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Astrum por Bastiat

Ver comentários: 11

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Palavras: 4060
Acessos: 5397   |  Postado em: 10/03/2018

Capítulo 23 - Sônia

 

Sara

    Montserrat balançou os dedos no ar quando se despediu de mim, em seguida a ligação foi encerrada abruptamente. Olhei para a Sônia que esteve por perto o tempo todo para ouvir a conversa. Minha amiga aprontou comigo, tenho certeza de que foi ela que falou para a Montserrat dos meus estudos.

    O caso da Annie mexeu com a minha cabeça. Apeguei-me à menina de uma maneira que só o destino pode explicar. Durante o período que estive na guerra na Síria, vi crianças mortas, mas vi também crianças que perderam os movimentos ou foram amputadas. A recuperação ou a adaptação após o trauma é crucial para o bem-estar de qualquer pessoa. Nos últimos três anos tenho tentado seguir em frente de maneira errada, esquecendo-me completamente do meu passado. Com o caso de Annie, cresceu dentro de mim a importância de estudar o assunto e parti para o trabalho voluntário. Preciso ganhar experiência para quando eu conseguir voltar a minha terra natal.

    - Estou cansada, preciso de um bom banho e minha cama - falei me levantando do sofá.

    - Vá querida, boa noite - Sônia me deu um beijo enquanto saia da sala.

    - Boa noite - desejei para ela também.

    Assim que pisei no meu quarto, tirei a roupa com cheiro de hospital, peguei uma toalha e corri para o banheiro.

    "Annie precisa de você"

    A voz da Carolina reapareceu enquanto os primeiros fios de água morna caiam sob o meu corpo. É claro que a Montserrat já tinha deixado no ar o quanto elas queriam a minha ajuda. Mas a Carolina temerosa, resolveu deixar bem claro que a proposta é talvez a última esperança que possuem.

    Votar a me encarar não deve ter sido um momento agradável para a Montserrat. Esteve bem nítido que a estilista está engolindo o seu orgulho para querer conversar comigo mesmo que há cinco meses ela tenha cortado qualquer possível contato.

    Eu gostaria de ter conversado com essa mulher que virou uma incógnita para mim.

    Como pode ter cuidado de mim sem nenhum interesse? Talvez querer provar que não desejava me seduzir como eu a acusei anos atrás? Muito simples. A explicação vaga que deixou com a Fernanda não me convenceu por completo. Pensei em escrever uma carta pedindo desculpas pelas coisas terríveis que disse. Até cheguei a esboçar alguns parágrafos, mas meu coração batia descompassado como se avisasse de que a minha atitude seria tão covarde quanto a de deixá-la plantada na rodoviária.

    Será o destino me dando uma nova chance de fazer com que eu possa retribuir por tudo que ela fez por mim? Será o destino me dando a oportunidade de me dedicar a um caso que pode me levar para crianças refugiadas que estão na Europa? Principalmente das vítimas de guerra. Talvez só depois voltar à Síria? Meu destino é cruzar o caminho da Montserrat de novo?

    Depois do banho, deitei-me na cama e passei a estudar mais o caso da Annie. Deixarei o meu coração me guiar.

 

...

 

    Por ser meu dia de folga, parece que o cansaço acumulado na semana resolveu tirar o atraso. Dormi mais do que pensei que conseguiria.

    Dentre os papéis que ocupam a minha cama por ter adormecido sem me dar conta, um me deixou bastante orgulhosa ao pegá-lo. Ali estão os primeiros exercícios que eu aplicarei com a Annie.

    Uma ansiedade para reencontrá-la e conviver mais com a menina se apossou de mim. É decidido: vou ajudar Annie. Aceitarei a proposta da Montserrat e Carolina. Já posso arrumar logo as minhas malas e ajeitar tudo. Aquela menina não pode mais perder tempo.

    A batida rápida na porta tirou os meus planos da cabeça. Pelo jeito de bater, só pode ser a Fernanda.

    - Pode entrar.

    Uma Fernanda esbaforida entrou no quarto. Sentou-se na minha cama e disparou:

    - Sara, você não sabe o que a Sônia inventou agora! Eu quase vim aqui te acordar, mas ela não deixou. Então, pode ser brincadeira, mas só você para me confirmar.

    - Boa tarde para você também, Nanda. Dormiu comigo?

