Alycia acordou primeiro e, ao se mexer, sentiu o corpo de Emily sobre o seu. Um sorriso tomou conta de seus lábios ao perceber que os braços da loira lhe envolviam. Aquela não tinha sido uma noite de sex*, mas, com certeza, tinha sido uma noite de intimidade.

Na noite anterior, a loira havia atendido ao pedido da morena para dormir em sua casa e tudo foi incrivelmente familiar, gostoso e tranquilo.

 

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Logo que saíram do DP, passaram em um restaurante de massas, bem próximo dali, o La Greppia, e compraram uma massa, algo que como muitas outras coisas que descobriram naquela noite, ambas gostavam. Seguiram para a casa da detetive.

No caminho, Alycia ainda estava meio pra baixo e Emily fez de tudo para animar a morena, procurou não mais falar do trabalho, que era um assunto pesado e resolveu contar histórias engraçadas sobre Elize no tempo da faculdade e da adolescência.

Em um dado momento, começaram a conversar sobre música e a loira, com o objetivo de arrancar um sorriso da morena, teve a ideia de fazer uma performance.

— Aly, de todos os cantores atuais posso te mostrar a que eu mais gosto?

— Claro, mas vai ter que cantar.

— Eu não planejava outra coisa. —  Emily disse com um sorriso travesso e piscou para a morena, depois conectou sua playlist com o carro e colocou a tal “música favorita” começou. Alycia começou a gargalhar antes mesmo da cantora começar a cantar. E, de repente, a loira começou sua dublagem:

Vem na maldade, com vontade
Chega, encosta em mim
Hoje eu quero e você sabe que eu gosto assim

Uh uh, uh uh, uh

Uh uh, uh uh, uh

Uh uh, uh uh, uh

Uh uh, uh uh (bang)

Bang (bang) dei meu tiro certo em você (bang)

Deixa que eu faço acontecer (vem)

Tem que ser assim pra me acompanhar, pra chegar

Então vem (vem), não sou de fazer muita pressão (não)

Mas não vou ficar na tua mão

Se você quiser não pode vacilar, demorar

A morena estava chorando de tanto rir.  Olhava para a loira ao seu lado fazendo caras e bocas e mal podia acreditar que a sua chefe durona, amiga do governador, sucessora de Furtado e uma das delegadas mais famosas do estado estava ali dublando Anitta. Não conseguia parar de rir e quase não conseguia manter os olhos na direção. Resolveu encostar o carro.

Emily, por sua vez, tinha certeza que nunca, em toda a sua vida havia pagado um mico tão grande para fazer uma mulher sorrir. Mas aquela não era uma mulher qualquer. Pensou.

A delegada terminou sua performance antes da música acabar, mesmo porque, ela não sabia letra toda.

— Não desliga, Emy. — Alycia falou quase sem ar de tanto rir.

— Acho que a mocinha já se divertiu demais às minhas custas, não? Além disso, se você continuar rindo desse jeito não vai dirigir e não vamos chegar na sua casa.

— Continua. —  Alycia pedia em meio aos risos. —  Eu só consigo imaginar Furtado ou o governador presenciando essa cena.

— ahahaha Jamais! Essa performance foi exclusivamente para você. —  Sorriu para a morena. —  Agora vamos porque nosso jantar vai esfriar.

— Sim, senhora delegada nada respeitável Rios. —  Sorriu e arrancou o carro. — Me conta, então a senhorita gosta de Anitta, Anavitória era só para me conquistar?

— Não, aliás, não tenho nada contra Anitta. Acho que é um estilo divertido, mas não é o meu. Eu gosto do nosso duo Anavitória, da Roberta Campos, do Nando Reis e tal. Das mais antiguinhas, gosto da Cássia Eller, do Cazuza, esse estilinho meio…ah sei lá!

— Romântico?

— É. —  Agora a loira estava um pouco envergonhada.

— E como aprendeu a letra da música da Anitta, Emy?

— Uai, eu faço academia. Não desde que esse caso começou, mas normalmente faço e nas aulas de hit dance rola de tudo. —  A loira fez aquele sorriso travesso e disse.—  Já ouviu MC Loma?

Aí que Alycia não conseguia mesmo parar de rir.

— Eu não acredito! Quem é você e o que fez com a Emily?

—  Tô brincando, boba. Essa não tem lá.

— Sei. —  A detetive fingia desconfiança, mas sabia que era verdade. Emily era romantismo puro, seu gosto musical verdadeiro deveria ser mesmo o que ela estava falando.

 

— E de que qual estilo você gosta, Aly?

