Capítulo 32 -- Amar é Complicado
A ILHA DO FALCÃO -- CAPÍTULO 32
Amar é complicado
O aviso de "Apertem os cintos de segurança" acendeu, e Talita, automaticamente, verificou se o cinto estava travado.
-- Dentro de minutos pousaremos no Aeroporto Internacional de Florianópolis, Hercílio Luz, anunciou a voz macia da aeromoça.
-- Por favor, verifiquem se a bagagem de mão está no compartimento, e fechem as bandejas das poltronas.
O avião mergulhou para se aproximar da pista e Talita estremeceu. Mas o tremor não foi causado pelo medo. O que a fazia tremer era a angustia de não ter notícias de Carolina. Em seu último contato, Elisa havia dito que Carolina não estava em nenhum dos abrigos oficiais da ilha. Essa informação a fez ter pensamentos horríveis sobre o que poderia ter acontecido com ela durante a tempestade.
A aterrissagem foi rápida e sem problema. O aeroporto estava movimentado. O feriado prolongado havia trazido muitos turistas à Florianópolis.
O avião taxiou tranquilamente no terminal, enquanto os passageiros e a tripulação recolhiam seus pertences.
As pessoas falavam alto, muitos estavam revoltados com a falta de sorte. Aquele era um voo turístico, a maioria dos passageiros haviam programado a viagem a meses. Seria o feriadão dos sonhos, mas a tempestade transformou tudo em um verdadeiro pesadelo. A mudança meteorológica foi repentina e agora era tarde demais para desistir.
O avião estacionou, a porta foi aberta e, os passageiros desembarcaram apressados.
Talita caminhou até o terminal, entregou o passaporte para a inspeção e entrou na fila para recolher a bagagem na esteira rolante.
Era apenas uma pequena mala, deixou o restante de seus pertences no Rio de Janeiro, para onde pretendia retornar em breve.
O celular tocou. Era Elisa.
-- Boa noite, Elisa. Acabei de chegar em Florianópolis -- Talita caminhava em direção ao portão de saída do aeroporto enquanto falava ao celular -- Estou indo para a marina... -- O que?
Se já estava ansiosa no avião, agora se sentia cem vezes mais nervosa. Seu coração quase explodiu.
-- Meu Deus, Elisa -- Talita falava com muito esforço. Não se conteve e começou a chorar -- Por que aquela cabeçuda não saiu da cabana?
Talita estava tão transtornada e perdida que quando se deu conta já estava entrando em um taxi.
-- Para o Hospital Celso Ramos -- o táxi se pôs em movimento, e Talita acrescentou: -- O mais rápido possível. Por favor!
Natasha abriu os olhos lentamente e olhou para o teto branco. Deitada de costas na cama, se sentia entorpecida e alheia aos bips a sua volta.
-- Natasha.
Ao reconhecer a voz de Talita, Natasha virou a cabeça devagar. Ela estava parada junto à cama, com uma expressão de choque e preocupação nos olhos quando a encarou.
-- Falei com a médica quando cheguei. Ela me contou que você teve uma crise de asma, mas que vai ficar bem -- disse, com um relance ao redor do quarto -- Ela também me disse que você chamava o tempo todo por Carolina.
Ao ouvir o nome Carolina, Natasha voltou a fechar os olhos. Momentos antes, ela dissera palavras desconexas em seu sono, devido à febre.
-- Qual delas? A falsa ou a verdadeira? -- perguntou cheia de amargura e revolta.
Talita puxou uma cadeira e se acomodou mais próximo dela. Natasha descobriria isso mais cedo ou mais tarde.
-- Então você já sabe.
Natasha ergueu o olhar para a encarar, e seus lábios tremeram, como se estivesse na iminência de uma crise de choro convulsivo.
-- Como uma pessoa consegue ser tão falsa e mentirosa? Como pude me enganar tanto? Reconheço agora que agi como uma boba ingênua, mas ela me pareceu tão sincera...
Talita percebeu que mais do que traída e magoada pela armação de Andreia, Natasha sentia-se humilhada.
-- Você não é uma boba, Natasha. Muito menos ingênua. A trama que elas montaram é que foi muito bem planejada. Só não deu certo porque a sua irmã verdadeira apareceu.
Natasha sabia que a médica estava tentando ser amável, tentando animá-la, mas nada nem ninguém conseguiria tal feito.
