Capítulo 42 -- Não foi uma visão
A ILHA DO FALCÃO -- CAPÍTULO 42
Não Foi Uma Visão
A vista de Carol escureceu. Natasha a amparou antes que caísse. Com ela nos braços, dirigiu-se até a cadeira mais próxima e sentou-se.
Sibele mesmo mancando, aproximou-se para orientar Natasha nos primeiros socorros.
-- Coloque as pernas mais altas que o corpo e a cabeça. Deixe a cabeça dela de lado, para facilitar a respiração e evitar asfixia devido ao risco de vômito. Natasha fez tudo o que Sibele pediu. Ela aconchegou Carol de encontro ao peito e passou a mão em seu rosto. Suas pálpebras entreabriram-se lentamente.
-- Você desmaiou, mas está tudo bem agora -- ela disse, tentando acalmá-la.
Ainda meio ofegante, a ruiva respirou fundo.
-- Já estou bem -- tentou levantar a cabeça, mas ficou tonta.
-- Espera mais um pouco -- disse Marcela -- Pode ser uma queda de pressão.
-- Você se alimentou bem, hoje? -- perguntou, Sidney -- Você costuma ficar muito tempo sem comer.
-- Passou por algum estresse? Trauma emocional ou medo? -- perguntou Sofia, aproximando-se da amiga para tocá-la -- A Natasha é uma grossa, estúpida, insensível...
-- Ei! Pode parar. Só falta você dizer que a culpa foi minha.
-- E não foi?
-- Em pensar que uma camisinha teria livrado a gente dessa coisinha aí -- Natasha respirou fundo e em seguida voltou a sua atenção para a ruiva sentada em seu colo -- Vou chamar a ambulância.
-- Não exagera, Natasha -- Naquele momento Carol só queria ter certeza de que era realmente César, o homem que acabara de ver -- Eu já estou bem. Olha só -- ela pulou do colo da irmã, deu alguns passos, dois pulinhos, rodopiou e abriu os braços -- Viu?
Natasha se levantou irritada.
-- Você está melhor que eu.
-- Acho melhor você não abusar, Carol -- Leozinho aproximou-se com o celular na mão -- Fiz uma pesquisa no Google e aqui diz que o desmaio pode ser desencadeado por uma série de fatores. Inclusive esforço excessivo durante a evacuação.
-- Aonde foi que eu errei meu Deus? -- Natasha deu um tapa na própria cabeça -- Acho melhor não responder Deus.
-- Tem mais -- continuou Leozinho, sem dar importância à Natasha -- Em casos raros, um desmaio também pode ser sintoma de tumores cerebrais, principalmente se acompanhado de outros sintomas neurológicos, como convulsão.
Marcela revirou os olhos e disse com ironia:
- Daqui a pouco ele diz que você tem apenas alguns meses de vida.
-- Foi por isso que você foi procurar a Talita? -- perguntou Natasha com uma voz suave e preocupada -- São episódios recorrentes?
Carol olhava desesperadamente de um lado para o outro à procura de César, o verdadeiro motivo de sua queda de pressão, hipoglicemia, estresse, qualquer coisa que possa ter causado o desmaio. Menos o esforço excessivo durante a evacuação. Lógico.
César não estava mais lá.
-- Não, Natasha. Não foi por isso que procurei a Talita -- Carol, colocou a mão no ombro dela -- Foi a primeira vez que desmaiei. Isso nunca aconteceu antes -- murmurou.
-- Então, acho que está tudo bem -- Natasha observou, sentindo-se aliviada -- Vamos voltar a nos divertir.
-- Você não está preocupada com ela, sua desalmada? Ela pode estar com uma doença grave -- Sofia cruzou os braços na altura do peito, forte indicativo de que queria provocar a empresária.
Natasha sabia disso. Ela era perito em ler a linguagem corporal, principalmente de seus adversários.
-- Ô da franja -- ela murmurou em voz baixa, esfregando a testa -- Não posso acreditar que esteja em minha ilha, em meu hotel e não tenha medo de amanhecer com a boca cheia de formigas, minhocas e afins.
-- A boca é minha e eu falo o que eu quero doa a quem doer.
-- Sabia que quanto menor a mente, maior a boca? -- Natasha sacudiu a cabeça com zombaria -- Eu sei que por trás dessa sua franja ridícula, existe uma testa de 42 polegadas.
-- Quem fala! Quando você nasceu, devia ser tão feia, que nem a Cuca quis te pegar -- retrucou Sofia.
