Boa noite a tod@s,
Segue mais um capítulo para vocês e espero que o apreciem e compreendam os rumos que a vida tende em tomar. Estamos nos aproximando de um momento crucial da fic e sei que nossas ansiedades só crescem. Continuem por aqui e sempre dando o seu retorno.
Xeros!
Capítulo 35 Entre Partidas e Chegadas
- Está tudo bem Cosima? – Shay lhe perguntava pela segunda vez desde que entraram num táxi que as levava junto com Louis e Marc para o restaurante que fora sugerido por Delphine após uma pequena confusão entre todos que estranhamente não sabiam qual lugar escolher.
- Oi? Ah sim... – Voltou a olhar para ela – Me desculpe. Ainda sinto resquícios da Tequila de ontem. – Mentiu e voltou a olhar para qualquer ponto para além da janela do carro. Estava completamente alheia a animada que conversa que rolava entre os demais ocupantes do carro que narravam para Shay, todas as audaciosas conquistas de Cosima desde que chegara à Sorbonne e em especial, a forma como sua namorada havia peitado a Toda Poderosa Cormier em sua arena da batalha favorita. Coisa que nenhuma outra pessoa fora capaz de realizar antes.
Esse relato atraiu a atenção de Cosima que focou na conversa dos amigos e percebeu o quanto foi tola e impertinente naquele momento embora não soubesse de nada que agora sabe acerca da Ordem. Lamentou-se pelo possível sofrimento e desgastaste que tenha feito Delphine passar. Mas algo que Shay comentou a alertou.
- Preciso confessar a minha surpresa ao conhecê-la! – A loira referia-se a Delphine – Não esperava alguém tão...
- Incrivelmente sensacional? – Louis a socorreu, causando reações dispares em Shay, que se incomodou ao constatar que era exatamente aquilo mesmo que havia sentido e em Cosima, que teve o seu ritmo cardíaco acelerado a uma velocidade impressionante, levando-a a mover-se desconfortável em seu lugar. – Nós também minha cara! Aliás, ninguém nunca está realmente preparado ou passa ileso pelo “Efeito Cormier” não é mesmo Cos? – Ela o olhou com evidente consternação em sua face, algo que foi percebido pelos outros dois ocupantes do carro.
Cosima trocou um olhar cúmplice com Marc que se compadeceu da agonia da amiga enquanto Shay observava cada reação de sua namorada que estava cada vez mais distante dela e em todos os sentidos.
- Mas Shay, diga-nos, quanto tempo pretende ficar em nossa linda cidade? – Marc olhou com repreensão para Louis que não entendeu nada, pois estava tentando mudar o foco da conversa, mas era evidente o quanto Cosima estava nervosa com a situação que enfrentaria dali a alguns instantes.
- Infelizmente só até o domingo. – Lamentou-se. – Eu deveria ter chegado há quatro dias, mas imprevistos com um de meus pacientes me atrasaram um pouco. Mas aqui estou. Não conseguiria ficar longe dessa srta por muito tempo. – Esticou-se um pouco para alcançar a mão de Cosima que repousava ao lado de seu corpo. Esse gesto causou um sobressalto na morena, que olhou para aquele ponto e em seguida para Shay, que tentou segurar o olhar da outra, mas essa se esquivou. Algo estava muito errado, pensou.
O táxi parou diante do charmoso bistrô Mavrommatis e assim que desceram do carro viram a limusine da Professora Cormier chegar e seus ocupantes descerem do carro. Ela havia dado carona para os demais Semideuses que ainda estavam estarrecidos com o fato. Cosima assistiu, com crescente ansiedade, cada um dos ocupantes do veículo saírem um a um. Primeiro René, que se apressou em se juntar aos demais. Em seguida viu Amélia e Sophie saírem numa animada conversa com a ultima ocupante daquele luxuoso carro que saiu em seguida e, como se fosse possível, ela tinha se tornado ainda mais espetacularmente linda desde a ultima vez que a vira, ainda na universidade, há poucos minutos atrás. Parecia que via aquela cena em câmera lenta. O jogar do cabelo que estava ainda mais espetacular do que o usual, o caminhar firme e ritmado de quem tinha a segurança e a certeza que era a pessoa mais maravilhosa do mundo e que estava sendo estranhamente agradável com todos.
O que ela não percebeu foi que outra pessoa também assistia aquela cena, da qual ela mesma fazia parte. Shay estava logo atrás dela, fingindo prestar atenção na conversa de Louis e Marc, porém sua atenção estava todo em Cosima. A loira sabia que sua namorada era extremamente incompetente no que dizia respeito a esconder suas emoções e desde que a viu assim que abriu a porta para entrar em seu apartamento, percebeu que algo estava diferente. Alguma coisa havia mudado. Ela mesma não era mais a pessoa que Shay conhecia. A sentia distante, para além da geografia e havia ido até Paris com a esperança de que pudesse mudar o que quer que a estivesse “roubando” dela. Em seu intimo sentia que jamais a teve por completa, mas mesmo assim decidiu investir seu sentimento nela, contudo ali... Vendo aquela cena, sentiu um alerta ser aceso em sua mente. Uma crescente e vibrante luz vermelha que atendia pelo nome de Delphine Cormier.
- Vamos entrar? Não sei vocês, mas a fome está me consumindo! – Disse uma espontânea Delphine levando todos a rirem e entrarem no bistrô indicado por ela. Um a um eles foram entrando a tendo como uma espécie de metre, pois ficou por ultimo os observando, e com o canto do olho, viu Shay abraçar Cosima pela cintura enquanto lhe beijava o pescoço. O desconforto de sua orientanda só não foi maior que o poderoso e dolorido ciúme que a consumia e quando Shay puxou Cosima de volta para si, com a clara intenção de beijá-la, o estalo de três lâmpadas dos postes ali próximos fez com que as duas se assustassem. A loira estava confusa, mas a morena sabia exatamente o que havia acontecido.
Cosima tratou de puxar Shay para dentro do restaurante e assim que passou por Delphine que fingia estar profundamente interessada em seu celular, a abordou mentalmente.
“O que você está pretendendo?” Questionou, mas só obteve um sorriso blasé como resposta.
Lá dentro, o animado grupo já estava mobilizando alguns garçons para organizarem as mesas para que todos pudessem se acomodar juntos. O bistrô possuía toques charmosos misturados com uma sofisticada decoração em tons pasteis com alguns ambientes diversos. Por se tratar de um numeroso grupo, ficaram numa longa mesa formada pela junção de várias, bem próximas a janela lateral.