-- Bom, pensarei nisso mais tarde. Como dizia um filósofo: É pra frente que se anda -- decidiu -- No momento o mais importante é cuidar da minha irmã verdadeira -- em poucos momentos ela esqueceu de tudo que não fosse a alegria de ter encontrado a verdadeira Carolina -- Como ela está?
-- Aquela garota adora entrar em encrencas -- Talita sorriu -- Ela vive se machucando. Dessa vez ela teve fratura exposta na perna esquerda e passou por uma cirurgia. O estado de saúde dela requer atenção profissional contínua, mas encontra-se estável.
-- Enquanto viver jamais esquecerei o horror, a dor e o desespero desse dia -- uma sombra de tristeza passou pelos luminosos olhos verdes -- Pensei que não sairíamos vivas daquele lugar.
-- Ela nasceu de novo, foi você quem a salvou. Não tinha como estar viva se não fosse por sua persistência e calma.
-- A coragem e inteligência é um carma que me acompanha desde que nasci. Fazer o que.
-- Você se acha a fodásica, não é mesmo?
-- Eu não me acho, mas o que é a minha opinião contra a de milhões? -- Natasha começou a arrancar os fios presos aos seus braços -- Estou bem. Não preciso mais disso. Quero ver a minha irmã.
-- Calma, Natasha! -- pediu Talita -- Criaturinha nervosinha. Deixa que eu tiro.
-- É esse o hotel -- disse Mariana, sem olhar para o motorista de meia-idade.
O homem obedeceu, saiu do carro e abriu a porta para ela sair.
Instantes depois, passos impacientes atravessaram o saguão do imponente hotel, parando diante do balcão da recepção.
-- Senhorita Mariana, nós não a estávamos esperando -- comentou a recepcionista, confusa.
Mariana não respondeu.
-- Quero a minha antiga suíte.
-- Sinto muito senhorita Mariana, mas a suíte está sendo ocupada pela irmã da dona Natasha.
Mariana ficou furiosa. A pele clara de seu rosto estava vermelha. Porém suspirou e controlou-se.
-- Então pode ser a suíte rosa.
-- Desculpa, mas nessa suíte está a dona Lalesca, amiga da dona Natasha. A única suíte vaga no momento é a do sexto andar.
-- O que? Então manda transferir essa tal de Grotesca, Balesca, sei lá o que, para a suíte do sexto andar.
-- Sinto muito, mas a senhorita não manda em mais nada por aqui -- Paloma se calou rapidamente. Levou ambas as mãos à boca, depois as deixou pender lentamente -- Desculpa.
-- Desculpa uma pinoia! -- disse irritada -- Considere-se demitida. Vou falar com a Natasha sobre essa sua atitude desrespeitosa -- Mariana deu um tapa no balcão e olhou para Paloma de um jeito estranho -- Me dê a chave da suíte do sexto andar, depois resolvo esse desaforo -- decidida, Mariana entrou no elevador, pálida, os olhos brilhavam intensamente demonstrando nervosismo.
O elevador se abriu no sexto andar e a figura esguia, de cabelos ruivos e longos entrava, enquanto ela saia.
-- Boa noite! -- disse Carol, sorrindo.
Mariana não respondeu. Saiu do elevador de modo prepotente e arrogante.
-- Odeio gente muito feliz!
-- Mal-amada - respondeu Carol.
Carolina dormia quando Natasha entrou no quarto. Ao vê-la, Talita levantou-se e contou:
-- Ela dormiu muito bem essa noite e só acordou uma vez. Eu passei a noite aqui, não queria deixa-la sozinha. E você como está?
-- Tô com asma. Asmania de ser trouxa.
-- Que coisa, Natasha -- Talita olhou para a janela pela qual entrava luz e depois para o relógio -- Daqui a pouco vai ter que voltar para a ilha. Acho melhor estar preparada para enfrentar a dura realidade.
-- Opinião é igual bunda: não é por que você tem, que você precisa dar -- Natasha tirou a jaqueta e sentou-se na cadeira ao lado da cama. Passou a mão pelos cabelos da irmã e deu um beijo em sua testa. A mão de Carolina, parecia frágil em cima do cobertor. Ao pegá-la, sentiu uma sensação de conforto.
-- Desculpa. Só queria ajudar -- Talita encolheu os ombros -- Não falo mais nada.
Natasha sorriu.
-- Confessa que está morrendo de curiosidade.
-- Claro que estou, mas não é de curiosidade. É de preocupação. Sei o quanto você é louca -- Talita voltou a sentar-se -- O que vai fazer com Andreia?
