FREAKS por Marcya Peres
Capítulo 9
PASSA TEMPO...PASSA...
“ Passa tempo...passa...ajude a afogar o que não consigo conter! Venha com suas mãos poderosas e faça imergir pras profundesas abissais dos meus sentidos aquele, justamente aquele único sentir que tanto buscam e ao qual resisto...não o quero...rejeito! Não vou me entregar a ele, não o aceito em mim!”
Mais uma madrugada e Nic acorda com essas palavras ecoando em sua mente...levantou e as escreveu em um papel sobre a cômoda. Eram sempre as mesmas martelando como uma bigorna e seu irritante som metálico. Parecia sua própria voz ecoando em sua mente como um mantra às avessas. Porque aquilo?
Mais de um mês que Lori havia partido pra Europa. À medida que passava pelas cidades, ia mandando cartões postais para avisar a todos que estava bem e falar amenidades sobre a paisagem ou costumes locais. Remetia cartões para as amigas, os empregados e para Nic. Os cartões para Nic eram em torno de 1 por semana, em algumas vezes vinham dois, e esta passou a esperar por eles com uma expectativa quase infantil, como a que acomete as crianças na noite de Natal, ansiosas em descobrir seus presentes. Não tinha consciência plena dessa sua ansiedade e pensava ser apenas preocupação natural com o bem estar da moça no outro lado do mundo. Mas acabava denunciando-se ao ir até sua caixa de correios pelo menos duas vezes ao dia checar se algo havia de novo.
Lori havia dito que não telefonaria pra ninguém naquele período, daria notícias apenas através dos cartões, pois queria realmente desligar-se de seu mundo e poder entregar-se completamtente ao conhecimento das novas culturas que surgiam a sua frente e principalmente fortalecer seu interior. Aquele tempo longe de tudo estava sendo crucial para o seu amadurecimento e auto conhecimento. Uma coisa havia descoberto como fato inegável, estava irremediavelmente apaixonada por Nic e tinha completa noção que aquele sentimento, era sublime apenas dentro de si, pois era algo que poderia arruiná-la se Nic soubesse o quão era intenso e dominante em seu coração. Não tinha a menor intenção de deixar-se transformar em mais uma cria desprezada de Nic. Não permitiria que ela arruinasse um sentimento tão belo com sua perversão mórbida e sua falta de afeto. Preferia enterrá-lo em si para sempre e esperar que ele um dia se transformasse em algo praticamente esquecido, a submetê-lo ao escárnio e ao desdém de Nic.
Passou noites inteiras tentando descobrir porque razão se deixara apaixonar! Nic em nada havia contribuido pra isso! Ela não era carinhosa, não era terna...fazia questão de mostrar a Lori seu lado malévolo e sem respeito ao próximo...não escondia que não acreditava e não admitiria na sua vida outro sentimento que não o desejo, o sex* e o sadismo...então porque havia se deixado envolver e apaixonar? Não poderia ser apenas pela beleza agressiva dela, nem pela sua admiração por seus desenhos, ou os olhares lascivos que deixava escapar de vez em quando para Lori, e muito menos por ser sua prima, sua única parente...não, isso definitivamente não era motivo pra que alguém caisse de amores por outro, ainda mais sendo esse alguém uma mulher e, pior, Nicole MacGillian, a fera!
Então constatou mais uma vez que não havia explicação plausível e coerente para aquele sentimento...apenas sentia e não havia motivo!
Procurava não cogitar se aquilo poderia ser considerado Amor ou era apenas paixão movida pelo desejo carnal...preferia com todas as suas forças acreditar na segunda hipótese e convencia-se disso a cada dia mais. Sem dúvida alguma seria muito mais fácil aprender a lidar com um tesão reprimido que um Amor sufocado. O fato de Nic ser mulher como ela era o que menos importava. Nunca havia perdido tempo questionando-se sobre ser lésbica, hetero ou bissexual ou que tipo de efeito isso poderia ter em sua vida íntima e social...não tinha relevância alguma! O que mais a deixava confusa e temerosa era ter se deixado apaixonar por uma personalidade ácida e travosa como a de Nic...que não acreditava, ou pelo menos não aceitava, o Amor em sua vida...e isso sim era relevante para Lori.
“Eu vou fazer o que puder para nunca amá-la, Nic! Essa paixão que estou sentindo vai se acabar da mesma forma que começou...do nada! Não vou alimentá-la e se puder, vou procurar apagá-la dentro de mim cada dia mais. Tenho nojo do seu gosto sádico, das suas perversões sexuais, da sua arrogância...e esse será meu maior trunfo para matar você dentro de mim!”