Propositadamente, Delphine sentou-se bem distante de Cosima, pois assim poderia observá-las com mais atenção e também avisou que reservassem mais dois lugares pois estava esperando a chegada de duas amigas. Aquela informação pegou Cosima de surpresa e lhe despertou uma demasiada curiosidade de quem poderiam ser. Mas até aquele instante, sua professora fazia questão de não lhe olhar nos olhos enquanto ela mesma buscava, desesperadamente, o olhar de reconhecimento e carinho, algum gesto que fosse capaz de acalentar seu desesperado coração.
Risos, conversas empolgadas e uma breve discussão sobre o que pedir preenchia aquele ambiente, porém a única voz que não era ouvida era a de Cosima que parecia nem estar presente ali. Recostada em sua cadeira, alternando o olhar entre Shay que estava ao seu lado e a outra extremidade da mesa que era ocupada por sua professora que acabara de se tornar o centro das atenções quando começou a explicar os tipos de vinhos adequados para acompanhar os pratos que haviam pedido.
- E para acompanhar o meu Salmão Profa. Cormier? – Shay a questionou com um toque de desafio em sua pergunta. Cosima a olhou surpresa.
- Apenas Delphine. Por favor! – Não elevou uma nota se quer a sua voz e se fez ouvir em toda a mesa. – Para o seu Salmão eu sugiro um Casillero del Diablo Pinot Grigio, e fez questão de pronunciar o nome do vinho com o sotaque de uma verdadeira latina, fazendo todos na mesa praticamente suspirarem. Contudo, as reações despertadas em Cosima iam muito além de suspiros. – Sabiam que as ovas de salmão eram utilizadas como remédio para os mais variados males da sexualidade?
“Sério Delphine?” Tentou mais uma vez se comunicar com ela, incrédula de como ela conseguia agir tão normalmente daquele jeito e estava dando aula sobre ovas de peixe.
- Acreditava-se que estimulava a virilidade masculina e a libido feminina! Era comumente consumido em orgias por vários povos do mediterrâneo.
- Por favor... Alguém traga uma porção dessas ovas – René anunciou.
- Meu caro, está com problemas em sua virilidade? – Marc brincou e logo todos voltaram a rir divertidos, contudo os risos foram cessando à medida que todos perceberam a aproximação de duas estonteantes mulheres, levando os homens da mesa a se levantarem para recebê-las.
- Meus caros estudantes, essas são as Srtas Stella Gibson e Helena Katz. – Delphine as anunciou enquanto sentavam ao lado dela. Helena conhecia todos ali com minúcias de detalhes, pois os havia investigado antes que pudessem estar ao lado de Delphine, mas fingiu ser a primeira vez que os via. – Ah sim, tem alguém aqui que não é uma estudante minha. A Srta Shay... – Fingiu desconhecer o sobrenome dela.
- Davydov! – Ela mesma respondeu – Muito prazer em conhecê-las. – Disse educadamente. Helena falhou escandalosamente em esconder o seu choque com a presença daquela mulher naquela mesa e foi repreendida por um apertão, dado por Stella em sua coxa.
- O que porr* está acontecendo aqui Delphine? – Inclinou-se para sussurrar em seu ouvido. A loira sorriu, fingindo que havia ouvido algo divertido e fez o mesmo, debruçando-se sobre Helena para lhe devolver o cochicho.
- Eu não tenho a menor ideia Helena. Mas... – Afastou-se para sorrir novamente e bebericar o seu vinho, retornando em seguida – Por favor, eu as chamei aqui para que me ajudem e me impeçam de fazer uma loucura. – Voltou a sorrir forçadamente. Helena entreabriu a boca e encarou Stella que foi informada da dimensão do problema que poderia vir a acontecer. Para a surpresa de Helena, Stella sorriu, sinceramente divertindo-se com aquela situação.
- Porr* Stella! Essa situação não tem graça. – Helena e repreendeu.
- A situação pode não ter Katz, mas a testemunhar Delphine Cormier descer de seu pedestal... Ou melhor, ser derrubada assim tão facilmente é impagável. Por isso que eu sempre gostei da Srta. Niehaus! – Ergueu uma taça em direção a Cosima que não sabia ao certo se sorria de volta.
De imediato reconheceu aquela mulher como sendo a frequentadora assídua que ia a seu café e se apresentara com outro nome. Havia presumido que era membro da Ordem e pelo que pode ver da mente de sua orientadora, foi uma das que a traiu, mas pelo visto haviam ajustado as contas. Por educação, lhe sorriu de volta até porque até então não tinha nada contra ela.
- Você conhece aquela mulher? – Sua ainda namorada lhe questionou. Cosima abriu e fechou a boca algumas vezes e acabou apenas respondendo com um aceno positivo de cabeça. Retirou os óculos e esfregou os olhos com cuidado para não estragar a sua maquiagem e em seguida deu um suspiro profundo, arriando em sua cadeira. – Você mal tocou na sua comida! – Indicou com o garfo. – Você está sentindo alguma coisa? – Tocou sua testa e desceu por sua face, na clara tentativa de checar a temperatura dela.
“Não consigo vê-la tocando em você!” A mensagem de Delphine acertou Cosima em cheio fazendo-a procurar por seus olhos. Ela estava imersa em uma conversa com René, mas, por uma fração de segundos, deixou seu olhar correr para encará-la e lá estava a dor cortante do ciúme. A expressão indiferente deu lugar a uma leve consternação que só poderia ser lida por quem soubesse o que estava acontecendo entre elas. Ou seja, boa parte dos presentes na mesa.
“Desculpe-me, por favor!” Disse enquanto retirava a mão de Shay de sua testa de forma brusca, mais até do que gostaria de ter feito. A outra lhe olhou sem aparente compreensão e então seguiu a direção de seus olhos e o foco deles era... Nela. A loira fixou seu duro olhar em Delphine que pareceu sentir o peso dos azuis olhos de Shay sobre si.
Helena que estava, desde que chegou, observando Shay assistia aquilo apreensiva e então um calafrio lhe subiu a espinha quando percebeu que Delphine havia se retesado, cerrando os punhos. Voltou a focar nas outras duas mulheres e viu Shay acariciando a nuca de Cosima. O que ela não conseguia enxergar era a mão da mulher loira apertando e subindo pela coxa da morena, por sob a mesa, numa evidente tentativa de afirmação de algum tipo de posse. Contudo Delphine sabia o que estava acontecendo ali muito bem, pois maneou a cabeça e massageou a própria nuca, fechando os olhos em seguida.
