Já gostaria de começar me desculpando pelo tamanho do capítulo, mas tem me sobrado pouquíssimo tempo para a escrita e para não faltar com vocês, estou optando por postar capítulos menores. Mas espero que esteja a altura de vocês.
Tenham uma ótima semana e boa leitura.
Xeros...
Ah sim, vocês me desculpam?
Ps: Relevem os erros. Logo serão corrigidos.
Capítulo 71 (Re)Nascimento
Para Delphine foi impossível voltar a conciliar o sono, pois seu coração estava inquieto e aflito. O aparente sonho que tivera pareceu real demais. Podia jurar que havia conseguido, de alguma maneira sentir o toque de sua amada e era justamente essa sensação que estava incomodando. Mas não só isso. Além da visão acalentadora da imagem dela, havia algo mais que insistia em torturar sua alma calejada.
O cheiro de Cosima! Ele era real demais para ter sido um simples sonho, mas era exatamente isso que havia acontecido. Havia apenas sonhado com seu grande amor e sabia que aquilo se deveu a imensurável falta que sentia dela e da conversa que havia tido com Sally na noite anterior.
Aquela ligação intercontinental com a Sra. Niehaus havia se tornado uma rotina quase diária nos últimos dias e para e ouvir as palavras ternas e, por vezes divertidas daquela mulher, acalentava seu coração machucado, como se alguém soprasse sobre um ferimento aberto e cessasse, por alguns instantes, toda a dor que lhe castigava incessantemente.
Para ela era encantador ouvir todas as deliciosas histórias que Sally lhe contava das peraltices de Cosima quando criança e Delphine se estava adorando poder conhecer um pouco mais sobre aquela que tanto amou e ainda amava. Para muitos aquilo poderia ser algum tipo de masoquismo que ela estava infligindo a si mesma, mas apenas ela sabia o quanto lhe fazia bem ouvir todos aqueles relatos e de como estar perto da mãe de Cosima, de alguma forma lhe colocava perto dela.
Lembrou-se da história contada na conversa que tiveram antes de dormir, do dia em que Cosima desafiou o professor de Ciências tão somente para saber qual era a sensação de ser repreendida e mandada para a detenção pós-aula. E de como esse mesmo professor lhe impôs um “castigo” de lhe ajudar a preparar uma aula prática para o dia seguinte, que consistia em realizarem uma espécie de autópsia em sapos e a pequena Cosima, assim como em um de seus filmes favoritos, soltou todos os sapos e isso lhe custou sua única suspensão.
Riu para si mesma e sentiu Manu se mover indicando que estava prestes a despertar. Esse breve movimento foi o suficiente para deixar Andrômeda atenta, com a cabeça e as orelhas erguidas. A gata preta não desgrudava um só instante da menina e estava ansiosa para mais um dia de peraltices tivesse início. Enquanto a criança se espreguiçava, o animal encarava Delphine com toda a soberania que só os felinos possuíam e piscava seus imensos olhos amarelados lentamente.
- Bom dia Del... – A saudação de Manu veio lenta e baixinha, de quem não parecia muito disposta para sair da cama ainda. – Tá acordada faz tempo? – Cocegou os olhos.
- Um pouco antes de você meu amor. – Mentiu com um sorriso espontâneo. Era mesmo uma dádiva das deusas poder contar com a alegria pueril de Manu em sua vida. Fora exatamente por isso que havia cancelado todas as suas atividades em Paris por tempo indeterminado e praticamente ter corrido para os braços de Manu.
Mais do que nunca, aquele acolhimento que lhe era tão familiar era capaz de acarinhar suas dores e pois mais incrível que pareça, aquela pequena criatura tinha a capacidade de lhe surpreender com as palavras que ela mais precisava ouvir. Então a filha correu para os braços da mãe. Assim era o encontro de suas almas e que dessa vez os papeis pareceram se inverter um pouco. Pensou em todos os sacrifícios que sua mãe fez por ela, tudo o que ela entregou para que Delphine pudesse viver... Como a havia protegido e amado de uma forma indiscutível. E sempre que pensava nisso, sentia-se consumir por um arrependimento tremendo. O que lhe levou a agradecer às damas do destino por terem lhe oferecido uma segunda chance para que pudesse se redimir.
