POV Nanda

            Passei a semana toda no meio da Chapada Diamantina em um treinamento de sobrevivência com uma atriz famosa da TV brasileira e sua equipe de filmagem. A ideia seria gravar um piloto e se fosse aprovado eu iria fazer parte do programa como consultora.

            Estava esperando o meu mochilão na esteira de bagagens e quando ligo meu celular sou bombardeada com inúmeras mensagens e ligações. “FUDEU, FUDEU, FUDEU!”.   Antes de qualquer coisa Carlão me liga e diz que João surtou e quer sair de casa e que, a pedido da minha esposa, meu filho está detido e não passa da guarita do segurança.

—  Pequena, o que aconteceu? – ligo preocupada.

—  Amor... Nanda... vem pra casa... – minha menina quase não conseguia falar.

—  Filha, vem direto pra casa. – minha sogra fala. – João descobriu que é filho do Vitor e tá de malas prontas pra ir morar com ele.

—  MASOQUÊ?

—  Ele está sentado no meio fio da calçada dentro do condomínio, completamente alterado. Os seguranças não deixaram ele sair antes que você chegue.

—  Tô quase chegando madrinha, mais meia hora e eu to ai. Não deixa ele sair. Tenta levar ele para a sua casa.

—  Certo, filha. O Carlos Eduardo tá em Brasilia, se estivesse aqui seria mais fácil porque o João escuta muito ele.

—  Carlão já deve estar chegando ai para ajudar.

—  Te esperamos aqui. - desligo o telefone e uma sensação ruim me toma.

POV Ana Clara

Eu me sentia completamente impotente. Só conseguia chorar. AnaBea me amparava falando palavras carinhosas ao meu ouvido. AnaLu caminhava de um lado ao outro falando ao telefone com Alex. Luiza estava no set de filmagens de uma nova superprodução da Marvel onde ela seria a nova heroína e não podia falar. Mazé e minha mãe falavam baixinho em um canto.

—  A Nanda tá chegando. – Alfredo chega e fala.

—  Vem, filha, vamos lá para casa. – mamãe me pega pelo braço e eu me sentia horrível. Toda inchada de tanto chorar e com o nariz entupido. Só queria estar nos braços da minha esposa.

O curto caminho entre as duas casas foi feito em silencio. Só se ouviam meus soluços. O sentimento de todas nós era um misto entre tristeza e raiva. Na sala da casa dos meus pais João estava sentado no sofá com a cabeça entre as mãos. Carlão estava em pé ao seu lado.

—  Alguém pode me falar o que aconteceu?

POV Nanda

—  Alguém pode me falar o que aconteceu?  - pergunto séria, Clarinha se atira em meus braços e Summer começa a chorar alto.

—  Desculpe, tia eu não devia ter contado eu...

—  Calma, lindinha... – falo para minha “sobrinha”. – Agora vá na cozinha com Mainha e madrinha. Tome algo pra se acalmar, ok? Carlão, pode ir... depois falo com você. – meu amigo concorda e nos deixa sozinhos. – João, pode falar.  – sento no sofá a frente do meu filho com Clarinha no meu colo.

—  Vocês mentiram pra mim. – ele fala magoado e chorando. – Vocês falaram que nunca mentiriam. Meu pai não é o Fernando. Meu pai é o Vitor. Você teve um lance com ele, mesmo ele sendo namorado da Ana Clara – ele cuspia as palavras e minha esposa choramingava no meu pescoço. Aquilo a estava matando.

— E você acha que isso é verdade?

—  Tá comprovado! Tem o DNA. – ele falou com raiva.

— Você só vê provas, né? Então você vai ficar quieto para me escutar.  Amor, fica com as meninas... – minhas filhas abraçaram a mãe e eu me levanto. – João nós nunca falamos nada a vocês, e principalmente a você, porque não queríamos te traumatizar. Eu vou contar tudo. – ele me olhava em expectativa. - Vitor era amigo de infância da sua mãe. Ela até tinha sentimentos por ele, mas nós duas descobrimos que estávamos apaixonadas. Ele sempre foi aquele tipo de homem machista e homofóbico. Em uma noite ele tentou estuprá-la. – meu filho arregala os olhos – Não conseguiu porque estávamos todos na casa de praia.  Seu padrinho Chico ajudou a evitar o pior.