-- Vou matá-la!
Talita prendeu a respiração. Assustada, fitou o rosto impassível de Natasha procurando encontrar algum vestígio de humor negro.
-- Você está brincando.
-- Pareço?
Não. Talita percebeu que ela não estava brincando.
-- Tanta crueldade é desnecessária.
-- Não é o que penso -- Natasha fez uma careta e, após um instante, mudou de assunto deliberadamente -- Carolina tem alguma previsão de alta?
-- O ortopedista responsável pelo caso, me disse que prefere aguardar 72 horas para então, dar o seu prognóstico.
Natasha pegou a jaqueta e a jogou nos ombros.
-- Fica de olho nela. Carolina é bem capaz de fugir.
-- E o senhor Fábio? Não quer mais que eu volte ao Rio?
-- Esqueça esse homem. Quero mais é que essa família se exploda.
Talita respirou fundo. Apesar de entender a revolta de Natasha, sentia-se muito mal.
-- Carolina está precisando de você, fique ao lado dela -- Natasha caminhou em direção à porta e quando já estava saindo, virou-se, olhou a médica nos olhos e sentenciou: -- Até que eu autorize, ninguém deve saber sobre a verdadeira Carolina. Entendeu?
Talita balançou a cabeça afirmativamente.
-- Outra coisa. Percebi que você e a Carolina estão bem amiguinhas. Só para lembrar:
"Fazer amizade com mulher é mesmo que criar frangos: Chega uma hora que dá vontade de comer".
Mariana dirigiu-se para a porta onde havia uma placa com a inscrição: Leopoldo Junior, Gerente Administrativo.
A fotógrafa entrou sem bater e passou pela secretária, que a olhou atônita, sem sequer cumprimentá-la.
Leozinho que estava ao telefone assustou-se ver aquela pessoa entrar de modo tão intempestivo e ficou aterrorizado de imediato quando a reconheceu.
-- Ahhh... socorro! Preciso de um exorcista. O capeta apareceu na minha sala -- ele desligou o telefone e se levantou -- Xô, demônio africano.
-- O mesmo idiota de sempre -- Mariana encarou-o furiosa com seus frios olhos cinzentos -- Onde está Natasha?
Leozinho pensou um pouco antes de responder e não perdeu a oportunidade de provocar Mariana.
-- Nesse momento, Natasha está em Florianópolis aproveitando ao máximo as maravilhas do continente -- Leozinho ajeitou uma mecha de cabelo que tinha se soltado do penteado -- Com sua noiva, é lógico.
-- Noiva?
-- Não sabia? Natasha está noiva, kirida.
-- Aquela... aquela... -- sem que Leozinho tivesse tempo de se afastar, Mariana saiu tão depressa que quase o derrubou.
-- Credo! Se grosseria fosse profissão, não teria tanta gente desempregada.
Carolina mexeu-se e estremeceu. O corpo todo doía. Abriu os olhos e franziu a testa.
Ao dar-se conta de que ela estava acordada, Talita relaxou. Inclinou-se para frente e a fitou com carinho.
-- Como se sente? -- A médica indagou numa voz perigosamente macia -- Está precisando de algo?
Carolina queria responder, mas a dor era tão aguda que a fez prender a respiração.
-- Está com dor?
Ah, doutora Talita. Você é o meu anjo. Pensou, fazendo uma careta.
-- Vou pedir para a técnica de enfermagem fazer uma medicação para a dor.
Carolina sorriu, e o simples gesto lhe provocou dor.
Elisa esperava por Natasha nas escadarias do hotel. A senhora estava apreensiva. Uma premonição de que algo não estava bem, mexia com seus nervos.
Natasha chegou, subiu um degrau, parou. Olhou para a senhora e balançou a cabeça. Depois, subiu a escada, degrau por degrau até parar diante dela.
-- Será que não dá para esperar eu entrar? Fofoqueira!
-- Não é fofoca. Vim aqui para impedir que cometa alguma besteira -- disse ela, séria -- Gostaria que pensasse bem antes de agir, ser inteligente, colocar o raciocínio em ação, para não ter remorsos no futuro.
-- Fingirei que não ouvi isso -- Natasha franziu a testa, substituindo o sorriso por uma expressão de desagrado, enquanto caminhava em direção a porta.
-- Natasha! -- insistiu Elisa -- Não devemos retribuir o mal com o mal. Deixe que a justiça julgue e condene.
