Capítulo 12
O BOTÂNICO!
Três meses se passaram desde o incidente com a enfermeira. A vida na Vinícola transcorria serenamente. Não tocaram mais no assunto desde aquele dia fatídico e a rotina foi retomada com maior prazer ainda. Depois de ter alguém tão incômodo pela casa por quase dois meses, voltar a ser somente eles, sem estranhos para dividir a convivência, deixava a todos muito mais relaxados e felizes!
Assim que foi liberada pelo médico, Iara retomou sua velha rotina de exercícios e em pouco tempo já havia adquirido de volta a excelente forma que sempre tivera. Sempre que podia deixava Bia com Emma e ia de bicicleta até a Vila para fazer pequenas compras, adorava praticar “jogging” pela estrada que cortava toda a Vinícola ou caminhar por entre as vinhas, as oliveiras e os campos repletos de girassóis daquelas vastas terras, de preferência ao lado de Constance!
Por conta desses saudáveis hábitos, Dr. Giane achava que não seria mais necessária outra cirurgia na perna de Constance, ela melhorava cada dia mais e já não fazia mais uso da bengala. Em menos de seis meses tinha conseguido progredir na sua reabilitação de tal forma, que os quase três anos perdidos em inércia pareciam não tê-la prejudicado tanto.
O que mais preocupava a todos era uma possível crise de catalepsia e catatonia a qualquer momento. O médico acreditava que as doses mais fortes dos medicamentos não a fariam ter outra crise tão cedo, mas era bom não descuidar e estar sempre atento aos sinais que surgiam pouco antes dessa fase. O mais evidente era que Constance ficava quieta demais, quase sem falar, se recolhendo no seu mundo e bastante ausente, dias antes de deflagrar os sintomas. Ou então um forte estresse emocional poderia desencadear a doença de repente, como acontecera da última vez. Mas todos tinham confiança no tratamento e na força de vontade que ela demonstrava em seguir minuciosamente as recomendações médicas! Sua recuperação era quase que total e progredia em velocidade geométrica, até quase esqueciam a gravidade das seqüelas daquele terrível acidente!
Beatriz completaria 5 meses no dia seguinte e cada mês era comemorado por todos com uma pequena festa para os de casa e os amigos próximos que quisessem vir visita-las. Emma preparava quitutes, uma deliciosa torta e dezenas de fotos eram tiradas por Constance para registrar cada expressão de sua pequena princesa.
Haviam combinado fazer essa comemoração todos os meses até Bia completar 1 ano, quando então seria a festa anual. Constance chega animada na sala com a irmã no colo...
- Esse mês acho que a festinha da Bia será mais cheia que as anteriores. Os filhos de Emma já confirmaram presença e Marcelo trará a mulher e os gêmeos, Francesca virá com Laura e uma sobrinha pequena, Jordi com Carlo e convidei também Ferdinand!
- Quem?
Iara pergunta não reconhecendo aquele nome...
- Ferdinand...o Botânico que está me ajudando com as novas mudas. Estamos cultivando uvas perfeitas para fabricar um dos melhores espumantes da Itália e ele é muito competente no que faz!
Iara sorriu lembrando-se de quem Constance falava.
Ferdinand estava na Vinícola há uns dois meses. Comparecia duas vezes por semana, a fim de acompanhar o desenvolvimento das novas vinhas que gerariam o espumante dos sonhos de Constance. Uma bebida de Bouquet suave com leves notas frutadas, para agradar especialmente o paladar feminino!
Aquele era um projeto de Constance que havia sido retomado desde o nascimento de Beatriz. A Vinícola já fabricava um espumante “Brut Extra Dry” de nome C.Lugano, um enorme sucesso de vendas no exterior, que era o orgulho daquela fábrica de sabores! Uma criação de Constance e Camille, batizado com o nome desta última!
A idéia do novo espumante era também das duas, porém nunca chegara a sair do papel pela interrupção brusca do destino! Mas quando Beatriz trouxe de volta a esperança e toda a vontade de viver que havia se perdido, Constance quis retomar seus planos e o nome do novo produto já estava em sua mente: “Piccola Bia”!
Por isso, contratou um Botânico com experiência em videiras para auxiliá-la no desenvolvimento da espécie ideal.
Ferdinand era filho de mãe francesa e pai italiano exatamente como Constance. Havia estudado na melhor Universidade da Europa em Botânica e prestava consultoria em diversos Vinhedos espalhados pela Itália e França. Era um homem bonito, moreno, com olhos castanhos claros, cabelos lisos escuros na altura da base do pescoço, extremamente educado e dono de um sorriso charmoso que o tornava encantador! Devia estar na casa dos 35 anos e por nunca estar muito tempo em um só lugar, costumava deixar para trás alguns corações partidos por onde passava!
