Boa noite a tod@s,
Espero que estejam bem. Segue mais um capítulo especialmente pensado para vocês que sempre me incentivam com seus comentários e leituras. Muitíssimo obrigada!
Uma excelente leitura.
Xeros.
Capítulo 48 Não são Sonhos... São Memórias...
“Algo como se tudo aquilo estivesse acontecendo com elas mesmas.”
Essa era a sensação mais palpável que Cosima já provara desde que começou a ler aquelas memórias. Estava sendo consumida por uma felicidade extrema, e sentia toda essa emoção transbordar de si até a sua amada Delphine que também demonstrava partilhar de tudo aquilo. E tal certeza vinha com cada lágrima que ela derramava.
Cosima pode ler no semblante dela o quão exausta estava, pois os ombros pendiam um pouco pra frente e podia também sentir a respiração pesada e a energia carregada que ela emanava, contudo nada daquilo escondia a verdadeira emoção que ela compartilhava, ainda mais porque Delphine sabia exatamente o que viria a seguir em cada uma das páginas restantes, pois não só as havia lido há pouco tempo, mas também porque havia vivido cada uma delas em sua plenitude.
Delphine fixou seu olhar na outra, tentando buscar qualquer resquício de reconhecimento em seu olhar, trazido à tona pelas emoções experimentadas por ela a partir do ponto em que a leitura estava e de como a via naquele instante, completamente tocada e comovida, quase como se ela estivesse vivenciando tudo aquilo, como se ela mesma fosse a própria Melanie. Tal reconhecimento era buscado, pois necessitava quase desesperadamente contar-lhe tudo. Ainda mais após os últimos acontecimentos e do quanto sua amada estava vulnerável, correndo um real perido de vida.
Esse pensamento a fez baixar a cabeça, ainda mais derrotada e lágrimas ainda mais copiosas escorreram de seus olhos, pois ela estava se aproximando de uma perigosa e terrível encruzilhada. Uma das piores, se não a pior decisão de toda a sua existência estava diante de si.
- Del? – A morena percebeu que havia algo errado e foi em direção a ela, tocando-lhe o rosto. A loura não ergueu a cabeça pois optou por encosta-la pouco acima do busto de Cosima e a abraçou pela cintura, buscando um evidente apoio. O recebeu sem demora sob a forma de abraço aconchegante e caricias em seus cabelos.
Cosima sabia que sua amada estava realmente enfrentando muita coisa e que certamente estava muito mais exausta do que parecia. Enquanto a tinha em seus braços e esperava pacientemente por ela, se deu conta que não poderia jamais imaginar o que poderia ser Delphine Cormier. Como se já não bastasse ela ser uma das intelectuais mais respeitadas de sua área ainda era líder de uma grandiosa e milenar organização que tinha a mais nobre das missões. E que como tal, estava absorvendo toda a carga do que estava acontecendo com a morte de uma de suas principais irmãs.
Ali, com ela em seus braços, foi inevitável que não fosse transportada para dentro do livro que estava lendo. Mais precisamente para uma passagem recente, onde a poderosa e temida Evelyne Chermont se desnudou diante da Melanie e assim como a autora, sentiu-se profundamente comovida por estar vendo aquela Delphine humana, de carne e osso. E esse pensamento lhe causou o inusitado e absurdo reconhecimento. Como se um estalo pudesse ser ouvido bem no fundo de sua mente. Novamente sacudiu sua cabeça, recriminando-se silenciosamente e afastando a esdruxula ideia que quis ganhar força.
“Tudo bem, elas são bastante parecidas e em vários aspectos, mas é só isso!” Pensou. Cogitou também que certamente Delphine e Evelyne possuíam muitas características em comum justamente pela posição que ocupavam na Ordem e tudo o que tal lugar suscitava.
- Estou tão cansada! – A voz dela saiu embargada e alertou Cosima. – Porém não posso me dar ao luxo de fraquejar! – Finalmente ergueu seu rosto encarou a morena que a olhava apreensiva e compadecida. – A presença daquele monstro... – Cosima foi interrompida quando ia falar algo. – Por mais que eu conheça, por mais que nos já tenhamos nos confrontado tantas outras vezes, isso sempre me afeta. E vê-lo lá, no velório da Susan, sendo ele o responsável foi demais... – Desvencilhou seus braços da cintura dela e apertou a madeira da mesa onde estava recostada.
- Venha cá! – Cosima demandou por mais carinho. – Você precisa descansar e tem sim o direito a isso. Vamos. – A puxou pela mão e a guiou para fora da Biblioteca.
- Cos... Precisamos conversar... – Tentou em vão, pois não foi imediatamente ouvida.
- Depois Del! Teremos muito tempo para conversarmos, mas eu estou vendo que você está exausta. O dia de hoje foi bastante turbulento e brutal para você. – A levou até o quarto e já foi ajudando-a a retirar o casaco e parte de sua roupa. Delphine se deu por vencida momentaneamente, pois estava se sentindo totalmente esgotada e não protestou mais, apenas permitiu que Cosima fosse praticamente lhe dando um banho. – Termine aqui enquanto trago algo para você comer.
Delphine a viu sair do quarto e realmente estava se sentindo bem melhor após o banho e o sono já pesava em seus olhos assim como toda a pressão que estava sustentando nos ombros só lhe diziam que precisava de boas e longas horas de sono.
Checou a sua agenda no celular e viu que só teria um compromisso da Universidade na quarta-feira, o que lhe possibilitaria toda a terça para que pudesse recompor suas forças e, quem sabe, ter a tão esperada conversa com Cosima. Isso se tornava cada vez mais urgente, ainda mais após o quase encontro de hoje entre ela e seu maior inimigo.
Por mais que lutasse, não conseguia afastar o terror que seria ter algo acontecendo à Cosima e isso ia muito além de apenas a realização da tão ansiada Profecia. Era o pavor de passar pela excruciante dor de perdê-la novamente. Refutou as lágrimas que quiseram vir à tona exatamente no momento em que Cosima retornou ao quarto, trazendo uma bandeja em mãos, contendo queijos e pastas de ervas e torradas, além de uma fervente caneca de café preto, do jeito que ela sabia que Delphine gostava.
- Meu pai sempre dizia que não havia problema algum que uma boa refeição não resolvesse. – Riu ao depositar a bandeja sobre a cama onde a loura já estava recostada.
- Bom... – Beliscou a primeira torrada com pasta de tomate seco – Acho que terei de concordar com seu pai. – Sorriu e se deliciou. A morena aproveitou e comeu um pouco mais enquanto conversavam amenidades sobre comida. Ambas estavam tentando evitar entrar em algum assunto mais denso, pois sabia que muito estava por vir e naquele instante, queriam apenas um pequeno momento sem maiores preocupações.