- O que você tá pensando? – Manu sentou-se, postando-se de frente para ela, tendo a calda de Andrômeda passando em seu rosto.
- Jamais deixarei que nada de ruim lhe aconteça Manu. – Aquela promessa era a mais sincera que ela poderia fazer e lágrimas vieram a seus olhos. A menina arregalou os seus e pareceu não compreender exatamente o que a mulher lhe dissera. Inclinou a cabeça um pouco para o lado direito o que fez seu cabelo que estava um caos perfeito, caísse em seu rosto e arrancasse uma gargalhada de Delphine.
- Você ri porque o seu cabelo é perfeito e parece que tá sempre arrumado. Mesmo quando você acorda. Ei... Como você faz isso? – A menina colocou ambas as mãos na cintura e ergueu o queixo indagando a mulher diante dela. Então Delphine fez o que deixava a criança possessa. Riu dela.
- O seu cabelo é lindo meu amor... – Disse com dificuldade, pois estava levando uma chuva de falsas tapas da menina e pequenas mordidinhas nos pés de Andrômeda, o que a fez gargalhar devido as cócegas que sentiu.
- Isso mesmo Andrômeda... Castiga ela! – Sentou-se no colo dela e insistiu nas cócegas. Não estava mais “chateada” com ela, apenas queria que aquele breve momento de alegria durasse um pouco mais. Manu detestava ver e sentir toda a tristeza de Delphine, e tentava, ao máximo alegrá-la sempre que pudesse.
- Que confusão é essa aqui? – Alguém entrou no quarto fingindo repreendê-las.
- Tia Helena! Socorro! – Manu berrou, pois já estava sob Delphine que inverteu as posições delas e estava devolvendo as cocegas que recebera.
- Seja lá o que a mocinha fez, mereceu esse “castigo”. – A morena sentou-se na beirada da cama.
- Vejo que já estás bem melhor! – Delphine disse quando cessou o ataque a Manu.
- Sabes que isso não foi nada! – Helena moveu o punho que estivera machucado e esticou a perna que ainda lhe incomodava, mas ela fazia questão de não demonstrar.
- Isso é porque você é a Diana Prince! – Manu disse e jogou-se nos braços de Helena que a recebeu e acolheu no colo.
- Quem? – Delphine franziu a testa estranho brevemente aquela referência.
- A Mulher Maravilha! Dã! – Manu virou os olhos diante da ignorância de Delphine que ergueu os ombros.
- Desde que assistimos a esse filme que essa garotinha cismou que eu me pareço com a heroína dele.
- Parece sim! Parece sim! Veja Del! – Segurou o rosto de Helena em suas mãozinhas e o virou para a loira.
- Bom, eu não vi o filme então...
- O QUÊ!? – As duas questionaram em uníssono, assustando Delphine que recuou um pouco na cama.
- Como assim você não viu o filme da heroína mais sensacional que existe? – Manu questionou visivelmente indignada. – Faremos isso agora! – Saltou da cama com uma das mãos na cintura e a outra fechada com apenas o indicador sendo movimentado, chamando Delphine.
- Boa sorte! – Helena sussurrou para a sua Mestra assim que essa passou por ela.
- Você vem também! – Manu a puxou pela mão.
- Manu! Já vimos esse filme quatro vezes! – A mulher protestou, mas foi em vão. Tanto ela quanto Delphine sabiam que era impossível vencer aquele embate e tiveram de ceder.
______
- A Manu tem razão Helena! Você se parece muito com essa atriz. – Delphine concordou assim que terminaram de ver o filme.
- Eu num disse? – A menina parou diante da imensa tela de tv. A morena revirou os olhos e cruzou os braços e as penas. – Mas a Tia Helena é mais bonita. – A menina a desarmou com uma piscada de olho para Delphine que mais uma vez precisou segurar a gargalhada. Adorava ver a interação entre ambas e de como aquela pequena menina conseguia desarmá-la sem esforço.