Os pobres desavisados ali na mesa mal sabia o inimaginável risco que corriam, pois assim que Delphine fechou os olhos, Helena e Stella sentiriam o pavor lhes consumir. Conheciam, como poucos, o significado daquele gesto e do que ele anunciava. Mas ali era o pior lugar possível para aquilo.
- Delphine... – Helena lhe tocou o antebraço. Ouviu-se o estrondo de uma pilha de talheres atingindo o chão após caírem, misteriosamente da mesa onde estavam, levando todos a procurarem a origem do barulho. Só então Cosima percebeu que Delphine havia fechado os olhos e estava com a sua mão sendo segurada por sua segurança. Tentou uma, duas, três vezes reestabelecer a conexão com Delphine, mas sentia a sua mente se chocar contra as barreiras erguidas por ela. Sentiu seu sangue gelar, mas não desistiu, ignorando Shay que tentava obter sua atenção.
Não entendia bem o porquê, contudo sabia que algo muito ruim estava acontecendo com Delphine, pois começou a ter a mesma sensação que experimentou no baile, pouco antes de sair de lá às pressas.
“Del... O que está acontecendo?” “Fala comigo, por favor,” Suplicou, mas sem sucesso até que um estrondo ao longe, derrubou a energia do restaurante e as poucas luzes acesas foram apagadas instantaneamente, causando certo burburinho. Juntou todas as suas forças e tentou uma derradeira vez mais.
“Por favor... Meu amor...” Tudo ao seu redor sumiu e um mortal silêncio imperou.
Como se tivesse sido envolvida por uma densa neblina escura, Cosima a viu, parada a poucos metros de si, porém havia algo diferente nela. “Delphine?” A chamou, mas ela pareceu não lhe ouvir. Decidiu caminhar até ela e parecia que o seu movimento era capaz de cortar aquela densa neblina, e assim que se aproximou o suficiente e a escuridão que a envolvia se dissipou a viu por inteira. Não pode admirar-se com a visão que teve, pois nada que houvesse visto em sua vida poderia prepara-la para aquilo. Delphine estava fantasmagoricamente com o corpo ereto, as mãos espalmadas nas laterais de seu corpo, a cabeça levemente erguida e seus pés não tocavam o chão. Ela levitava!
Sem medo ou receio, contornou seu corpo até parar diante dela. O rosto adorado estava com uma expressão aparentemente tranquila com os olhos fechados. Voltou a chama-la.
“Del...Olha pra mim”. Mas essa não se moveu. Sua aflição tornou-se ainda mais agonizante e então decidiu tocá-la! Assim que suas peles se encontraram, a loira baixou a cabeça e abriu os olhos causando o pavor em Cosima, pois eles eram de um negro fosco e sem vida. O pavor que sentiu ao ver a escuridão na qual Delphine estava foi demais para ela. A morena desfaleceu e nesse instante, como se fosse despertada de um pesadelo, Delphine a viu aos seus pés.
“COSIMA!”
O barulho de uma cadeira tombando alertou a todos e quando Delphine voltou a si foi no segundo exato que antecedeu a queda de sua orientanda.
- Cosima!! – Correu para tentar socorre-la, mas foi impedida por Stella e Helena. Olhou severamente para suas irmãs, mas sabia que elas estavam fazendo o que lhes fora pedido. De longe viu que sua amada era socorrida por Shay e aquilo a afetou muito mais do que gostaria.
- Tragam álcool! – A médica demandou e em poucos instantes teve seu pedido atendido. Passou o pequeno copo com aquele líquido próximo ao nariz da morena que foi voltando a si até que puxou o ar com força, como se estivesse saindo de um lago onde se afogava. Não discerniu bem onde estava ou o que acabara de acontecer, contudo só uma coisa a importava.
- Delphine? Onde está Delphine? – Questionou com um filete de voz quase inaudível, mas que foi ouvido com dolorosa nitidez por Shay que, naquele instante, sentiu seu mundo desabar. – O que eu estou fazendo no chão? O que aconteceu? – A morena parecia ter voltado a si enquanto se sentava.
- Caramba menina! – Disse Sophie.
- Que susto você nos deu Cos! – Disse uma receosa Amélia, que já havia desistido de tentar algo com sua colega, ainda mais com a namorada ali. Era apenas uma legítima preocupação de amiga.
- Do que vocês estão falando? – Ela lhes perguntou verdadeiramente confusa.
- Cos minha querida, você apagou o som e a imagem! – Marc a ajudava a levantar.
- Eu... Desmaiei? – Constatou assim que foi colocada de volta a sua cadeira, mas antes que ouvisse qualquer outra resposta a viu, parada a sua frente, do outro lado da mesa com a expressão aflita nos olhos.
“Meu amor... Você esta bem?”
“Agora que me chamou de meu amor, estou bem melhor.” Restabeleceram aquela poderosa conexão que mesmo não podendo ser ouvida, ficava evidente para qualquer bom observador.
- Cosima acho melhor leva-la a um hospital – Shay finalmente voltou a falar, contudo o seu semblante estava fechado e não tinha só a ver com o desmaio de sua namorada.
- Isso mesmo Cosima. É o melhor. Deixe-me ligar para minha mãe...
- Não precisa se incomodar com isso “Delphine”. – Shay a cortou secamente. – Nós cuidaremos de tudo. – Anunciou já recolhendo as coisas delas para saírem. Delphine foi totalmente pega de surpresa com a ousadia daquela mulher.
- Não será incomodo algum! Além do mais, o hospital de minha mão é o mais moderno de Paris – Disse já elevando sutilmente o seu tom de voz. Todos ao redor ficaram estáticos, apenas assistindo aquela cena inusitada de uma evidente disputa.
- Não duvido que o hospital de sua mãe seja muito bem. Mas...
- Sem “mas”! Helena, chame o Félix e diga para nos esperar na porta do restau...
- Professora Cormier... – Shay contornou a mesa e parou bem próxima a ela - ... Já disse que NÃO PRECISAS SE INCOMODAR! – Fez questão de quase soletrar as palavras, obrigando Delphine a se aproximar ainda mais dela, desvencilhando-se de Helena e Stella que fingiam que a seguravam.
