Lentes Escuras por EriOli
Capítulo 1
Capítulo 1
O
som estridente fizera com que acordasse. Ergueu a cabeça com dificuldade devido a forte pontada em sua fronte, o som continuava e tudo ainda estava turvo. Focou as mãos com certa dificuldade, uma ensanguentada e a outra portava um objeto metálico. Apertou novamente os olhos e a nova pontada fora ainda mais forte, abriu-os novamente e só então fora capaz de enxergar o cenário em que se encontrava.
Assustou-se ao olhar para o banco do passageiro e encontrar o corpo de seu marido sem vida. Tapara a boca de forma instintiva ao ver as perfurações de bala e só então percebera a pistola que segurava. Sua cabeça girava sem entender o que realmente estava acontecendo, havia batido o carro, ou ao menos era o que podia supor, já que estava no banco do motorista, a cabeça doía e os cortes feitos pelos estilhaços do para-brisa sangravam ajudando a manchá-la ainda mais as roupas.
Novamente o ruído voltou a ecoar. Seguiu o som e procurou pelo aparelho e este estava jogado ao chão do carro. Ainda tremia por ver o rosto de Bruno, desfigurado. Número desconhecido. Indicara a tela brilhante. Atendeu. Mesmo com toda a dor que sentia, imediatamente ao desligar obrigou-se a sair pela janela do carro, já que a porta estava emperrada. Depois de se deixar cair sobre o chão de cascalho olhara ao redor e certificou-se que não havia ninguém por perto ou passando, então não pensara duas vezes antes de se embrenhar por entre a mata que se estendia as margens daquela rodovia.
Uma hora mais tarde, os paramédicos e a polícia rodoviária chegaram ao local depois de serem chamados. Em seguida, apareceram os curiosos e não tardou para que a televisão e os repórteres dos jornais também viessem. A cena incomum chamara a atenção e logo o suposto acidente estava sendo noticiado na TV e na rádio, abutres sensacionalistas atrás de mais uma história de imprudência. A princípio parecera se tratar de mais um acidente com uma vítima fatal, porém essa possibilidade fora descartada quando os paramédicos observaram as perfurações de balas no corpo encontrado no carro. Depressa a área fora isolada para que as provas fossem preservadas e uma treinada equipe da Delegacia de Homicídios fora chamada.
— Bom dia, Delegado Vilhena, Agente — o Primeiro Sargento cumprimentou os recém-chegados.
— Bom dia, Sargento. Qual a situação? — Perguntou o Delegado.
— Provavelmente um assassinato, senhor. Já isolamos a área e apenas um dos paramédicos se aproximou da vítima, o mesmo é quem relatou as três perfurações de bala, não sabemos se a vítima foi morta no carro ou apenas desovaram o corpo nesse local.
— Ok, Sargento assumimos daqui.
— Senhor!— respondera o oficial. Despediram-se com um menear de cabeça.
O delegado ajustou os óculos contra o nariz e volveu-se para a agente que caminhava ao seu lado.
— Alencar, você ficará responsável pela equipe de peritos criminais e pela a instauração do inquérito — ordenara antes de resmungar — Maravilha! Um caso desses era tudo que precisava a poucos dias da minha aposentadoria — dissera com sarcasmos.
— Sim, Delegado — foi tudo que Sylvia respondeu enquanto se dirigia a equipe, que já fotografa todas as minúcias da cena, ainda pudera ouvir o resmungar do Delegado, mas apenas continuara seu caminho.
Conversou com a equipe de peritos e chamou novamente os policiais e paramédicos, que foram os primeiros a chegarem ao local, e começou a apurar seus depoimentos. Passaram a manhã e boa parte do almoço recolhendo provas e esquadrinhando todo o local minuciosamente. Sentia-se cansada, mas estava animada com a oportunidade. Seria seu primeiro caso, comandando uma equipe, desde que terminara sua especialização em Perícia Forense, uma grande chance e isto com toda a certeza a deixava incrivelmente em êxtase. Afinal, o sucesso e a honra eram resultado de trabalho árduo e ela faria o melhor possível, ainda pensava nessa nova fase que se apresentava, quando ouviu o perito-chefe chamar-lhe.
— Encontramos a possível arma do crime, e também as capsulas e os documentos da vítima e de mais uma pessoa, além de um rastro de sangue com pegadas que seguem em direção à mata.
— A porta esquerda está abrindo?