- Tudo bem então. Ah... Eu tenho uma sobrinha que se chama Diana e ela é grega. – Helena anunciou.
- Isso mesmo... Filha de sua irmã... Como é mesmo o nome dela? – Delphine perguntou enquanto mordia o que restava do sanduiche que comia.
- Meia-irmã Ágata.
- Sério? Diana? Que legal! Quantos anos ela tem? – Manu questionou sentando-se ao lado dela.
- Mais ou menos a sua idade! – Helena respondeu apertando a ponta do nariz da menina.
- Que legal! Eu adoraria conhece-la!
- E ela é uma excelente amazona! – A morena piscou um dos olhos para menina e sorriu para a Delphine. – Assim como a mãe dela que ganhou várias medalhas e troféus de hipismo.
- Assim como a tia dela também! – Delphine espreguiçou-se.
- Agora que eu quero conhece-la ainda mais... Ei, onde a senhorita pensa que vai? – Interrompeu a saída de Delphine.
- O que foi? – A loira parou no meio da sala.
- Precisamos assistir aquela série que lhe falei. – A expressão de confusão da mulher fez a menina prosseguir. – Aquela que fala das bruxas e que a moça principal... – Estalou os dedos tentando lembrar-se da palavra correta. – Protagonista! Isso... Ela tem um gatinho preto que nem eu.
- Manu, prometo que veremos sua série mais tarde, mas sabe o que eu gostaria de fazer agora?
- O que? – Perguntou já ansiosa.
- Vamos brincar de amazonas?
- Vamos! – Saltou já dando palminhas.
- Você já pode montar? – Indagou a Helena.
- Está brincando? Ficarei novinha em folha assim que montar em belo animal! – Levantou-se com o mesmo entusiasmo da menina.
E saíram as três para vestirem roupas mais adequadas para a montaria.
- Eu tô tão feliz hoje sabia? – A menina disse para a mulher que estava ajoelhada diante dela calçando suas botas. Delphine a olhou surpresa.
- Eu posso saber o motivo? – Dedicou-se ao outro pé dela.
- Por que o hoje você não está tão triste. – A honestidade da menina a acertou em cheio. Acariciou o rostinho dela e o sorriso que trazia nos lábios diminuiu de intensidade. – Droga! Eu devia ter ficado calada.
- Ei... Hoje eu tô melhor do que ontem sim. E amanhã estarei ainda melhor. – Sentou-se ao lado dela.
- Mas ainda dói muito não é? – A menina tocou o peito dela.
- Sim meu amor... Dói demais... – Manu baixou a cabeça. – Mas estar com você me ajuda muito viu? Alivia muito a minha dor. – A criança, que já tinha lágrimas se formando nos olhos sorriu.
- Jura?
- Claro Manu. – Fez o mesmo gesto que ela e tocou no peito da menina. – O que você tem aqui dentro me faz um bem danado. – Ambas sorriram e Delphine percebeu que, do jeitinho dela, Manu compreendeu o que ela quis dizer.
Estava se referindo ao encontro de suas almas. Ao cuidado e ao carinho que emanava espontaneamente da menina para ela.
- Estão prontas? – Helena adentrou o quarto já devidamente trajada.
- Prontíssimas! – Delphine disse e as três saíram rumo aos estábulos.
******
- O que aconteceu aqui? – Ouvi aquela pergunta repetidas vezes assim que recobrei minha consciência. E quando dei por mim, a vi parada no meio daquele salão em meio a muitos corpos sem vida, onde a maioria deles eram dos invasores do Martelo que foram aniquilados por nós. Olhei rapidamente e não havia sinal algum de Armand. Aquele covarde havia feito o que era de costume para ele. Fugir!
- Minha Senhora...? – A chamei bastante receosa. A imagem daqueles terríveis olhos negros não saia de minha mente e temi voltar a me deparar com aquela escuridão aterradora. Contudo, assim que ela se virou em minha direção não os vi mais. E onde outrora havia duas bolas negras, estavam seus lindos olhos verdes visivelmente perdidos. E também uma súplica silenciosa neles. Ela estava bastante confusa.