-- Antes de me julgar, se olhe no espelho. Só tenha cuidado para não se cortar com os cacos -- disse Natasha, no máximo de sua paciência.
-- Vocês duas são tão chatas! -- resmungou, Leozinho.
-- Cala a boca, Leopoldo -- Natasha, apontou para ele, mas o gerente não deu importância à ordem.
-- Só dei minha opinião.
-- Então toma ela de volta, que eu não quero.
-- Por favor, parem! -- pediu a ruiva.
Sofia virou-se para Carol.
-- Sua irmã é a culpada.
Ah, como odiava a palavra irmã. Pensou Carol. Sofia era uma mulher adorável, embora fosse impulsiva. Fora bondosa e lhe oferecera amizade nos piores momentos de sua vida. Para uma mulher solitária como ela, isso era muito importante. Naquela noite, porém, ela estava se superando em suas provocações. Natasha já estava a ponto de esganá-la.
-- Sofia! -- Carol enganchou seu braço no braço da amiga -- Preciso ir ao banheiro. Vem comigo?
-- Claro, amiga -- Sofia olhou para Natasha e mostrou a língua.
Natasha ficou vermelha de raiva, os dedos se fecharam com força.
-- Mulherzinha insuportável -- disse, por entre os dentes - Só o que me resta nesse momento é ficar bêbada e achar alguém para azucrinar -- Natasha pegou um copo de bebida da bandeja e saiu abrindo caminho entre a multidão de turistas.
Talita pegou a bebida e olhou em torno. O local reservado para a festa estava cheio de pessoas bebendo, rindo e dançando. O som da música era alto e as pessoas em movimento na pista de dança gritavam como loucas. A lua brilhante iluminava o céu escuro, mostrando o oceano.
Talita tinha trabalhado muito nos últimos dias e preferia ter ficado em casa descansando em vez de ir àquela festa. Mas, Natasha insistiu tanto e não seria gentil recusar o convite dela.
-- Adoro Reggae -- disse Carolina próximo ao seu ouvido -- Pena que estou impossibilitada de dançar.
-- Pois eu estou tão cansada que mal consigo sair desse banquinho -- Talita jogou a cabeça para trás, deixando que o ventinho praiano brincasse com seus cabelos.
-- Você trabalha demais. Precisa diminuir um pouco o ritmo.
-- No momento não é possível. Enquanto a Natasha não resolver o que fará com a Sibele, terei que me desdobrar.
-- A Natasha é uma mentecapta, uma estúpida, praticamente uma debiloideeee... aiii... - Carolina levou um tapa na nuca que a fez gritar de dor. Virou-se rapidamente e deu de cara com a irmã.
-- Quer desaparecer por mais vinte anos, é? -- disse Natasha, com cara de zangada.
-- Desculpa, Nat -- Carolina sentou ao lado de Talita, com as muletas sobre o colo -- É que você está sendo complacente com esses bandidos.
-- Não estou sendo complacente -- afirmou, Natasha abrandando sua expressão com um sorriso maroto e duas covinhas sedutoras -- Apenas quero me divertir um pouco antes de entregá-los a justiça.
-- Espero realmente que faça. Porque se você não fizer, eu faço.
Não choraria. Carol entrou com toda pressa no banheiro feminino. Por sorte, estava vazio e se apressou a se fechar em um dos banheiros. Pegou um pouco de papel do porta papel e o apertou com força contra seus olhos. Só podia ser uma alucinação. Não podia ser verdade!
-- Abre a porta! -- solicitou Sofia com a voz preocupada.
-- Já vou abrir -- disse enquanto abria a porta.
-- Está bem?
-- Sim -- respondeu Carol entre gemid*s -- Só estou nervosa.
-- Não pode ser ele Carol. Como esse cara iria te encontrar aqui? -- Sofia tentava acalmá-la, mas não sabia o que fazer. Tocou em seu braço transmitindo coragem. Um simples toque às vezes é mais significativo que mil palavras -- Será que posso ajudá-la de algum modo?
-- Você já está me ajudando muito, ficando ao meu lado.
A ansiedade na voz dela tocou o coração de Sofia.
-- Não se preocupe. Ficarei ao seu lado o tempo todo.
Layla sentou no banco vazio ao lado de Natasha e cruzou as pernas. Natasha virou o banco do bar para ficar de frente para ela.
-- O que quer beber? -- perguntou Natasha, de forma amável.
-- Gostaria de beber uma taça de vinho sem álcool.