- Srta. Davydov...
- CHEGA! – Cosima atingiu seu limite. – Eu não irei a hospital algum e isso pode por fim a esse embate DESNECESSÁRIO. Vamos Shay! – Ordenou se levantando. – Gente desculpa ter estragado a nosso almoço. – dirigiu-se aos amigos que estavam confusos com tudo aquilo exceto por Marc que a olhava com ar divertido de repreensão.
- Bobagem Cos. Vá descansar um pouco. E qualquer coisa está com uma médica linda e maravilhosa ao seu lado. – Sophie brincou ingenuamente, causando certo desconforto.
- Eh... Profa. Cormier, obrigada pela preocupação, mas irei descansar. – Mal a olhou nos olhos para evitar se perder neles, pois sabia que poderia conversar com ela melhor depois. A coisa que mais queria era sair daquele lugar já que o clima já havia extrapolado os limites do desconforto.
Saíram ainda se despedindo dos demais, deixando todos tentando entender o que havia acontecido ali. Alguns faziam uma vaga ideia, outros tinham uma boa ideia, mas apenas uma delas detinha a certeza e sabia que, muito em breve Cosima iria precisar dela. Virou-se para Helena.
- Me dê a chave de seu carro! – Exigiu.
******
Todo o breve trajeto de volta até o apartamento foi feito em silêncio. Cosima fingia cochilar e Shay fingia que acreditava nela. A verdade era que aqueles breves segundos eram aproveitados por ambas, pois tinham suas cabeças em turbilhão.
A jovem médica sentia uma angustia intensa lhe oprimindo, como se um nó subisse e se instalasse em sua garganta, pois o que mais temia estava se mostrando real. Sua namorada não estava distante apenas por seu jeito mais esquivo. Havia outra pessoa e esse era um grande temor que sentiu desde o dia em que ela recebeu aquele fatídico e-mail. Shay sentiu que aquele fora o instante em que quase a teve para si e que a perdeu por completo. Virou a cabeça para olhá-la, mas ela ainda estava com os olhos fechados. O tempo que pode compartilhar com ela lhe mostrou um pouco de sua personalidade. Cosima era sincera, doce, gentil e intensa. E tudo isso a levou a conclusão que o repentino desmaio que ela tivera não foi devido a nada se não o seu sistema nervoso. Por isso não insistiu mais para que fossem a um hospital, pois tinha um triste palpite do que se tratava.
A morena sabia que havia falhado com louvores em manter-se tranquila diante da presença de Delphine junto a Shay. Em sua cabeça, aquele encontro jamais aconteceria, pois teriam uma conversa antes de qualquer coisa, contudo a realidade é bem distante daquilo imaginado e ela se pegou sendo uma covarde. Impotente diante da mulher que até então havia escolhido para ser sua namorada. Alguém por quem nutria um carinho imenso e um respeito maior ainda, contudo a havia traído, mentido para ela e sabia que a outra havia percebido assim que Delphine havia se aproximado. Questionou-se se seria capaz de estar na presença de sua professora sem ser afetada por ela. E isso a fez lembrar-se do que lhe acontecera há instantes atrás. Sua mente ainda estava confusa e as imagens não faziam muito sentido, mas algo que tinha a clara convicção era de que havia atingido outro nível de conexão com seu amor. Algo ainda mais poderoso do que tudo que haviam experimentado. Era como se tivesse ouvido ou sentido o desespero e a angustia de Delphine e precisasse ir até ela, a seu socorro. Mas ainda assim não compreendia o todo.
Considerava-se uma mulher inteligente e as peças que estava conseguindo juntar daquele misterioso quebra-cabeça lhe faziam crer que o seu papel em toda aquela história era muito maior do que apenas ser a portadora daquele livro e de tudo o mais que lhe fora entregue. E o fato de descobrir que fora vigiada durante anos também corroborava para essa conclusão. Ela só ainda não conseguia enxergar que papel seria o seu. Contudo, sabia que aquela dúvida teria de esperar, pois havia um assunto tão complicado quanto aquele para resolver e ele atendia pelo nome de Shay.
- Chegamos! – A loira lhe tocou o braço, despertando-a. Pagaram o motorista e subiram as escadas lentamente, pois ambas sabiam que assim que passassem pela porta, teriam algo muito sério para conversarem. Mas era inevitável.
- Shay...
- Cosima...
Ambas falaram ao mesmo tempo e se surpreenderam com aquilo. A ansiedade para conversarem deu lugar a um silêncio desconfortável que só fora quebrado pelo audível suspiro que Cosima deu ao se jogar em seu sofá. Shay fechou a porta e depositou as chaves sobre o balcão da cozinha, onde foi para pegar água. Bebeu dois copos cheios em seguida o lavou e o colocou no escorredor. Ao terminar, se dirigiu até o quarto, mas parou ainda na entrada e sem olhar para trás anunciou.
- Estou indo embora Cosima. – e entrou no quarto. Cosima sentiu aquelas palavras com uma dolorosa intensidade, mas não conseguiu dizer nada, apenas se permitiu deixar as lágrimas caírem copiosas, aliviando um pouco a agonia que lhe consumia. Só após vários minutos, conseguiu reunir forças para se levantar. Precisava fazê-lo por Shay. Ela e toda a história que tiveram, merecia uma explicação.
Com dificuldade, pôs-se de pé e caminhou até o quarto, onde encontrou Shay sentada na beira da cama, chorando em silêncio. Sentiu-se um monstro! Mas precisava ser honesta com ela, lhe devia aquilo.
- Shay... Eu... – A voz embargada à fez se virar para olhá-la. Cosima esperava encontrar raiva ou até mesmo ódio nos lindos olhos azuis, porém o que viu a arrasou ainda mais. Era tristeza e decepção. Recostou a cabeça na soleira da porta e respirou fundo. – Lhe dizer que eu não queria nada disso ou que não procurei por isso seria uma forma escrota de começar essa conversa. – Juntava forças para continuar. – Até porque você me conhece. Mas Shay... Tudo o que posso lhe dizer, do fundo de meu coração é... Sinto muito.