Iara já o tinha visto algumas vezes quando caminhava ou corria pelas estradinhas da propriedade, mas nunca chegaram a se aproximar. Sempre o avistava de longe nas estufas ou entretido em alguma conversa com Constance. Tinha percebido que era um belo homem, mas não provocava ciúmes nela, pois sabia que Constance nunca se relacionara com homens e não olharia para ele de outra forma que não a profissional ou no máximo como um bom amigo.
- Essa menina vai ficar tão mimada! O quarto dela já não tem mais espaço pra tanto brinquedo! Todo mês eles trazem toneladas de bonecos e bichinhos de todas as formas, ela nem consegue brincar com eles ainda!
Iara falava enquanto olhava com ternura Constance brincar com Bia no colo. A menina estava às gargalhadas com as caretas que a irmã fazia. Sem dúvida ela era muito mais apegada à Constance que a própria mãe! Muitas vezes quando começava a chorar só conseguia se acalmar no colo da irmã, mas isso jamais trouxe nenhum tipo de incômodo para Iara, pelo contrário, tinha certeza que Bia era tão incondicionalmente amada por Constance que considerava aquela ligação uma benção! De certa forma sentia-se também amada por tabela e isso sim era um alento para o seu coração!
Depois daquelas declarações sobre Camille no dia do embate com a enfermeira, Iara decidiu camuflar ainda mais seus sentimentos por Constance. Não tinha como lutar contra um Amor que era considerado perfeito...o Amor Morto! Sim, querer disputar espaço com alguém que não a magoaria jamais, que nunca iria contra suas vontades, que seria sempre idolatrada e considerada insubstituível, era injusto demais!
Aceitou os conselhos de Jordi e tentava sublimar o que sentia por Constance olhando para ela como alguém importantíssima na sua vida e na de sua filha, mas inatingível como mulher!
Às vezes a vontade de estar mais próxima dela era maior que qualquer sentido de razão, nessas horas disfarçava e tocava em suas mãos ou em alguma parte do seu corpo sem que ela suspeitasse de como seu coração se acelerava por apenas sentir a textura suave daquela pele!
Constance adorava pentear os longos cabelos negros de Iara, fazia isso desde que ela estava no hospital ainda e esses momentos eram sagrados e de completo deleite para Iara! Sentia a escova deslizar por suas madeixas com cuidado, desembaraçando cada fio, acompanhadas da outra mão que Constance usava para segurar as mechas e soltar os cabelos. Sabia que ela também sentia um enorme prazer com aquela atividade e o ritual nunca era interrompido até o seu final, quando ambas se afastavam com pesar!
Era um ato automático Iara sair do banho e procurar Constance com a escova na mão. Ela deixava qualquer coisa que estivesse fazendo para realizar aquela tarefa! Algumas vezes conversavam, em outras apenas se dedicavam a agir e receber...sem palavras!
Sem perceber Iara sentia-se acarinhada por Constance de várias maneiras: na escovação diária dos seus cabelos, na forma carinhosa e gentil com que era tratada, nos olhares cheios de ternura velada, nos sorrisos de cumplicidade. E todos aqueles gestos eram não só uma carícia, mas um conforto ao seu coração apaixonado!
Não havia como deixar de amá-la! Somente tentar tornar esse amor sua Relíquia Sagrada, daquelas que não se pode profanar com desejos pagãos!
No dia seguinte, a reunião estava animada! Bia passava de mão em mão como uma bonequinha que todos queriam pegar! Não estranhava ninguém e seus brilhantes olhos verdes acompanhavam a movimentação, atentos a tudo!
Orgulhosas, mãe e irmã tagarelavam sobre as últimas gracinhas que a pequena havia feito, quanto o último convidado chega...Ferdinand!
Trazia nas mãos um cachorrinho de tecido e Constance o apresentou a todos no recinto. Por fim, aproximou-se de Iara que estava com Bia no colo e disse...
- Essa é Iara, viúva de meu pai e essa coisa linda aqui é a nossa Beatriz!
Olhando intensamente para Iara, Ferdinand faz um carinho no rosto de Bia, entrega o brinquedinho à mãe e estende a mão para cumprimentá-la...
- É um prazer conhecê-la finalmente! Só a via de longe nas suas corridas ou de bicicleta, confesso que de perto a imagem é infinitamente melhor!
Iara sorriu já percebendo o jeito de conquistador daquele homem. Cumprimenta-o simpática...
- Prazer Ferdinand! Constance fala muito bem do seu trabalho! Espero que esteja gostando desse novo desafio!.
Com um sorriso de canto e os olhos apertados, ele diz...
- Adoro novos desafios...sempre! É o que impulsiona a minha vida! Estou sempre atrás de novidades!