- Acho que a Srta está precisando dormir um pouco. – Cosima concluiu após um longo bocejo de Delphine que apenas concordou com um balançar de cabeça.
- Vem dormir comigo! – Pediu de forma quase infantil e encantou sua amada que concordou de imediato.
- Não precisa pedir duas vezes. Vou só levar isso tudo para a cozinha. – Cosima saiu do quarto e deixou Delphine já afastando a pesada colcha de sua imensa cama. Sentia o sono já retardar os seus movimentos e percebeu o retorno da outra mulher já entre o piscar lentos dos olhos. Já deitada, esticou o braço, oferecendo seu ombro para que a outra se aninhasse bem ali.
A morena deitou ali, naquele lugar que era só seu e sentiu o calor acolhedor dos braços de quem tanto amava e onde se sentia mais segura. Era incrível como parecia que nada de ruim pudesse lhe acontecer enquanto estivesse ali, ao lado dela. E mesmo sabendo que estava correndo sérios riscos, sentia-se pronta para enfrentar o mundo se tivesse Delphine ao seu lado.
O respirar pesado da loura lhe indicou que ela já estava mergulhada no sono profundo e pensou que ela realmente deveria estar exausta. Aninhou-se ainda mais cuidadosamente e aproveitou a respiração tranquila e as ritmadas batidas do coração dela para também mergulhar nos braços de Morpheus.
Apesar do cansaço dos últimos dias, a mente de Cosima estava inquieta e o sono durou pouco para ela. Acordou após um agitado sonho, só que dessa vez não era um sonho com o passado ou com as mulheres do livro que estava lendo e sim com seus amigos nos EUA, onde todos pareceram bastante tristes por algum motivo e algo que não combinava com aquele sonho a incomodou, a presença da garotinha que conhecera e por quem se apaixonara recentemente. A pequena Manu.
Percebeu que ainda era madrugada e, ao seu lado, sua amada dormia pesadamente. Tentou em vão conciliar o sono novamente e sabia exatamente qual era o motivo de tudo aquilo. Havia algo que precisava fazer, algo que necessitava de sua atenção, pois era algo que poderia ajuda-la a compreender qual era o seu verdadeiro papel naquela história.
“Preciso terminar aquele bendito diário.” Pensou.
Com cuidado, desvencilhou-se dos braços de Delphine que nem se quer moveu um músculo, tamanho era o seu cansaço. Ainda a admirou por alguns instantes e se afastou da cama silenciosamente, enrolando-se num confortável roupão.
Quando retornou a Biblioteca, a lareira estava apenas em brasa, mas ainda bastante aconchegante e com um leve calor emanando de lá. Buscou a mesma poltrona e lá estava o livro sobre ela. O tomou em mãos e assim que tornou a ler as ultimas passagens lidas, sentiu-se novamente tocada pela emoção. Considerava-se uma pessoa romântica na medida certa e não costumava chorar ou se comover com tanta facilidade, mas era impossível refrear aquelas sensações com aquela história, até porque não era nenhum conto fictício, tratava-se de uma história real e contada por quem a viveu em toda a sua intensidade. Suspirou profundamente e reiniciou de onde parou.
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Não existem palavras para descrever tudo o que senti naquele instante, com você ali diante de mim, se entregando de corpo e alma e me propondo algo que eu jamais poderia imaginar ser possível.
- SIM! – Eu praticamente gritei e assustei a todas. Até você pareceu estremecer por um segundo de incredulidade e depois abriu o mais lindo dos sorrisos, aquele que tinha o poder de iluminar até os recantos mais sombrios daquele castelo.
Num movimento único você se levantou e me abraçou me tirando momentaneamente do chão. Rodopiamos em meio as demais mulheres que riam e choravam diante de nós, celebrando aquele momento tão especial para todas.
Paramos exatamente diante de Manu, que parecia estar se controlando ao máximo, mas os olhos marejados lhe entregavam e quando não pode mais suportar, ela lançou-se e nos abraçou em meio a risos e lágrimas de alegria.
- Obrigada Melanie! – Ela segurou as nossas mãos e alternou os olhares entre nós. – Por trazer a minha filha de volta pra mim... Para nós! – Indicou aquelas que estavam ao redor delas. – E... minha filha, o seu lugar sempre esteve guardado para você. Eu rogava as deusas por sua volta e sabia que precisavas travar suas próprias batalhas e percorrer os seus caminhos, para chegar até aqui. – Nós três chorávamos emocionadas.
- Muito bem, muito bem! As horas urgem e a cerimônia se aproxima. – Nanuk nos interrompeu, enquanto tentava sem sucesso, esconder as lágrimas – Essas duas precisam ser preparadas para todo o cerimonial. – Ela se meteu entre nós, causando uma gargalhada generalizada.
- Isso mesmo! – Izabelle juntou-se a ela. – Venha comigo menina Mel. Lhe ajudarei a se preparar.
- E você vem comigo! – Manu puxou você para outra direção. Nos olhamos intensamente e não conseguíamos retirar o sorriso de nossos lábios.
Subi as escadas e parecia que eu estava flutuando, tamanha era a minha felicidade e mal prestava atenção em tudo que Izabelle me dizia até que fui repreendida por ela.
- Menina! Preste atenção! – A olhei assustada assim que entramos em meu quarto onde Alba repousava em minha cama e ela também se assustou. – Esses ritos que devemos fazer aqui, deveriam ter iniciado há dias, mas como não temos mais tempo, precisaremos correr. Para a sua purificação precisamos do banho de expiação.
- Mas o que é isso? Como se faz? – Eu estava um pouco receosa.
- Não se preocupe menina... Não tem nada a ver com confissões cristãs ou coisas do tipo. – Ela me tranquilizou, pois a noção que eu possuía de expiação era aquela narrada nas escrituras e que tinham a ver com o reconhecimento e a punição por pecados praticados. – Consiste num banho ritualístico em uma água de cheiro e ervas, onde você deve entrar em contato consigo , com a deusa e rever suas ações. Mudar as que achar que devem ser mudadas e aprender com aquelas impossíveis de serem mudadas. – Respirei mais aliviada. – Mas antes precisas de um banho comum. – Gesticulou para duas mulheres que nos seguiram até o quarto, solicitando que preparassem o meu banho. – Vou deixá-la. Alba, você consegue ajudá-la ou preciso ficar aqui?
- Não se preocupe Iza. Sei que tens muitas coisas para resolver. – Alba disse se levantando com certa dificuldade. – E para mim será um prazer ajudar a menina Mel como sempre fiz, ainda mais em um momento tão especial para ela. – Me sorriu docemente. Izabelle concordou e assim que meu banho estava pronto, ela e as demais saíram de meu quarto.