- Sei que sentes! Pude testemunhar o quanto. – Não era sarcasmo ou desdém, era uma afirmação. – Eu posso me gabar de lhe conhecer um pouquinho ao ponto de conseguir ler em seus olhos e em seu corpo o que estais sentindo. E desde que cheguei que eu soube Cos. Soube que não eras mais minha. – A morena fez menção em dizer algo – Ou melhor, você nunca foi minha. Eu que me enganei e apostei nessa história. Mergulhei de cabeça só que você não estava lá para me segurar. – A essa altura ela já chorava com mais intensidade levando Cosima a se aproximar e parar ajoelhada diante dela.
- Você foi uma das melhores coisas que aconteceram em minha vida! – tomou as mãos delas nas suas. – E eu realmente queria estar lá... Para lhe segurar. – Ambas choravam!
- Tínhamos algo realmente especial Cos – ela concordou com um vigoroso aceno de cabeça. – Dávamo-nos tão bem... Em todos os aspectos. Quer dizer, quase todos. Faltava um pequeno detalhe em você. Um brilho no olho, aquela fagulha capaz de fazer a dona dela a mulher mais feliz do mundo. – Suspirou. – E eu nunca tinha visto tal fagulha em você... Não até hoje. Ela estava lá naquele restaurante e ela está agora em você. – Fechou os olhos e olhou para o teto. – Caramba! Como eu queria ser essa mulher Cosima.
- Me desculpe! Eu queria poder ser capaz Shay... Mas não é assim que funciona. – Tentava, em vão, controlar as lágrimas.
- Cacete! Que filha da puta mais sortuda ela é! Só espero que ela saiba o quão precioso é o que tem em mãos – Ergueu-se enquanto desvencilhava-se das mãos dela que tentava mantê-la ali diante dela. – Eu juro que queria sentir raiva de você. – Iniciou a coleta de suas roupas e as foi colocando de qualquer jeito na mala. – Mas o meu amor por você não permite.
Lá estava a palavra que Cosima mais temia. Amor. Sempre teve a clareza de que Shay estivera um passo a frente dela naquela relação, mas nunca ela havia dito o quanto. Sentiu a melancolia naquela frase e foi novamente atingida pela culpa. Mas não aquela que vem seguida de arrependimento. Longe disso, pois a certeza latejante do que sentia por Delphine não deixava frestas para tal. Era apenas a culpa por estar magoado Shay e algo dentro dela sempre lhe disse que aquele momento aconteceria, independente de haver outra pessoa ou não.
- E também torço muito para que ela esteja no fundo do abismo, para te segurar, pois o que vi hoje em você é intenso demais. – Cosima arregalou os olhos. Era a primeira vez que ouvia alguém narrar para ela o que estava lhe acontecendo. O que ela estava deixando transparecer e o tom de alerta nas palavras de Shay depositou uma pitada de receio na mente de Cosima. – Pois a queda será muito feia Cosima e possivelmente eu não estarei mais lá para te amparar.
Após essa ultima frase, trancou-se no banheiro por longos minutos, deixando uma pensativa Cosima jogada sobre a cama. Estava assistindo uma pessoa maravilhosa sair de sua vida e aquilo lhe doía profundamente, então tentou buscar apoio no lugar onde mais sentia-se segura. A buscou em sua mente, mas não a achou. O que era estranho, pois tinha a plena sensação de que ela estava por perto, mas não conseguia estabelecer aquela conexão. Como se estivesse sendo bloqueada. A semente do temor cresceu um pouco mais
Pensou e valer-se das tecnologias convencionais para contatá-la, porém antes de achar o seu celular Shay saiu do banheiro já pronta para ir embora.
- Por que você não fica até o domingo? Até a data do seu voo. – Ofereceu com sinceridade embora soubesse qual seria a resposta. Se tinha algo que aquela mulher era é orgulhosa e sensata.
- Cosima... Não tem o menor cabimento nem clima para eu ficar aqui. – disse com um sorriso amargo. – Mas não se preocupe, tem um trem que sai em poucas horas para a Espanha. – disse enquanto pegava a sua mala.
- Barcelona? – Cosima perguntou um pouco mais aliviada. A loira balançou a cabeça positivamente. Aquela era a cidade favorita dela na Europa e sempre que podia ia até lá onde tinha amigos de longas datas. Pensou que seria bom para ela e então se permitiu ficar feliz por ela. – Se vir o Filipe e a Lola, mande um forte abraço. – Passaram a falar amenidades, mas era notório o pesar nos fundos olhos azuis. Cosima a seguiu até a porta e a abriu para ela. – Espere que eu chamo um taxi pra você. – Buscou seu celular.
- Não precisa. Já o fiz do banheiro. – Parecia que Shay estava desesperada para sair dali e Cosima não poderia condená-la por aquilo, pois se estivesse no lugar dela, faria o mesmo.
- Shay... – Segurou na maçaneta e a impediu de sair. – Posso lhe pedir uma coisa? – A loira a olhou, estavam bem próximas uma da outra. – Sei que não tenho o direito, mas... Não suma da minha vida! – Era um pedido sincero e atingiu a outra mulher em cheio. As lágrimas, que haviam sido controladas a duras penas retornaram. Sem pensar, ambas se abraçaram como não haviam feito desde que ela chegara. Era um abraço carregado de significados, repleto de carinho e demorou o tempo necessário. Mas fora desfeito, lentamente, por Shay, que antes de afastar-se completamente, tomou o rosto dela entre as mãos e lhe beijou nos lábios.
Cosima não se surpreendeu nem tão pouco resistiu. Tudo o que precisava ser dito o fora. Aquele beijo era apenas uma forma de fechamento. Uma despedida como mereciam.
Também fora Shay quem pôs fim ao beijo e antes que Cosima pudesse abrir os olhos ela já havia passado pela porta e estava descendo as escadas. A morena correu até o topo e ainda a pediu.
- Me avise quando estiver em Barcelona. Por favor! – Lhe pediu.
- Aviso sim! – Embora duvidasse que o fizesse, pois sentia que precisava de um tempo completamente longe dela, para tentar superá-la. – E eu desejo que sejas verdadeiramente feliz Cosima! – Sorriu tristemente e saiu da vista e da vida de Cosima.
******
A densa cortina de fumaça que pairava pouco acima das cabeças daqueles homens indicava a quantidade de charutos que fumavam em meio a conversas empolgadas e gargalhadas quase escandalosas e no centro das atenções de todos estava John Lamartine, sentado em uma imponente poltrona Imperial Luiz XV de encosto alto e forro vermelho terra. Quase um trono para ele. Imponência em meio aquela sala ostentosa de uma mansão tão grandiosa quanto. Tratava-se do Country Clube La Main de Marteau, uma atiquíssima edificação que abrigava as reuniões de importantes e proeminentes homens da alta sociedade não só francesa, mas mundial também. Políticos influentes, ricos empresários dos mais variados ramos e até mesmo altos membros do clero estavam ali. Apenas homens poderiam fazer parte daquele seleto clube que ficava bastante afastado do centro da cidade, justamente para conferir aos seus visitantes, a privacidade que desejavam.