- O que aconteceu aqui Izabelle? – Girou lentamente indicando o caos que aquela cena indicava.
- Evelyne... Você não se lembra de nada? – A questionei me sentindo ser tomada pelo receio, pois o silêncio e o olhar perdido dela indicavam que alguma coisa não estava correta. E isso me levou a tudo o que aconteceu a ela, especialmente àquele ritual tenebroso ao qual ela foi submetida.
- Está tudo muito confuso...
- Do que se lembra?
- Das masmorras do castelo Verger... Do cerco... Da praça... Da fogueira... – A voz dela foi perdendo força a medida que sua mente lhe levou até aquele terrível acontecimento. – A Melanie... – Sussurrou o nome de quem tanto amava. – Tudo o que consigo me lembrar com clareza é da... Morte dela. – Baixou a cabeça diante da dor que aquela lembrança lhe causou, mas essa postura não durou muito tempo, pois ela a ergueu bruscamente e me encarou assustada. Percebi então que ela acariciava a própria barriga que estava a mostra devido ao vestido que usava possuir um grande rasgo bem ali.
- O que foi? – A reação dela me pegou de surpresa.
- Eu fui ferida... – Tornou a buscar aquele ferimento. – Mortalmente ferida. – Percebi o desespero ganhar força. – Aquele ferimento... Eu deveria ter morrido... – E então ela cambaleou para trás, levando ambas as mãos ao rosto que outrora esteve bastante machucado, para o choque dela e receio meu, não havia vestígio algum dos inchaços, luxações e cortes profundos que sofrera durante o tempo em que as torturas do Martelo e das quais lembrava vividamente.
- Evelyne... Você precisa se acalmar. – Tentei, mas antes de conseguir qualquer sucesso, percebi o olhar dela fixo em algo que eu trazia em uma de minhas mãos.
- O Labrys Sagrado! – Disse e eu praticamente consegui visualizar a mente dela trabalhando. Ela tomou aquela arma de minhas mãos e a observou detalhadamente. As marcas da mais recente batalha que aquele machado havia enfrentado ainda estavam bastante frescas. As lâminas, o cabo e até mesmo a fita lilás que o marcava continham muito sangue e algumas partes podiam vistos tufos de cabelo.
Com aquela arma em mãos ela caminhou pela sala e parou diante do corpo sem vida de Françoise, o mais fiel seguidor de Armand. Foi naquele instante que havia chegado o momento crucial e que me fora confiado. O de contar aquela terrível história para a quem mais interessava. Mas naquele instante eu estava verdadeiramente apavorada com a reação que ela poderia ter diante de tudo o que eu tinha para lhe contar.
- Eve... – Toquei-a no braço e senti o tremor que já tomava conta dela. Busquei a coragem que duvidava possuir naquele instante e dei início aquela narrativa que mudaria a vida daquela mulher para sempre. – Só soubemos da captura de vocês bem tarde. E quando a notícia chegou, Emenuelle moveu céus e terra para irmos ao seu resgate. Contudo... – O arriar de ombros dela me disse que ela sabia a que eu me referia. – Chegamos tarde demais para salvar a Melanie... Sinto Muito. – A vi chorar pela primeira vez diante daquela narrativa. – Mas conseguimos resgatá-la a tempo e num tempo inimaginável, trouxemos você até aqui...
- Sim... Está tudo muito confuso, mas consigo lembrar de algumas cenas... Do mundo balançando ao meu redor...
- Deve ter sido na carruagem ou no navio. – Emendei e ela concordou pensativa.
- Também me lembro do rosto de... Izabelle, onde está minha mãe? – E lá estava o que eu mais temia. Eu realmente não fazia ideia de como dar aquela notícia para alguém que acabara de perder o amor de sua vida da forma mais cruel e perversa possível.