Iara notou o duplo sentido e Constance olhava de um para o outro captando o interesse do rapaz em Iara. Pegou Bia no colo e abaixando o olhar falou...
- Fiquem à vontade, Francesca quer ficar um pouco com Bia.
Iara e Ferdinand então entabularam uma conversa sobre plantas, viagens pelo mundo, lugares exóticos, até que descobriu que ele havia passado uma temporada no Rio de Janeiro e, inclusive, falava um pouco de Português! Daí pra frente, foram descobrindo diversos assuntos em comum que os mantiveram numa agradável conversa por longos minutos.
Iara era uma mulher vaidosa que a vida toda estivera acostumada ao assédio das pessoas. Desde seu casamento com Lorenzo e principalmente depois de sua morte, não sentia seu ego de mulher tão bem massageado como naquele contato com o Botânico! Ele era um homem muito interessante, bonito, inteligente, articulado, conversava sobre diversos assuntos com conhecimento e bom humor e não deixava de jogar charme de vez em quando no meio do papo! Era sem dúvida um conquistador nato! Não escondeu seu interesse por Iara desde o primeiro minuto e parecia nem notar as demais pessoas na casa!
Iara de certa forma estava gostando do flerte! E qual mulher não ficaria envaidecida diante do interesse explícito de um homem jovem e charmoso como aquele?! Fazia um enorme bem ao seu brio, que há muito estava esquecido!
Porém, no fundo sabia que aquilo não passava de uma brincadeira para ela, um joguinho de sedução com o único intuito de saber se ainda era uma mulher desejável, de se sentir admirada, de saber que ainda tinha o poder de provocar e atrair alguém interessante! Era como se voltasse à adolescência e estivesse exercitando seu poder de sedução apenas para não perder a mão, era somente divertido!
Mas o casal, destacado de todos, não estava passando despercebido! Cada risada mais alta dada por um deles, imediatamente era acompanhada por olhos bem atentos: Jordi...Francesca...e Constance!
Em certo momento da festa Jordi se aproximou deles e falou simpático...
- O papo de vocês parece tá ótimo hein?! É a dupla mais animada da casa! A não ser Bia que tá escancarando as gengivas pra todo mundo que vê!
Ainda sorrindo do último comentário de Ferdinand, Iara responde...
- Você não imagina, Ferdinand conhece todos aqueles buracos que a gente tava acostumado a ir lá na Lapa, tanto os de samba quanto os de black music! Esse cara é uma enciclopédia em cultura pop!
Jordi sorri simpático...
- É mesmo?! Que interessante! Então a partir de agora o que não vai faltar é conversa pra você dois porque essa aí adora um “underground”!
E aproveitando a deixa, o Botânico diz ...
- Bom saber! Aqui em Montalcino não há lugares assim, mas posso ver algo em Siena, Arezzo ou Florença. Quem sabe não tiramos um final de semana para curtir o “underground” de uma cidade grande?! Claro que podemos ir todos juntos, inclusive Constance!
Duvidando Iara comenta...
- Constance gostar de submundo?! De bar fuleiro?! Acho difícil! Não consigo imaginá-la no meio de um lugar assim!
Neste instante ouvem a voz grave de Francesca que se aproximava do grupo...
- Pois você pode se surpreender com ela! Antes de conhecer Camille, Constance era a amiga mais festeira que eu tinha! Era ela que me arrastava para os lugares mais badalados aqui da Toscana! Chagávamos a ir à Roma, Paris ou Londres nas férias e nos feriados mais longos apenas para curtir as boates e festas das mais loucas que vocês podem imaginar! Ela sempre foi muito alegre e contaminava a todos com sua energia!
- Que surpresa saber disso! Ela realmente não tem jeito de mulher festeira, apesar de ficar muito à vontade com os amigos como agora.
Ferdinand comenta.
Iara olha para Constance e tenta formar as imagens ditas por Francesca. Fala baixo, quase que para si mesma...
- Adoraria ter conhecido ela nessa época!
Pegando-a pela mão, Francesca diz para os dois homens...
- Me emprestem ela por um minuto? Assunto de meninas!
Francesca levou-a até o bar onde um garçom preparava drinks sem álcool e com sucos de frutas. Pegou um coquetel e deu outro para Iara, brindaram e logo ela começa a falar sem rodeios...
- Eu sei que nós duas tivemos pequenas rusgas desde que nos conhecemos, mas sei também o quanto você e sua filha fizeram bem para Constance! Eu a amo como a irmã que nunca tive e sei que ela me ama da mesma forma, mas é inegável que desde que Camille morreu eu nunca mais tinha visto tanto brilho nos olhos dela! Parece a velha Constance de antes do acidente, alegre, jovial, bem humorada e feliz! Só que algo me preocupa muitíssimo...
