Olá manas maravilhosas!
Tem aí mais um capítulo cheio de emoções fresquinho pra vocês.
Boa leitura!
Beijinhos.
2. Disritimia
Uma fisgada profunda na minha cabeça juntamente com raios de sol machucando minhas vistas me fez acordar. A expiração exalando aquele odor etílico me fez entender que eu já estava ficando velha pra beber tanto assim. Iniciei meu dia com uma típica ressaca.
Meu corpo não tinha forças para levantar sozinho, tomar aquela chuva na noite anterior realmente não me fizera bem. Aliás, várias coisas não me fizeram bem no dia anterior. Sentia que tinha conduzido toda aquela situação de forma errada, e agora não sei o que ela irá pensar de mim.
Ela... aquela menina tão doce, forte, de sorriso tão lindo. Talvez bebesse um pouco demais, fumasse um pouco demais, mas era maravilhosa demais, ela era inteligente, sagaz, e aquele cheiro floral suave, que só de pensar já o sentia em minhas narinas. Pena que nossas roupas estavam molhadas, pois, se fosse do contrário, provavelmente elas estariam com nossos cheiros fundidos, misturados em uma total fluidez.
Abracei o travesseiro como se pudesse dar mais veracidade aos meus devaneios ali naquela cama. Infelizmente tudo aquilo foi rompido de súbito por uma força que me fez despertar totalmente para realidade: MAINHA.
- Olha o troco da cama! Já é hora de levantar visse, passa das 8 da manhã. - Disse entrando no quarto e puxando minhas cobertas -
- Arre égua! Não se pode nem dormir sossegada no domingo mais! - Falei escondendo a cabeça no travesseiro. - Não me bula não! Deixe-me dormir que estou cansada.
- Nada disso, hoje você vai me ajudar a fazer feira. Vá se levantando que não tenho tempo a perder não. - Praguejou saindo do meu quarto. -
E foi assim que meu belo domingo de ressaca etílica e moral iniciou. Tomei um banho rápido para despertar e melhorar o mal estar de ter tomado chuva ontem. Entrei na cozinha e meu pai já estava adiantando o almoço todo animado ao som de Zeca Pagodinho.
- Quando o Canto da Sereia reluziu no seu olhar, acertou na minha veia, conseguiu me enfeitiçar... - E assim ele seguia cantando todo animado limpando umas carnes que pelo visto viraria feijoada. - Tem veneno o seu perfume, que me faz o seu refém, seu sorriso tem um lume, que nenhuma estrela tem... - Me viu chegando e logo deu um sorrisão, meu pai era alto astral, com ele não tinha tempo ruim.
- Bom dia painho! - Disse indo ao seu encontro dar-lhe um beijo no rosto. -
- Bom dia meu denguinho! - Disse sem largar seus afazeres na cozinha. - Como foi seu passeio ontem? - Virou pra trás e me encarou com bom humor.-
- Foi bom, tirando a chuva que tomei no caminho. - Ele nem pode sonhar que eu enfiei cachaça no carro dele pra o fazer andar. -
- Mas como você tomou chuva se você estava de carro? - Falou desconfiado.
- E..E... - Precisava inventar uma desculpa boa. - O motor morreu e eu tive que empurrar até chegar no posto. - Disse tomando uma golada de café preto desesperadamente.
- O motor morreu? Mas eu revisei ele não tem nem uma semana, ele estava tinindo trincando. - Meu pai era mecânico, ele sabia do que estava falando. - E outra coisa, você conseguiu empurrar o carro na chuva sozinha? - Agora ele me pegou na minha mentira mal elaborada. -
- E... E... que... - Socorro preciso de uma mentira pra encobertar outra mentira. - O carro morreu mesmo, não sei o que houve. Mas a Adriana estava comigo e me ajudou a empurrar ele até o posto. Chegando lá o frentista deu uma olhada pra gente. -Mais uma golada desesperada de café preto. -
Ele olhou pra mim com um ar de que sabe que eu aprontei alguma, ele estava preparado pra abrir a boca para fazer sua tréplica, porém mamãe chegou já mandando e desmandando, para meu alívio.
