O RENASCER DE UM ANTIGO AMOR

Cap 09 - O outro lado da moeda

Fernanda passou a tarde toda de domingo com os pais de Isabel. Ícaro era um sujeito muito inteligente e podia ficar horas falando e falando sobre todo tipo de assunto com ele. Percebia-se que nesse ponto Mariana havia puxado o pai.

Mariana era outra figura muito interessante, tinha um ar sério, porém delicado, era professora em uma escola infantil e aparentemente apaixonada por crianças.

Ao ver a filha do meio falar empolgada de seus alunos Regina comentou:

-- Se você não tivesse terminado com aquele pobre coitado do Alexandre, provavelmente estaria falando dos teus filhos já, e não tendo que se contentar com algumas horas com os filhos dos outros.

Mariana revirou os olhos e Ícaro riu baixinho para que a esposa não ouvisse, já havia cansado de discutir com sua mãe sobre aquele assunto. Aparentemente ela ainda levaria anos para superar o fim de seu namoro com o jovem estudante de arquitetura.

Estava no início de sua segunda graduação, em psicologia, quando conheceu o rapaz bonito, bem humorado e extremamente galanteador.

Não era uma romântica, mas foi conquistada por ele.

Infelizmente em poucos meses de namoro percebeu que aquilo não funcionaria a longo prazo. Alex era um cara legal, porém vivia de festas e do dinheiro de seus pais. Sustentou o relacionamento por um ano e três meses apenas pelo fato de que sua mãe o amava.

Quando resolveu terminar, o próprio pareceu bem satisfeito com a decisão, entretanto sua mãe passou a amargar profundamente a perda do “genro perfeito”.

Fernanda encarou Mariana e riu balançando a cabeça negativamente. -- Meu pai já é diferente, parece que ele surta com a ideia de eu estar namorando alguém. -- Olhou para Isabel. -- Você viu a cara amarrada dele quando você foi me levar em casa?

Isabel riu de nervoso, Oscar devia estar se roendo de raiva dela e aquilo era definitivamente um problema. Nem encarou Mariana pois ela provavelmente fixava um olhar reprovador em si.

-- Todo pai é ciumento Fernanda. -- Ícaro falou. -- Não se preocupe que logo ele supera.

No final da tarde de domingo Fernanda foi para casa com um sorriso no rosto. Estava morrendo de medo de conhecer os pais de Isabel, porém eles se mostraram pessoas maravilhosas e se sentiu acolhida ali como nunca havia se sentido antes.

Chegou em casa e seu pai já havia dormido, tomou um banho e ligou a TV, em 4 anos muita coisa havia mudado, por isso a cada notícia se surpreendia um pouco mais. A novela que assistia na época não passava mais, o jornal já havia trocado de âncora, a bandinha de pop-rock do momento já não fazia mais sucesso, e assim por diante.

Ouviu o celular vibrar e sorriu, era uma mensagem de Isabel.

“Se divertiu hoje?”

“Muito”

Respondeu enviando um coração vermelho na frente e completou.

“Eu não podia ter escolhido sogros melhores kkk”

Isabel mordeu o lábio inferior e suspirou apaixonada. Fernanda sempre seria Fernanda, independente de ter perdido a memória, seguia sendo a mesma garota gentil e carinhosa de sempre. Porém, dessa vez ela era sua.

Viu a porta do quarto em que dormia ser aberta de supetão por sua mãe. Arqueou as sobrancelhas.

-- A senhora ficou louca? É difícil bater na porta?

Regina respirou fundo, não sabia de onde Isabel tinha puxado aquele cinismo.

-- Quem enlouqueceu aqui foi você! O que você pensa que está fazendo? A Fernanda é namorada da sua irmã!

A tatuadora sentiu o maxilar tremer de nervoso, não era possível que aquilo continuasse sendo atirado em sua cara, Fernanda era sua namorada e pronto.

-- Ela não é namorada da minha irmã! -- Levantou se exaltando. -- Hoje ela viu uma foto da Vic no meu celular e ela nem ao menos reconheceu!

Isabel virou as costas puxando fôlego. Passou as mãos pelos longos cabelos a fim de conter a raiva que sentia. -- A Victória não significa nada pra ela, eu sou a namorada dela agora, e a senhora vai ter que engolir isso!