- Antes de qualquer coisa... Se acalme... – Não comecei muito bem aquela conversa e vê-la passando por mim apressadamente e em direção ao subsolo do castelo, tive a certeza. - Evelyne? Espere. – Berrei inutilmente e também não consegui alcança-la. Só o fiz pouco antes dela chegar as catacumbas, postei-me diante dela. – Você precisa se acalmar menina! – Tentei ser firme com ela e eu quase consegui contê-la, mas perdi toda a sua atenção. E eu pude ver nos olhos dela o exato instante em que ela viu o Manu. Jamais, repito, jamais serei capaz de esquecer aquela expressão. Vi a angustia e a confusão serem transformados e tomados pela dor. Infligi ainda mais força na vã tentativa de contê-la, mas ela me empurrou e passou por mim como se eu não fosse nada. A força dela também fora potencializada com tudo o que sofrera.
Estremeci e verdadeiramente todas as paredes do castelo pareceram vibrar também diante do urro doloroso que ela emitiu ao debruçar-se sobre o corpo de sua mãe. Jamais a vi chorar daquela maneira e compreendi que ela estava se permitindo deixar extravasar toda dor que comprimia o seu peito.
Ela chorava por sua mãe... Chorava por Melanie e certamente chorava por si mesma, pois estava viva e teria de conviver com toda aquela dor. Foi então que eu senti o sangue congelar em minhas veias quando ela viu o pote entre os dedos de Manu e logo correu os olhos para o ferimento fatal no abdômen de sua mãe e viu o corte reto e quase perfeito. Anuiu negativamente e trouxe pra perto de seu rosto o Labrys que trouxera com ela.
Recuei quando ela se ergueu de súbito e olhou ao redor. As várias mulheres mortas ali, cambaleou entre elas anuindo negativamente com a cabeça e balbuciando algumas palavras.
- Eles não vieram até aqui... – Ela disse baixinho.
- O que Evelyne? – Fingi que não havia ouvido.
- Não tem nenhum dos homens do Martelo aqui... – Fechei meus olhos com força e temi sinceramente por minha vida naquele instante. A impulsividade daquela mulher era famosa e eu não conseguia prever o que ela seria capaz de fazer com quem ela era agora. – Quem fez isso? – Não tive tempo para responder, pois já senti a força descomunal das mãos dela contra o meu pescoço. Desesperada eu percebi que meus pés não tocavam o chão e chocada eu constatei que ela havia me erguido do chão sem aparente esforço algum. Lutei e me debati, mas não tive forças para me libertar. – O que diabos aconteceu aqui? – Ela berrou bem próxima a meu rosto, mas eu não mais conseguia raciocinar logicamente, pois eu sentia desesperadamente a falta do ar em meus pulmões.
Porém, quando eu tinha a certeza de que havia chegado minha hora, ela me largou sem cortar o olhar surpreso. Tossi algumas vezes e respirei com bastante dificuldade, pois minha garganta queimava e doía bastante.
- Não! - Ela disse em estado de total incredulidade. Não entendi a princípio, mas ela só continuava repetindo aquela negativa. Ela cambaleou para trás até que esbarrou na larga mesa de pedra que ainda possuía manchas de sangue. – Não pode ser... – Levou a mão até aquela mancha que havia secado a pouquíssimo tempo, e assim que a tocou, levou sua outra mão a própria barriga. – O que vocês fizeram? – E com a expressão apavorada ela visualizou o Livro das Sombras caído num canto. – Não... Não... NÃO!!!
Aquele grito foi tudo o que ouvi e, não sei quanto tempo depois, despertei aqui, nesse quarto onde lhe escrevo nesse exato momento. E desde então não tocamos mais no assunto daquele ocorrido. Hoje sei que, de alguma maneira completamente desconhecida para nós duas, ela conseguiu ver algumas de minhas lembranças. Aparentemente mais um dom que foi passado para ela no momento de seu Renascimento.
Foi isso que aconteceu naquele dia. Evelyne Chermont, filha da grande Mestra da Ordem realmente morreu. E renasceu como alguém que ainda estamos tentando descobrir quem é.