Iara a olhava de modo direto e franco, esperou que ela continuasse...
- Se não conseguir fazer Constance olhar para você como mulher, vai partir dessa casa?
Iara abalou-se! Não esperava aquela pergunta de ninguém! Não tinha resposta para aquilo e falar com Francesca sobre seus sentimentos estava fora de cogitação! Como ela sabia que amava Constance?!
Tentando firmar a voz, respondeu...
- Entendo sua preocupação com a saúde e o bem estar dela, mas essa é uma pergunta para a qual não tenho resposta! Não me sinto à vontade para falar sobre o que sinto com você! Desculpe Francesca, mas você não tem o direito de me confrontar dessa forma!
Olhando firme para Iara, a mulher insiste...
- Como melhor amiga dela eu tenho o direito de saber o que pode acontecer sim, porque depois é ela quem vai ficar aqui estraçalhada e nós que a amamos vendo ela morrer em vida!
Iara indignou-se...
- Mas as coisas acontecem na vida da gente sem que tenhamos controle sobre tudo! Alguém tinha como evitar o sofrimento dela pela morte de Camille?! Se eu for sistematicamente rejeitada terei que renunciar a uma vida normal de mulher já que ela nunca vai ser capaz de me dar o que deu à Camille?! Não poderei nunca mais me sentir amada e desejada?! Eu não tenho culpa dela não me querer!
A última frase foi dita quase em meio a lágrimas que a todo custo segurava para não dar vexame!
Iara sentia raiva por Francesca saber do que sentia por Constance e ainda por cima jogava nela a responsabilidade de manter a saúde física e mental da amiga, como se tivesse que anular-se completamente para manter as coisas exatamente como estavam! Mas e ela?! E a sua frustração por saber que não era e não seria correspondida no tipo de amor que sentia?!
Percebendo o pequeno descontrole de Iara, Francesca a leva até a biblioteca para que os convidados não notassem que ela estava perto de chorar! Fecha a porta atrás de si e suavizando o tom de voz diz...
- Desculpe, você tem razão! Não podemos jogar nos seus ombros a responsabilidade pelo bem estar dela. Você a ama e isso é um fato, por mais que você tente esconder! Eu sei que você se casou por interesse com Lorenzo, mas também sei que o que sente por Constance é verdadeiro! Está no seu rosto, nos seus olhos, na sua dedicação a ela! Não precisa se esforçar em disfarçar isso, não há como negar! Todos nós já sabemos!
Iara chorava baixinho, tentando enxugar as lágrimas que borravam seu rímel.
- Ela não me quer como mulher, nunca vai me olhar dessa forma! Eu sou jovem ainda e, mesmo que não ame ninguém como a amo, tenho o direito de me sentir desejada por alguém!
- Você está ser referindo ao Botânico?
- E não foi porque me viu falando com ele que você me abordou com essa conversa?! Deve ter notado o interesse dele por mim! Tem receio de que? Que eu um dia arrume alguém que me leve para morar longe de Constance?
Francesca balançou a cabeça em afirmativa. Iara recobrou-se limpou o rosto e arrematou...
- Por enquanto pode ficar tranqüila, Francesca! Eu não tenho forças para me afastar de Constance, não seria feliz vivendo longe dela, seja com quem for! Não consigo imaginar a minha vida sem falar com ela todos os dias, sem olhar seu rosto, seu sorriso! Mas não posso te garantir que será assim para sempre! Infelizmente não depende só de mim!
E finalizou a conversa voltando para a sala onde estavam os convidados.
Francesca sabia que ela estava absolutamente certa! Era mulher como ela e entendia perfeitamente suas razões! Apesar de temer pelo futuro da amiga, concordava com Iara. Se Constance não a queria, não era justo fazer uma mulher tão jovem e bela abrir mão de viver plenamente com outra pessoa tudo o que a amiga não estava disposta a dar-lhe. Seria injusto e egoísmo demais!
O restante da noite transcorreu muito bem! Ninguém percebeu nada de errado com Iara, que por dentro vivia um turbilhão! Apenas Jordi viu que ela não estava tão natural como no começo da festa. Resolveu abordar a amiga...
- O que foi hein?! Tá com uma cara estranha depois do seu papo com a Francesca! Ela encheu seu saco de novo foi?!
- Como sempre ela consegue arrancar de mim coisas que não quero falar!
- Foi sobre o bonitão ali ou sobre Constance?
- Os dois! Ah, depois eu te falo o que aconteceu...
- Tá bom, mas cá pra nós, que homem é esse hein?! Simpático, agradável e lindoooo!!!
- Se controla, bicha! Agora você tá casadinho e com o homem dos seus sonhos e não me pareceu que Ferdinand goste desse tipo de fruta que você carrega ai!