- Já está pronta Toninha?
- Já sim! Podemos ir. - Já disse me levantando quase que instantaneamente.
O sol estava doendo as minhas vistas que estavam desprotegidas pelas lentes dos meus óculos de grau sem proteção solar. Mas confesso que eu amava aquele clima de feira, cheiros misturados, gente pra todo lado, sorrisos, gritos, alegria e ainda apareciam de vez em quando uns repentistas ou violeiros que davam mais vida pra aquele lugar. Tudo aquilo me ajudava a esquecer aquele fim de noite catastrófico.
Saí puxando o carrinho de feira enquanto minha mãe escolhia as verduras e pechinchava com o dono da barraca. Fiquei por um momento parada admirando minha mãe, ela era uma baiana arretada, daí nossa ancestralidade religiosa. Ela veio pra Caicó por causa do meu pai, que nasceu aqui, assim como eu. Ela era uma mulher forte, guerreira que sempre me apoiou e me botou pra cima quando eu estava triste, ela era minha verdadeira heroína.
- Comprou tudo? - Perguntei. -
- Ainda falta passar no supermercado. Mas por aqui acabou-se. - Disse enquanto saíamos do meio do tumulto em direção a nosso bairro.
Andamos debaixo de sol de quase meio dia por cerca de 20 minutos. Até chegarmos no supermercado. Minha mãe saiu na minha frente, meio perdida sem saber pra que lado ia. Vendo aquela situação, resolvi ficar parada esperando se decidir o que colocar no carrinho. Encontrava-me no início de um corredor de bebidas que no final transitava para a seção de congelados. Minha mãe estava em uma ponta e eu em outra, dava pra lhe enxergar de longe. Estava aérea enquanto olhava um rótulo de uma cerveja artesanal de trigo (que particularmente amava), quando de repente ouço um barulho de garrafa caindo no chão, não chegou a quebrar, mas o estrondo foi forte o suficiente pra me tirar dos meus devaneios.
Virei-me bruscamente quando me deparo com a seguinte cena:
Mariana ali do meu lado, com um óculos escuros que tampava quase que seu rosto inteiro, pela cara ela devia ter acabado de acordar. Estava tentando equilibrar nos braços a garrafa de Jack Daniel's que acabara de deixar cair, uma garrafa de energético, dois maços de Luke Strike e para completar um pacote enorme de Doritos.
Confesso que como "quase médica" me assustei com a quantidade de produtos nocivos a saúde que havia em suas mãos, era praticamente uma bomba tudo aquilo. Mas antes daquele julgamento, é claro que eu, como uma boa pisciana acabei dando uma mancada ao me deparar com ela e acabei deixando cair à garrafa de cerveja que eu estava segurando, porém, não tive tanta sorte como ela. A garrafa quebrou bem no meu pé, que por acaso estava calçado com chinelos de dedo.
- Ooooh praga! - Praguejei e em seguida me abaixei pra ver se não tinha me cortado. -
- Você se machucou Antônia? - Mariana me encarou preocupada se abaixando. - Ta tudo bem? - Me olhou nos olhos. -
- Oii... - Fiquei emudecida com ela tão próximo assim de mim. - Não machucou, só ta doendo. - Me levantei desajeitada após tirar os cacos de vidro de cima do meu pé. -
Ela se levantou ao mesmo tempo, sem tirar os olhos de mim. Permanecemos ali, mudas, sem jeito e com a respiração ofegante por alguns instantes, até sermos despertadas por minha mãe desesperada, como toda boa mãe quando seu filho(a) deixa cair uma garrafa de vidro no próprio pé.
- O que aconteceu aqui? - Disse olhando pra mim. - Mas é lerda mesmo! - Obrigada pelo carinho mãe. - Olha quem está aqui! Tudo bem com você querida? - Se dirigindo para Mariana.