-- Aqui na ilha, babá. Eu sou a justiça. O que eles fizeram comigo não tem perdão.
Carolina olhou em volta e perguntou:
-- Que hospital é esse?
Talita ajudou-a a sentar-se contra os travesseiros e a beber um copo de água.
-- Hospital Celso Ramos em Florianópolis.
Fitaram-se. Talita colocou o copo sobre uma mesinha, sentou-se na beirada da cama e segurou a sua mão.
-- Você tem dado muito trabalho, Carolina. E nos deixou, muito preocupados.
Incapaz de desviar o olhar, Carolina sorriu.
-- Desculpa. É que eu nunca tive tantas pessoas se preocupando comigo.
-- Natasha não gosta de ser contrariada.
-- Eu não gosto de ser controlada.
-- É, vocês vão se dar muito bem -- Talita passou a mão pelo rosto de Carolina -- Está com fome? -- ela perguntou.
-- Comida é a última coisa que eu quero. Estou nauseada.
-- Mesmo assim, precisa se alimentar -- Talita afirmou. O sinal de mensagem de texto em seu celular fez com que ela soltasse a mão de Carolina e pegasse o aparelho de cima da mesinha.
-- Onde está a Natasha? -- quis saber a garota.
-- Voltou para a ilha, mas amanhã, volta para te ver -- Talita continuava olhando para a tela do celular.
-- Problemas?
-- Meu marido está perguntando se tenho um horário disponível para ele em minha agenda.
-- Desse jeito, vai perdê-lo. "Quem ama cuida".
-- Eu sei -- Talita olhou para o rosto delicado da garota e sentiu algo estranho agitar-lhe o peito -- Vou ligar para ele. Já volto.
Carolina ficou olhando Talita sair do quarto.
-- Como é horrível amar alguém e não ser correspondido.
Natasha e Elisa entraram na recepção lotada, e foram saudadas com aplausos e vivas.
A senhora sem entender franziu seu sobrolho e olhou ao redor.
-- Posso saber o que significa isso?
-- Ora, ficamos sabendo que a senhorita Natasha, nossa querida chefe, salvou uma turista de morrer soterrada -- disse um funcionário, emocionadíssimo.
Um homem loiro de meia idade do outro lado do recinto levantou o copo e disse em voz alta:
-- Um brinde a coragem! -- ele sorriu e acrescentou em êxtase -- Temos uma heroína entre nós.
Mais uma, explosão de palmas e vivas.
Natasha, levantou a mão, agradecendo a homenagem.
-- O mundo precisa de mais heróis humildes! Hoje em dia somos poucos... -- ela disse, recebendo o cumprimento das pessoas.
-- Acho que vou vomitar -- Elisa seguiu Natasha até a porta do elevador -- Pense bem, Natasha. Não faça besteira.
Natasha bufou, revirando os olhos, e logo deu as costas a ela sem nada dizer. Amava e respeitava Elisa e quase sempre atendia aos seus pedidos. Porém, dessa vez, o assunto era muito mais sério. Andreia e seus comparsas pagariam caro por tudo o que fizeram. Estava decidido.
Rapidamente abriu a porta de sua suíte e entrou. O coração disparou quando Carol surgiu de súbito e jogou-se em seus braços chorando desesperada.
Fim do capítulo
Comentar este capítulo:
Mille
Em: 04/05/2018
Olá Vandinha
Olha eu acho que essa atitude da Andreia vai abalar a decisão da Natascha. E seria legal ela ter uma conversa com ela esclarecendo que sabe da verdade até porque o ex vai querer dar o golpe sendo que ela não é herdeira de nada.
E ainda bem a chegada da Mariana que vai fazer ela direcionar a raiva para a ex interesseira.
Bjus e até o próximo capítulo um ótimo final de semana.
Resposta do autor:
Olá Mille.
Será que a Natasha sempre tão impulsiva vai ter essa reação? Sei não. Veremos.
Beijos.
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NovaAqui
Em: 04/05/2018
Aiai
Não quero nem ver agora
Apesar do golpe eu gosto da Andrea. Ela fez pensando em salvar seu pai. Mesmo assim ela errou
Elisa deve ajudá-la
Não consigo ficar com raiva da Andrea. Só da Marcela e da médica interesseira
Ainda tem a ex
Aguenta, Natasha que aí vem mais!
Abraços fraternos procês aí
Resposta do autor:
Olá NovaAqui.
Apesar das boas intenções da Andreia, Natasha com certeza não deixará por menos.
Beijão. Até.
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