    - Não porque você diz que não gosta de mulher. Mas, se um dia quiser dormir, podemos tentar.

    - Você não consegue falar sério uma vez na vida? - Bufei.

    - E quem disse que não estou falando sério?

    A recriminei com o olhar para logo vê-la rir da minha cara.

    - Ai, Sara, não sei o que faço contigo, viu?! Mas me conta, qual é a da invenção da Sônia?

    - Sobre o que você está falando? - Resolvi brincar também, só que com sua curiosidade.

    - Sobre uma coisa maluca! Sônia me disse que a toda poderosa dona do hospital, vulgo Montserrat, entrou em contato para pedir sua ajuda. Tem coisa mais absurda do que isso?

    - Talvez seja verdade.

    - Como talvez? Ou é verdade ou não é.

    - Sim, Nanda. Eu, a Montserrat e a Carolina conversamos por vídeo ontem e ela me fez uma proposta.

    - Vai me dizer que a Sônia estava falando sério quando me disse que Montserrat te chamou para cuidar da filha dela lá na Eslovênia?

    - Sônia não estava brincando com você, nem eu estou. Elas estão com dificuldades para encontrar uma pessoa para ajudar no tratamento da pequena Annie.

    - E por que tem que ser você? Justo você?

    - Porque eu venho estudando casos com o dela nos últimos meses. Perdas de movimentos após um trauma. Acabei me apegando às crianças que sofrem de algum tipo de limitação motora. Eu não digo que sou especialista, mas tenho me empenhado bastante nos estudos e no trabalho voluntário que estou desempenhando na condição de recuperação pós-cirurgia. Pelo que eu entendi, Annie precisa mais de uma pessoa que ela goste do que as profissionais que as mães andam contratando.

    - Certo, essa parte bate com que a Sônia me contou. O que eu quero saber agora é se você vai aceitar e qual foi a proposta?

    - Todas as despesas com a minha ida pagas, um generoso salário, trabalho de segunda a sexta e o antigo apartamento da Montserrat para eu morar. Sim, vou aceitar.

    - VAI? Sara! Você sabe o que tudo isso implicará? Você e a Montserrat juntas de novo? Ela não quis nem conversar com você.

    - Eu estou fazendo isso pela Annie. Poxa, a Montserrat me procurou e pediu pela filha. Annie não tem culpa das besteiras que fizemos. Sim, ela mentiu para mim e eu a enxotei da minha vida, mas ela também pagou meus estudos e se sou o que sou hoje é por causa das boas ações dela. Faço isso também porque me sinto em dívida com ela. Nada mais justo do que ajuda-la no momento que mais precisa de mim.

    - Lindas palavras, parece até que você ensaiou para repetir isso mentalmente toda vez que chegar perto dela na Eslovênia e negar o que sente por ela - Fernanda discorreu a verdade.

    Se tem uma coisa que eu detesto e ao mesmo tempo amo na Fernanda é o modo como ela consegue captar as coisas no ar.

    - Eu não pretendo ficar muito próxima dela. - Belo argumento, pensei.

    - Realmente, você pode marcar as sessões de fisioterapia para quando ela estiver trabalhando... Acorda, Sara! A cidadezinha é um ovo pelo que você fala, acha que não vão se encontrar, sei lá, em um supermercado?

    - Montserrat fechou qualquer porta de diálogo que poderíamos ter sobre o que nos aconteceu. Pagou meus estudos como se fosse uma mãe ajudando uma filha, soube que eu descobri e depois disso voou para longe com uma Annie ainda precisando de cuidados no Brasil. Para ela eu fui uma garota que a interessou, está legal? Eu me apaixonei? Sim. Mas foi um erro que felizmente já superei - suspirei cansada.

    - Mentira. Você acha que superou porque está longe dela. Para o seu bem, pense mais um pouco antes de dar a resposta. Desse jeito você vai acabar se machucando mais ainda, não brinca com o amor, Sara. Ainda mais com uma criança doente no meio. Se quiser ser egoísta para não se machucar, tudo bem. Se você se machucar e não conseguir ajudar Annie, serão duas sofrendo.

    - Eu já estou decidida, Nanda - fui firme.

    Os cabelos ruivos da Fernanda balançaram conforme sua cabeça negava a minha última frase dita. Minha amiga está decidida a me proteger.