Era nada mais nada menos que a alta cúpula do Martelo que se reunira a chamado de seu líder, sob o pretexto de que algo grande estava prestes a acontecer. Uma reunião extraordinária fora convocada, pois o líder deles precisava lhes confidenciar algo importantíssimo.
- Meus caros companheiros. Festejo a presença de todos que estão aqui e gostaria muitíssimo de dividir algo que certamente os irá agradar! – Disse pondo-se de pé e exigindo atenção para si.
- Achamos bom mesmo, pois os últimos eventos só tem nos envergonhado! – Lamartine não viu de imediato que disse tal frase, mas assim que o localizou percebeu que aquela fala havia reverberado para mais vozes discordantes.
- Meu caro Stephen... – Dirigiu-se até um homem alto e esguio, de ralos cabelos grisalhos e óculos de armação de tartaruga. -... Esses “contratempos” aos quais fomos submetidos estão próximos de seu fim. Posso lhe garantir isso. – Sorriu assustadoramente enquanto fuzilava aquele homem que ousou lhe contradizer. Era um importante empresário norte-americano das telecomunicações e extremamente útil às causas do Martelo. – E lhes digo uma coisa, nunca estivemos tão próximos de... – Caminhou lentamente até Stephen que pigarreou algumas vezes, precisando afrouxar o nó de sua gravata. -... Acabarmos com aquelas vagabundas que OUSAM pensar que são melhores do que nós. – O pigarro do homem diante dele converteu-se numa tosse agonizante, fazendo com que a tez branca do homem assumisse um perturbador tom de vermelho que logo mudava para roxo – Nós vamos sufoca-las! – Aquele que tossia agora agonizava no chão, para o pavor dos demais. – E iniciaremos isso cortando a cabeça da cobra! – Sibilou! – SIM MEUS AMIGOS! Vamos acabar com a maldita Ordem do Labrys de uma vez por todas... – Disse aquilo com absurdo desdém. – E começaremos do TOPO! – Ele assumia ares de loucura enquanto o homem que agonizava estava dando seus últimos suspiros de vida. – Vamos matar a maldita Mestra da Ordem! – Seus olhos brilhavam repletos de perversidade enquanto todos os outros olhavam perplexos para o corpo morto de Stephen.
- Ele... Está morto! – Um outro anunciou assim que checou o pulso do colega.
- Que pena! Parece que o senhor Jones teve um mal súbito! – Levou ambas as mãos ao peito e fez uma cínica cara de pesar. – Alguém retire esse corpo daqui. – Disse ao passar por sobre ele. – Bom, já sabem o que tem de fazer e... – Parou pouco antes de sair por uma porta que o levaria a sua sala privativa. – Espero que não haja mais... “desacordos” entre nós! – Todos os homens olharam-se apreensivos e assustados e não ousaram dizer mais nada. Dispensados! – Saiu, seguido por Paul e Ferdinand.
- Acredito que agora não ousarão mais discordar do senhor! – Disse o homem de óculos e terno perfeitamente ajustado a seu corpo e de um porte aristocrático. Era o carrasco do Martelo, aquele que fazia o serviço sujo para Lamartine e tinha a confiança dele e despertava o rancor e a inveja de seu colega e filho adotivo de seu líder, Paul.
- Cretinos! Escotos! – Praguejou contra a porta. - Só são o que são por minha causa! Quem seria o líder do mundo livre sem mim? – Os homens se entreolharam. - Tantos presidentes, primeiros-ministros, líderes influentes que até perco a conta. Todos alçados aos postos que estão por minha causa. MINHA CAUSA! - Sentou-se atrás de sua mesa. – Mas agora eu realmente preciso de boas notícias. Paul? – Questionou enquanto passou a língua sobre a ferida que lhe lembrava o seu pior pesadelo.
- John... Eu... – Paul gaguejou. E aquele gesto só enervou ainda mais o já desequilibrado Lamartine.
- Não me diga que não conseguiu? – Disse entre dentes! Paul engoliu em seco. Havia acabado de assistir seu pai assassinar um de seus mais leais aliados apenas porque ele ousou duvidar dele. O que poderia fazer com ele? Sabia que toda a sua lealdade estava com seu pai, mas duvidava que Lamartine sentisse algo mais profundo por ele. Só o viu demonstrar amor por uma pessoa. Suspirou.
- Não conseguimos pegá-la ainda pai. Lamento! – O viu cerrar os olhos e decidiu se justificar – Estamos seguindo todos os passos dela, mas por ela ser quem é, tem um fortíssimo esquema de segurança. Ela nunca sai sem pelo menos 4 seguranças. Além de várias delas em sua casa.
- INCOPENTENTES! Estou cercado de incompetentes! – Gritou.
- O senhor percebeu alguma outra mudança em si? – Ferdinand quis tornar mais evidente a sua preocupação e presteza.
- Além do corte? Não! Meus poderes continuam como antes. – Apontou para a porta. – Mas algo aconteceu. Algo está causando isso! –Disse com olhar perdido. – E eu preciso saber o que é para por um fim nisso! – Esmurrou a mesa.
- Então me dê mais uma chance papai. Eu a trarei até você! – Paul apoiou-se na mesa diante dele.
-Não! Teve a sua chance. Agora quem irá resolver isso sou eu! – Sacou seu celular enquanto praguejava algo incompreensível. O aparelho tocou algumas vezes antes de ser atendido.
- Alô? Minha querida! – Destilava todo o seu veneno. – O quê? Não posso ligar para uma velha amiga? – Riu debilmente. – Pois bem. Queria lhe fazer um convite. – Olhava para seus homens que o observavam apreensivos. – No próximo sábado teremos a apresentação de Madame Buterfly no Opéra Garnier e eu bem sei o quanto gostas dessa ópera! – Fez um breve silêncio. - Porque temer? Estaremos num lugar público. E ainda poderemos jantar. Num lugar de sua escolha! – Aguardou alguns instantes e depois abriu aquele mesmo assustador sorriso. – Perfeito! Nos vemos no sábado então! Ciao Bella! – Recostou-se em sua cadeira, com uma expressão triunfante. – Agora sabemos onde ela estará exatamente no sábado. Preparemos tudo!