-- O único vinho que conheço que não tem álcool é o ovinho de codorna -- Natasha sorriu, divertida -- Brincadeirinha. Temos o Natureo Muscat, que é um vinho desalcoolizado de alta qualidade. Límpido, fresco, com sabor doce de uvas frescas.
-- Então, vou beber o Natureo Muscat -- disse, rindo; um riso doce e suave que envolveu todo o rosto.
-- Você combina com esse lugar, sabia? -- os olhos verdes de Natasha voltaram-se para Layla.
-- Por que diz isso? -- indagou, curiosa.
-- Linda, independente, sonhadora, misteriosa. Tudo o que combina com a minha ilha da magia.
-- Obrigado pela gentileza! Fico lisonjeada com o elogio -- E surpresa também. Natasha era arrogante, autoritária e áspera. Layla não esperava receber elogios dela.
O garçom serviu as bebidas e saiu rapidamente.
-- Você deveria passar uns dias aqui na Ilha, Layla. Não a trabalho, mas sim, em férias.
Layla levou a taça aos lábios, ao mesmo tempo que encarava o rosto da empresária.
-- Talvez tenha razão, Natasha. Preciso de férias, mas não agora. Antes quero colocar em prática o nosso projeto do parque temático.
A mãe de Layla sempre dizia que ela envelheceria dentro do escritório da empresa. Depois da morte da mãe, as coisas ficaram ainda piores. O pai caiu em depressão e deixou os negócios nas mãos dela e do irmão mais velho. Para uma jovem de dezoito anos, foi catastrófico. A rotina da empresa não lhe deixava nem tempo nem energia para pensar em qualquer outra coisa.
-- Mas, depois que terminar, quero passar um mês na vida boa.
-- A vida é mais do que só trabalhar, Layla. Se dedique ao seu ganha-pão, mas saiba a hora de parar e aproveitar os momentos de lazer.
-- Até que enfim! -- Leozinho parou ao lado de Natasha e descansou os braços no encosto do banco -- Estamos a um bom tempo procurando por você.
Natasha olhou para Sofia e fez uma careta.
-- Já estava com saudades de me encher o saco?
-- Está vendo, Carol? Sua irmã está de marcação comigo.
-- Não começa, Natasha -- Carol soltou o braço de Sofia e se encostou contra o balcão de bebidas -- Por favor, moça. Prepara um drinque para mim.
-- Carol, essa moça é a Nani. Os drinques que ela prepara são os melhores, graças a ela, nosso bar está ficando famoso -- disse Natasha, fazendo Nani abrir um largo sorriso.
Nani, a barwoman, entregou o drinque para Carol.
-- A moda da casa -- anunciou sorrindo.
Carol bebeu um gole e deu um suspiro de satisfação.
-- Delicioso! Excelente -- disse, com sinceridade -- É o melhor drinque que bebi até hoje.
-- Muita gentileza sua, obrigada -- Nani enxugou as mãos em uma toalha, levantou o olhar para Natasha -- Vou preparar uma rodada de drinques para todos.
Sofia sentiu-se contagiada pela música que a banda começou a tocar. Fez um sinal para Leozinho e apontou para a pista.
-- Vamos?
-- Demorou! Vamos pessoal! -- Leozinho enlaçou os braços em torno de Sidney e os dois saíram pulando pela pista.
-- Vamos Layla -- convidou, Sofia.
-- Claro! -- a moça assentiu e as duas saíram em direção a pista.
-- Você não vai? -- perguntou Natasha, puxando-a mais para perto. Carol sorriu.
-- Você se importa se eu ficar com você? -- perguntou, encarando-a nos olhos -- Não estou com ânimo para dançar.
-- Lógico que pode -- Natasha segurou o rosto dela e a beijou perto da orelha -- Pelo menos você está se divertindo esta noite?
-- Apesar do desmaio, estou me divertindo muito. A festa está muito animada.
-- Então, ótimo! -- sorrindo, Natasha levantou seu copo insinuando um brinde e bebeu -- Vamos pedir mais...
Jessye chegou ao bar, e ela não terminou sua frase.
-- Natasha! Desculpe atrapalhar a diversão, mas temos um problema com a refrigeração dos freezers do bar principal.
Natasha soltou o ar com força, insatisfeita.
-- Que droga!
-- Tudo bem, Natasha -- Carol tocou o braço da empresária de leve -- Eu espero.
-- Tem certeza?
-- Claro. Vai Lá! -- disse sorrindo.