- Tô casado e muito feliz, mas não morri né?! Não tô de olho nele pra mim, tô falando de você. O cara tá babando na sua, mulher!
Impaciente Iara retruca...
- Você sabe muito bem que meu forte não é homem! Eu sempre tive vários por questões profissionais, mas por prazer sempre me diverti mesmo foi com as mulheres!
- Eu sei, mas também sei que você tá numa carência de fazer dó e não é sacrifício nenhum ser cortejada por uma maravilha dessas! Aproveite, boba, você também está viva!
Jordi tinha razão! Não era pecado algum se sentir bem em ser paquerada por um homem daqueles! Que se danassem os fofoqueiros de plantão! Lorenzo estava morto há mais de sete meses, era solteira e não tinha compromisso com ninguém, então que mal havia em fazer um novo amigo?!
Ferdinand foi o último convidado e ir embora, parecia querer ficar com Iara o máximo que pudesse! Despediu-se de Constance e Iara o levou até a porta onde ficaram ainda conversando mais um pouco.
Constance estava sentada no sofá fazendo Bia dormir, mas não perdia nenhum movimento dos dois que sorriam de algo junto à porta...finalmente ele se foi!
Ainda sorrindo Iara senta-se ao seu lado e comenta com um suspiro...
- Essa festinha foi agitada hein?! Criança correndo pra todo lado, gente diferente! Bia desmaiou né?!
Constance olhava para a irmã com a cabeça baixa, não fez comentário algum!
Iara continua a falar...
- Gostei muito de Ferdinand! Uma graça de pessoa! Sabia que ele morou no Brasil?! Mais especificamente, no Rio de Janeiro?! Tivemos assunto que não acabava mais!
Então Constance a olhou cabisbaixa, com um sorriso amarelo nos lábios, como quem tenta parecer alegre pelo outro, e diz meio sem graça...
- Que bom que encontrou alguém para interagir por aqui! Eu não costumo ser boa companhia sempre e ele parece ser uma boa pessoa. Você precisava de novos amigos!
Pegou Bia no colo e completou...
- Pode deixar que eu a coloco no berço. Boa noite!
E deixou para trás uma Iara pensativa...
“Será que ela ficou chateada por eu ter gostado de Ferdinand? Não deve ser ciúmes, claro que não! Deve ser o mesmo medo que Francesca tem, que eu arrume alguém e queira ir embora daqui levando Bia pra longe dela! No fundo acaba sendo egoísta como todo mundo!”
Depois daquela noite, Iara e Ferdinand estreitaram a amizade! Tinham diversos assuntos em comum e as conversas eram sempre muito animadas entre os dois!
O Botânico passou a acompanhar Iara nas suas corridas no fim da tarde, nos dias em que estava na Vinícola. Constance costumava acompanhá-la somente nas caminhadas e nos passeios de bicicleta. A cada dia deixava mais claro seu interesse em Iara e ela, por sua vez, nem o incentivava nem o rechaçava. Fazia o papel de viúva que ainda não está pronta para recomeçar, o que de certa forma a ajudava a manter o rapaz a uma distância segura!
Gostava de ter alguém bonito e divertido para exercitar seu velho poder de atração, como um gato brincando com o indefeso camundongo antes de matá-lo! Iara sabia que Ferdinand, apesar de ser muito atraente, jamais passaria de brincadeira para ela! Só que as outras pessoas não sabiam disso!
Ele mesmo tinha certeza que levar aquela bela brasileira para sua cama era só questão de tempo e pouco tempo na opinião dele!
Já Constance sentia-se cada dia mais incomodada com aquele flerte entre os dois! Sabia que Iara tinha todo o direito de ter outros amigos, de encontrar alguém, de namorar, .mas essa idéia fazia seu coração sentir uma tristeza imensa! Abaixava os olhos quando via os dois juntos, sempre sorrindo um para o outro! Não gostava de ouvir o tom animado com que Iara se referia a ele. E sentia uma angústia inexplicável quando pensava que algo sério pudesse estar acontecendo entre os dois! Creditava todo esse desconforto ao medo de ficar longe de sua pequena Bia, do seu anjinho. E aquele receio aumentava cada vez mais!
Uma tarde Iara entra ofegante na cozinha, após uma corrida com Ferdinand. Constance está sentada comendo um pedaço de bolo quando ela fala animada...
- Estamos combinando uma ida até Siena para uma noitada em um bar super exótico que Ferdinand descobriu! Vamos formar um grupo de amigos pra noite ser bem divertida, que tal?! Eu, você, ele, Jordi, Carlo...se quiser chame também Francesca e Laura!
Constance ficou quieta olhando para o bolo em suas mãos, pensou e disse desanimada...