    - Você vai entrar de férias, não é? - Perguntei.

    - Sim, semana que vem! - Respondeu feliz.

    - Vamos para Slovenj Gradec. Você me ajuda e ainda conhece uma linda cidade.

    - Nem pensar. Só a passagem de ida deve ser uma fortuna, não tenho esse dinheiro.

    Fernanda ficou nervosa de repente.

    - Aceite como presente a passagem de ida e de volta. Quem sabe você não se anima e vai conhecer Bruxelas? Não é uma cidade que você quer conhecer antes de morrer?

    - Olha... como você joga sujo, Sarinha. Hum... só vou porque a senhorita precisará da minha ajuda mesmo para lidar com as turbulências do avião chamado Montserrat. Será realmente uma aventura.

    Dei risada com o duplo sentido de suas palavras. Agradeci por me acompanhar e liguei o notebook para dizer à Montserrat que aceitarei a proposta.

 

 

Sônia

 

    Esperei a madrugada na Eslovênia para entrar em contato com a Montserrat. Adquirimos o hábito de conversar no horário menos convencional depois das revelações que a minha amiga de infância fez sobre a sua história com a Sara. Era só ela marcar que eu prontamente me prontificava a escutá-la. Fingíamos não existir Carolina na história, agora dou dias para esse casamento fracassado terminar de vez.

    - Estava esperando a sua chamada - o sorriso da bela loira iluminou a tela do meu laptop.

    Vi minha velha amiga ajeitar-se em uma cadeira na sua varanda como sempre fazia.

    - Tem certeza que a Carol está dormindo? Não vou te poupar das perguntas.

    - Fica tranquila que a deixei bem cansada e relaxada na cama - sorriu com malícia.

    - Certo - dei risada da sua autoconfiança - Mas, não vamos dar margem ao perigo, vou direto ao assunto: Como está esse coração depois que a Sara aceitou tratar a Annie?

    - Inquieto, dando carreiras pela ansiedade ao mesmo tempo agradecida por ela entender que a Annie é maior do que a falta de sentimentos dela por mim. Ainda estou me convencendo de que fiz certo pois isso ajudará e muito a pessoa mais importante da minha vida, a minha filha.

    - Sabe da minha teoria de que talvez ela não seja tão indiferente assim. Eu tenho certeza de que assim como você desabafa comigo, Sara tem a Fernanda como sua confidente.

    - Já falei para você tentar ouvir uma conversa ou até mesmo colocar um gravador no quarto dela. Eu não tenho a mínima esperança de que ela sinta pelo menos carinho por mim.

    - Sara gosta de você - tentei confortá-la.

    - Não do jeito que eu gostaria. Como é que fui me apaixonar perdidamente por uma pessoa que eu nunca terei?

    - Você vai tentar conquistá-la?

    Depois da minha pergunta, os olhos de Montserrat se escureceram e o verde ficou parecendo mato molhado sem brilho.

    - Não se pode conquistar uma pessoa que não quer ser conquistada. Como disse antes, já me convenci que a Sara é heterossexual e que eu confundi admiração que ela criou por mim com amor. Acontece quando ficamos cegos de paixão, não é mesmo?

    Eu detesto quando a voz da minha amiga soa tão dura e pesada. Montserrat ama a Sara como jamais amou ninguém antes. É uma situação difícil conviver com a Sara e não poder falar do amor bonito que a Mon sente por ela. Um amor puro, profundo, sincero e machucado. Um amor como poucos que já vi. Sara transformou a Montserrat só pela simples presença de seu amor no coração dela.

    - Eu vou tentar uma última coisa para arrancar algo dela, fique tranquila - tentei sorrir.

    - O que seria? Você já tentou de tudo.

    - Se der certo, você saberá. Agora tenho que desligar. Volte para a sua cama e durma bem, boa noite.

    Montserrat ainda tentou falar alguma coisa, mas cortei a chamada. Ainda recebi uma mensagem dela falando que ela não vai dormir sem saber o que vou fazer para a Sara falar. Mandei apenas uma mensagem escrito "Vou contar a história da minha vida" e ela entendo mandando um emoji de que já estava dormindo.

