O RENASCER DE UM ANTIGO AMOR

Cap 12 - A Melhor Notícia do Mundo

Às 3h45 da madrugada o hospital central não costumava ter muito movimento. Alguns técnicos em enfermagem transitavam pelo local apenas para conferir se os pacientes precisavam de alguma coisa.

Mas aquela não seria mais uma noite comum.

Victória apertou os olhos, mas só enxergava o teto borrado do quarto. Se perguntou onde estariam seus óculos, mas seu pescoço doía a ponto de um simples movimento ser torturante.

Sônia era enfermeira e trabalhava no hospital a muitos anos, estava passando as tarefas do turno da noite para a novata. -- Com esta aqui você não vai ter muito trabalho. -- Disse parando em frente a porta de número 405.

Sara baixou o olhar no prontuário. Acidente de moto em 2015, era uma menina de 21 anos de idade, tinha feito 24 alguns dias atrás, presa numa cama de hospital. Sentiu pena. Passou a folhear o arquivo, Victória nunca tivera uma saúde muito boa desde a infância. Era surpreendente que tivesse aguentado o acidente e a série de cirurgias a que foi submetida.

Ergueu o olhar quando ouviu a bandeja de metal com medicamentos que Sônia segurava bater contra o chão provocando um barulho estrondoso. Desviou os olhos para o leito e viu uma jovem que apertava os olhos incomodada.

-- Quem são vocês? Querem me matar de susto? -- Victória resmungou com a mão direita sobre a testa. -- Isso aqui é um hospital? Cadê os meus pais?

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Quando o telefone na sala de estar tocou pela terceira vez, Mariana se remexeu sob o colchão irritada, não era possível que alguém tivesse a falta de bom senso de ligar aquela hora.

Levantou e caminhou sonolenta até o aparelho, seja lá quem fosse, era alguém bem insistente.

Olhou no relógio de parede que marcava 04h00 da manhã e gelou ao ver o número do hospital onde Victória estava internada no visor. A última ligação que tinham recebido de lá não havia sido nada boa.

-- Alô? -- Atendeu com a voz hesitante e se identificou para em seguida escutar o que a mulher do outro lado da linha falava.

Simplesmente não conseguia acreditar, era a melhor notícia do mundo. A cada palavra dita do outro lado, lágrimas escorriam pelo seu rosto.

Apenas concordou com tudo e desligou o telefone. Sua vontade naquele momento era de gritar de felicidade, mas seu lado sensato a lembrou de ligar para os seus pais. Sabia que a condição em que sua irmã se encontrava era uma ferida aberta no coração dos dois e aquela notícia seria a cura para anos de sofrimento.

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Victória respirou fundo tentando se localizar no quarto frio e impessoal. Todo seu corpo doía, estava em transe, uma enfermeira havia comentado que haviam se passado 3 anos desde o acidente que a levou até ali. Seu primeiro pensamento inconscientemente recaiu sobre Fernanda. Como ela estaria? Será que sentia sua falta? Havia a esquecido? Encontrado outro alguém?

A última hipótese provocou um embrulho em seu estômago, porém repreendeu a si mesma. Como poderia esperar que Fernanda se mantesse ali por todo aquele tempo sozinha? Sua namorada era uma mulher encantadora. Era óbvio que encontraria alguém para suprir sua falta.

Mordeu o lábio inferior tentando conter as lágrimas. Quem estava tentando enganar? Não desejava que Fernanda tivesse passado todo aquele tempo sofrendo, porém ao mesmo tempo, repulsava a ideia de que ela poderia estar com outra.

Foi uma Victória em prantos que Mariana encontrou assim que abriu a porta do quarto para onde ela havia sido transferida.

-- Vic? -- Chamou baixinho na porta fazendo a outra levantar o olhar avermelhado.

-- Mari… -- Victória piscou algumas vezes. -- É você?

Mariana sorriu e abriu a bolsa retirando os óculos de grau, sentou-se na beirada da cama e colocou nos olhos da irmã mais nova. Victória sorriu ajeitando-os. -- Agora sim.

-- Chorando porque hein? -- Perguntou limpando uma lágrima que escorria pela maçã do rosto dela.

-- Sei lá, talvez porque a minha vida parou e eu provavelmente perdi tudo o que eu tinha?  -- Respondeu com seu habitual sarcasmo.

Mariana balançou a cabeça negativamente. -- Só não te dou um tapa nessa tua orelha porque o médico disse que você provavelmente está sentindo muita dor… Mas você devia agradecer aos céus por ter acordado, porque isso foi quase um milagre.

-- Eu sei… -- Victória abaixou a cabeça. -- Mas me responde uma coisa Mari?

-- O que?

-- Quanto tempo demorou pra ela desistir de mim? -- Perguntou quase num sussurro. Mariana sabia bem sobre quem sua irmã se referia. Mas não sabia o que dizer.

-- Ela nunca desistiu Vic. -- Disse passando a mão pelos cabelos da outra que exibiu um olhar que parecia um misto de surpresa e felicidade.

-- Então…? -- Victória perguntou como se precisasse de uma confirmação de que sua namorada ainda estaria ali a esperando. Mariana mordeu o lábio inferior pensando em como não queria ser a responsável por jogar aquela bomba. Agradeceu mentalmente quando a porta do quarto se abriu e seus pais apareceram emocionados.

