Capítulo 23
A repercussão da noite anterior foi inimaginável. Naquela noite, ao chegarem em frente à galeria já avistaram um aglomerado de pessoas, formando uma fila na entrada, o que indicava que o espaço de arte estava repleto. Mais uma vez a imprensa se fazia presente, bem como outros tantos colecionadores e apreciadores da arte da fotógrafa.
Érika, determinada hora, anunciou a projeção do documentário, mas ao contrário de indicar que o acervo exposto seria leiloado, relatou os resultados do evento da noite anterior, e mais uma vez o público demonstrou o apreço pela iniciativa da fotógrafa, ovacionando-a por longos minutos.
Vinte dias depois, encerrada a exposição, Érika informou à Camille os resultados da exposição, que estava providenciado a entrega das obras leiloadas aos seus devidos donos e que, ao final, pouco da mostra completa não havia sido vendido, comprometendo-se em lhe enviar os cheques a serem destinados às organizações filantrópicas.
No meio daquela tarde interfonaram para o apartamento, e a fotógrafa concordou em receber a entrega que Érika lhe mandara. O que não imaginava é que além do envelope contendo cheques e relatórios, a equipe da galeria lhe trouxera o painel que havia sido arrematado antes do leilão. Acreditando que se tratava de um engano, pediu que lhe fornecessem o protocolo de envio, mas o que recebeu foi um envelope menor, no qual encontrou um cartão com os dizeres: “Porque o fato de tê-la me faz não precisar de mais nada. Porque amo você. E porque não há palavras para expressar meu profundo arrependimento por não ter estado ao seu lado quando essa imagem foi captada.”Sua L.H.
Sem saber o que pensar ou o que fazer, apenas tendo a certeza de não podia ser mais feliz, indicou que deixassem o painel encostado em uma das paredes da sala. Aguardou que os entregadores saíssem, e correu para o estúdio da mulher que, distraída, nem havia percebido que alguém tinha estado no apartamento, tão absorta estava, escrevendo.
Camille rompeu a sala com uma expressão indescritível, com o cartão na mão. Sem dar tempo para que a escritora dissesse algo, jogou-se no seu colo, invadindo-lhe a boca e revirando-lhe os cabelos.
- Quem não precisa de mais nada além de você, sou eu. Você é o meu porto seguro... é com quem eu quero estar, e é em quem eu me perco e me encontro.... Afastou-se um pouco para olhar no fundo dos olhos de Luana, e tentar expressar todo o amor que sentia pela mulher.
- Cam, eu... simplesmente amo você. Foi tudo que conseguiu dizer antes de ser calada pela boca da outra.
Eleonora quando soube do gesto de Luana passou a admirá-la mais ainda, e teve a certeza de que a filha não poderia ser mais feliz. E não há nada mais gratificante para uma mãe que saber que seus filhos são amados.
O painel foi colocado no corredor de acesso aos estúdios, de forma a preservar o anonimato da propriedade. A pedido de Luana, apenas as pessoas mais íntimas ao casal viriam a saber que tinha sido ela a arrematar a obra, para presentear a própria autora.
Em julho, Luana convidou a mulher para passar alguns dias em sua casa em Campos do Jordão, que naquela época ficava ainda mais bonita exibindo diferentes paisagens do inverno. A casa, com apenas dois dormitórios, tinha uma varanda que circundava boa parte da casa e permitia que se apreciasse o vale, que alguns dias amanhecia coberto de branco, por causa da geada. As lareiras, da sala e do quarto, permanentemente acessas, deixavam a casa aquecida e a atmosfera mais romântica, por isso, apesar do Festival de Inverno daquele ano ter na programação grandes nomes da música erudita, geralmente decidiam ficar em casa a noite.
Camille mostrou-se especialista em Fondue, e não foram raras as vezes que saboreavam os de queijo e de chocolate preparados pela fotógrafa, que também aprendeu a preparar Paninis da Brasa e Tortelloni. Mas não dispensava a Paella que a mulher preparava.
Como Luana não terminara o livro ainda, enquanto escrevia Camille editava algumas fotos, fazia anotações para captação de novas imagens e lia. Muitas vezes passavam horas deitadas no sofá em frente à lareira, cobertas, Luana digitando, e a mulher ou lendo ou assistindo algum filme no tablet.
Saiam para fazer compras para abastecer a dispensa, vez por outra passeavam pelas lojas de decoração, ou simplesmente sentarem num dos cafés ou restaurantes na Vila Capivari. Em um dos dias terminaram embarcando na Maria Fumaça que faz o passeio pela cidade, por pura diversão, como se fossem turistas.
No segundo final de semana na cidade, receberam a visita da mãe de Camille, e de Half, com quem passaram dois dias agradabilíssimos. No domingo pela manhã o casal foi surpreendido com um delicioso café na cama, preparado por Eleonora. A sogra auxiliou Luana a preparar a refeição para o almoço, sob a supervisão de Camille e Half, que estavam mais preocupados em dançar, ao som de John Legend, que aprender alguma receita.
Faltando apenas dois capítulos para conclusão do romance, Luana intensificou o trabalho depois que os sogros voltaram para São Paulo, enquanto a mulher tomava conta dos pequenos afazeres da casa e preparava as refeições para o casal. O demais serviço era feito por uma senhora, contratada para limpar e arrumar a casa todas as manhãs.
Numa das noites ficaram sem luz, então sem poder escrever, Luana permitiu-se aproveitar a atmosfera romântica para namorar a mulher.