— Os mesmos que você. Chegamos. — Disse já mudando de assunto.

Emily tinha quase certeza que Alycia tinha o dom para evitar climas. Mas isso não lhe incomodava, pelo contrário, achava divertido esse jeito “fugitivo” da morena.  — Somos uma combinação perfeita, eu sou muito melosa. Imagina se fossemos iguais —  riu do próprio pensamento.

Ao chegarem no apartamento de Alycia, o papo não tinha fim. Em nenhum momento elas se sentiram constrangidas. Depois de arrumarem a mesa, a detetive separou uma roupa para sua convidada, toalha e indicou o seu banheiro para ela.

Não fez menção de entrar, mas isso não incomodou a delegada. Não esperava nada além da companhia da morena. O dia havia sido realmente pesado. As imagens dos vídeos eram terríveis.

Alycia, assim que sua convidada entrou para o banheiro, fez o mesmo, mas no quarto de visitas, terminou mais rápido, não queria deixar a loira esperando. Quando chegou na sala, percebeu que correu muito, ela foi a pessoa a esperar.

Resolveu ficar um pouco na sacada, colocou uma música seguiu para a pequena área externa, ficou a observar o movimento lá embaixo.

A detetive havia colocado uma camisola branca, de seda, que lhe caia perfeitamente bem. A intenção era ficar à vontade, não sexy, mas falhou. Quando Emily a viu de costas, escorada no parapeiro da sacada, perdeu o ar. Alycia tinha um corpo lindo e com aquela camisola, aos olhos da detetive, estava irresistível.

— Calma, Emily! Você prometeu para ela que pisaria no freio, que usariam o tempo para se conhecerem. Respira fundo e se concentra. Você precisa pegar leve para conquistar essa mulher, ela é a pessoa da sua vida. ISSO!

 

A loira conversava consigo mesmo e caminhava na direção da sua morena. Chegou por trás abraçando-a. Alycia não evitou o contato. Pelo contrário, Emily pôde sentir seu abandono.

— Está tudo bem com você, linda? Estou preocupada! —  Beijou a nuca da detetive.

— Porque está preocupada?

— Hoje, no final do turno, seu rostinho estava abatido, agora você está aqui pensativa.

— Eu….—  Alycia se calou sem completar a sentença.

— Não precisa me contar nada que não queira, mas saiba que eu estou aqui.

— Eu fico muito feliz por ter você.

Alycia se virou para a loira e sorriu. Emily viu novamente aquele olhar tristonho, ainda que nos lábios houvesse um sorriso. A morena beijou a loira. Assim que os lábios se tocaram, elas pensaram ao mesmo tempo: — Como eu amo você!

Alycia se sentia protegida, Emily colava o corpo da morena ao seu, como se pudesse lhe proteger do mundo. E foi essa quem interrompeu suavemente a carícia. Não queria, mas precisava se segurar.

— Vem, vamos comer. —  Sorriu para a morena e pegou em sua mão. Sentaram-se à mesa. E a detetive respondeu ao que loira ansiava saber:

— Não foi comigo, foi com minha irmã.

— Seu pai?

— Sim. — Alycia pegou uma garrafa de vinhos para serví-las. Não olhou para loira enquanto falava. — Mas eu prefiro não falar sobre isso. Eu não sei explicar, mas dói como se fosse em mim quando toco nesse assunto.

— Eu não posso imaginar, mas entendo e te respeito, Aly. Mas —  Se aproximou da morena, colocou a garrafa na mesa e segurou em suas mãos. — eu quero que você saiba que não está mais sozinha. Não guarde para você as coisas que te fazem mal, minha linda. Como eu já disse, eu sei que é cedo para afirmar isso, mas a verdade é que eu te amo, não quero você só para sex*. Quero construir um relacionamento com você. Então, se precisar falar sobre qualquer coisa, pode falar. Sempre. Sempre.

— Eu… eu…. agradeço. E Emy, eu também te amo.

 

Emily sorriu ao escutar aquela confissão.

— Então você não ACHA mais que me ama. — Fez referência a fala da noite anterior. — Agora você tem certeza? — A loira falava em tom brincalhão.

—  Sua boba, vem aqui.

Novamente se beijaram e novamente a loira cortou o momento. Estava adorando o clima, mas agora, mais que antes, tinha certeza que precisava resistir àquela camisola branca. Alycia não precisava de uma noite sex*, estava carente, é verdade, mas o que ela precisava era se sentir segura, ter companhia, se sentir amada. O dia fez com que ela recordasse, lembranças ruins.