- Oii dona Tereza. Eu vou bem, e você? - Disse com uma intimidade que confesso, me assustou. -
- Eu estou aqui na labuta né minha filha? - Olhou pra mim totalmente alheia àquela situação. - Essa é a minha filha que acabou de voltar de São Paulo. -Colocou a mão no meu ombro enquanto olhava pra ela. - Antônia, essa é Mariana. Mariana, essa é Antônia, minha filhota. - Sorriu olhando para nós duas. -
- Prazer em conhecê-la Antônia! Bem vinda de volta. - Ahhh miseravi! Está fingindo que não me conhece agora?! - Se vocês me derem licença, eu tenho que ir. - E saiu andando rapidamente.
Fiquei estática, acompanhando com os olhos ela ir embora. Talvez tenha ficado ali tempo o suficiente pra minha mãe entendesse o que se passava.
- É uma boa menina, nem parece que é filha daquele ordinário. - Olhando pra ela indo embora. - Pena que ela está entrando na bebida, deve ser de desgosto com um pai daquele.
- É... - Disse sem prestar a mínima atenção no que minha mãe acabara de falar.
Minha mãe ficou me encarando com a mão na cintura esperando uma satisfação da minha cara de cachorro olhando pra máquina de frango assado.
- O que foi? Ta me encarando por quê? Oxe!! - Desvencilhei. -
- Já tava se assanhando pra cima da menina não é abestada! - Me disse ainda me encarando com a mão na cintura. -
- Eu? Você ta vendo coisa onde não tem mãe. Nem conheço a moça. - Agora quem fingiu que não a conhecia fui eu. -
- Eu conheço a cria que eu tenho! A quanto tempo você conhece ela? - Me pressionou com seu olhar fulminante.
- Está bem! Você ganhou! Conheci a Mari ontem por acaso no campus da faculdade. - Soltei tão rápido que dificultou a clareza das palavras.
- Mari? Já está nesse nível de intimidade? - Eu ia me defender, mas ela me cortou e continuou. - Olha Toninha, ela é uma menina muito boa, mas não é bom se meter por causa daquela família. É caçar sarna pra se coçar. - E saiu andando com o carrinho de compras e me deixando para trás.
Depois desse encontro desastroso e da conversa com a minha mãe, passei o resto do dia pensativa, apenas queria poder falar com ela, pedir desculpas pela forma com que eu saí sem jeito, sem muito me despedir, sem justificar o porquê de eu ter arrancado o carro sem dizer tchau, sem pedir seu telefone, sem dizer o quanto gostei de conhecer ela naquela noite... como eu amei conhecer ela. Mas a essa altura do campeonato, após saber de quem eu era filha, ela já deveria ter compreendido a minha ação.
"- C.C.Co.Como s.seu pai chama?
- Paulo Sérgio. Por quê? Você o conhece? - Me perguntou confusa. -
Acenei com a cabeça confirmando que o conhecia. Continuei em silêncio me sentindo perdida, em meio ao rancor de lembrar do que aquele homem fez com o meu pai. Ela me olhou de uma forma doce, mas preocupada com a minha expressão.
- Antônia, ta tudo bem? - Acariciou meu rosto com sua mão. -
- Eu acho melhor você descer. - Disse olhando pra baixo. -
Ela me olhou meio sem entender o porquê daquela minha atitude grossa. Ainda tentando entender o que acontecera para eu mudar de humor repentinamente, perguntou.
- Tem certeza que está tudo bem?
- Eu só quero chegar em casa. Por favor... - Disse ríspida, sem olhá-la nos olhos. -
Ela saiu em silêncio, provavelmente magoada, confusa e com raiva daquela minha atitude totalmente grosseira."