    Como imaginei, ao adentrar o corredor que dava para os quartos, encontrei Sara no quarto dela lendo um livro sobre lesões na coluna. Ela está mesmo dedicada para com a questão da Annie.

    Com sua porta entre aberta, apenas a empurrei chamando a sua atenção.

    - É mais psicológico - apontei para o livro.

    - Entre, Sônia.

    Sara sorriu com gentileza e apontou a cama dela para que me sentasse mais próxima a ela.

    - É importante ler e praticar as técnicas, mas devo te confessar que eu espero que você seja de grande ajuda para a Annie não só nessa parte.

    - Não estou entendo, Sô.

    - O que quero dizer, minha querida, é que Annie é uma menina que está com medo de não voltar a andar como dissemos que voltaria. Annie precisa de uma atenção especial, de conversas e de muito carinho.

    - Eu tenho certeza de que ela recebe muito apoio das mães dela.

    - Está sendo complicado para elas também. Carol anda trabalhando mais em casa, mas algumas viagens são inevitáveis. Já a Mon, conhecendo como a conheço, sei que está toda atrapalhada.

    - Você sabe que sou carinhosa com os meus pacientes, atenção para a Annie não vai faltar, pode ficar tranquila.

    Sara é realmente muito fechada e passou a travar com a minha presença. Por mais que a gente viva na mesma casa e que tenhamos construído uma amizade, depois que ela ficou sabendo da minha relação com a Montserrat, tornou-se cautelosa comigo. É um distanciamento como se quisesse se proteger de mim.

    O que eu vivi no passado, antes de comprar esse apartamento, poucas pessoas sabem. De fato, apenas a Montserrat e algumas pessoas que conviviam comigo na época. Escondo por vergonha, por mágoa, por não saber como contar.

    - Eu vou sentir sua falta - disse ainda procurando um jeito de introduzir o assunto que queria.

    - Serão alguns meses, mas também sentirei muito a sua fala, Sô. Você é muito especial para mim.

    Ela acabou de abraçando. Ficamos curtindo o momento para dizer sem palavras o quanto gostamos uma da outra. Quando nos soltamos, decidi que é a hora.

    - Eu gostaria de te contar algumas coisas sobre mim. Coisas que você nem imagina.

    Sara olhou temerosa para mim. Pude perceber em seu olhar uma leve preocupação. Talvez ela tenha interpretado aquilo de modo errado, lembrando-se da Montserrat.

    - Eu já fui casada.

   Os olhos cor de mel trataram logo de mostrar sua surpresa. Tentando entender, Sara abriu a boca algumas vezes, mas não saiu som.

    - Eu o conheci no último ano de medicina. George cursava economia e era até de outro campus da faculdade, mas no dia que o conheci ele precisou de ir à secretaria que ficava na minha unidade. Ele era um príncipe encantado, um homem que toda mulher desejaria ter ao seu lado. Não apenas por ser bonito e charmoso, mas também por ser educado, gentil e amoroso. Sou uma mulher bonita, mas a realidade é que a sociedade ainda nos vê como pessoas inamoráveis. É uma luta diária que ganhou repercussão nos últimos anos, mas mascarada pelo Brasil não discutir o racismo. Naquela época, confesso que nunca imaginei que teria uma chance com ele,  tanto que demorei a entender que ele realmente estava dando em cima de mim na saída da biblioteca da faculdade. Porém, ele insistiu até pegar meu número e ligou ainda no mesmo dia.

    Sara mostrou-se curiosa e bebia cada palavra que eu pronunciava com atenção. Por dentro estava sendo difícil relembrar, mas tenho que me manter firme e ir até o fim.

    - George era bem simples sabe? Ou pelo menos se demostrava ser. Então eu tive vontade de me abrir para aquele homem. Quase no final do último semestre, depois de duas semanas com conversa por telefone, marcamos de nos encontrar. No barzinho, George declarou-se e me beijou. Se eu já estava apaixonada, depois disso passei a amá-lo. Eu não via o homem com pinta de galã que todas as mulheres da faculdade falavam, enxergava apenas o meu George. Não demorou para que engatássemos um romance mais sério. Era um namoro fora dos padrões, formávamos um casal interracial. Não éramos o primeiro e nem seríamos o último, mas ainda assim não posso negar que pensei se algum dia sofreríamos preconceito escancarado por outras pessoas. Na verdade, ele me fazia acreditar que isso não era importante e que não deveríamos discutir sobre isso. Eu tinha certeza de que ele não ligava para as minhas origens, pelo meu passado humilde. Vivíamos o nosso namoro tão feliz que eu acabei indo morar em um apartamento que ele dizia ter alugado assim que chegou de São Paulo. Ficamos dois anos seguidos juntos, mas eu comecei a perceber que nós não saímos para lugar nenhum.