Natasha colocou o copo vazio no balcão e saiu acompanhando os passos de Jessye por entre os turistas que se espalhavam pela praia, bebendo, rindo e dançando.
Sem muito ânimo, o sorriso morrendo, Carol observou Natasha se afastar.
Carol olhou ao redor, ainda desconfiada. Estava tensa e tentava se convencer de que havia se enganado redondamente. Teve que admitir que, afinal, estava se divertindo. Estava decidida a não estragar mais aquela noite pensando em César. Já tinha perdido bons momentos de sua vida por causa disso. Estava mais do que na hora de esquecer aquele homem de uma vez por todas e começar a viver de novo. De repente, seus olhos encontraram os da moça de muletas. A mesma que desastrosamente havia se esbarrado com ela no ambulatório.
Ela estava ocupando uma das mesas espalhadas ao redor do palco, o rosto meio escondido pela aba do boné, como se não quisesse ser vista por alguém. Curiosa, Carol não conseguia parar de olhá-la.
Provavelmente ela percebeu que Carol a observava pois, virou o rosto rapidamente.
-- Por favor, Nani. Enche novamente o meu copo. Vou dar uma volta.
-- Claro que sim!
A praia estava repleta de luzes e de gente que se divertia com a banda de reggae que continuava a sua exibição. As pessoas caminhavam pela areia, sorridentes, conversando com animação. Havia muitas mulheres com saída de banho e homens de bermuda e camiseta.
A ruiva continuou sua caminhada pela praia, deixando para trás o som da música, o murmúrio das vozes e as risadas altas. Como gostaria de também estar naquele clima de descontração, sem preocupações e tristezas.
Ela sem se dar conta foi se afastando cada vez mais da festa.
Natasha retornou ao bar e não encontrou Carol. Seus olhos procuraram, ansiosamente por ela, mas em vão.
-- Nani, você viu para onde a Carol foi?
-- Ela disse que ia dar uma volta -- ela encolheu os ombros e olhou ao redor.
-- A sua Carolzinha foi naquela direção -- murmurou Carolina, parando ao lado da irmã, com olhos cerrados e sorriso irônico.
-- Que mulher teimosa. Parece que quanto mais eu falo, mais ela me desobedece.
-- Você parece preocupada -- comentou Carolina, encostando-se ao balcão.
-- Estou muito preocupada -- afirmou irritada -- Ela acabou de ter um desmaio. Sem contar o perigo de caminhar pela praia a essa hora.
-- Que se dane essa trambiqueira -- Carolina afirmou, balançando os ombros.
Natasha não gostou nem um pouco do que ouviu.
-- A Carol é responsabilidade minha. Confesso que não gosto de ouvir você o tempo todo falando como devo agir com relação a ela. Portanto, guarde a sua opinião para você -- Natasha se virou e saiu de cara fechada.
Quando olhou para trás, Carol percebeu o quanto havia andado pela faixa de praia que corria adjacente ao calçadão. Estava tão alheia a tudo, que caminhou mais de uma hora sem direção, afastando-se do local da festa.
-- Droga! -- apreensiva, Andreia deu meia volta e retornou pelo mesmo caminho -- Vou passar o resto da madrugada andando. Não queria estragar a noite da Natasha, mas já passava das duas horas e, ela já deveria estar preocupada.
A ruiva caminhava apressada e as batidas de seu coração ficaram ligeiramente aceleradas. O som do vento e das ondas que outrora a acalmaram, agora eram assustadores. Carol se livrou das sandálias buscando mais agilidade no caminhar.
Alguns metros dali, um homem a observava em meio às sombras. Seus olhos seguiam a ruiva que caminhava a passos largos pela areia macia da praia. Ela parecia tão vulnerável, com a cabeça baixa e os ombros levemente curvados.
Carol pressentindo a presença de alguém, virou o rosto para o lado, e prendeu a respiração. Seus olhos castanhos se ofuscaram. Ela pensou em correr, mas era tarde demais.
O choque de vê-lo foi tão grande, tão inesperado, que ela pensou ter uma visão. Mas depois de piscar duas vezes, incrédula, ela encarou a realidade: César estava mesmo na ilha. Carol sentiu-se empalidecer quando seus olhos se encontraram e ela reconheceu o mesmo ar de zombaria de sempre.
-- Agora somos apenas nós dois, princesa -- disse ele, rosnando como um animal enfurecido.
Fim do capítulo
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Anny Grazielly
Em: 11/09/2020
Ceussssss... o que vai acontecer?!?!
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