Paulo Sérgio é vizinho dos meus pais a 2 anos, e mais precisamente a 1 ano meu pai estava na rua lavando a caminhonete da sua oficina, quando Paulo Sérgio tentou ultrapassar um carro que vinha andando na rua estreita de mão única e acabou atropelando meu pai que estava próximo do meio fio. Meu pai foi pressionado entre o carro dele e a caminhonete, teve 3 costelas quebradas, rompimento do baço, lesão no intestino além de várias escoriações. Ele ficou internado dois meses tomando antibióticos para não correr o risco de gerar uma infecção generalizada por causa da colostomia que ele teve que fazer devido às lesões intestinais. Paulo Sérgio não prestou socorro. Meus pais entraram na justiça, mas o caso foi arquivado devido aos excelentes advogados do pai de Mariana.
Estava deitada na rede na varanda pensando em como minha atitude foi estúpida. Minha mãe e meu pai gostavam da Mariana, eles não a discriminavam pelo caráter do pai. E eu deveria ter feito o mesmo naquele fim de noite. Mas naquele momento me encontrava de mãos e pés atados, não sabia como encontrar ela para me desculpar. Não poderia bater na porta da casa dela. Precisava arrumar um meio de conseguir me comunicar.
Nós morávamos praticamente uma de frente pra outra, da porta da minha casa eu conseguia ver as janelas da sua, se as luzes estavam acesas, se não estavam. Uma proximidade tão grande e tão inútil ao mesmo tempo. Maldita tecnologia que nos permite as primeiras aproximações basicamente por redes sociais.
- É isso! Claro! Facebook! - Disse para mim mesma correndo procurar meu celular.
Busquei pelo seu nome, mas era inútil, era um nome muito comum. Pesquisei então pelo evento do qual participamos ontem, e nada... Então resolvi recorrer a minha hippie preferida, que era a sapatão mais antenada de Caicó.
Peguei o carro e segui rumo à república da qual Adriana morava. Mais conhecida como República Checa. Não era longe dali, era praticamente no bairro vizinho. Apertei o interfone e outra voz atendeu, provavelmente alguma das moradoras.
- Eu queria falar com a Adriana. Ela está? - Perguntei. -
- Ela foi na padaria mas daqui a pouco ela deve voltar. Pode subir! - Uma voz que eu não reconheci falou. -
Subi as escadas até o terceiro andar. Era um prédio antigo, espaçoso, mas precisava urgentemente de reformas, fazendo daquele prédio uma opção barata para estudantes, aquele lugar era dominado por repúblicas e suas festas eram inevitáveis.
Quem abriu a porta pra mim foi uma moça muito bonita, de cabelos Black Power, negra, maravilhosa, de um vestido laranja que fez ressaltar ainda mais a sua pele. Ela sorriu simpática a me ver, como se já me conhecesse.
- Olá! Você deve ser a Antônia não é? A Adriana fala muito de você. - Confesso que me espantei com aquele comentário - Entra, fica a vontade! - Me deu passagem. -
Como já era de se esperar, estava rolando uma mini festa na República Checa. Cerveja para todo lado, algumas mulheres jogadas no sofá, outras sentadas no chão conversando em um clima amistoso. Entrei meio acanhada, cumprimentei todas com um "Oi" coletivo. Sentei-me em um cantinho mais discreto sem chamar muita atenção.
A moça que me atendeu viu aquela cena da menina tímida que não conhecia ninguém ali e de certa forma ficou comovida e veio ao meu encontro com duas garrafas long neck de cerveja nas mãos.
- Hey! Você aceita? - Me oferecendo uma cerveja se sentando do meu lado. - Eu acho que eu não me apresentei, meu nome é Júlia! - Sorriu. -
- Prazer em conhecê-la Júlia! Você mora aqui também? - Perguntei tentando socializar enquanto bebia minha cerveja. -
- Mais ou menos. Eu fico mais aqui do que na minha casa.
- Então você é muito próxima das meninas não é? - Indaguei. -
- Sim! Eu namoro a Adriana. - Sorriu timidamente. -
Aquele momento eu só estava afim de esganar minha amiga! Como ela não me conta que estava namorando? Eu já deveria ter desconfiado que elas tivessem algo. A Adriana não é de falar muito sobre os seus amigos pra qualquer pessoa.