- Eu vou me casar Alba! – Disse de uma única vez, levando-a a cambalear para trás.
- Como assim criança? Acabamos de impedir seu casamento com o Duque! – Ela estava bastante confusa.
- Não é disso que estou falando. Vou me casar com a Evelyne! – Rodopiei sobre meus próprios pés diante da perplexidade de Alba. – Na verdade é um ritual de união. Mas pra mim é um casamento. – A abracei e só parei devido ao protesto de dor dela. – Desculpe.
- Não sabia que tal coisa existia! – Ela sorriu ainda sob a perplexidade da notícia.
- Eu também desconhecia até hoje. Mas trata-se de um ritual antigo entre as mulheres da Ordem... - Respondi enquanto terminava de me despir.
– Bom, se é isso que queres e o que lhe faz feliz, também ficarei. – Recebi um caloroso abraço.
- Bom li algo sobre um ritual semelhante praticado pelas antigas amazonas, mas não pensei que ainda fosse praticado em meio ao poder da igreja. - Ainda tentei lhe explicar.
- Melanie! Você viu tudo o que a Evelyne é capaz de fazer? – Ela me perguntou o óbvio. – Nada aqui é convencional minha menina, acho que já deverias ter percebido isso. – Alba tinha razão. Cada vez mais eu me convencia de que normalidade nada tinha a ver com a vida ao lado da mulher incrível que eras.
Após o meu banho eu desci com Izabelle. Procurei você por todos os lados e não a vi. Precisei conter a minha ansiedade que só crescia, principalmente porque eu estava sendo guiada para uma parte do castelo na qual eu nunca havia ido, embora eu soubesse que existiam muitos cômodos ali que eu ainda desconhecia.
Como bem sabes, eu estava indo para as Grutas das Anciãs. Uma série de cômodos que foram esculpidos nas pedras fundamentais de todo o castelo, nos subterrâneos. O ar era denso e quase sufocante, e a náusea era algo quase inevitável de se sentir. Passamos pelas catacumbas de antigas irmãs falecidas e mais a frente, bem sobre a entrada principal das Grutas havia uma inscrição em latim que dizia “In sacris enim potentia feminam.”[1]E aquela frase me dizia que eu estava entrando em um lugar extremamente especial e assim que passei por sob aquele pórtico, eu pude sentir algo impressionante. Definitivamente aquele era um lugar especial. E ao contrário do que eu poderia imaginar, ali não era tão quente nem tão frio e a overdose de odores naturais de ervas e plantas me atingiu em cheio.
A iluminação indireta vinha de tochas e luminárias que ladeavam um corredor que ia se alargando e assim que atingimos o centro da gruta principal, fiquei estarrecida com a grandiosidade daquele lugar. O teto de pedra era bastante alto, quase como se eu estivesse no salão de uma grande catedral e as paredes eram repletas de pinturas, desenhos e inscrições contando a história da Ordem. Mas haviam vários espaços ainda livres e que certamente deveriam ser preenchidos pelas futuras gerações de mulheres da Ordem.
Mais ao centro eu percebi que havia uma grande fonte de pedra negra lisa, lembrando mármore e um vapor quente emergia de lá. Ao redor da fonte estavam Manu, Nanuk e as demais anciãs, aquelas que eu jamais havia visto, pois elas não saiam das grutas devido a idade já bastante avançada.
- Venha criança! – Manu me chamou e segurou minha mão enquanto me apresentava para todas que não me conheciam. Ela vestia uma túnica branca com detalhes em dourado e cada uma das anciãs vestiam túnicas em cores diferentes, totalizando cinco. – Que se inicie a cerimônia de expiação. – Manu gesticulou e uma outra mulher me trouxe um cálice prateado. Olhei receosa para sua mãe, mas ela acenou gentilmente. – Tudo bem criança, podes beber. São ervas que lhe possibilitarão entrar em contato consigo mesma e com a deusa. – Então peguei o cálice e o levei a boca. O cheiro não era dos mais agradáveis e o gosto não era muito melhor. Assim que terminei o ultimo gole, duas mulheres se aproximaram de mim e começaram a me despir. Inicialmente o pudor me fez relutar um pouco. – Melanie... A vergonha de sua nudez está em sua criação cristã e na ideia do pecado original. – Manu me tranquilizava. – Não existe mal algum muito menos vergonha nela. Lembre-se sempre disso.
Concordei com aqueles argumentos e relaxei. Assim que estava completamente despida, o frio me incomodou um pouco, mas logo eu comecei a enxergar todas de forma desfocada e a ouvir orações e cânticos emitidos por elas. Manu entrou comigo na fonte e com delicadeza e firmeza, foi me empurrando para baixo, para que todo o meu corpo pudesse submergir na água. Senti a consciência me abandonando e assim que mergulhei por completo, tudo sumiu.
Poucos segundos depois, me ergui como se houvesse acordado de um longo e profundo sono e me deparei com as mulheres surpresas.
- Nunca foi tão rápido assim! – Disse uma senhora negra e de longas tranças pintadas de vermelho.
- De fato! – Manu me ergueu.
- Do que vocês estão falando?
- De sua passagem menina. – Nanuk disse enquanto me estendia uma manta para que eu me secasse. – Foi muito mais rápida do que seria esperado.
- Como assim? Parece que dormi por horas e... Tive alguns sonhos... Visões de minha vida.
- Mel, esse ritual lhe coloca em contato consigo mesma. É um banho para expiar tudo de negativo, impuro e sombrio que exista em você. E a rapidez só nos diz que não possues nada disso em você criança. – Ela tinha lágrimas no rosto. – E isso é realmente impressionante, dado de quem és filha.
Aparentemente eu já era pura meu amor e não havia mal algum em meu coração, nem mesmo o esperado ódio por meu pai não existia em mim.
- Você está pronta! – Manu anunciou ao termino das orações. – Vá agora! – Manu me indicou o caminho de volta e o fiz sendo novamente levada por Izabelle. Eu ainda estava um pouco tonta e sob o efeito da infusão que bebi e pouco antes de alcançar a passagem que me levaria para o castelo eu lhe vi. Era a sua vez de passar pelo mesmo ritual que eu acabara de vivenciar. Apenas trocamos olhares ternos e repletos de carinho, certas de que muito em breve estaríamos juntas definitivamente.
Fui para o meu quarto, onde Alba me esperava com um sorriso nos lábios.
- Isso acabou de ser deixado para você! – Ela me disse e se afastou para que eu visse uma lindíssima túnica lilás que estava espalhada sobre a minha cama.
- É minha? – Alisei a superfície do tecido quase o idolatrando. – Devo vesti-la agora?