— Mas que filho da puta... – AnaLu fala com raiva. – Vou pegar aquelas muletas dele e enfiar no seu cu arrombado!

— AnaLu! – falo e minha filha fica quieta. – O Vitor se tornou pior do que já era. Começou a usar drogas e se juntou ao seu Manoel para nos separar. Sim, João. Ao seu biso. – João me olhava cada vez mais incrédulo. – Contratou umas putas que me sedaram e tiraram fotos comprometedoras. Isso fez com que sua mãe e eu ficássemos separadas por algum tempo. Mas eu não consigo ficar longe da sua mãe.... ela é o meu raio de sol. Sem ela eu não sou eu. Mesmo estando casada com outro, nós nos amávamos. – não quis contar do abuso sofrido pela minha esposa. Não era hora. – Quando nós iriamos ficar juntas novamente.... eu cai em uma emboscada.

— Como assim?

— Eu voltava de Nova Iguaçu e uma falsa blitz fez eu parar. Eles me sequestraram e fiquei em um barraco por várias semanas. – tiro a minha camiseta ficando apenas de top. – Essas marcas, essas cicatrizes.... foi ele que fez... todos os dias.... ele me torturava.... e me violentava. – minha esposa soluça mais alto, minhas filhas e meu filho choram em silêncio. – Consegui fugir mas cai em um barranco e fiquei desacordada. Eu perdi a memória e me encontrei... nua... com frio.... sem saber quem eu era... só sabia que devia fugir. Fiquei sozinha na floresta me escondendo até que a sua tia Bruna me encontrou. Fiquei com ela e achava que meu nome era Ana Clara. Porque eu tinha essa corrente.

— E ele?

— O importante foi que nós viemos para a capital, encontramos sua vó que me reconheceu... cuidou de mim.... Quando eu descobri que estava gravida em nenhum momento pensei que seria algo ruim. João, você foi o meu presente. – me sento ao seu lado. – Você me deu razão para viver.

— Quando eu achei sua Mainha e soube que você estava vindo... que estava dentro da barriga dela... eu só conseguia pensar que você era nosso. NOSSO filho. Apenas isso. Nosso amor. Nosso menino. – Clarinha falava enquanto João se ajoelhava aos seus pés.

— Mãe... mãe... desculpa... eu sou um babaca... mãe – ele se abraçou na cintura da minha esposa. As meninas se abraçaram a ele e a ela.

— Eu amo vocês. – ela diz. – Meus bebês.

— João, tudo o que você quiser saber a gente vai contar. Não contamos antes porque vocês eram muito pequenos e tínhamos medo da reação de vocês. Foi um erro. Deveríamos ter contado.

— Mainha desculpe.... – meu filho pedia inconsolável. Me ajoelho ao seu lado e braços reconfortantes me acalentam. Minha família. Meus amores.

— João, nunca mais.... nunca mais fale com a mamãe do jeito que você falou. – AnaLu dizia séria.

— Eu prometo, nunca mais. Eu amo vocês. Me perdoem por favor. Me perdoem... – a emoção era grande e ficamos os cinco abraçados por muito tempo. Decidimos fazer como antigamente e ficar na casa da minha sogra em uma grande festa do pijama com direito a filme de terror, pipoca e refrigerante. Era uma forma de estreitar os laços familiares. Era uma forma de mostrarmos que nós amávamos uns aos outros.

No meio da noite acordo com minha esposa, AnaBea e os pugs enroscados em mim. Procuro meus outros filhos e não os acho. A casa esta silenciosa e procuro meu celular para ver as horas. O encontro embaixo do Sabrino e vejo que são três horas da manhã. Levanto para fazer xixi e ver se meus filhos estão na cozinha. O celular toca e eu atendo.

— Mainha vem pra cá! João fez uma besteira! – AnaLu gritava desesperada.

— AnaLu onde vocês estão?

— Na casa da Summer.

Fim do capítulo