- Não saio há muito tempo para bares! Não sei se vou conseguir me divertir e se quiser vir embora logo?! Siena não é tão perto assim!
- Ah, Constance vamos! Por favor! Acho que vai ser ótimo pra você que não sai daqui há tanto tempo! Francesca me contou como costumava ser baladeira na época da faculdade, vamos! Não vai ser tão bom se você não for!
Tentou rebater ainda desanimada...
- E Bia? Não podemos deixá-la sozinha e...
Iara a interrompeu com as mãos na cintura...
- Ai não me venha com essa! Sabe muito bem que Emma adora ficar com Bia e ela tem litros de leite meu armazenados no freezer, é só esquentar! Que outra desculpa esfarrapada vai me dar?!
Constance sorriu vencida! Como dizer não para aquele rosto tão animado e bonito?!
Ficou então combinado o encontro entre os amigos no sábado seguinte! Iara iria dirigindo com Constance e em Siena encontrariam Ferdinand, Jordi, Carlo, Francesca e Laura, que lá moravam.
Constance consultou Dr. Giane para saber se podia suspender a medicação naquele di, queria aproveitar e degustar um bom vinho ou Prosecco como há muito tempo não fazia! No final, acabara também ficando animada com a noite junto aos amigos!
O bar era realmente exótico! A decoração era toda inspirada nos grandes clássicos do cinema Italiano: ”La dolce Vitta”, “Il Gattopardo”, “Armacord”, “Satyricon” e outros tantos! Havia cartazes espalhados pelas paredes com cenas dos filmes, dos atores, dos diretores. O cardápio era também temático e a música ótima! O lugar estava repleto de pessoas interessantes que circulavam de um lado ao outro com seus drinks na mão, esperando ver e serem vistas! O ambiente era eclético desde a comida e bebida, até no visual, tipo e a idade de seus freqüentadores. Podia-se ver belos jovens enturmados com pessoas mais velhas, artistas alternativos da região junto com turminhas GLS, rapazes e moças em busca de flerte e companhia, enfim, o lugar era vibrante!
Foram as últimas a chegar e os amigos fizeram uma enorme festa com a presença de Constance, enquanto Ferdinand se levantava para cumprimentar Iara com um olhar de gula para o corpo bem feito que se destacava num belo vestido cor de sangue!
Constance também estava especialmente bonita naquela noite e vestia saia longa verde com uma blusa justa na mesma cor num tom mais claro, que realçava seus olhos, destacava a silhueta elegante e deixava à mostra o colo alvo de seios bem torneados e discretamente convidativos!
Iara havia se impressionado quando a vira pronta para sair e quase deixa escapar mais que uma exclamação de elogio, mas se conteve diante do olhar de Constance para o visual dela...tinha um ar de desaprovação!
Tá certo que vermelho escuro era uma cor que a deixava ainda mais sexy, mesmo sem querer, mas o vestido tinha um corte clássico e simples, e não mostrava nada de mais que a fizesse se envergonhar, então mesmo chateada com a reação dela, resolveu ignorar!
Por isso ficou tão feliz com os elogios de Ferdinand! Sabia que estava muito bonita e se Constance não gostava do estilo dela, era uma pena!
A noite começou bastante agradável, a conversa era generalizada e todos interagiam com muita diversão! Iara sentou ao lado de Constance e de frente para Ferdinand, que não escondia seus olhares de admiração pela mulher!
Todos decidiram pedir Prosecco para incrementar o clima de festejo entre amigos e a mesa se tornou uma das mais animadas da noite! A cada nova garrafa, um novo brinde e as borbulhas do espumante espocavam nos narizes e bocas sorridentes!
Iara se controlava, e após duas horas, havia bebido somente três taças de espumante. Sabia que deveria dirigir de volta quase 100 km até a Vinícola, e não queria arriscar-se nas estradas escuras até em casa! Percebendo tudo, Francesca diz a ela...
- Pode beber á vontade porque vocês não vão voltar para a Vinícola de madrugada, de jeito nenhum! Minha casa é bem grande e há espaço suficiente para vocês se acomodarem, Conca conhece muito bem o lugar! Há um pequeno chalé anexo à casa só para hóspedes e poderão ficar lá com privacidade total! Quanto a roupa eu e Laura temos o suficiente para vocês duas!
Constance levantando sua taça com um sorriso meio bobo, falou...
- Ok, mamãe! A senhora que manda! Nada de voltar hoje!
Iara olhou para Constance e só então percebeu que ela parecia estar de pilequinho! Os olhos verdes brilhavam como duas esmeraldas finamente lapidadas, estavam mais apertados, o rosto num leve tom ruborizado, o sorriso permanente e fácil, a voz mais lenta que o normal! Sim, ela estava de pilequinho!