Se afastou para ver se Isabel tinha retornado alguma das suas ligações. Mas nada. De qualquer forma, ela iria ficar sabendo em algum momento, pois seus pais já estavam espalhando a notícia aos quatro ventos desde a madrugada.

Resolveu almoçar por ali mesmo, não ficou surpresa quando viu a caminhonete de Isabel parar em frente ao hospital, porém ao ver Fernanda descendo pensou que definitivamente sua irmã tinha perdido o juízo. Ou talvez contato tudo para sua cunhada?

Não, Fernanda parecia tranquila demais.

Se aproximou das duas e cumprimentou Fernanda com um abraço.

-- Desculpa ter estragado a viagem de vocês. -- Disse sorrindo. -- Eu tava muito eufórica de madrugada e acabei exagerando nas ligações. -- Olhou para Isabel que parecia um poço de tensão.

-- Que nada Mari, você tinha que avisar mesmo… A Isa me falou uma vez dessa irmã de vocês, eu fico muito feliz por você e por toda sua família. -- Fernanda falou, entretanto, estava estranhando um pouco a reação de sua namorada. Era como se Isabel estivesse preocupada com o fato de sua irmã mais nova ter acordado de um coma. Mas talvez estivesse apenas preocupada com o estado de saúde dela, que ainda não era dos melhores.

-- É, estamos muito felizes mesmo. -- Mari falou encarando a irmã. -- Você não vai ver ela Isa?

Isabel colocou as duas mãos nos bolsos do casaco que usava e abaixou a cabeça. Ao mesmo tempo que queria vê-la, também não queria. Levantou o olhar para Mariana que arqueava as sobrancelhas como se esperasse uma resposta, respirou fundo e assentiu com a cabeça.

Parou na porta e todas as suas neuras foram embora quando a viu sorrir para si.

-- E aí pirralha? Você não acha que dormiu demais não? -- Perguntou se aproximando.

-- Eu vou ficar uma semana sem dormir agora, pra compensar. -- Victória respondeu abraçando-a, e Isabel prolongou o abraço, sabia que provavelmente seria o único abraço que teria dela, pois quando Victória descobrisse o que andava fazendo, um abraço seria a última coisa que iria ganhar.

-- Mamãe disse que você tava viajando…

-- É mas não era muito longe, a gente pegou a estrada cedo, assim que eu vi as mensagens da Mari.

-- A gente? -- Victória arqueou as sobrancelhas. -- A gente quem hein Isa? -- Perguntou rindo, sabia que sua irmã vivia de rolo com uma ou outra mulher.

-- Eu e… Minha namorada. -- Respondeu receosa como se Victória pudesse ler seus pensamentos, mas ela apenas riu.

-- Namorada? Uau! Eu dormi demais mesmo! -- Passou as mãos sobre o rosto. -- Quero só ver quem fez esse milagre.

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Fernanda comprou um pacote de salgadinhos para comer enquanto esperava Isabel. Havia dito que pegaria um ônibus para voltar para casa, porém a outra fora insistente para que a esperasse. Viu quando Mariana entrou no quarto em que sua namorada estava e logo em seguida saiu acompanhada dela, as duas pareciam quase discutir no final do corredor e Isabel parecia muito aflita. Conhecia aquele gesto de puxar os cabelos para trás, ela estava no limite da tensão.

Franziu a testa ao ver as duas virarem o corredor e desaparecerem. Alguma coisa bem séria estava acontecendo ali, mas com certeza era assunto de família, nada que fosse de sua conta.

Sara entrou no quarto e notou que Victória tentava se levantar de qualquer jeito. -- Ei mocinha, você não pode fazer isso aí não! -- Disse vendo-a puxar o soro.

-- Eu quero usar o banheiro… -- Victória resmungou. -- Como eu ia no banheiro durante todo esse tempo? -- Perguntou e logo em seguida balançou a cabeça. -- Deixa pra lá, não quero saber.

Sara riu e puxou uma cadeira de rodas para acomodar a jovem. Estava um pouco abaixo do peso, com toda certeza, pois havia conseguido levantá-la. Porém assim que se acomodou na cadeira Victória saiu porta afora do quarto.

-- Ei, o banheiro é aqui dentro meu bem. -- Sara falou indo atrás dela, mas parou comovida ao vê-la parar numa parte do corredor que era iluminada pelo sol e ficou ali. Sentir o sol sob sua pele parecia a melhor sensação do mundo.

Se encostou ao lado dela, dava até pena de tirá-la dali.

-- Victória, vamos entrar? Eu não tenho autorização pra passear com você pelo corredor… Logo você vai receber alta e vai poder ficar no sol por todo tempo do mundo. -- Pediu com delicadeza.

-- Tá bom…  -- A outra respondeu chateada e já ia voltando para dentro quando sua atenção foi tomada por uma mulher que se encontrava sentada no início do corredor. Sentiu o coração bater descontroladamente no peito.

Fernanda ergueu o olhar ao ouvir um barulho se aproximando. Abriu um sorriso, só tinha visto uma foto, mas a semelhança de sua cunhada com Mariana e Isabel era inegável.

Victória prendeu o ar, Fernanda parecia ainda mais bonita, como se fosse possível, os cabelos na altura do ombro, o sorriso meigo, o perfume que a deixava zonza. Era a mulher que amava perdidamente.

Esperava um abraço apertado, um beijo, qualquer coisa, menos o que veio a seguir.

-- Você deve ser a Victória né? Eu sou a Fernanda, namorada da sua irmã. -- Disse estendendo a mão.

Fim do capítulo