O RENASCER DE UM ANTIGO AMOR

Cap 15 - “Ainda Que Você Mereça o Mundo”

Victória encostou-se na cabeceira da cama, não tinha dormido nada, não conseguia pregar os olhos, estava uma pilha de nervos.

Viu sua irmã abrir a porta. -- Vic? Já acordada?

Mariana a notou pigarrear e se remexer na cama. -- Queria um café…

-- Vou pegar. -- Falou indo até a cozinha e voltando com duas xícaras em mãos. Entregou uma a irmã caçula. -- Falei com a sua enfermeira hoje.

-- Hum. -- Victória resmungou enquanto olhava para um ponto vazio na parede.

-- É aquela lá do hospital, que você queria. -- Disse tentando fazer a irmã esboçar alguma mínima empolgação.

-- É mesmo? -- Respondeu.

-- Vic… Vamos lá, ânimo!

Victória ajeitou os óculos sobre o nariz, como poderia ter ânimo? Nunca tinha se sentido tão deslocada como naquele momento. Havia perdido muitas coisas e não tinha um ponto daquele cômodo em que estava, que não remetia a lembrança dos momentos que havia passado com Fernanda.

Era quase uma tortura.

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Fernanda encarou o copo de café que já estava frio. Não havia tomado sequer um gole. Seu pai já tinha saído fazia alguns minutos, Isabel não respondia nenhuma mensagem, Caio provavelmente estava com sua futura esposa.

A solidão era definitivamente algo que temia, desde sempre. Se pegou imaginando como estaria sua vida naquele momento, se não tivesse perdido a memória. De acordo com seu pai, antes de acidente estava trabalhando em uma agência de marketing no centro da cidade, provavelmente tinha muitos amigos, talvez até uma “paquera”.

Sorriu pensando que por um lado não tinha sido tão ruim assim ter se esquecido, do contrário nunca teria reparado em Isabel, afinal, fidelidade era uma coisa que prezava muito.

Se levantou e começou a tirar a mesa. Queria falar com Isabel mas tinha decidido que não insistiria tanto, talvez estivesse sendo grudenta demais.

Suspirou desanimada, tiraria o dia para fazer uma faxina, precisava fazer alguma coisa, caso contrário iria surtar. Varreu todos os cômodos, recolheu o lixo, lavou o banheiro, até que viu uma porta que ainda não tinha entrado. Estava trancada.

Era o depósito e sabia que seu pai guardava todo tipo de velharia lá dentro, provavelmente estava uma bagunça. Revirou toda a casa até que achou a chave, na terceira gaveta do escritório dele. O que era particularmente estranho, mas não deu importância.

Assim que abriu começou a tossir, o cheiro de poeira e as janelas fechadas com apenas um fino raio de sol adentrando pela escuridão tornava o local um tanto quanto desagradável. Acendeu a luz e mexeu em duas caixas que estavam sob uma mesa de madeira. Riu. Eram fitas e um rádio antiquíssimo da época que seu pai trabalhava viajando pela estrada. Balançou a cabeça negativamente, aquilo nem devia funcionar mais.

Pegou as caixas e tentou organizar num canto, não jogaria nada fora, sabia que Oscar ficaria louco, mas não custava nada manter ajeitado.

Seu olhar foi distraído enquanto empurrava as caixas para cima de uma prateleira. Um delicado colar brilhava escapando de uma delas. Fernanda o pegou e analisou encantada, era definitivamente lindo, dourado com uma fina camada de pequenas pedras brilhantes. Se perguntava se aquilo seria de sua mãe, mas tinha quase certeza que não, seu pai jamais guardaria pertences da mulher que os abandonou. Talvez fosse dela mesma, mas porque teria deixado ali? Presente de alguém que a magoou? Não era do seu fetio, provavelmente teria jogado fora caso fosse.

Prendeu o colar no pescoço, depois veria como ficou, agora seu interesse era definitivamente vasculhar aquela caixa. Pegou uma caixinha menor, encapada com papel de presente e se deu conta de que aquilo era definitivamente seu, se lembrava da caixa, mas não de alguns itens que havia ali dentro.

Tirou de dentro um anel e arqueou as sobrancelhas, era a coisa mais linda que já havia visto em toda sua vida, mas não usaria, aquilo se parecia tanto com uma aliança que chegava a ser assustador, Isabel provavelmente torceria o nariz. Como ia explicar sem parecer estranho?