-- Quero só ver quando a sua irmã acordar e… -- Dona Regina foi interrompida pelo barulho forte de Isabel chutando a cômoda do quarto.

-- Mas que inferno! A Victória não vai acordar! Para de ficar alimentando essa ilusão ridícula!

Mariana resolveu interferir no que podia ficar pior. -- Ok, já chega vocês duas. -- Disse entrando no quarto. -- Mãe… -- Tentou usar seu tom de voz mais ponderado. -- A Nanda não se lembra de nada… Ainda que não fosse a Isa, ela ia acabar conhecendo alguém em algum momento… Ela não ia continuar fiel a Vic porque… Ela não faz a mínima ideia da existência da Vic.

-- Mas sua irmã está se aproveitando da situação… Não vê isso?

Mariana fez uma careta, era lógico que Isabel estava se aproveitando da situação. Mas não iria “colocar lenha na fogueira”.

-- Ela não procurou por isso mãe… Deixa ela. -- Disse vendo Regina fazer um gesto negativo com a cabeça e sair pisando duro pelo corredor.

Isabel abaixou a cabeça esperando que Mariana dissesse alguma coisa.

-- Obrigada. -- Falou por fim, na tentativa de quebrar o silêncio.

-- Não pense que eu apoio isso… -- Mariana falou se virando. -- Você não pode apagar a Vic das nossas vidas.

Isabel suspirou sentida, Mariana falava como se fosse um monstro.

-- Eu não posso apagar a Victória nem mesmo da minha vida… Quem dirá da vida de vocês. Eu não quero apagar ninguém Mari, eu só quero ser feliz.

-- Feliz com uma mulher que ama sua irmã? -- Perguntou apertando os olhos.

Isabel suspirou cansada. -- Não Mari… Feliz com a mulher que eu amo. -- Sentou-se na cama com as mãos no rosto. -- Me deixa sozinha, por favor.

Assim que Mariana fechou a porta do quarto Isabel se jogou na cama amargando a discussão com sua mãe. Claro que esperava por uma reação ruim, mas aquilo a machucava profundamente.

Toda aquela reação a irritava, se sua irmã não estivesse mofando naquele hospital nada daquilo estaria acontecendo.

Odiava a forma que sua família e amigos no geral havia romantizado todo o sofrimento de Fernanda, como se fosse a maior prova de amor do mundo.

Ninguém enxergava o outro lado da moeda, Victória não merecia um terço daquela dedicação toda.

15 de dezembro de 2013

Ouviu sua irmã chamando-a do banheiro, com o chuveiro ligado.

-- O que é? -- Perguntou.

-- Isa me empresta sua moto? Eu to meio atrasada, precisava dela hoje.

-- Tá bem, eu to saindo, vou deixar a chave na sua cama.

-- Tá bom.

-- De nada Victoria. -- Brincou ouvindo a outra rir do lado de dentro.

Pegou a mochila e trancou seu quarto que ficava no final do corredor. Entrou no quarto de Victória que estava quase sempre aberto e jogou o molho de chaves na cama. Quando ia saindo ouviu o celular de Victória vibrar insistentemente.

No visor haviam 5 chamadas perdidas e 23 mensagens de Talita, uma garota que Isabel sabia bem ser ex-ficante de sua irmã. A última exibia um emoji de coração partido e o texto

“já reparei q só me usou de novo”

-- Cruzes Vic, que merd*! -- Resmungou baixinho. Não estava surpresa, sua irmã tinha 20 anos de pura imaturidade, fruto da criação mimada que tinha recebido.

Era uma perfeita idiota. Tinha a melhor namorada do mundo, mas insistia em tomar decisões ruins.

Deixou o aparelho onde estava e saiu. Se confrontasse Victoria sobre aquilo daria uma bela discussão, que acabaria nela a acusando de querer destruir o lindo relacionamento que ela mesma estava destruindo.

De volta ao presente, Isabel abraçou o travesseiro na tentativa de se livrar daquelas memórias e concentrar-se na lembrança de Fernanda em seus braços.

Fim do capítulo