- Apenas na hora de sua iniciação. Deves descer para a cerimônia com ela. Eu venho para buscá-la. Descanse um pouco agora, pois sei que o efeito da infusão demora um pouco a passar. – E saiu do quarto, me deixando apenas com Alba que quis saber tudo sobre o ritual do qual eu havia acabado de passar.
- Então... Aparentemente, eu sou uma moça livre de todo pecado e trevas. – Brinquei.
- Isso eu sempre soube criança. – Me disse ternamente. Deitei-me ao seu lado e fiquei contemplando o teto do quarto por alguns instantes e logo pensamentos um tanto quanto perturbadores começaram a me assolar.
- Alba... ? – Disse baixinho.
- Sim.
- Como é? – Virei-me para ela e a encarei com olhar curioso.
- Como é o que menina? – Ela me perguntou de olhos fechados, pois estava ainda se recuperando. Tentei organizar os meus pensamentos confusos e a forma como poderia perguntar aquilo a ela.
- Como é estar com... Uma mulher? – Sentei-me de pernas cruzadas e a vi arregalar os olhos e quase se engasgar com a própria saliva diante da surpresa com a minha pergunta.
- Menina Mel... Eu, eu... – Ela estava visivelmente desconfortável com aquela situação.
- Alba, eu tenho medo de decepcionar a Evelyne... Ela é tão... Experiente e eu? Nunca fiz nada... Nem se quer provei de uma outra boca. – A angústia começava a me consumir e era potencializada pelo nervosismo e a ansiedade que só cresciam com o passar das horas. – Não sei fazer nada!
- Calma criança! – Alba sentou-se e segurou minhas mãos. – Diga-me o que verdadeiramente sentes pela Evelyne. – A olhei com certa surpresa e num suspiro profundo eu a respondi.
- Eu a amo! Com cada fragmento do meu ser, eu a amo. – Um sorriso bobo pairou em meus lábios e um frio gostoso em meu estômago.
- E é mais do que evidente para qualquer pessoa que ela também a ama! Basta ver o que ela fez por você. Tudo o que ela passou e enfrentou por sua causa. Isso basta Mel. O amor. – Ela tocou meu rosto. – Deixe-se levar por esse sentimento e se permita experimentar e se descobrir com ela. – As palavras ternas de Alba me tranquilizaram momentaneamente. Em meu íntimo eu sabia que certamente seria a experiência mais incrível que eu iria experimentar, mas isso só potencializava o meu nervosismo.
O lento passar das horas também só piorava a minha ansiedade e eu estava começando a achar toda aquela demora estranha, pois já conseguia ver pela janela toda uma movimentação seguindo para os fundos do castelo. Então, batidas na porta me sobressaltaram.
- Pode entrar! – Eu disse com um filete de voz. Então Izabelle e duas outras mulheres entraram em meu quarto, já com suas vestes cerimoniais.
- Está na hora! – Foi tudo o que Iza me disse ao estender a mão. Olhei para a túnica que me foi entregue por Alba.
- Boa sorte criança.
- Você não virá comigo? – A questionei e Alba apenas anuiu negativamente.
- Só membros da Ordem podem participar das cerimônias sagradas. – Izabelle disse num tom apaziguador. Pensei em protestar, mas sabia que seria em vão, pois as tradições da Ordem eram bastante rígidas.
Deixei-me ser guiada por elas e fomos percorrendo os corredores silenciosos do castelo. Presumi que todas já haviam ido para a cerimônia e eu era a última.
- Porque demorou tanto o início da cerimônia? – Questionei enquanto passávamos pelos jardins suspensos da Manu.
- Pergunte a Evelyne! – Foi a resposta que obtive da Izabelle e que causou alguns risinhos das outras mulheres. As olhei em dúvida. – O ritual de expiação dela foi bem mais demorado que o seu. – Ela finalmente me respondeu e fez uma expressão divertida. Entendi de imediato o que ela quis dizer, e compreendi o que tudo aquilo poderia significar para você. Seu retorno para a Ordem representava preços a serem pagos, contas a serem acertadas e sacrifícios a serem aceitos. E por mais que me digas o contrário, eu sei que muito daquilo tudo era por minha causa. Me senti ainda mais especial e duplamente ansiosa.
Chegamos a uma construção menor e que ficava nos fundos do castelo. Não me lembrava daquele lugar, pois nunca havia estado ali. Quando entramos vi que era uma sala completamente vazia. Fui deixada lá e me recomendaram que me despisse e vestisse apenas a túnica. Assim que elas saíram eu comecei a me despir com desnecessária vergonha, pois não havia ninguém lá e o local era bastante escuro, exceto por uma fresta de luz vinda de uma porta diferente daquela usada por Izabelle para sair.
Já devidamente vestida, comecei a ouvir uma canção ao longe e entendi que era o início da minha cerimônia. Ainda esperei alguns instantes que alguém viesse me buscar, mas ninguém veio, então decidi seguir para a origem daquela musica. Quando abri a porta me vi numa antessala com poucos móveis e com uma grande porta escancarada e que dava acesso a um gramado perfeitamente aparado e que se estendia até onde o labirinto vivo tinha início. Olhei ao redor e não consegui ver mais ninguém. Suspirei fundo e me embrenhei naquele perigoso labirinto, onde eu jamais havia tido a permissão de ir. Peguei-me pensando se eu não iria me perder ali, pois os caminhos eram confusos e por mais de uma vez eu dei de cara com caminhos sem saída. Procurei tranquilizar meu coração e focar na canção. Gradativamente eu a percebia se aproximando e isso me dizia que eu estava caminhando para o lugar certo.
Foi então que vi o dançar das chamas por sobre uma parede de trepadeiras verdes e sabia que era para lá que eu deveria ir. Ultrapassei mais duas curvas e uma reta mostrava uma abertura onde eu já conseguia ver algumas delas. Caminhei lentamente, tentando tranquilizar meu coração e minhas respiração e ficar repetindo para mim mesma que era aquilo mesmo que eu queria.
Quando cheguei ao final daquele corredor, percebi que estava exatamente no meio do labirinto onde havia uma circular e perfeita clareira com algumas pedras dispostas em círculos. Entre cada uma delas, havia uma das mulheres que eram membros da cúpula da Ordem e no centro estava Manu, que diferentemente das demais que usavam as mesmas túnicas que eu, estava de branco e dourado, segurando um cajado adornado com flores em uma das mãos. Confesso que naquele instante eu senti uma pontada de receio, mas preferi não emitir nenhuma opinião.
Então todas começaram a mover-se no ritmo daquela melodia que era tocada e cantada por outras irmãs da Ordem. Percebi que a melodia foi progredindo e logo estava chegando ao seu ápice. Nesse exato instante, todas elas abriram suas túnicas e essas caíram ao chão, revelando seus corpos nus. Pensei que o constrangimento teria vez em mim, mas não foi o que aconteceu. Lembrei-me do que Manu havia me dito mais cedo sobre a noção atribuída a nudez e passei a olhar aquele momento a partir da beleza que ele representava e da beleza que cada uma daquelas mulheres representavam. Cada uma com suas particularidades e imperfeições que as faziam lindas.