A conversa seguiu de uma forma muito agradável. Júlia era extremamente simpática. Contou-me um pouco sobre a sua vida, de como acabou parando em um curso de Ciências Políticas na UFRN e sobre sua pesquisa de campo em comunidades quilombolas no norte da Bahia. A conversa fluía como se já estivéssemos nos conhecido há tempos. Após muita conversa, Júlia pediu licença e foi verificar se o quibe vegano que ela estava fazendo estava pronto.
Enquanto isso, já mais entrosada, resolvi dar uma espiada na paisagem na varanda do apartamento. O que eu não esperava era que eu estivesse enganada desde que eu entrei naquela república. Tinha sim uma pessoa que eu conhecia naquele lugar. Ela estava linda como sempre, com seu jeito despojado, cabelos lisos, compridos, enrolados em um coque desgrenhado, camisa cinza do Led Zeppelin (sua banda favorita), de short jeans e de pés no chão, admirando a paisagem enquanto se deleitava em um trago do seu Malboro.
- Oi An! O que você anda fazendo por aqui? - Disse terminando o cigarro. - Bem, eu acho que ontem a gente nem teve tempo de conversar né? - Sorriu sem jeito. - Eu posso te dar um abraço? - Me olhou esperando pela minha resposta. -
- Oi Isa! - Meio desconcertada. - Eu estou esperando a Adriana. Precisava falar com ela. - Sorri. - Oxe! Claro que você pode me dar um abraço mulher! - Abri meus braços. -
Ela retribuiu o meu sorriso e veio ao meu encontro me abraçar. Um abraço sem jeito, com um certo nível de estranheza, mas logo me lembrei da familiaridade daquela troca de energia que tinha anos que já não tínhamos.
Isadora e eu namoramos por 1 ano e meio, entre idas e vindas. Ela foi realmente uma pessoa da qual eu tinha muito carinho ainda, isso eu não negava. Mas não soubemos conduzir o relacionamento da forma como devíamos. Eu sempre fui calma, pé no chão e um pouco desapegada, Isa, por outro lado era totalmente passional e insegura. E essa insegurança alavancava um ciúme nada saudável. Ela era super carinhosa comigo, companheira, mas seus surtos não eram nada agradáveis, principalmente quando ela soube que eu iria me mudar para o outro lado do Brasil. Propus terminar o namoro, não queria vê-la sofrendo comigo à distância, mas ela foi irredutível, ela queria continuar comigo mesmo sabendo que eu não tinha dinheiro pra ver ela com regularidade. Após minha mudança pra Ribeirão Preto conseguimos sustentar essa situação por 4 meses. Além de estar longe, o curso em horário integral roubava grande parte do meu tempo, eu não tinha como dar a atenção que ela merecia. Resultando em um término conturbado via webcam, com direito de juras de ódio eterno. Ela não conversou mais comigo depois disso, me bloqueou de todos os meios de comunicação, seis meses depois, no natal, ela me ligou transtornada falando que não agüentava viver separada de mim, fui realista, um pouco ríspida talvez, mas não existia possibilidade de dar certo àquilo. Mais uma vez, ela amaldiçoou de todas as formas possíveis, e dessa vez realmente, não nos vimos mais, até a minha volta. Eu não guardava rancor ou mágoa, mas eu tinha medo de como ela reagiria a me ver de novo.
- Bem vinda de volta! - Sorrindo e olhando pra mim. - Você está ótima! - Disse sem jeito. -
- Você também está! - Isadora realmente era uma mulher muito bonita. - Você mora aqui com a Adriana? - Perguntei curiosa. -
- Não! Eu moro sozinha no apartamento do andar de cima. Finalmente consegui sair de casa. Estou trabalhando num restaurante no centro da cidade.
- Mas que notícia maravilhosa hein. Fico feliz por você... de verdade. - Fui sincera.
- Valeu An, quando estiver passando por essas bandas, se tiver afim, dá um pulo lá em casa. - EU ESTOU PERPLEXA COM ESSA OUSADIA. -
Aconteceu uma coisa atípica nesse momento, a sorte soprou a meu favor. Antes que eu pudesse responder, vi de relance a Adriana entrando no apartamento e logo fui ao seu encontro.