- Adoro esse teu cheiro... Confessou a escritora, afundando o nariz no pescoço da mulher.
- E eu morro de tesão quando você me puxa assim e me beija o pescoço...
Risos
- ... e essa é a minha ideia...
- ... bandida...
- Amor?
- Hum? Respondeu, sem querer prolongar a conversa, querendo que a outra usasse a boca para percorrer seu corpo, da linha do pescoço aos seios...depois...
- Será que daqui a alguns anos ainda vamos ter essa vontade toda?... esse mesmo tesão?
- ...hum... você não sei... mas eu, com certeza... agora, dá pra me beijar e deixar essa conversa pra mais tarde... Pediu, mas já agarrando a mulher pelos cabelos e guiando-a para lhe dar prazer.
E como um beijo leva a outro, e uma carícia pede outra, fizeram amor no tapete da sala, em frente à lareira, sobre a manta que antes as cobria. E mesmo que não gostassem de praticamente nada que se referisse à saga Crepúsculo, adoraram quando, no tablet de Camille, a música Thousand Years inundou o ambiente.
Na penúltima noite em Campos do Jordão, o casal saiu para jantar e acompanhar uma das últimas apresentações do Festival. Tão logo adentraram no prédio do Auditório Cláudio Santoro, Luana foi cercada por algumas fãs, interessadas em conhecer mais de perto sua escritora favorita. Camille tendo avistado alguns conhecidos afastou-se da mulher, para cumprimentar os amigos, deixando a escritora com seu público.
Passado algum tempo, de longe percebeu que Luana ainda estava envolvida em uma conversa animada com suas leitoras, e que o grupo ao seu redor tinha aumentado. O que a deixou feliz e orgulhosa, pois sabia que a mulher não se sentia muito à vontade com esse tipo de situação, pois era bastante reservada, e de certa forma se sentia intimidada em contato com fãs.
Entretanto, Camille percebeu que uma das fãs da escritora era relativamente mais saliente, e fazia questão de fazer contato físico com Luana, vez que outra tocando em seu braço, outras vezes querendo falar mais próximo a seu ouvido, como se tivesse intimidade suficiente para isso.
Observou que mesmo que a mulher, de quando em vez, parecesse tentar se afastar, acabava achando algo que a outra dizia interessante ou engraçado e acabava lhe dando atenção. Em um dado momento, a morena passou o braço sobre os ombros de Luana, deixando Camille irritada com a situação, mas ainda porque a mulher não havia se afastado, permitindo tamanha intimidade. E diferente de antes, quando ela e Luana trocavam olhares furtivos, a escritora agora parecia alheia, como se a tivesse esquecido.
Camille procurou na bolsa o celular, pensando em ligar para Luana, e discretamente tentar lhe convidar para que entrassem para tomar assento no espetáculo que começaria em breve, mas percebeu que o havia esquecido no chalé.
Sem suportar mais a proximidade da outra, que monopoliza a atenção da mulher, não pensou duas vezes, percorreu o curto espaço que as separava e, sem fazer questão de ser discreta, aproximou-se do grupo, chegando justamente pelo lado que a outra mulher a assediava, falando próximo ao ouvido de Luana, mas em volume suficiente para que o grupo a ouvisse.
- Querida, desculpa, mas precisamos entrar... Cortou a conversa olhando diretamente para Luana, como se ela estivesse sozinha.
A morena que antes tentava aproximação de todas as formas, pareceu se assustar e, com uma expressão de poucos amigos, virou-se para ver de quem era a voz que chegara. Observando-a de alto a baixo, percebeu que se tratava da mulher com quem a escritora havia sido fotografada várias vezes, com quem se dizia que a escritora tinha um relacionamento.
Apesar do sorriso da mulher, Luana percebeu que algo não estava muito bem, pois quando Camille empinava o nariz e parecia um tanto hostil, era porque algo não a tinha agradado.
- Claro, querida... Me desculpem... preciso entrar. E obrigada pelo carinho... Em breve poderão ler o próximo romance... Mais uma vez, muito obrigada... Desculpou-se com as fãs e virou-se para Camille, procurando seu olhar de forma cúmplice, para que a mulher se acalmasse, mas a recíproca não veio.
Camille imediatamente correu a mão ao longo do braço da mulher e apossou-se de sua mão, fazendo com que ela a acompanhasse. Sabendo que estavam sendo observadas, especialmente pela morena que antes cercara Luana, a fotógrafa tratou de acariciar a nuca da escritora e correr a ponta do dedo, maliciosamente, pelo pescoço da mulher, praticamente exigindo que ela a abraçasse pela cintura.
Procuraram seus assentos no auditório e se acomodaram para assistirem a apresentação. Coincidentemente Camille, ao percorrer com os olhos o ambiente, percebeu que a morena que antes a fizera ficar irritada, sentara-se na fila logo atrás delas, há poucas cadeiras de distância. Ainda chateada com a situação, e querendo deixar claro que Luana não estava livre, tratou de passar o braço por trás das costas da escritora, fazendo carinho em seus cabelos, falando quase em sussurros a seu ouvido e esbanjando sensualidade, observando de canto de olho a fã, um tanto indignada.
Luana, alheia ao fato de a mulher estar enciumada, e já acostumada com as expressões de afeto públicas, não percebeu que Camille estava possessa, embora estranhasse um pouco a repentina necessidade da mulher monopolizar sua atenção, coisa que conseguia sem esforço.
Fim do capítulo
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