Foi então que lhe vi. Vindo do lado oposto ao meu e mesmo estando longe de mim, pude sentir o poder da sua presença e então nossos olhares se encontraram. Você se moveu primeiro e caminhou para o centro do círculo e postou-se ao lado de sua mãe. Ambas olharam em minha direção e compreendi que eu também deveria seguir até lá. Com um pé após o outro, venci os últimos metros que me separavam da minha antiga vida, para a nova que teria início em poucos instantes.
Cada passo que eu dava eu via o seu sorriso se agigantando e iluminando ainda mais aquele cenário, me acolhendo, me recebendo e dizendo para o meu coração que eu havia definitivamente encontrado o meu lugar no mundo.
Parei de frente a você e ambas nos postamos diante de Manu que nos recebeu de braços estendidos e com uma expressão serena no rosto. Olhei para você e a vi com o mesmo ar confiante de sempre e senti uma pontada de inveja, pois eu estava nervosa ao extremo. Apesar de já ter lido tudo sobre aquela cerimônia e de ter sonhado com ela, nada poderia me preparar para a realidade.
- Minhas irmãs. Estamos hoje aqui, diante umas das outras e perante a deusa, para celebrar mais um solstício de verão. Contudo, essa noite temos muito mais a celebrar, pois hoje estamos recebendo definitivamente entre nós... – Manu deu uma breve pausa em seu discurso para demorar seu olhar sobre você e pude perceber um traço de dúvida pairar sobre os belos olhos azuis. Ela ainda não conseguia acreditar que havias, de fato, retornado para a Ordem e se esforçou bastante para não deixar aquela inquietação ser percebida por você. – Essas duas jovens mulheres que, a partir de hoje, se tornarão nossas irmãs.
- SIM!- Todas as demais disseram em uníssono.
- Portanto... – Gesticulou para que Izabelle segurasse o cajado que ela trazia em mãos. Foi então que a vi duas outras mulheres trazendo caixas de madeira escura. Elas pararam ajoelhadas diante de Manu e ergueram as caixas. Ela então abriu ambas e pude ver que dentro delas havia duas coroas de flores e folhas. O perfume vivo e doce me indicaram que aquelas plantas ainda estavam frescas, o que estava de acordo com o que eu havia lido. Mandava a tradição de que a ultima iniciada confeccionasse a coroa da aspirante que seria iniciada naquela cerimônia. E assim foi feito. Isso fazia com que cada coroa fosse única e especial.
A minha continha pequenas flores brancas e lilás, que possuíam um cheiro doce e eram chamadas de Flor de Mel. Achei curiosa a coincidência e admirei o belíssimo trabalho. Já a sua continha flores maiores que eram de um azul vivo e impressionante e de cheiro marcante. Conhecidas como Flor Abelha Azul ou Delfinio, o contraste com os seus cachos dourados que estavam presos numa trança solta era a melhor definição da perfeição.
- Que agora, essas novas irmãs possam estar conectadas a todas nós! – Manu prosseguiu e pediu que uma outra irmã visse até ela. Essa trazia um rolo de fita de cetim lilás, na mesma tonalidade das nossas túnicas. Manu a tomou e começou a soltar a ponta enquanto cantava palavras em celta antigo. Começou a contornar a fita em minhas mãos, depois nas suas, em seguida nas dela e repassou, para que todas que estava ali fizessem o mesmo. Ao final, aquela fita, simbolizava a profunda conexão que podia ser verdadeiramente sentida por cada uma de nós. - A deusa e nós saudamos as nossas novas irmãs! – Erguemos nossos braços ao céu sob a linda luz da lua.
Risos e cumprimentos permearam o ambiente e percebi que então todas já haviam vestido as suas túnicas e após um outro gesto de Manu, retornaram aos seus lugares, de volta ao circulo. Foi então que eu percebi que ao longe as cinco anciãs se aproximavam de nós, o que causou algum espanto em várias das presentes, pois não era comum que elas saíssem das grutas. Olhei para você e percebi que também estavas surpresa e olhamos ao mesmo tempo para sua mãe.
- Essa noite também nos foi solicitado um ritual de união... – Arregalamos nossos olhos enquanto alternávamos nossos olhares de Manu para as anciãs que agora estavam próximas a nós, fazendo com que até a poderosa Mestra se ajoelhasse diante delas. E todas nós fizemos o mesmo.
- Hoje a deusa falou conosco! – A mais velha dentre elas, Celene, se pronunciou com dificuldade, devido a sua avançada idade que nem ela mesma tinha a certeza qual era. – Pedimos a benção dela para esse ritual especial e ela nos disse que essa ligação, que será estabelecida hoje, não é uma união comum. Ela estava escrita para acontecer! – Nos entreolhamos extremamente emocionadas – Pois, minhas crianças... – Ela se dirigiu especificamente a nós duas, o que as conecta é o mais poderoso e extraordinário amor! – Senti sua mão procurar a minha e apertá-la com força. Meu coração não cabia mais em meu peito. – Levantem-se! – Ela solicitou e gesticulou para que Manu e as demais se afastassem.
As cinco anciãs ficaram ao nosso redor e uma delas trazia uma pequena caixa de madeira bem velha, cuja a tampa trazia esculpido o labrys. Celene a abriu e tirou de lá um pequeno punhal enrolado por uma fita de cetim vermelha bastante gasta, o que denunciava a idade daqueles objetos.
- Suas mãos esquerdas! – Ela demandou e nós, ainda ajoelhadas, obedecemos. Ela desenrolou a fita com bastante dificuldade devido ao excessivo tremor de suas velhas mãos. Apesar de antiga, a lâmina ainda era brilhante e afiada, pois num único golpe, Celene fez pequenos talhos em nossas mãos. Cortes superficiais, mas suficientes para deixarem filetes de sangue a mostra. Ela então juntou nossas mãos de maneira que nossos líquidos vitais se unissem e se misturassem e selou aquela união, envolvendo nossas mãos com a velha fita de cetim vermelha. – O que a deusa uniu, nenhuma força será capaz de separar! – Profetizou e puxou nossas mãos, nos fazendo ficar de pé com as mãos unidas, os dedos entrelaçados, nossos seres conectados eternamente.
Jamais senti uma sensação como aquela! Eu era sua e você era minha! E a certeza de que aquilo era a coisa mais certa me enchia de uma felicidade tão intensa, que eu não conseguia segurar mais as lágrimas e retirar o sorriso dos lábios.