    Minha garganta começou a esquentar.

    - Viajamos uma vez para Petrópolis, mas ficamos mais no hotel. George até brincou nesse dia que o desejo dele por mim era tão grande que o melhor lugar do mundo era a cama. Na verdade, depois dos dois primeiros anos, notei que ele usava aquela tática sempre. Por que sair se a cama é um lugar tão bom? Era o que ele dizia. Depois que completamos quatro anos juntos, aquilo começou a me incomodar com nunca. As viagens constantes que ele começou a fazer passaram a ligar o meu alerta. Mas George ainda continuava o mesmo homem educado, gentil e amoroso, o que me fazia sentir culpa por desconfiar dele. Depois atinei para o fato de não conhecer ninguém da família dele, que ele dizia ser brigado, e que também não conhecia nenhum amigo dele. Nem colegas de trabalho, Sara! Eu só vivia para o meu trabalho, para a minha especialização e para ele.

    Sara percebeu minha alteração e alcançou as minhas mãos como se desse a entender de que ela estava do meu lado e ao mesmo tempo pedia para continuar.

    - Demorei, mas um dia entendi que tinha algo de errado no meu relacionamento. Comecei a tentar lembrar a última vez que saímos juntos e não me recordei. Aquilo me incomodou demais e eu passei a chamá-lo para sair. Insisti até desistir. Comecei a me arrumar para sair sozinha, na esperança de que ele viesse atrás, o que não aconteceu. Foi neste momento que decidi mexer nas coisas dele, procurar alguma pista. Depois passei a questioná-lo de forma sutil, sem alarde. Seu nervosismo foi me instigando cada vez mais, até que comentei o que estava acontecendo com minha colega de trabalho. Essa colega indicou-me um detetive. Foi essa a solução que arranjei.

    Apertei as mãos da Sara e nos uni ainda mais.

    - Não demorou muito tempo para que o senhor que contratei como detetive, com pesar, me entregasse um papel com um endereço me dizendo que quando ele fizesse uma pequena mala para viajar, eu deveria ir lá. Uma amante. Eu fiquei arrasada e custei a acreditar, nós não tínhamos nenhum problema. Éramos um casal quente. Naquele mesmo dia, quando cheguei em casa, George estava acabando de fazer a mala e saiu apressado, nem notou que eu tinha chorado. Na mesma hora, peguei o carro e o segui. Para o meu pavor, George não foi ao aeroporto. Ele parou justamente na porta da casa do endereço do detetive. Eu iria conhecer a amante do homem que eu amava. Mas antes fosse uma amante. Duas crianças com aparentes 2 e 4 anos apareceram no portão chamando-o de pai. Os filhos que eu desejava ter com ele. Depois uma bela mulher, apareceu com uma barriga de grávida. George agachou-se no meio da rua e beijou sua barriga para depois subir e colar os lábios que me beijavam com doçura no dela. Parecia um comercial de margarina. Nem preciso te dizer que ela era branca. Uma família feliz entrou dentro da casa e eu passei a chorar dentro do carro. Foi uma dor terrível. A amante era eu.

    - Céus, Sônia! Que horror. Além de enganar você da maneira mais horripilante possível, ele também enganou essa mulher. Como esse homem teve coragem de fazer isso?

    - Preconceito, Sara. Puro e simples preconceito. Nos dias que se seguiram na qual ele estava em viagem para a casa de sua família do outro lado da cidade, eu pensei que fui apenas uma mulher burra. Só quando ele chegou em casa que me entendi como vítima. Só quando contei para ele que já sabia de tudo que o vi despejar todo o preconceito que sempre esteve ali.