— Não, com a forte batida ela contraiu impedindo que se abra — respondera o agente.
— Isso quer dizer que havia mais alguém nesse carro, e pelas manchas de sangue na porta esquerda e os rastros que encontraram, podemos presumir que esta pessoa, mesmo ferida, jogou-se sobre janela, fez todo este trajeto e embrenhou-se na mata — analisou indicando os pontos exatos de cada detalhe.
— Precisamente — concordara o perito. — Podemos liberar o corpo para o IML? Já terminamos de recolher as provas e aqui estão os documentos.
Sylvia pôs as luvas e recebeu o saco plástico que o perito lhe estendia e ordenou que empacotassem a suposta arma usada no crime, uma pistola 9mm Glock G17. Observou primeiramente a identificação da vítima, Bruno Chagas, Assessoria Empresarial, dizia o cartão de visitas. A carteira de motorista confirmava o nome da vítima, 38 anos, pelas contas que fizera. Ao passar para a próxima identidade, seu coração disparara e sua cabeça deu uma volta de 360 graus, não era possível. Não poderia ser! E de repente foi como se houvesse sido transportada ao primeiro ano da Faculdade de Física, quando a conheceu.
Helena Libardi. A garota mais linda e descolada que já conhecera na vida, se Sylvia tornara-se mais espontânea, Helena com toda a certeza tivera grande participação nessas mudanças. Bom, pela foto a reconhecera, um pouco mais velha era fato, no entanto, jamais esqueceria aquele rosto, mesmo que agora seu sobrenome constasse como Chagas e não Libardi. Devia ser a esposa. Esposa?! Perguntou-se e riu desse pensamento, uma informação assim sobre Helena era mesmo surpreendente, o caso começara a ficar mais interessante do que poderia imaginar.
Mais tarde, recolhida ao seu próprio cubículo na Delegacia, Sylvia analisava os depoimentos e os documentos encontrados na cena do crime e pensava naquela estranha coincidência. O que será que acontecera com Helena desde que ela saíra da universidade? E por que cargas d’água uma pessoa que sempre fizera questão de apregoar sua sexualidade, estaria casada com um homem? Essa era a pergunta que não queria calar. Não era um fato principal, mas era um fato a se considerar.
As primeiras impressões sobre o caso indicavam que o suposto autor do crime esteve naquele carro, porém, isto é apenas uma primeira impressão e como diria seu avô, tudo nem sempre é o que parece. E a dúvida é o que sempre carregava consigo. Observou novamente o cartão de visitas encontrado e decidira que na manhã seguinte começaria fazendo uma visita ao escritório de Bruno Chagas.
No dia seguinte, Sylvia acordara cedo, a manhã ainda era carregada pela escuridão, porém ela ignorou tudo isso, pois o sono já se havia distanciado. Arrastou-se para fora da cama e procurou seus afazeres matinais. Algum tempo depois já estava devidamente vestida, então se dirigiu a cozinha e aspirou o cheiro do vazio, eram assim todas as suas manhãs. Ela precisava de um esforço sobre-humano, para sentir-se encorajada a enfrentar sua rotina diária. Não era como se não gostasse do que fazia, mas havia muito tempo que sentia falta de algo a mais em seu dia-a-dia.
Às oito horas da manhã chegara à delegacia, despachou a papelada em sua mesa e saiu em busca do escritório da vítima. Mais ou menos meia hora mais tarde estacionava em frente ao endereço que pegara na ficha do caso. Seguiu até o prédio comercial, se dirigiu à portaria e pediu informações sobre que direção seguir a fim de encontrar a sala indicada no cartão. Após subir três lances de escadas adentrou por um corredor, quatro portas a frente deparou-se com um grande banner grudado na porta de vidro fosco. A & S Aluga! Dizia o anúncio acompanhado de números de telefones.
Sylvia permaneceu imóvel, poderia ficar confusa com o que viu, mas não era o que sentia. Com a crescente onda de empresas fantasmas, essa não seria a primeira. Anotou os números e desceu, voltou à portaria para sondar e tentar obter mais alguma informação. Aproximou-se do balcão onde um rapaz que parecia não ter mais que uns vinte anos de idade, estava mais interessado em seu aparelho de celular do quê prestar atenção na movimentação do prédio, talvez não conseguisse nada, mas não custava tentar. Sylvia pigarreou chamando a atenção do rapaz, que imediatamente ajeitou a postura para atendê-la.