- Pronto minhas crianças, agora vocês são duas metades de um todo perfeito! São uma só! – Rimos embevecidas e nos perdemos em nossos olhares. Quando desviei meus olhos, as anciãs não estavam mais lá e as outras irmãs da Ordem também tinham lágrimas em seus olhos, especialmente Manu, que correu para nos abraçar e gentilmente desenrolou a fita vermelha de nossas mãos.
- Isso fica comigo! Parabéns minhas filhas! – Sorriu emocionada.
- Obrigada Manu. – A agradeci.
- Pelo o quê Mel?
- Por me deixar fazer parte disso tudo e... Por trazeres para mim o meu grande amor. – Olhei para você que não conseguia parar de me olhar.
- Eu não fiz nada criança. Ouviram o que as anciãs disseram, estava escrito. – Ela piscou o olho para mim.
- Mel... – Estremeci ao ouvir a sua voz naquele tom. Virei-me para encará-la e senti minhas pernas amolecerem quando recebi o carinho de suas mãos em minha face. Com o canto dos olhos e ainda pude perceber que Manu se afastava e indicava que todas fizessem o mesmo.
- Sim Eve? – Respondi baixinho, mas o pedido, a pergunta, a declaração não foi pronunciada e sim sentida.
Nem em meus sonhos ou delírios mais apaixonados eu poderia imaginar o quanto seria maravilhoso o seu beijo! A maciez de seus lábios, a doçura do seu sabor e o poder do seu desejo me proporcionaram a mais fantástica das experiências e eu, finalmente encontrei o meu lugar no mundo. Era no seu beijo.
Contudo, a ternura daquele toque tão íntimo logo despertou em mim sensações até então inexploradas e o calor que tomou conta de meu corpo rapidamente concentrou-se em meu baixo ventre e quase involuntariamente eu soltei um gemido que lhe atingiu em cheio, pois senti toda a sua firmeza titubear ao ponto de precisares dar dois passos para se firmar novamente.
Aquela reação que lhe causei me encheu de uma súbita confiança me levando a abrir ainda mais meus lábios para receber mais de você. A força com que se agarravas a mim era impressionante e denunciava o quão fora de si estavas naquele momento. Foi a sua vez de gem*r entre meus lábios e um latejar dolorido bem entre minhas pernas indicavam o quanto eu precisava de você.
- Espera! – Você disse ofegante e após se afastar um pouco de mim.
Meu amor, eu poderia dizer que me assustei com o que vi em seus olhos naquele instante, pois eles estavam escuros, quase turvos. Seu rosto adquiriu um tom avermelhado e o ritmo de sua respiração me lembrava dum animal selvagem, prestes a avançar sobre sua presa. Mas não temi!
- Esperar por quê? – Dei dois passos em sua direção. – Eu quero! Eu preciso de você! – Eu não conseguia pensar em mais nada, apenas em estar com você, me entregar a você por completa, embora o receio da minha inexperiência ainda estivesse presente, eu estava consumida por uma súbita coragem.
- Vem comigo! – Você pegou minha mão e foi me guiando por entre os corredores do labirinto vivo. Eu apenas conseguia me deixar levar e focar no balançar de sua trança. Parecia que conhecias aqueles caminhos de cor, pois em poucos minutos já estávamos saindo daquele emaranhado verde e quase correndo, subimos os degraus de volta para o castelo poucos segundos antes de uma inesperada chuva despencar.
Passamos pela cozinha que estava vazia e escura, percorremos os corredores que nos levariam até a imensa escada principal do castelo e não havia sinal de mais ninguém. Em poucos passos, vencemos os degraus e atingimos o primeiro andar. Só então você virou seu rosto para mim e pude ver que a urgência também se fazia presente em você.
Seguimos sem parar em meu quarto que então percebi que não seria mais meu, pois eu caminhava para o seu, que também não poderia mais ser chamado assim. Ele seria nosso!
Me surpreendi ao sentir o tremor em sua mão sempre firme aumentar a medida que nos aproximávamos do quarto e a vi hesitar diante da porta. Decidi então lhe lançar mais uma mensagem do quanto eu estava à beira do desespero em tê-la. Aproximei-me por trás de você, quase colando nossos corpos e sussurrei em seu ouvido.
- Eu quero ser sua! – Era tudo o que tinha a certeza naquele instante e perceber você se retesar diante daquilo me fez ter certeza de que estávamos prestes a viver algo único. Num único movimento você abriu a porta e me puxou para dentro, fechando a porta já com o meu corpo colado ao seu contra a superfície dura de madeira.
Estremeci com a aproximação de sua boca entreaberta e engoli em seco pouco antes de receber mais um apaixonado e urgente beijo.
- Eve... – Sussurrei baixinho entre os lábios dela.
- Oi meu amor?
- Eu, eu... – A súbita coragem de antes pareceu titubear por um instante, mas a questão era que eu realmente não fazia ideia do que viria a seguir após o beijo. – Eu não sei... Como... Eh... – Baixei meus olhos envergonhada. Você segurou meu queixo e procurou se tranquilizar antes de me dizer algo.
- Mel... Não se preocupe... Não precisamos fazer nada que você não... – Lhe calei antes que você pudesse prosseguir, pois nada nem ninguém me impediriam de ir em frente com você.
- Eve...Eu quero tudo com você. Só peço que... Tenha paciência comigo. – Você segurou minhas mãos entre as suas e beijou os nós de meus dedos com carinho e devoção.
- Meu amor, te peço então que não tenhas medo e... Confiei em mim. – Me olhaste de baixo para cima e começaste a beijar meu rosto com inicial ternura e eu só conseguia focar na maciez de seus lábios roçando sobre a pele de meu rosto. Você passou por minha boca, quase sem a tocar, permitindo apenas que eu sentisse o calor do seu hálito e beijou minha outra face. A cada toque de sua boca em minha pele o ritmo de meu coração aumentava e a urgência atingia níveis inimagináveis.
Estava amando o carinho com que beijavas e me acariciava, mas eu queria mais e cansei de esperar!
Enfiei meus dedos por baixo de sua trança e puxei-a contra a mim, já lhe recebendo com a boca entreaberta, ávida para receber tudo o que tinhas para oferecer. Não me arrependi.
Foi o beijo mais intenso, cru e apaixonado que trocamos e a chama que já me aquecia, me fez entrar em ebulição.
- Mais! – Sussurrei e aquele comando era tudo o que precisavas.
Suas mãos subiram pela lateral de meu corpo e alcançaram o laço que prendia a minha túnica, pouco acima de meu busto. Com uma lentidão torturante, você desfez o nó e pude sentir a diminuição da pressão, indicado que com qualquer movimento um pouco mais brusco, aquela peça de roupa – a única que eu estava vestindo – cairia. Estremeci e deixei que meu nervosismo transparecesse. Como se você tivesse lido a minha mente, lhe vi se afastar um pouco sem tirar os olhos de mim. Então assisti suas mãos desvencilhando o nó que prendia a sua túnica. Com uma sensualidade provocante, abriste a tua túnica se desnudando diante de mim.