Guardou o anel no bolso, não o deixaria ali naquele quarto escuro, puxou um papel de presente e sorriu, sempre teve o hábito de guardar os papéis de presente que ganhava, aquele era um pacote pequeno e espelhado na cor rosa. Havia um cartão preso a ele.

“É simples mas é de coração, ainda que você mereça o mundo.

PS: Achei tão sua cara, te amo!”

Fernanda jogou o cartão de volta na caixa, se sentia estranha lendo aquilo.

-- Ainda que você mereça o mundo… -- Repetiu para si mesma os dizeres do cartão.

Decidiu que era melhor sair dali e trancar aquele lugar.

Se olhou no espelho, o colar lhe caia bem, como uma luva, e ainda que tivesse começado a suspeitar que aquilo fosse presente de alguma ex, o usaria, era muito bonito pra ser jogado fora. Já o anel achou por bem deixar na gaveta de seu quarto.

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Isabel acordou sentindo que sua cabeça explodiria a qualquer momento, percebeu onde estava em poucos segundos ao ver Joaquim preparando o café e Amanda colocando a mesa.

Se levantou esfregando os olhos e parou na porta da cozinha.

-- Fiz vocês passarem vergonha ontem a noite? -- Perguntou tentando sorrir, apesar da dor de cabeça surreal.

-- O que você acha querida? O garçom queria chamar a ambulância porque você simplesmente apagou.

-- Arhg, que micão. -- Isabel resmungou pegando uma xícara de café. -- Ainda bem que eu já segurei barras piores pra vocês dois né? -- Riu.

-- E ela nem agradece, tá vendo Amanda?

Amanda riu, Isabel tinha dificuldades em demonstrar, mas sabia que ela agradecia, não precisava ouvir. -- Isa senta aqui. -- Puxou uma cadeira. -- Me conta o que aconteceu.

Isabel respirou fundo. -- Sério que a notícia ainda não chegou até vocês? Meus pais só faltam pedir pro locutor falar na rádio. -- Deu uma risada de desgosto. -- A Victória acordou.

Amanda arregalou os olhos abismada e Joaquim não se conteve e começou a rir. -- Minha nossa, ela deve ter sentido que você tava pegando a mulher dela.

-- Não tem graça Jô! -- Amanda o repreendeu. -- Mas ela acordou bem Isa? Tipo… Normal? -- Perguntou se voltando para a amiga.

-- Acordou no “normal” dela… Melhor impossível. -- Disse fazendo aspas com as mãos.

-- E ela já sabe…? -- Perguntou se referindo ao relacionamento com Fernanda e Isabel balançou a cabeça fazendo sinal positivo. -- Minha nossa… Agora entendi tudo.

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Victória olhou para uma sacola cheia de coisas que de acordo com Mariana se tratava de seus pertences no dia do acidente. Tirou de dentro sua mochila, algumas pulseiras, uma fitinha de Nossa Senhora Aparecida e seu anel de compromisso.

Colocou tudo de volta em si, se sentia nua sem seus “adereços”, menos o anel, sentiu uma pontada no coração ao olhar para a peça levemente chamativa e que não combinava nem um pouco com seu estilo, mas caia perfeitamente bem em Fernanda, sempre fazia tudo pensando nela.

Atirou-o contra a parede revoltada, Mariana a encontrou com as duas mãos sobre a cabeça.

-- Vic…

-- Tá tudo bem. -- Disse engolindo o choro que teimava em aparecer.

Isabel parou de frente ao portão de Fernanda, tinha ouvido muito seus amigos e por um momento pensou em desistir daquela loucura e contar toda a verdade para sua namorada. Tinha certeza de que ela passaria a odiá-la, mas não seria nada muito diferente do que recebeu dela durante todos aqueles anos.

Por um momento pensou que poderia suportar.

Entretanto, lembrou se da respiração ofegante da morena enquanto a tocava, do beijo calmo e apaixonado, do olhar de felicidade que ela exibia ao vê-la.

Não estava preparada para perder isso.

Tocou a campainha depois de refletir alguns segundos e viu Fernanda abrir a porta e descer os três degraus da escada que dava até a área. Arqueou as sobrancelhas, ela parecia tão séria que chegava a dar medo.

-- Oi? -- Chamou hesitante.

Fernanda soltou um suspiro e abriu o portão.

Fim do capítulo