— Posso ajudá-la?
— Bom, eu vim deixar um currículo em uma empresa nesse prédio, mas eu cheguei lá e tem uma placa de aluguel, sabe se eles mudaram de endereço? O nome da empresa é Chagas Assessoria.
— Qual o número da sala e o bloco? — ele perguntou mexendo em seu computador.
— Sala 101, bloco C.
Respondeu e ele rapidamente digitara, depois de alguns segundos ele se voltou para ela com uma expressão de dúvida.
— Tem certeza que é este endereço? Pois aqui só consta que a sala pertence a uma imobiliária que geralmente aluga a sala para reuniões.
— E sabe me dizer se ela foi alugada recentemente?
Indagou e esperou que ele checasse.
— De acordo com a agenda ela foi alugada no mês passado por sócios de uma empresa de taxi aéreo. Mas... — fez uma pausa — Parece que estão querendo abrir um heliporto próximo às docas — ele dissera em tom de confidência — pelo menos foi o que o faxineiro amigo meu, ouviu pelos corredores. E talvez vão precisar de gente pra trabalhar mesmo — completou e sorriu gentilmente.
— É... talvez... — disse ela displicentemente, porém juntando várias linhas de pensamentos — então tá, obrigada assim mesmo.
Despediu-se e voltou para o carro, pensou por um minuto e resolveu ligar para a imobiliária. Precisava de mais informações. Sylvia desligou o telefone frustrada, não conseguira praticamente nada, sua única certeza até então, era que a empresa de assessoria não existia de fato, e que Bruno Chagas jamais alugara aquela sala, ou ao menos não com esse nome, há sempre uma possibilidade, pensava ela ao retornar para a Delegacia.
Durante os dias que seguiram Sylvia continuara sua busca por mais informações, tentou sem sucesso entrar em contato com os supostos familiares da vítima, mas ninguém foi encontrado, assim também fora com Helena. Na verdade, Helena nunca falara de família, mesmo na faculdade esse jamais foi um assunto abordado. Os dias passavam-se e cada vez mais todas as pistas que Sylvia seguia pareciam levar a lugar nenhum. Era como se o Sr e a Sra Chagas fossem dois fantasmas.
Era ainda muito cedo e a delegacia fervilhava em movimentação. Passaram-se cinco dias após o corpo ser encontrado, a equipe de peritos já tinha dados suficientes para uma análise pericial, e assim apurar a dinâmica do homicídio. O procedimento lembrava uma reconstituição, mas sem envolver a presença do suspeito pelo crime. Por conta do procedimento que fora marcado para aquela manhã, a Rodovia onde o carro foi encontrado, foi fechada parcialmente. Sylvia chegara ao local ao lado do Delegado e juntos acompanharam a simulação, o instituto de criminalística utilizara o carro, a arma e um corpo simulado.
Ao fim da tarde já estavam todos de volta a delegacia e Sylvia teria ainda muito trabalho pela frente. O assassino realmente estivera naquele carro e isso era o mais óbvio, só não conseguia acreditar nos rumos que a investigação levara. Porém as provas cada vez mais afunilavam para este caminho. Além de muito racional, Sylvia era também muito intuitiva, criando um paradoxo quase estranho entre essas duas facetas.
Mais três dias haviam se passado e Sylvia estava prestes fazer o indiciamento. Porém, não conseguira convencer a si própria das conclusões em que chegara juntamente com a equipe. Ainda faltavam os laudos da necropsia, mas já havia provas suficientes para um indiciamento, mas ela sentia que algo não se encaixava naquela cena. E por mais que a pericia indicasse pela trajetória das balas que a pessoa que atirara na vítima estivesse exatamente no banco do motorista e que a arma encontrada, de uso exclusivo da Policia Federal, combinava exatamente com as cápsulas encontradas e com as perfurações do corpo da vítima, algo ainda estava errado. Ela achara fácil demais esse quebra-cabeça. Era quase como se alguém tivesse arrumado tudo em seu devido lugar.
Fim do capítulo
Comentar este capítulo:
NovaAqui
Em: 27/08/2018
Como será o reencontro delas
Acho que estão querendo incriminar alguém para limpar a barra do verdadeiro culpado
Abraços fraternos procês aí
Resposta do autor:
Será? Veja nos próximos episódios kkkkk, mas olha também tô achando!
Há braços pra vc linda
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