Sob a luz da lua que entrava pelas amplas janelas eu vi cada vez mais trechos da brancura de sua nudez e minha mente deu um giro quando num movimento brusco, você abriu os braços puxando a sua veste e a deixando cair ao chão.
Definitivamente era a coisa mais sensual e linda que eu já havia visto e cada pedacinho de mim respondeu àquela visão, pois senti algo até então novo para mim, a quente umidade escorrer por entre minhas pernas.
Lentamente descolei meu corpo da porta e dei dois passos curtos em sua direção, esse simples movimento fez com que a minha túnica começasse a se desprender de meu corpo, me revelando para você.
Delirei quando vi seus olhos abandonarem os meus, descerem e verificar tudo o que eu tinha a lhe oferecer. Sorri deliciada ao ver seu lábio ser mordido e os olhos serem cerrados assim como seus punhos.
Parei a poucos centímetros de você e o calor que emanávamos, podia ser sentido por nos duas e, a despeito do frio que fazia lá fora e da chuva persistente, gotas de suor brilhavam em seu rosto e escorriam de algumas partes de meu corpo. Desci meus olhos e foquei na rigidez de seus seios que tremiam sob o ritmo alucinado de seu coração que parecia me chamar, clamar por mim e mesmo sem a certeza do que eu estava fazendo, estendi minha mão e toquei a lateral de seu seio de forma insegura, lhe olhei nos olhos, buscando algum sinal de aprovação ou não, sobre o que eu estava fazendo embora o arrepiar de sua pele sob o meu toque já me indicava que eu estava indo bem. Ousei então acariciar seu outro seio, contornando as curvas perfeitas e firmes lhe fazendo estremecer, e esse tremor aumentava à medida que eu me aproximava do centro deles, aqueles pequenas e rosadas protuberâncias que estavam absurdamente rígidas.
Meu amor, necessito fazer uma ressalva aqui, pois eu estou narrando o momento da minha primeira e definitiva vez com você e naquele momento eu era uma total inexperiente nos caminhos do prazer, contudo estou narrando com a propriedade de quem pode gabar-se de conhecer cada reentrância de seu corpo, cada tremor que antecedia o seu êxtase, cada som que emanavas, cada gota, cada cheiro... Mas naquele instante, eras ainda uma desconhecida para mim e a quem eu estava amando descobrir.
Então olhei de baixo para cima e mordi meus lábios e indiquei com os olhos como se pedindo algum tipo de permissão. O anuir firme e rápido de sua cabeça me lançou uma frágil segurança. Finalmente sobrevoei e mal toquei os bicos de seus seios e lhe vi retesar todo o seu corpo. Lentamente fui fechando minhas mãos e os sons que começas a emitir eram indicadores perfeitos de que eu estava fazendo alguma coisa certa.
Com os olhos cerrados e a cabeça pendendo um pouco para trás, você se entregava para mim e eu explorava cada pedacinho de seus seios, deliciando-me com a visão de cada pinta que possuías e eu percebia que, assim como eu, já estavas chegando ao seu limite, contudo, algo ainda a segurava, a detinha. Aproximei-me de você e quase colei minha boca ao seu ouvido. Precisei de todo o meu autocontrole para manter o meu foco, pois o súbito e rápido roçar de nossos seios provoca a mais sublime das sensações. E quando eu estava próxima o bastante, sussurrei em seu ouvido.
- Me faça sua! – Você afastou a cabeça com os olhos arregalados e, como se eu tivesse arrebatado as amarras invisíveis que lhe continham, você me tomou em seus braços e nos girou, sentando-me sobre a sua mesa de estudos, encima de alguns pergaminhos abertos, mas não nos importamos nem um pouco com aquilo, pois eu só conseguia delirar com a dança alucinada de sua língua contra a minha e atrito quente e arrepiante de nossas peles nuas.
O latejar de minha feminilidade aumentava de forma que seguia cada investida de sua língua em minha boca e das carícias mais intensas se suas hábeis mãos, que me tocavam como se explorasse um terreno intocado e quase sagrado. Quase instintivamente eu abri minhas pernas para que você se posicionasse entre elas e assim que o fizeste, eu literalmente urrei, ao sentir o toque da sua intimidade contra a minha.
Aquilo definitivamente era a definição mais que perfeita de paraíso.
Seguindo as ordens que meu desejo me demandava, enlacei sua cintura com minhas pernas, cobrando cada vez mais contato.
Gemíamos juntas!
Você se segurava em mim, me apertando com intensidade, para logo em seguida, me acariciar com gentileza. Estavas me testando e eu estava amando. Mas queria mais... E novamente pedi.
- Eu quero mais... – Novamente me olhastes com um misto de surpresa e satisfação e num outro hábil movimento, me ergueu naquela mesma posição e me carregou até a cama onde fui quase jogada por você. Me esparramei em meio aos seus inúmeros travesseiros e lhe vi vir subindo sobre mim, engatinhado como um felino a espreita e o rastro molhado que ias deixando em minhas pernas a media que subias estava me fazendo perder a razão e a consciência.
Então você parou com o rosto a centímetros acima de minha intimidade pulsante e puxastes o ar com violência, gem*ndo alto quando o meu cheiro invadiu sua mente.
Por um breve instante eu perdi a noção de tudo, ao sentir o rápido e sutil toque de sua língua lá onde eu mais a desejava. Quando voltei a mim já estavas com o corpo completamente sobre o meu e lentamente fostes baixando e ambas gem*mos alto quando senti toda a extensão de meu corpo ser pressionada pelo seu.
Era sublime demais!
Num movimento seguro e ágil, você mexeu seu quadril e pernas de tal maneira que nossas intimidades se tocassem de forma ainda mais inteira que há poucos instantes. Foi quando ouvi pela primeira vez aquele som fabuloso, de nossas umidades em perfeito atrito. Você se movia no meio de minhas pernas e me observava atentamente, como se buscando algum indício de que estavas indo pelo caminho certo.
Tudo que eu conseguia era soltar um grunhido rouco do fundo de minha garganta.
- Hunrum!
E ela sorriu de forma estonteante.
Então eu percebi que um calor desconcertante começou a emanar de onde nos tocávamos e a cada pressão do seu quadril contra o meu me lançava uma onda de energia que eu jamais havia experimentado. Eu tremia, gemia e inevitavelmente lágrimas começaram a transbordar de meus olhos, pois a felicidade que eu estava vivenciado não cabia mais em mim.