Lorena estava conseguindo realizar o que havia planejado para aquela viagem. Levara pouco dinheiro e em cada lugar que resolvia ficar mais que uma semana, procurava uma praça pública onde pudesse armar seu cavalete e vender alguns desenhos dos rostos que por ali passavam. Seu talento era inegável e não era difícil que ao final de uma tarde, tivesse dinheiro suficiente pra uma boa refeição e um hotel barato. Nas cidades que visitava, adorava andar por onde os turistas não costumavam ir e, assim, ia descobrindo belos recantos, lugares exóticos, outros simples, mas sempre mais próximos do que o povo nativo costumava frequêntar. Era disso que gostava, estar perto para melhor conhecer e entender como viviam as pessoas dos lugares por onde andava. Tirava muitas fotos, aprendia deveras, espantava-se às vezes, ria do que via, intrigava-se com alguns costumes diferentes...e com isso o tempo passava e as lembranças de Nic ficavam para a madrugada e seus sonhos. Por onde passava atraía pessoas diversas, fossem crianças, velhos, homens, mulheres...que se deixavam encantar por sua beleza “amorável” e singela...porém sua personalidade um pouco arredia e introspectiva, não permitia que fossem além de simpáticos cumprimentos e poucas palavras, que raramente extendiam-se em uma breve conversa. Os rapazes eram sempre mais ousados, porém Lori conseguia mantê-los a uma distância segura, de modo firme, sem perder sua natural delicadeza.
A exceção havia sido Pietro, um jovem Italiano, dois anos mais velho que ela, que também pintava quadros na “Piazza del Duomo”, uma das principais praças do centro de Florença. Pietro tornou-se um amigo e todos os dias, durante uma semana, estiveram lado a lado pintando, conversando sobre suas vidas e visitando os museus, igrejas, praças da cidade, o rio Arno, as esculturas de famosos filhos de Florença (daVinci, Maquiavel, Michelangelo, Galileu, Dante...) e apreciando ao final do dia uma típica refeição Italiana. Ele também era meio tímido e instrospectivo como Lori, talvez por esta razão tivessem se dado tão bem, ao reconhecerem-se semelhantes. Pietro fez questão de acompanhá-la em outros pontos da Itália, próximos a Florença, tais como: Bolonha, Gênova, Pádua, Veneza e Verona. Gastaram mais dez dias por estas cidades até que Lori partisse para a Austria, deixando pra trás um novo amigo. Não houve interesse sexual entre ambos, apenas um singelo sentimento fraternal. Lori teve a sensação que o mais novo amigo era homossexual, mas como ele não tocou no assunto, ela não quis ser inconveniente em perguntar. Eram duas almas parecidas que se encontravam no meio do velho continente, para trocar experiências e desfrutar bons momentos de companheirismo e jovialidade. Lori partiu, não sem antes fazer um convite para que Pietro a visitasse em sua casa, disse que fazia questão de mandar-lhe as passagens e que gostaria muito de apresentá-lo à sua querida Florida e seus belos balneários.
Durante aquelas semanas, Nic impôs-se um celibato involuntário. Simplesmente não sentia o desejo aflorar, parecia-lhe que o tesão havia ido embora no mesmo avião que Lori. Dispensou Moly todas as vezes que a procurara, bem como Anette, Sean e o Gladiador. Isso era algo atípico em sua vida, sua libido sempre fora intensa, com ou sem sessão de sadomasoquismo, e não compreendia o porquê daquele “apagão” em seus sentidos. A única pessoa que fazia seu corpo acordar daquela dormência era Lori! Todas as vezes em que principiava a masturbar-se, a imagem dela sempre vinha à sua mente e, ao invés de continuar, ela simplesmente parava e reprimia sua vontade como se treinasse o corpo para não sucumbir àquele desejo insano quando a visse novamente.
Estava determinada e ter sob controle aquelas emoções que a assaltavam e a deixavam confusa, sem saber como agir diante da novidade do que sentia. Em sua agitava vida social e íntima, Nic havia sentido fortes desejos e tesão incontáveis vezes, por homens e mulheres, no entanto nunca nada comparável as sensações que seu corpo manifestava cada vez que flagrava Lori a fitando daquele jeito inconscientemente sensual....cada vez que ouvia sua voz suave e naquele tom levemente rouco e mais baixo que o normal...cada vez que via aquele sorriso que lhe ofuscava a mente e fazia o coração acelerar. Nada nunca chegou próximo da fraqueza que sentiu ao aspirar através de sua boca e nariz o perfume, o hálito e a essência que exalava da pele de Lori, no Baile de formatura. Nada! Nunca!
