a cabeça sorrindo.
-- Deixa que eu abro. Desse jeito vai assustar a visita.
Andreia girou a chave e depois a maçaneta, entreabrindo a porta de leve e não pôde acreditar no que viu.
-- Oh, Deus! -- Andreia, piscou várias vezes e estremeceu.
Natasha inalou bruscamente, soltou o ar de forma violenta e tocou a ponta do seu sapato encharcado contra o chão. Olhando para ela, perguntou:
-- Não vai me convidar para entrar? -- disse, sorrindo de leve. Seu cabelo molhado caía despenteado sobre os ombros. Minúsculas gotas de água caíam de seu cabelo e escorriam por seu pescoço.
Uma emoção tão forte a percorreu, que Andreia não conseguiu falar ou gritar. Por alguns momentos, ela só conseguiu olhar para Natasha. Seu coração saltava no peito.
Ela abriu a boca para falar, provavelmente para dizer que estava com saudade; porém, uma vez que isso era óbvio, abandonou a ideia imediatamente. Braços ansiosos circularam o pescoço de Natasha, e dedos delicados se entrelaçaram em seus cabelos. A respiração de Natasha parecia ofegante, e ela tremia. Não tinha certeza se estava com frio ou excitada, ou experimentando um pouco de cada emoção.
Natasha afastou-se para encontrar o olhar de Andreia.
-- Como você está, meu amor? -- ela murmurou, erguendo a mão delicada para passá-la pelo rosto molhado de Andreia -- Fiquei tão preocupada com você e com o Márlon.
-- Desesperada -- respondeu, enfatizando bastante a palavra, para que ela tivesse noção de como se sentia -- Caí numa desolação profunda -- ao mesmo tempo em que ela sorria, chorava aliviada, aninhada junto ao corpo da empresária -- Na verdade, quase morri de preocupação. Não sabia como você estava.
Natasha beijou o topo de sua cabeça e fez um carinho em seu braço.
-- Eu estou bem, mas aonde está o meu herdeiro que não veio me receber?
-- Está aqui -- Sofia orgulhosamente apareceu empurrando o carrinho com o bebê -- Apresento-lhe, Márlon Falcão.
-- Márlon Dias Falcão -- corrigiu Andreia.
-- Meu filho! -- Natasha disse com voz abafada e seus olhos se encheram de lágrimas -- Posso segurar? -- pediu olhando para o berço.
-- Claro, meu amor.
-- Eu estou toda molhada -- disse hesitante.
-- Não tem problema, amor. Ele está bem enroladinho na manta.
Natasha se dirigiu ao carrinho estacionado no centro da sala e abaixou-se para espiar o bebê.
-- Olá, meu anjo -- murmurou, pegando a criança no colo. O rosto de Natasha se iluminou de orgulho e satisfação. Pegou-o com cuidado, encostando-o no peito -- Ele tem muito de você -- comentou.
-- Graças a Deus -- Andreia sorriu, observando as feições delicadas do filho.
Natasha olhou para Sofia e franziu a testa.
-- Foi ideia sua, não foi? Sua ameba gaúcha -- Natasha falou alto demais e o bebê se mexeu em seus braços. Ninou-o de novo até que se acalmasse.
-- Eu hein! A ideia foi da sua esposa. Você não sabe como é Andreia? Quando se decide a fazer uma coisa, ninguém a convence do contrário.
Natasha olhou para Andreia de forma interrogativa.
-- Fui eu quem tive a ideia de fugir para Bagé -- ela falou ligeiramente embaraçada -- Sabia que acabaria por se arrepender, mas era tarde demais para mudar os planos.
Natasha percebeu o tom de tristeza que havia na voz dela.
-- O que aconteceu?
-- O parto foi muito difícil. Pensei que morreríamos -- Andreia suspirou alto, mas continuou a falar -- Deus foi tão bom conosco. Ele enviou um anjo para nos socorrer -- ela olhou para o médico, sorrindo -- Esse é Leandro, o médico que fez o parto e nos salvou.
-- Obrigada, Leandro -- murmurou Natasha, segurando o bebê com os dois braços -- Nossa família será sempre grata a você -- disse com sinceridade.
Leandro balançou a cabeça emocionado e feliz. Andreia abraçou Natasha por trás e encostou a cabeça em seu ombro.
-- Ele é lindo né Nat.
-- Lindo como você -- Nesse momento, Márlon abriu a boca, deixando escapar um choramingo -- Ei garoto, não faça isso. Sua mamãe Natasha não tem a mínima experiência com bebês chorando -- para sua surpresa, ele parou de chorar e a olhou, o rostinho corado, a respiração acalmada. Com olhos arregalados, fitou-a curioso.
-- Você tem os mesmos olhos castanhos da mamãe Déia. Você vai destruir corações com esses olhos -- disse baixinho.
Os lábios do bebê se curvaram. O sorriso pegou Natasha desprevenida.
-- Ele riu pra mim -- ela comemorou -- Você viu?
Andreia achou graça.
-- Ele sentiu que você o ama.
-- Amo demais! -- murmurou, segurando o bebê junto ao corpo.
Alexandra empurrou a porta e colocou somente a cabeça para dentro.
-- Oiê, será que já podemos entrar?
Fim do capítulo
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Anny Grazielly
Em: 04/10/2020
Aiaiaiaia... que momento lindo... e Alex, como sempre, louca... kkkkkkk
jake
Em: 22/11/2018
Vandinha enfim o reencontro...
Xanda já pensando em matar um boi
Nossa Marcela e Sibele pegando no pesado ...e tendo elefante como animais de estimação
Parabéns autora e obrigada pelas risadas e ensinamentos que vc nos presenteia em cada capítulo...
Resposta do autor:
Olá minha querida.
Vamos curtir os últimos momentos da: Ilha do Falcão.
Beijão.
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patty-321
Em: 21/11/2018
O milagre aconteceu. Sibele e marcela trabalhando. Olha q o castigo foi bênção. Legal. Até q enfimna busca da nat teve fim. Familia reunida. Bjs
Resposta do autor:
Olá Patty.
Chegando com os últimos capítulo da Ilha do Falcão.
Beijão meu anjo.
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Mille
Em: 20/11/2018
Oi Vandinha
Agora a família está reunida e a felicidade é o complemento desse reencontro.
Gostei de ver a mudança da Marcela e Sibele o trabalho as transformou e tirou da Marcela o comodismo e a vida luxuosa. E elas se adaptaram a nova realidade e estou feliz que se tornaram pessoas melhores.
Bjus e até o próximo capítulo
Resposta do autor:
Olá Mille
Chegando com os últimos capítulo da Ilha do Falcão.
Beijão meu anjo.
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NovaAqui
Em: 20/11/2018
Você consegue sempre me deixar com os olhos marejados.
Que felicidade para Natasha!
Feliz por Marcela e Sibele. Serão ótimas administradoras
Abraços fraternos procês aí!
Resposta do autor:
Olá NovaAqui.
Chegando com mais um capítulo. O fim está próximo, mas ainda teremos fortes emoções.
Beijão minha querida.
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