Gritei assim que senti o primeiro e violento espasmo me acometer. Era como se eu estivesse explodindo em milhões de pedaços e me reconectando, tão somente para explodir novamente repetidas vezes e cada uma mais intensa que a anterior.
Era o êxtase que estavas me proporcionando.
Eu me lançava contra você de forma descoordenada e quase desesperada e então vi em seus olhos que não tardarias mais em me acompanhar naquela alucinante viagem, pois lutavas para manter os olhos abertos, mas os limites daquela explosão que estava me acometendo lhe forçaram a cerrar os olhos e aumentar o ritmo da dança que conduzias.
Eu não mais gemia sozinha e o som do seu êxtase tornava tudo ainda mais delicioso e como alcancei aquele lugar um pouco antes de você, pude recobrar a minha lucidez ainda em tempo suficiente de vê-la se perdendo em tremores descontrolados e suspiros fora de ritmo.
Definitivamente era a coisa mais linda que eu já vira em toda a minha vida.
E quando o ultimo espasmo lhe fez retesar todos os seus músculos, senti o peso de seu corpo relaxar sobre o meu. Ficamos naquela posição por longos minutos e em completo silêncio, apenas apreciando aquele momento único, como se desejássemos guarda-lo para sempre em nossas memórias.
Lentamente você escorregou para o meu lado e deitou virada para mim. Eu ainda permaneci de olhos fechados, mas tinha a certeza que me olhavas, pois sentia o peso e a intensidade de seu olhar. Não estava enganada. Virei meu rosto e lhe vi com o olhar apaixonado e embevecido. Olhar esse que eu sempre veria dali para frente.
Chorei!
- Você está bem? – Você se preocupou de imediato. – Fiz algo que lhe desagradou?
- Não meu amor... – Disse entre risos e lágrimas. – O que você me proporcionou foi algo tão maravilhoso e lindo que não consegui me conter. – Senti seus lábios sorvendo as gotas salinas de minha face.
- Que bom meu amor. Foi maravilhoso para mim também.
- Foi mesmo? – A insegurança voltou a dar as caras.
- Porque eu mentiria? Melanie foi maravilhoso como nunca fora com nenhuma outra. – Meu coração quase explodiu de felicidade. - E... Sabes porque foi tão perfeito? – Eu neguei com um movimento de cabeça, embora soubesse exatamente o que estava por vir. Eu queria ouvir. – Porque eu a amo demais! – Me envolveste em teus braços, garantindo que falavas a verdade.
- Eu também lhe amo Eve! Com toda a força de meu ser. – Aninhei minha cabeça sobre seu peito e novamente permanecemos naquela posição, imóveis por alguns instantes até que...
- O que a sra quer por ai? – Ergui meus olhos e vi sua face curiosa, com uma das sobrancelhas erguidas e indicado com o olhar a minha mão que havia abandonado seu seio e descia por seu abdômen. Forcei a minha expressão mais ingênua para lhe responder.
- Eu? Absolutamente nada... – E delirei ao sentir a fina penugem úmida sob meus dedos. Meu prazer só não foi maior que o seu e com mais um olhar meu, pedi silenciosamente por sua permissão. Ela veio com o abrir de suas pernas, me convidando para explorar tudo o que eu mais desejava, mesmo sem saber ao certo o que deveria fazer.
As repetidas vezes que a lancei ao êxtase naquela noite, me mostraram que eu estava indo pelo caminho certo.
******
- Não eram apenas sonhos! – Cosima soltou o diário que caiu no chão assim que ela se levantou da poltrona. Ela estava aflita e angustiada, completamente confusa e perdida diante das constatações que estava tendo.
Estava se referindo aos estranhos sonhos que passou a ter desde que chegou à França. Todos eles sonhos perturbadores e quase reais com Melanie. Tão reais que, por vezes pode experimentar o que era ser ela.
- Não pode ser... – Perambulou pela sala, levando a mão à testa e apertando o estomago. – Não são sonhos... São... – Tentou refrear aquela surreal ideia, mas ela era poderosa demais para ser ignorada ou lançada para as profundezas do esquecimento. – São... Memórias!
[1] O poder do feminino é sagrado.
Fim do capítulo
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LB-93
Em: 08/06/2018
Caríssima autora,
preciso-lhe dizer, que sua estória me pegou de forma impar e arrebatadora. Acho que nunca havia lido algo que me causasse tantas emoções ao mesmo tempo. Deixei o meu comentário para o final, pois a cada novo capítulo devorado eu me sentia mais extasiada e precisando ver o que viria a seguir, e confesso, você não me decepcionou, e aposto que a nenhuma outra de suas leitoras. Aguardo ansiosamente o continuar da mesma, que a cada instante me prende, me angustia e me enche de alegria por poder lê-la. Não, não penses que estou exagerando em meu comentário, pois sua estória realmente me prendeu de forma inigualável, me fazendo passar dias seguidos em sua leitura a devorando. Pois não tens noção de como essa temática me encanta e a forma como abordou todos os assuntos, o feminismo, o machismo, o amor e a História propriamente dita, foram expetaculares, demonstrando o quanto deve ter estudado para chegar a tal narrativa.
Um grande abraço,
LB-93
Resposta do autor:
Olá LB...
Primeiramente Fora Temer rs...
Segudanmente, desculpe a demora na resposta, mas a minha semana foi bastante corrida e só vim conseguir terminar o capítulo dessa semana às vésperas da postagem.
Bom, fico muitissimo feliz em saber que tenhas apreciado tanto a minha história. Me encanta perceber que algumas pessoas curtem minhas loucuras e se sentem tocadas por elas.
Gostaria de saber como você chegou nela e, caso queiras papear mais sobre, segue o link de meu face:
https://www.facebook.com/profile.php?id=1223930183
Muito obrigada pelo seu carinho.
Xeros
Pollyan
Em: 03/06/2018
Meeeu Deeeeeeeus! Ahhhhh (risos) Eu definitivamente amo essa estória! Jules_Mari, minhas felicitações mais uma vez. Gosto das cenas descritas mais "coisadamente", se é que me entendem, mas a singeleza da cena da primeira vez da Mel foi linda, gente! Ela é bem saliente sim, mas foi especial a forma de descrever (risos). Obrigada por essa preciosidade. Meu Deus o domingo que vem precisa chegar logo! O que é meio impensado de minha parte pq tenho muito trabalho pra concluir, mas sim quero ver a continuação.
Resposta do autor:
Mais "coisadamente"? Fiquei curiosa com essa expressão ahahaha
Melanie não seria capaz, nem tinha como, de descrever com mais lacividade as suas experiências eróticas.
Agradeço os eslogios e ambas teremos uma semana cheia... Espero conseguir produzir o próximo capítulo a altura de vocês.
Xeros
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