Preocupou-se, afinal ela não bebia nada alcoólico há muito tempo por causa da medicação forte que tomava desde o acidente. Ficou atenta para que ela não se excedesse.
Em certo momento Ferdinand a chama para dançar e Iara aceita. A música não era lenta e dançavam próximos, mas separados. Ferdinand se aproxima do rosto dela e diz com voz sensual...
- Venha para minha casa comigo! Deixe Constance na casa das amigas e vamos passar a noite juntos! Há muito tempo espero por isso!
Instintivamente Iara se afasta e diz agitada...
- De jeito nenhum! Não posso deixar Constance sozinha!
- Sozinha?! Mas ela vai estar com as amigas! Além disso, ela é bem grandinha e não precisa que você a ponha na cama para ninar não é?!
- Desculpe Ferdinand, até gosto de você e confesso que me sinto lisonjeada com seu interesse, mas não posso corresponder ao que você quer!
- Porque não, Iara?! Sabe que estou louco por você desde que a vi correndo pela primeira vez por aquelas terras, não consigo parar de pensar em você! Entendo que queira ser discreta porque o pai dela morreu não faz nem um ano, mas você é linda, jovem, não pode se privar de ser feliz por causa disso! Fica comigo!
Iara balançou a cabeça em negativa, já estava começando a ficar incomodada!
- Não vou pra sua casa! Não insista! Vamos continuar como bons amigos que somos!
E antes que pudesse terminar, Ferdinand a pega e beija de surpresa! Sentiu a língua invadir sua boca e tentar arrancar dela algum gemido de prazer! A barba cerrada machucava sua pele, as mãos seguravam firme seus braços, sentiu toda a excitação dele junto ao seu ventre e procurou corresponder ao beijo para ver se empolgava seu corpo! Afinal, uma boa noite de sex* talvez ajudasse a levantar sua auto estima que estava lá no chão depois do olhar de crítica de Constance para o seu vestido naquela noite!
Só que a empolgação não veio! Era como se beijasse um dos “paizinhos”, não sentia absolutamente nada! E com essa sensação o afastou delicadamente de si. Gostava dele, mas tesão que era bom, nada! Não adiantava insistir! Falou contundente...
- Desculpe, mas realmente não dá! Não vou conseguir, mesmo que seja só sex*, não vou conseguir! Sinto muito!
Desolado o Botânico a soltou e disse com tristeza na voz...
- Não entendo, a gente se dá tão bem! Porque não tentamos?!
- Porque não vai adiantar! Vou ser completamente honesta com você, apesar de você ser um homem muito atraente, eu não o desejo! Só isso!
Soltando um sorriso de resignação ele diz...
- Você é a primeira mulher que me diz isso, em geral elas desejam e muito! Mas pra tudo tem a primeira vez né?! Até mesmo ser rejeitado! Ok, Iara, seja como você quiser! Eu gosto de você como amiga de qualquer jeito e se não me quer como homem, pelo menos quero manter-me seu amigo! Pode ser?
Com um sorriso de alívio por ele ser um cavalheiro e não insistir, ela responde...
- Claro que sim! Também adoro ser sua amiga!
Ao se virarem para voltar à mesa se depararam com todos olhando para eles sem disfarçar! Iara ficou encabulada, pois não notara que a mesa tinha visão total de pista de dança! Todos viram o tal beijo, inclusive Constance!
Totalmente sem graça e tentando parecer divertido, Ferdinand comenta...
- Calma pessoal, ninguém vai casar! Fui solenemente dispensado e só vou ter para lembrar aquele beijo delicioso! Vamos comemorar que é pra isso que estamos aqui, celebrar a vida e à amizade! Garçom, mais Champagne!!!
Constance olhava para Iara de uma forma tão intensa que parecia querer arrancar sua alma pelos olhos e desvendá-la minuciosamente! Iara não tinha a menor idéia do que se passava na mente dela, mas não conseguiu sustentar aquele olhar tão perturbador por muito tempo!
Virou de uma só vez a taça que lhe deram e completou novamente. Precisava relaxar de alguma forma!
O constrangimento durou alguns minutos, mas bastaram umas garrafas a mais de espumante e todos já estavam entabulando uma animada conversa outra vez! Os amigos pareciam não querer deixar que Constance mudasse de humor e exigiam a atenção dela o tempo todo e tudo pareceu voltar ao mesmo clima de antes.
Um par de horas depois e todos já estavam bem altos pelo efeito do Prosecco! Decidiram pedir a conta e ir embora.
Já estavam se encaminhando para a saída do bar, quando alguém puxa Constance pelo braço...era Giovanna!
A enfermeira estava acompanhada de outra mulher que ficou um pouco afastada enquanto ela abordava a ex-patroa.