    Engrossei minha voz para ela entender que as próximas palavras que serão ditas foram dele:

    - Sônia como eu poderia te apresentar para a minha família? Eu só sou rico por causa da minha família, então seria deserdado na hora. Casei-me sim com a Amanda, mas quem eu sempre amei foi você. Aliás, eu amo. Entenda que eu precisava de uma mulher para desfilar pelas ruas de Copacabana. Precisava de uma mulher para dar netos para os meus pais. Eu queria que essa mulher fosse você, mas você tinha que nascer negra?

    Eu não aguentei e chorei. Anos e anos rodando essas palavras na minha cabeça. Se eu pudesse apagar tudo isso da minha mente, talvez conseguisse dormir sem me lembrar disso toda noite.

    - Pre-e... - Respirei fundo para continuar a falar. - Preconceito, entende? Eu fui usada como as mulheres escravas eram usadas pelos seus senhores. Eu era o pedaço de carne que o satisfazia. A amante que ele manteve em cárcere ao seu dispor. George não suportava a ideia de que estava apaixonado por uma mulher negra. George não quis enfrentar seu próprio preconceito, não quis lutar pelo que dizia ser amor. Ele achou mais fácil viver de aparência.

    Sara remexeu-se. Vi atingi meu objetivo com ela quando saiu de sua boca:

    - "Preconceito existe de todas as maneiras no mundo. É de classe social, cor, religioso, sexual, de todo tipo. O preconceito arrasa pessoas como se fosse a morte e mata um pouquinho da humanidade a cada minuto", foi o que você disse para mim um dia enquanto tomávamos café na cantina do hospital. Essa frase ficou guardada comigo e agora eu a entendo ainda mais.

    Não me recordava de quando eu tinha dito isso, mas achei lindo ela ter gravado. Pelo menos sabia que tinha preconceito e refletia sobre isso.

    - Eu sinto muito pelo que você passou, Sônia. Você não merecia passar por isso. Ninguém merece. Te admiro ainda mais agora, pois você é forte e é um exemplo de vida.

    - Você também é um exemplo de vida, Sara. Por tudo que você passou na guerra, já mostra que é uma menina muito forte também.

    O abraço dessa vez foi mais longo e afetuoso. A energia da Sara parece outra.

    Comecei a me despedir dela, mas antes que eu atravessasse a porta do seu quarto a ouvir dizer:

    - Obrigada, Sônia.

    Ela não precisou explicar, eu entendi.

    - De nada, Sara.

    Esta noite parece que tirei um pouco do peso que carrego da minha história com o George. Pelo menos serviu para alguma coisa hoje.

 

Fim do capítulo


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Comentários para 23 - Capítulo 23 - Sônia:
Pam Sobral
Pam Sobral

Em: 13/03/2018

Que triste esse capítulo. 

Tadinha da Son. 


Resposta do autor:

Verdade :(.

Responder

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Jo Santos
Jo Santos

Em: 12/03/2018

Estou passada com esse capítulo. A história da Sônia é muito triste, infelizmente nos deparamos, ainda, em pleno século XXI, com preconceitos e pré-conceitos de todas as espécies e gêneros, seja pela cor da pele, seja pelo status social, seja pelo bairro onde tu  mora, seja por uma cidade ou um estdoe, é duro dizer e admitir que estamos na "era do exibicionismo constante". Mas alegra-me muito saber que no final, rico ou pobre, preto ou branco, todos vamos para o mesmo camarim quando o show da vida acabar. Nada levaremos daqui, absolutamente nada. Mas deixar a gente deixa e muito. 


É disso que  gosto em tuas histórias, sempre nos levando a refletir , sobre a realidade. É esse contexto, e essa essência, que procuro nas histórias que leio. 


Moça, o corretor não ajuda, dê um desconto, bichinha rsrs. 


Um abraço. 


Resposta do autor:

De fato, uma história triste, mas que não está fora da realidade, infelizmente. Adorei o que escreveu no final.

Que bom que consegui fazer refletir um pouco :). Fico feliz com isso.

 

Abraço!

Responder

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Nocturne
Nocturne

Em: 12/03/2018

Fiz uma maratona para chegar até aqui, haha

Esse George me deu vontade de vomitar. Nele, de preferência. Que pesado, hein, autora.

Adoro a Sônia. Até achava que ela tinha um crush pela Montserrat, mas, pelo visto, não, ahahhhh.

Essa Fernanda é uma figura. Hahah


Resposta do autor:

Me chame para vomitar junto, preciso.