Esses últimos dias tem sido de descobertas, nem sempre tão agradáveis e, apesar de saber que ela não gostaria, eu preciso registrar aqui tudo o que vivenciamos. Isso faz parte do meu papel e, de uma certa maneira, estou atendendo não só o pedido de Manu, mas o da própria Evelyne. Pois disse que precisa saber de tudo o que aconteceu naquela noite, mas apenas quando estivesse pronta.
Nesse momento ela ainda está aprendendo a lidar consigo e sofrendo todas as dores que eu se quer consigo imaginar que seu corpo tem sofrido com o renascimento dele. Além disso, ela precisa conviver com o seu luto e com algo ainda mais assustador que todos os seus dons.
Sua imortalidade!
Isso é o que ela mais abomina em quem se tornou. E não tem passado um dia que ela não tenha atentado contra a própria vida tão somente para constatar que nada pode ser feito para acabar com o seu sofrimento.
Me dói vê-la assim, tão entregue. A Evelyne que ajudei a criar, sempre foi muito cheia de vida e adorava aproveitá-la ao máximo, mesmo que isso significasse desobedecer todas as ordens de sua mãe e os ditos da Ordem.
Mas agora ela parecia que não vivia, apenas existia. Como ela mesma me disse em uma das poucas vezes que trocamos mais do que formalidades. Sei que tudo ainda é muito recente e tenho procurado respeitar toda o sofrimento dela, mas algo precisa ser feito. A cúpula da Ordem havia sido desfeita. Desse geração só sobramos eu, ela e Josephine. A quem mandei em uma longuíssima viagem, com a difícil tarefa de informar dos ocorridos em Dublin e de que agora possuíam uma nova Mestra.
Por precaução, achei por bem ainda não alardear sobre a nova condição de nossa Mestra. Um mundo regido por uma instituição tão contraditória quando a igreja não estava pronto para lidar com uma informação como esse. Ouso pensar que em momento algum tão realidade será fácil de ser assimilada.
Mas espero cara leitora, que tudo o que foi relatado aqui, lhe sirva para ajuda-la a compreender a sequência de eventos fantásticos que vivenciamos e que, por mais absurdos que possam parecer, eles foram reais.
Pois a Ordem do Labrys é exatamente tudo isso. Repleta de misticismo e ciência, de bravura e de coragem, mas acima de tudo pela linha tênue que nos une. Que liga todas nós mulheres. Mesmo aquelas que se quer sabem de nossa existência e, com o passar dos tempos, usufruem de tudo o que lutamos e conquistamos. E tenho certeza que não iremos esmorecer. Muito pelo contrário. Apesar de ainda estamos envoltas pela atmosfera da perda, a esperança queima forte em meu peito sempre que penso em Emanuelle e em todas as outras que deram suas vidas por, por Evelyne e por você que agora lê tais palavras.
Pois, a despeito do que o Martelo presumiu, naquela noite a Ordem não teve seu fim. Teve seu recomeço. A Ordem não acabou com a morte de sua Mestra.
Não! Ela RENASCEU juntamente com Evelyne Chermont! E eu tenho a firme certeza de que ela fará coisas grandiosas. E chego a quase invejar aquelas que virão depois de mim que estarão ao lado dela.
E agora falo diretamente com você, minha irmã de Ordem. A Protetora da Mestra. Por mais que ela pareça indestrutível, mesmo ela representando a essência da Ordem, uma verdadeira fortaleza. Ela precisará de você, pois a você cabe a mais honrosa e difícil das missões. A de guardar esses segredos e a de protegê-la quando ela mais precisar.
Também cabe a você guardar o mais precioso de nossos tesouros. A verdade acerca da profecia que fora proferida no leito de morte de minha querida amiga Manu. A de que o reencontro das almas de Evelyne e Melanie, colocaria fim a essa monstruosa maldição da imortalidade e permitiria a derrocada do nosso maior inimigo.
E somente... Tão somente quando essas almas se reconhecerem, é que essa maldição terá fim. Os pormenores desse reencontro, não estão muito claros e o momento do mesmo está a cardo das damas do destino.
Só torço para que o sofrimento dessa pobre menina não precise ser muito demorado.