- Dona Constance, que surpresa maravilhosa vê-la aqui! Será que podemos falar só um instante?
Completamente indignada Iara tirou com força a mão que segurava o braço de Constance e bradou para a mulher...
- Como se atreve, sua cretina! Tire suas mãos nojentas de cima dela!
Vendo que Iara estava se descontrolando, os homens a seguraram! Constance parecia estar surpresa com a abordagem, mas estava também com a mente muito embaralhada pelo álcool! Olhou para a mulher e disse com cautela...
- O que você quer de mim?
- Quero dizer que tudo o que fiz, ter me declarado, aquele beijo...foi tudo por amor!
- Beijo?! Ela conseguiu te beijar, Constance? Essa vagabunda te beijou?
Iara estava completamente fora de si e fazia força com os três homens que a seguravam e impediam que avançasse sobre aquela cara cínica!
Constance estava confusa! Sim lembrava que Giovanna havia tentado beijá-la, mas estava num momento tão sofrido, chorando a morte de Camille, que nem sabe ao certo se ela conseguiu! Só se recordava da repulsa que sentira e de querer ela fora do seu quarto, depois Iara apareceu e tudo se desenrolou da forma que sabemos...
- Nã..não sei!
Estava tonta e não reagiu quando a enfermeira novamente a tocou...
- É ela que não quer que arrume ninguém, ela quer manipular você para continuar controlando tudo! Olha pra mim, estou aqui dizendo que te amo e que posso ser sua a hora que quiser, basta me chamar e irei imediatamente! Só que enquanto essa víbora estiver na sua vida, ela vai tentar afastar qualquer pessoa que se aproxime, mas não porque se preocupa com você e sim para não perder o domínio sobre sua fortuna!
Iara ficou possessa! Com os homens segurando seus braços, só conseguiu erguer as pernas para tentar acertar um chute naquela serpente peçonhenta, mas a mulher foi mais ágil e se afastou pronunciando baixinho e pausadamente cada sílaba...
- PU-TA-NA!!!
Olhou para Iara com ar de deboche e antes que alguém pudesse sequer suspeitar do que estava por vir, pegou Constance pelo pescoço e deu-lhe um beijo escandalosamente provocante!
Completamente zonza pelo Prosecco e pela surpresa daquele beijo, Constance a afastou lentamente de si! Se estivesse sóbria provavelmente teria sido mais rápida, mas estava sem forças para reagir! A coordenação motora estava comprometida e o raciocínio lento demais!
Todos assistiram a cena, aturdidos! Iara parou de xingar a mulher e ficou observando Constance. Seu coração parecia que ia explodir de angústia dentro do peito! Pensou...
“O que foi aquilo? Ela se deixou beijar por aquela vadia escrota?!”
A mulher entrou em um carro e foi embora deixando todos boquiabertos e Iara arrasada!
A adrenalina a fez ficar sóbria de imediato e sua mente parecia um letreiro em neon a todo instante piscando - ”Ela se deixou beijar!”
Constance parecia não ter dado tanta importância assim ao fato, balançou a cabeça em negativa sorrindo debilmente e com a voz pastosa falou...
- Gente, vamos que eu já passei da conta aqui! Foi emoção demais para uma noite só! Tem muita gente maluca nesse mundo né não?!
Todos estavam igualmente bêbados e caíram na risada com o jeito gaiato de Constance falar! Menos Iara, que já se encontrava completamente sã de tudo que acontecia!
Pegou as chaves da mão de Francesca e encerrou a noite dizendo de forma áspera...
- Eu dirijo até sua casa, amanhã venho buscar o outro carro! E vocês três vejam se conseguem abrir a porta do carro e achar o caminho para casa sem causar nenhum acidente! Se quiser eu chamo um taxi!
Carlo, que era o mais sóbrio dos três, disse acalmando a mulher...
- Pode deixar que estamos bem pertinho e Ferdinand dorme lá em casa mesmo! Eu posso dirigir!
Iara olhou para Constance e falou irritada, sem tocá-la...
- Será que consegue andar até o carro?
Com um sorriso bobo no rosto ela respondeu...
- Claro que sim! Não estou bêbada, estou só de pilequinho! Sabe que tem diferença?!
Sem responder, virou as costas e entrou no carro esperando que as outras fizessem o mesmo. Francesca foi na frente indicando o caminho.
Chegaram a casa dela e a mulher, mesmo cambaleante, arrumou roupas e toalhas, levando as duas até o chalé. Chegando ao quarto disse com indisfarçável malícia na voz...
- Esqueci de avisar a vocês que só há uma cama de casal! Espero que não tenham problemas para dormir por causa disso! Boa noite e durmam com os anjinhos, quer dizer, com as anjinhas!
E saiu gargalhando da sua infame piadinha!
Fim do capítulo
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