- Arre égua mulher de Deus! Você foi à padaria ou foi construir uma? - Disse abraçando-a. -
- Eu nem sabia que você estava me esperando aqui. - Me encarou séria. - Aconteceu alguma coisa Toninha?
- Eu preciso da sua ajuda com uma coisa particular. Será que a gente pode conversar em algum outro lugar. - Sussurrei entre os dentes. - A Isadora está aqui.
- Ela vive aqui em casa por causa das outras meninas que moram aqui. Coisa de lésbica... adora tomar uma cerveja em bando. - Olhou pra mim pensativa. - Vamos dar uma volta lá na praçinha. - Disse já me arrastando. - Não demoro minha neguinha! - Disse para Júlia. -
Saímos do prédio e na rua eu já comecei a explicar toda a história para minha amiga. De como a situação do carro se criou, do clima romântico debaixo de chuva que eu beijei a Mariana, dos nossos amassos, da despedida catastrófica e do nosso encontro inesperado no supermercado em companhia de mainha.
Eu ia contando e o queixo de Adriana ia caindo mais e mais. Pelo visto ninguém esperava que a gente tivesse se beijado naquele dia.
- Bichinha, mas eu to é passada com essa história. - Disse enquanto nos sentávamos num banco de cimento na praça. - Confesso que eu percebi desde a hora que você chegou que seus quatro olhos não desgrudavam da Mari, mas eu não imaginaria que ela iria te dar bola.
- Oxe! Mas ela é uma pessoa tão impossível assim é? - Perguntei intrigada. -
- Não sei se impossível é a palavra certa... ela é uma pessoa muito fechada quando o assunto é a vida pessoal dela. Ela é muito social, simpática, mas quando é pra falar algo da vida dela, ela fica séria, se fecha. Ela é um enigma. - Completou. - E várias meninas tentaram se aproximar dela, mas nada. Por isso todas estávamos olhando a conversa de vocês de rabo de olho.
- Nossa, eu não imaginava mesmo. Realmente tem alguma coisa nela que eu não consegui decifrar.
- Pois tente, que sua amiga vai te ajudar! - Disse sorrindo e me olhando nos olhos. - Se ela deixou você se aproximar assim dela deve ser porque algo especial surgiu na conexão de vocês. - Fez silêncio pensando em algo. - Você vai encontrar ela na ocupação, ela está ficando lá o dia inteiro, por causa das férias.- Olhou pra mim otimista. - Mostra pra ela que você é intensa! - Caímos na gargalhada.
Voltei pra casa pensando em tudo o que Adriana falou, "e se realmente tivéssemos uma conexão especial?" Isso explicaria o porquê de que ela não saía da minha cabeça, aquele sorriso, aquele toque, aquele cheiro, aquele carinho tão doce com uma pessoa quase desconhecida. Algo me pedia pra ir a fundo e explorar toda aquela história.
Meu sono foi conturbado devido à ansiedade de que segunda-feira chegasse logo. Eu não sabia ao certo que horário ela iria estar ocupação, então resolvi acordar cedo e ir até lá. Acordei meus pais já haviam saído pro trabalho, melhor assim, não precisaria dar satisfação para onde estava indo e nem que horas iria voltar. Tomei um café reforçado e segui até meu destino, mas antes resolvi passar numa floricultura. Meu pedido de desculpas seria o mais "fofo" possível.
Cheguei na ocupação por volta de 9 horas da manhã. Era um casarão enorme que havia sido abandonado há muito tempo, mas ele aos poucos estava ganhando cara nova, com cores, plantas e decorações diversas. Percebi que o portão da garagem estava aberto e havia uma movimentação de mulheres no local. Pelo visto já haviam começado a trabalhar.