Namoraram, riram e se curtiram bastante. Alycia não voltou a falar sobre o abuso sofrido por sua irmã e Emily não insistiu. Depois de muita conversa, Alycia propos de assistiremum filme, em seu quarto. A loira estava disposta a fazer qualquer coisa pela morena e topou na hora.

— Qual você quer?

— Me surpreenda. —  A loira disse e piscou para a morena.

— Hum já sei.

Alycia escolheu o filme Extraordinário e Emily, após dez minutos de filme, teve certeza de duas coisas: primeiro, ela estava certa, Alycia não queria ser seduzida, queria apenas um momento de aconchego. Porque se ela quisesse insinuar algo, aquele seria o momento. Segundo, elas iriam chorar muito.

E assim foi. Ambas adoraram o filme, mas a detetive estava realmente emotiva, se aninhou à loira e adormeceu antes do fim. Por sua vez, a delegada terminou de assistir e ficou, por algum tempo velando o sono de sua amada morena, mas logo também não resistiu e partiu para os braços de Morfeu.

 

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Alycia, que estava de costas para loira, virou-se. Ficou alguns segundos contemplando aquele rosto que lhe parecia o reflexo do céu. Emily dormia serena, tranquila como se estivesse em casa.

— E você está e acho que eu também estou. — A morena pensou. Não se referia ao espaço físico, mas aos braços de Emily. Não queria se levantar, mas sabia que precisavam sair cedo. Então, sem acordar a loira, saiu daquela cama que nunca tinha sido tão aconchegante quanto naquela noite.

Seguiu em direção à cozinha e preparou uma linda bandeja de café da manhã para Emily. Quando tudo estava pronto e seguia de volta para o quarto, resolveu ligar o rádio baixinho. Dali alguns minutos começariam as notícias e ela gostava de estar bem informada.

Entretanto, qual não foi sua surpresa quando a música que decifrava seus sentimentos começou:

Eu quero a sorte de um amor tranquilo

Com sabor de fruta mordida

Nós na batida no embalo da rede

Matando a sede na saliva

Ser teu pão

Ser tua comida

Todo o amor que houver nessa vida

E algum trocado pra dar garantia

E ser artista no nosso convivio

Pelo inferno e céu de todo dia

Pra poesia que a gente nem vive

Transformar o tédio em melodia

Ser teu pão

Ser tua comida

Todo o amor que houver nessa vida

E algum veneno anti monotonia

E se eu achar a tua fonte escondida

Te alcanço em cheio mel e a ferida

E o corpo inteiro como um furacão

Boca, nuca, mão e a tua mente não

Ser teu pão

Ser tua comida

Todo o amor que houver nessa vida

E algum remédio que me de alegria

Ser teu pão

Ser tua comida

Todo o amor que houver nessa vida

E algum trocado pra dar garantia

E algum veneno anti monotonia

e algum....

Sentia-se leve e feliz.

 Já no quarto, deixou a bandeja sobre o criado e se aproximou da cama:

— Ei, loirinha linda, acorda. — Tirou os fios de cabelo do rosto da delegada e começou a beijar seu rosto.

— Loirinha, nós vamos ficar atrasadas. Psiu, Emy. — Mais beijos, agora selinhos em seus lábios.

Emily sorriu.

— Vou me mudar pra sua casa. —  Emily abraçou a morena fazendo com que ela deitasse.

— Ah é?

— É, quero acordar assim todos os dias. Bom dia!  — Sorriu.

— Bom dia! — Sorriu e beijou a loira. —  Posso providenciar isso, mas agora vamos ao café da manhã.

A morena então levantou, pegou a bandeja e a colocou na cama.

— Isso é para mim?

— Tecnicamente é para nós. —  Sorriu mostrando que estava brincando.

—  Hum, sério, não saio mais daqui. E ainda tem música boa de fundo!

— Eu procurei Anitta, mas só achei Cazuza mesmo. —  Alycia disse novamente em tom de brincadeira, estava realmente solta naquela manhã.

— Engraçadinha. — A loira lhe deu um selinho.

— Assim que começou a tocar, pensei em você e pela primeira vez entendi a letra.

O cantor voltou na primeira parte da letra:

Eu quero a sorte de um amor tranquilo

Com sabor de fruta mordida

Nós na batida no embalo da rede

Matando a sede na saliva

Emily e Alycia se olhavam com ternura e desejo. O locutor então anunciou:  

— Não saia daí ouvinte, daqui a pouco a famosa Beatriz Rosa nos concederá uma entrevista exclusiva ao vivo.

Os celulares de ambas começaram a tocar.

Fim do capítulo