Bom, finalizo aqui esses relatos. Esperando que os dias que estão por vir sejam mais generosos conosco. Que possamos tirar todas as lições de nossas derrotas e aprender a melhorar nossas vitórias. Sabendo que toda a força que necessitamos está em nós mesmas e em nossa irmandade.
Fiquem vivas!
Fiquem juntas!
Pois juntas somos poderosas e sempre teremos a Ordem do Labrys!
******
A imagem de uma miniatura do Labrys sagrado estava desenhada ao final daquele relato.
Cosima soltou aquelas folhas e recostou-se na cadeira estarrecida e completamente tomada pela mais poderosa das emoções. Aquelas palavras finalmente a fizeram provar o verdadeiro significado do que tanto pesquisa. A sororidade! Aquele impressionante e vigorosa energia que irmanava as mulheres da Ordem e que agora ela realmente sentia-se fazendo parte dela.
- Agora eu sei... – Ergueu-se da cadeira de pronto. – Sei quem sou... – Sorriu largamente e saiu às pressas da sala e logo seus passos apressados converteram-se numa corrida desenfreada.
Ela passou correndo por algumas das anciãs, que resmungaram algo num idioma que ela não compreendeu. Apenas desculpou-se delas com o mesmo luminoso sorriso nos lábios.
Passou direto pela entrada da sala da sacerdotisa, mas pausou sua corrida em voltou ofegante parando na porta dela. A mulher que estava sentada em sua usual posição misturando suas substâncias encarou a jovem diante dela buscando o ar.
- Eu sei... Eu sei quem eu sou! – Sorriu ainda mais e recebeu um largo e satisfeito sorriso de volta. A mulher lhe acenou com a cabeça, indicando que ela deveria ir e ela o fez.
- Já não era sem tempo! – A sacerdotisa disse visivelmente feliz.
Num só folego subiu as escadas que davam acesso ao andar principal, causando surpresa nas mulheres que se alimentavam na grande copa da Fundação. Poucas pessoas sabia da presença dela ali, mas ela não se demorou diante do estranhamento. Apenas as questionou.
- Onde está a Delphine?
- Não sei. – Foi a resposta que obteve delas. Bufou e seguiu procurando-a por todos os lugares. Mas não havia sinal nem dela, nem de Manu. Pensou em buscar por Siobhan, mas pensou que ela poderia tentar convencê-la a desistir de acabar com toda aquela farsa.
E ela estaca decidida a não desistir. Não mais! Agora sabia quem ela era. Conhecia toda a história e sentia em seu intimo o que deveria fazer. E acima de tudo, precisa urgentemente abraçar seu grande amor mais uma vez.
Foi então que algo lhe ocorreu. Parada, na porta principal da Fundação e sob olhares curiosos respirou fundo e subiu suas mãos até que elas alcançassem o peculiar adorno em seu pescoço. Fechou seus olhos e em seguida os seus dedos em volta do cordão. Segurou o ar nos pulmões por alguns segundos e simultaneamente abriu os olhos, soltou a respiração e puxou com força o colar que despedaçou-se sem maiores resistências.
Uma brisa quase imperceptível balançou suas roupas e seguiu porta a fora, dançando ao vento e indo longe.
______
Nos limites do território da Fundação Ártemis, três amazonas cavalgavam despreocupadas. Duas delas mais a frente apostando uma pequena corrida. Eram Manu e Helena e mais atrás um pouco, Delphine as assistia de forma serena.
Já havia cavalgado demais e travado batalhas demais sob um cavalo, e queria apenas aproveitar o contato com a natureza que aquele animal lhe proporcionava.
O dia estava quente e um tanto quanto seco, mas uma brisa furtiva a alcançou e sacudiu seus cachos.
Imediatamente freou o trote de seu cavalo e se permitiu atingir pela acolhedora e poderosa energia que aquela brisa levou até ela.
Permaneceu naquela posição, imóvel, com os olhos fechados e sua parada chamou a atenção das demais.
- Del? – Manu virou-se para ela, e Helena fez o mesmo. As duas trocaram olhares confusos com a reação da loira e ficaram atônitas com o que ela disse logo em seguida.