******
Culpa! Estava sendo consumida pela mais brutal e corrosiva culpa.
Desde que parou o carro ali, a poucos metros do apartamento de Cosima, sentia-se mortalmente ferida. Pois teve a certeza de que havia cometido um erro colossal em ter ido até aquele almoço. Achou que seria forte o suficiente para suportar ver com os próprios olhos as duas juntas, mas não conseguiu nem se quer suportar algumas poucas horas.
- Sua idiota! – Bateu a cabeça contra o encosto do carro repetidas vezes. Tinha a consciência de que havia pressionado demais sua amada. Ela já estava numa situação extremamente desagradável e sua presença só piorou tudo.
Contudo, o que mais a estava perturbando foi o que aconteceu em meio ao almoço onde qualquer pessoa mais atenta poderia ter visto algo. Estava se referindo não apenas ao relacionamento delas duas, mas muito, além disso. Da poderosa conexão que elas possuíam. Ver seu grande amor nos braços de outra mulher a lançou num abismo de escuridão que ela mais queria evitar e recriminou-se por isso. pois poderia, mais uma vez, machucar inocentes e pior, machucar Cosima!
- NÃO! – Gritou dentro do carro, levando ambas as mãos a testa e em seguida mexeu freneticamente em seu cabelo.
Mas dessa vez foi diferente das outras já que pode ter vislumbres completos de quando estava em transe. Coisa que nunca aconteceu antes. Fechou os olhos e lembrou-se da terrível nuvem escura que a envolvia e de como aquilo lhe causava dor, só que algo amenizou sua agonia. E depois só lembrou-se de ter ouvido a voz tão amada e como se um véu negro fosse retirado de seu rosto, a viu em meio a escuridão.
- Ela estava lá! – Arregalou os olhos com o que acabou de perceber. E aquilo mudava absolutamente tudo. Pois, assim como na noite do Baile, Cosima a trouxe de volta. A impediu de fazer algo bem mais sério. Ela realmente tinha aquele poder só que, a que custo? Em ambas às vezes ela perdeu a consciência. Precisava compreender melhor o que aquilo significava e quais as implicações.
Sentia-se perdida, como a muito não se sentia e por mais que quisesse, sabia que não seria justo estabelecer aquela conexão naquele instante. Já havia atrapalhado demais então tentou bloqueá-la, mesmo que a sentisse tentando e tão próxima.
Não tinha certeza do porque havia ido até ali, mas também não havia outro lugar que desejaria estar mais. Bastava, naquele momento, estar próxima a ela. Foi então que a aproximação de um táxi a alertou. Ele parou bem em frente ao prédio de Cosima, no lado oposto a onde estava. Algo acontecera. Foi então que, para o sua surpresa, o portão se abriu e de lá Shay saiu carregando...
- Malas? Ela está indo embora? – O excesso de segurança de Helena lhe garantia privacidade atrás da escura película dos vidros e de lá a assistiu olhar para o topo do prédio e depois mergulhar no táxi e esse partir. Experimentou um misto de emoções naquele instante. Um imenso alívio por finalmente ter Cosima só para si, mas ao mesmo tempo um duro pesar por ter magoado uma outra pessoa. Porém, a primeira a dominava com facilidade e então, sem pensar duas vezes, saiu do carro e entrou no prédio de Cosima, aproveitando que o portão ficara aberto. Em poucos segundos já havia alcançado o topo das escadas e para sua felicidade e surpresa estava ofegante. Sorriu para a escada! Mas antes que sua mão alcançasse a porta, ela fora aberta.
Olharam-se como se há muito não o fizeram e não conseguiram dizer uma palavra se quer, pois o que sentiam naquele instante era intenso demais.
Cosima não recuou nem Delphine se moveu por alguns longos instantes. Perdidas uma na outra, nas promessas silenciosas, nas declarações não ditas. Certas de que estavam diante do grande amor de suas vidas e de que nada mais as impedia. Nada mais estava entre elas.
Mas fora Cosima quem cortou o olhar entre elas, baixando a cabeça e deixando lágrimas escorrerem. Aquela visão machucou Delphine duramente. Sabia que parte daquele sofrimento visto no rosto tão amado era sua culpa. Também baixou a cabeça e focou em sua bota marrom escura. Queria poder arrancar aquela dor de Cosima e bem poderia se não fosse o fato de que a dor da outra tinha a ver com ela mesma.
- Posso ir embora se preferires ficar sozinha... – Delphine cortou o silêncio sem a menor convicção de que seria capaz de fazer o que estava oferecendo.
- Seria o melhor a se fazer agora... – Cosima respondeu ainda de cabeça baixa, destruindo a loira ainda mais. -... Mas...
- Graças às deusas que tem um “mas” – Adiantou-se após um sonoro suspiro de alivio. Cosima finalmente riu com vontade.
- Eu sou completamente incapaz de ficar longe de você Delphine! – Deu dois passos para trás, a convidando a entrar. – Mesmo estando com um pouco de raiva de você! – Disse com fingida dureza, mas evidente sinceridade. Elas sabiam o motivo da raiva. Delphine havia sido infantil e inconsequente ao ir naquele almoço.
- Eu sei meu amor. Desculpe-me, mas também sou um fracasso no que diz respeito a não estar com você. – Disse já com os olhos marejados. – E eu lamento muitíssimo por tudo que possas ter passado. Mas eu não conseguia suportar a ideia de mais alguém com você. Cos... – A morena tinha a certeza do que ela lhe diria. – Foi doloroso demais... Ontem a noite... Eu... Senti ABSOLUTAMENTE tudo! – Começou a tremer involuntariamente.
- Venha cá meu amor! – Cosima a envolveu num acolhedor e apaixonado abraço. – Também preciso me desculpar com você. – Ergueu o rosto dela que estava afundado em seu pescoço. – Deveria ter sido mais forte, resistido mais, mas... – Teve suas palavras silenciadas pelos lábios de Delphine.
- Ambas fizemos o que tivemos de fazer! – Deu rápidos beijinhos no rosto da morena que riu deliciada. – Mas agora só o que importa é que estamos juntas sem mais nenhum empecilho entre nós. – E partiu para mais um beijo, mas fora interrompida. – O que foi?