Respirei fundo várias vezes antes de me direcionar a entrada da ocupação. Enfim segui, atravessei a rua, entrei porta adentro. Todos os olhares direcionados para mim por ser uma cara nova ali e também por causa das flores que carregava em meus braços. Buscava com os olhos algum vestígio de Mariana mas não encontrei. Me dirigi até uma moça que estava próxima de mim.
- Olá, bom dia! Será que você pode me informar se a Mariana já chegou? - Perguntei educadamente. -
- Qual Mariana? Temos várias aqui. - Disse enquanto olhava pro bouquet na minha mão.
- Ela tem 18 anos, morena, cabelos compridos, dizem que ela faz parte da organização daqui. - Falei meio perdida. - Ela é linda, muito linda.
Ganhei um olhar de desconfiança da moça que nem precisou se pronunciar pois a voz que eu ouvi atrás de mim já foi o bastante pra entender que eu achei quem eu procurava.
- Antônia... o que você está fazendo aqui. - Perguntou Mari com um balde de tinta na mão e na outra um rolo de pintura. -
Virei-me lentamente até consegui-la ver por completo. Deixei escapar sorriso de orelha em orelha, dei um passo a frente olhando-a nos olhos. Eu suava frio, tremia, as palavras me fugiam da boca, mas eu precisava me expressar da melhor forma possível.
- Eu... vim aqui te pedir desculpas pela noite de sábado. Eu não queria ter sido estúpida com você. Eu amei te conhecer, você é uma mulher incrível e eu não quero que você se sinta magoada... me perdoa Mariana? - Estendi as flores para que ela pudesse pegar. - Eu sei que parece algo idiota trazer flores depois de ter feito uma burrada, mas eu achei eles tão parecidos com você.
- Girassóis... - Disse pegando o arranjo da minha mão. - Você me acha parecida com eles? - Deu um leve sorriso. -
- Sim, você é radiante igual eles... Você é solar. - Senti meu rosto queimar de vergonha. -
Ela olhou pras flores, sorriu sem graça e depois voltou o olhar pra mim já séria.
- Por que você fez aquilo? Por que agiu daquela forma quando eu falei o nome do meu pai? - Falou com um resquício de mágoa. -
- Eu sei... não deveria ter te tratado assim, foi uma total grosseria da minha parte. Eu fiquei sem reação. - Respirei fundo. - Eu não deveria ter te julgado por uma coisa que seu pai fez com meu pai. - Completei. -
- Oi? O que meu pai fez com Sr. Amaro? - Ela me questionou totalmente perplexa. -
- Como? Você não sabe quem atropelou meu pai um ano e meio atrás? E ainda por cima não prestou socorro e... - Ela me interrompeu. -
- Antônia! Eu não sabia dessa história. - Seu semblante estava totalmente desnorteado. -
- Como você não sabia? Foi na nossa rua. - Falei sem entender bem como ele conseguiu esconder aquela informação tão séria da própria filha. -
- Um ano e meio atrás eu não estava em casa. - Disse deixando uma lágrima cair. - Mas não me surpreende essa atitude inescrupulosa do meu pai. - Abaixou a cabeça. -
- Oxe... onde você estava onde tudo isso aconteceu então? - Estava totalmente confusa como ela.
- Eu estava na radioterapia. - Me olhou enquanto outra lágrima caía. -
- Radioterapia? - Disse com um fio de voz. -
- Sim, por causa da leucemia...
Fim do capítulo
E aí minha gente!
Essa história é quase um drama mexicano né? hahahahahaha
Quero agradecer o carinho de todas vocês que aqui no Lettera ou no Facebook me dão feedbacks sobre a história. Tô amando esse carinho maravilhoso <3
Beijinhos e até semana que vem!
Comentar este capítulo:
Carol The M
Em: 19/10/2018
Meu Deus, cada reviravolta! Tô passany! Adorando o rumo dessa "novela mexicana" hahaha!
Beijos!
Resposta do autor:
Romance sapatônico sem drama não existe né? hahahahahahaha
Beijos!
[Faça o login para poder comentar]
Deixe seu comentário sobre a capitulo usando seu Facebook:
[Faça o login para poder comentar]