- Cosima!? – Arregalou os olhos e num movimento rápido virou seu cavalo e o atiçou para uma cavalgada veloz.
- Isso! – Manu vibrou enquanto Helena sentiu um misto de alegria e medo.
Fim do capítulo
Comentar este capítulo:
Deborah
Em: 26/01/2019
Boa Noite,ou Boa Madrugada
Descobrir sua historia tem três dias e por conta de nao ter tempo pelo dia tenho ido dormir as 4 da madrugada lendo ,estou fascinada,encantada por esse seu mundo.
amo Cosima e Delfine ,mas estou loucamente apaixonada por Helena e Stella,e sim estou sendo muito ousada em pedir mas das duas ,ou ate mesmo uma historia solo ,kkkkkk,desculpa se fui muito pidona ,mas e sua culpa pois nos faz ficar fascinada com seus personagens.
Parabêns ,você é uma escritora maravilhosa.
Atenciosamente uma nova fã.
ps - Mas Helena e stella ,tá parei,kkk
Dryka
Em: 18/11/2018
Boa noite.
Você autora, me tira da moita me fazendo vir atras de saber onde anda o proximo capítulo...trabalhei durante a madrugada e todo o dia de hoje e estou aqui, a caricatura de um zumbi, fazendo força para não dormir apenas esperando ELE, O Capítulo!! RS
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Lanezann
Em: 12/11/2018
Eiiiii!!! Sabia que tortura no Brasil "ainda" é crime???
Um piscar de olhos no capítulo e fim... agora mais uma semana...
Pelas Deusas, não faça isso nunca mais!!!
Resposta do autor:
Tortura? Jamais! Apenas procovando um tiquinho da ansiedade de vocês e aguçando a imaginação do que está por vir.
E mais uma vez perdão pelo capítulo pequeno.
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Dryka
Em: 12/11/2018
Bom dia...
Que maldade sem tamanho essa de nos deixar sete dias sem saber o desfecho deste encontro.
Confesso, sem vergonha nenhuma, que passo a semana toda esperando o domingo chegar apenas para ler este que, sem sombra de dúvidas alguma, é o conto mais bem escrito que tive o prazer de me deparar até hoje. E olha que ja leio a bastante tempo, para não dizer décadas... kkkkkkkkk
Esperando a semana passar voando.
Até a próxima.
Dryka
Resposta do autor:
Sete dias imaginando, pensando em como será rs... É uma espera boa!
E você conseguiu me deixar imensamente feliz com sua declaração. Me esforço para lhes oferecer uma estória de qualidade.
É um privilegio tê-la como leitora.
Xeros
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Karla Medeiros
Em: 12/11/2018
Aí Jesus... Nao acredito que vamos ficar até o próximo domingo esperando por esse reencontro rsrs .... Uau .... Magnífico... Vou enlouquecer de anciedade, querida autora isso não se faz.... Rsrs
Bjsssssss...
Resposta do autor:
Uma semana passa rapidinho, ainda mais com feriado no meio rs...
E instigar um tiquinho a ansiedade de vocês ajuda a manter o clima rs...
Xeros
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Unica
Em: 12/11/2018
OOi autora....
Estória maravilhosa, não tenho palavras para descrever.
Na hora que a Del falou que não viu o filme, eu verbalizei junto com a Manu e a Helena a mesma resposta... Rsrsr
Ansiosa pelo reencontro das duas. Muito ansiosa.....
Resposta do autor:
Fico muitissimo feliz com sua emoção.
E a Del é ocupada... Não viu o filme, até pq ela mesma tem uma estória tão empolgante quanto a propria Mulher Maravilha ahahaha
Xeros
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Liana
Em: 11/11/2018
Mais um capítulo Maravilhoso ! Ansiosa pelo reencontro destas duas almas . :)
Com certeza desculpo pelo capítulo pequeno , mas por favor compense no próximo! Kkk
bjs e uma ótima semana
Resposta do autor:
Obrigada! Tentarei compensar nesse próximo.
Xeros
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