- Isso me lembra que existe algo que preciso lhe mostrar. – Com cuidado, se desvencilhou dos braços de Delphine que a assistiu caminhar até o quarto, mas teve o cuidado de puxá-la pela mão. Havia finalmente chegado o momento. Delphine pensou que estaria preparada para aquilo. Ledo engano.
Cosima pediu que ela a esperasse na cama enquanto ela foi até seu closet e retornou de lá após alguns instantes, com algo nas mãos. Envolto em um plástico que o protegia, lá estava o outro livro.
O leve tremor que sacudiu seu corpo há pouco retornou com ainda mais intensidade e como se perdesse o controle sobre as próprias emoções, levou ambas as mãos a boca e começou a chorar copiosamente.
- Espera! – Pediu que Cosima segurasse o livro um pouco mais, pois queria olhá-la com ele em mãos. O livro que fora escrito por seu amor do passado. O livro que jurava que havia sido destruído juntamente a ela. Mas não, assim como seu grande amor retornara para ela, aquele livro também. E a visão de Cosima com o livro em mãos que fora escrito por Melanie era demais para Delphine.
Com mãos trêmulas, o recebeu e com apaixonada devoção, acariciou a capa e se demorou sobre o nome nela. Cosima assistia a tudo profundamente comovida. Não tinha a real dimensão dos significados implícitos ali, mas imaginou que Delphine estava tendo aquela reação tão emotiva por ser ela a Mestra da Ordem do Labrys e aquele ser um dos artefatos mais precisos para ela. A viu folhear as páginas e o choro de felicidade só ganhava mais intensidade. Viu as veias da testa de Delphine acentuarem-se, denotando o quanto intenso estava sendo aquele momento. Mas ela realmente não tinha dimensão.
A loira não havia esquecido da caligrafia belíssima de sua amada, o estilo da escrita que, mesmo se tratando de uma cópia do seu, possuía a identidade altiva de Melanie. Olhou para Cosima que também chorava, compartilhando aquele momento único e o arrebatamento a consumiu. Depositou o livro de lado e a puxou para o beijo mais maravilhoso e intimo que deram e imediatamente os seus corpos respondiam às suas emoções.
Então Cosima sentou-se no colo de Delphine, de frente para ela e tendo a certeza de que estavam definitivamente conectadas, disse o que precisava ser dito.
- Eu te amo!
- Eu te amo!
Disseram juntas, selando aquele amor ancestral que passou a levá-las a uma nova experiência de conexão.
******
A madrugada já se aproximava quando Delphine tentou, gentilmente, libertar-se dos braços de Cosima, que dormia profundamente sobre ela. Permitiu-se apreciar um pouco mais a deliciosa sensação da pele quente da mulher amada sobre si. O doce e amadeirado perfume dela. A respiração ritmada e tranquila, permitida apenas a quem desconhecia o que o destino lhe reservava. Seu corpo nu refletia a luz da lua que incidia pela janela e as abençoava. Delphine ousou se permitir sonhar que a vida delas poderia ser assim, exatamente daquele jeito para toda a eternidade, mas sabia muito bem que aquilo seria impossível, pelo menos até que seu maior inimigo fosse definitivamente derrotado. Isso levou sua mente até aquele livro e a tudo que a posse dele por Cosima representava.
Necessitava ter aquele livro em mãos um pouco mais, e como o sono negava-se a dar o ar da sua graça para ela, decidiu-se levantar. Vestiu o casaco marrom de Cosima que nela não ficava tão comprido, pegou o livro que estava na cabeceira da cama e o envolveu contra o peito enquanto contemplava a serenidade de seu amor. A morena dormia de bruços e estava completamente nua, representando um delicioso convite à luxuria, mas achou melhor deixa-la repousar. Até porque tinha algo em mãos que precisava analisar com mais calma. Com todo o cuidado, puxou a colcha que estava parcialmente caída ao lado da cama e cobriu Cosima, garantindo que estive protegida da frieza da noite, e então foi até a sala, para não perturbar o sono de sua amada.
Caminhou quase nas pontas dos pés e sentou-se no sofá. Para qualquer pessoa, a falta de luz seria um problema, mas a pouca luz que incidia da janela, lhe era mais do que suficiente. Viu que a mesa de centro de Cosima estava um verdadeiro caos, com livros e anotações espalhadas sobre e sob ela além do computador aberto e ligado. Tentou juntar o máximo que pode, buscando trazer alguma ordem àquele pequeno caos e quando ergueu uma pequena pilha de papeis viu algo que capturou toda a sua atenção. Um pequeno livro de capa dura, também envolto em plástico, bastante semelhante ao que trazia em mãos; Contudo fora o titulo dele que a chocou como nada antes o fizera, pois nunca havia visto aquilo em toda a sua longuíssima vida nem tão pouco conhecia a sua existência. Mas lá estava. Com incredulidade, leu aquelas palavras:
- Les Souvenirs de Melanie Verger![1]
[1] As Memórias de Melanie Verger em francês.
Fim do capítulo
Comentar este capítulo:
patty-321
Em: 04/03/2018
Incrivel essa conexão delas e está cada vez mais forte. Shay foi madura. Fiquei triste por ela. Cos nunca quis magoa-la mas foi impossível nao acontecer. O sentimento entre del e cos e tao intenso e avassalador q a Del perdeu o controle e mergulhou na escuridão. E o maldito está Armando arapucas para pegar Del. Medo. Ele é terrivel. E e as memorias da Melanie vao mexer ainda mais com as emoções da Del. Mas ela precisa ficar forte para enfrentar o maldito. Bom demais. Adoro. Boa semana. Bjs
Flavia Rocha
Em: 04/03/2018
Adorei o capitulo. A reação da Shay me surpreendeu, foi bem madura quando conversou com a Cos. É bom ver o poder/conexão de Cos e Del aumentando. Pela Delphine ter ficado surpresa quando lembrou que a Cos estava com ela na hora do transe, eu fiquei pensando que a Melanie nunca conseguiu fazer isso que a Cos fez.
Ja tô ansiosa pra ver o proximo capitulo, A Del vendo as memorias da Mel rs
Se a Cosima abrir o livro que esta com a Del vai perceber que a caligrafia é da Delphine?
Boa semana, autora.
[Faça o login para poder comentar]
Deixe seu comentário sobre a capitulo usando seu Facebook:
[Faça o login para poder comentar]