Sorry pela forma pesada, não tinha outro jeito hahahaha.

Ah não, eu nem imagino Mon e Sônia. Nossa, não... nunca hahahaha.

 

Abs.

Responder

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Donaria
Donaria

Em: 12/03/2018

Olá autora...fiz um comentario gigante aqui e não sei o que aconteceu e ele desapareceu....afff, vamos lá escrever de novo, se ficar repetido perdoe-me. Vamos por partes então..... primeiro A minha crush suprema Sara ser de gemeos, o que posso dizer alem de acerteeiiiii....rsrsrs. Agora depois da exposição de mais fatos e sentimentos meu encanto pela Sara só aumenta, minha admiração pela Mon chega a extratosfera e a minha peninha pela Carol só não é maior porque sei que a Fernanda ira consola-la lindamente, mas o que falar da carol se ela teve a infeliz sorte de estar no meio desta historia de amor mal acabada. Autora você me deixou atonita com a cena da Carol e da Fernanda, eu jurando que elas iam ter um lance e quando vejo a Carol ja pegou lindamente a Fernanda em cima da mesa....meu queixo caiu! Ainda falando sobre a Sara, posso afirmar que estou cada vez mais encantada com seu crescimento. Parabéns autora estou encantada com a forma como você tem cutucado a ferida do preconceito, fazendo isso de maneira responsavel e magistral, e ainda nos dando o balsamo de um amor lindo que é este da Sara e da Mon. beijos


Resposta do autor:

Olá!

A Montserrat está sabendo desse seu crush louco para cima da Sara? Hahahahahaha.

Acho que supreendi um pouquinho com o que já rolou com a Carol e a Fernanda rsrsrsrs. I like it!

A Sara está crescendo aos poucos e na hora certa, de fato.

Obrigada, Sophiebrt.

 

Beijos.

Responder

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Anna Caroll
Anna Caroll

Em: 11/03/2018

A história da Sônia me deixou de coração partido. 

Bjsss. 


Resposta do autor:

Também me deixou assim </3.

 

Beijos.

Responder

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Nunes
Nunes

Em: 11/03/2018

Coitada da Sônia... 

 


Resposta do autor:

Sim :(.

Responder

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Baiana
Baiana

Em: 11/03/2018

Rapaz,algo me dizia que a Fernanda iria com a Sara,ela será o suporte para a Carol,quando resolver tirar a venda dos olhos.

A Mon está sendo egoísta,mantendo um casamento falido só porque a pessoa que ela ama não corresponde aos seus sentimentos.

Poxa,que narra a Sônia passou,pelo menos sua triste história serviu para fazer a Sara refletir


Resposta do autor:

Fernanda será de grande ajuda para Sara e para a Carol sim haha.

Não sei se egoísmo é a palavra... Ambas estão mantendo o casamento e gostam uma da outra.

 

Realmente :(. Se foi triste para escrever, imagino para vocês lerem.

 

Abs.

Responder

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mtereza
mtereza

Em: 11/03/2018

Que horror essa história da Sonia espero que sirva sim de exemplo para a Sara .E então quer dizer q a Fernanda tb vai com a Sara apostando que vai rolar algo entre ela e a Carol que merece alguém que a ame


Resposta do autor:

Vai servir sim :).

 

Abs.

Responder

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sonhadora
sonhadora

Em: 10/03/2018

Cara que história a da Sônia! Que lição para Sara! Espero que agora ela entenda tudinho e faça a coisa direito! Lindo o capítulo!

Beijosde Luz


Resposta do autor:

Ela entendeu e foi de grande ajuda.

Obrigada :).

 

Beijos!

Responder

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patty-321
patty-321

Em: 10/03/2018

caramba; que estória triste a da sonia. Como pode um preconceito tão grande assim?


Resposta do autor:

Você deve imaginar como foi difícil escrever e pior quando veio na minha cabeça.

 

Abs.

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Julliaa
Julliaa

Em: 10/03/2018

Partindo para o próximo!!!!!

Eita, eita, eita que a viagem vai dar o que falar! 

Kkkkkkkk 

Capítulo duplo! Ameiiiiiiiiiiiiiii. 


Resposta do autor:

E bota o que falar! hahahaha

 

Todo (ou pelo menos quase todos) coloco duplo haha.

 

Abs.

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