Nic sempre recusou deixar-se envolver demais por alguém. Além de não crer no sentimento Amor como utopicamente descreviam os poetas, jamais admitiria ter outra pessoa a dominando ou controlando sua vida ou seus desejos por estar apaixonada. Por isso, com o tempo, intensificou sua fixação pelo sadomasoquismo, transferindo de foco a paixão que poderia vir a sentir por alguém, projetando-a no sadismo e nos jogos que impunha a si e a seus parceiros. Nunca havia se permitido aproximar-se de alguém o suficiente, a fim de enxergá-lo com olhos diferentes. Não notava o ser humano por baixo do corpo que a divertia e saciava. E o final das relações era sempre o mesmo...passada a novidade pela “carne fresca”, esgotados os jogos pervertidos, atingidos os limites que se impunham...cansava-se daquele corpo, enojava-se e partia em busca da próxima diversão.
Uma vez havia lido um texto sobre relações sadomasoquistas que dizia que o Romantismo e o Sadomasoquismo eram as formas mais intensas de se expressar o Amor! Ambos eram as faces opostas de uma mesma moeda! Ambos tinham a capacidade de colocar o mundo a serviço de seus sentimentos e desejos! Ambos exerciam com plenitude aquilo que os humanos tem de mais humano! Eram apaixonantes...radicais...vibrantes!
Tanto o Amor Romântico quanto o Sadomasoquista tinham o poder de abranger o mundo com nossos sentimentos, de emprestar às coisas o nosso modo de ver e de sentir. Por isso, não raro o Romântico é ridicularizado e o Sadomasoquista execrado!
Muita gente ainda pensa que Sadomasoquismo é uma perversão, um desvio da sexualidade, um transtorno psicológico. Mas os estudos de Freud sobre sexualidade humana, veio nos ensinar que toda sexualidade humana é em tese pervertida, ou seja, o que faz com que nossa sexualidade seja diferente da sexualidade animal, é que a nossa é pervertida! Não a usamos somente para procriar, queremos o prazer, o gozo que advém dela, coisa que os animais não sabem! Portanto, o Sadomasoquismo é um estilo de sexualidade que sabe da perversidade do humano e o assume! Ao contrário dos outros estilos, é uma sexualidade crua, aberta, que instiga o lado cruel que todos temos...é uma sexualidade honesta!
Nic adorou o texto, mas não concordava com o autor do mesmo que achava que o Sádico ao fazer uma pessoa sua escrava, na verdade celebrava seu amor por este alguém. Isso ainda não havia acontecido com ela...apaixonar-se e ainda por cima por um de seus escravos! Na verdade o que acontecia com ela era o contrário do que o texto aclamava...ela não conseguia aprofundar nenhum tipo de relação com seus masoquistas, acabando por sentir-se indiferente ou então nojo depois de certo tempo.
Só que o que vinha sentindo por Lori era um desejo quase desenfreado, como nunca havia experimentado até então. Nos seus sonhos mais alucinados, via-se subjugando e dominando Lori, só que a resistência que encontrava somada a paixão que a dominava, minava suas forças e acabava vendo-se sucumbir e vergar-se diante dela! Os papeis de Dominador e Dominada se invertiam! E esse era o maior pânico que Nic sentia...pensar que alguém, algum dia poderia fazê-la dobrar-se diante de um sentimento, de uma vontade!
Passados alguns dias mais, acordou com o pensamento de que deveria sair daquela letargia! Tinha que voltar a ser a Nic de sempre e nada melhor pra isso do que exercer seu domínio e sua força sobre alguém! Ligou para Moly e combinou uma sessão. Fez o mesmo com o Gladiador, que chamava-se Will, mas que para ela continuaria a ser apenas Gladiador.
“É disso que estou precisando, de uma festinha de sadomasô com dois escravos bem bonitos pra satisfazer minhas vontades! Tenho que voltar a minha melhor forma! Principalmente saber que ainda tenho controle sobre os outros e sobre mim mesma! Preciso esquecer!”
Deixou Sean de lado. Sabia que o rapaz era do time dos Românticos e talvez não aceitasse bem a pressão dos jogos perversos de Nic. Muita gente havia tentado apenas para satisfazê-la e desistiam no primeito tapa na cara que levavam. Nic tinha um bom faro para perceber essas pessoas, a experiência fazia com que notasse em pouco tempo de conversa mais íntima se quem estava diante de si poderia ser um futuro “escravo” ou não. Portanto, descartava aqueles que não se encaixavam no perfil do que buscava.
O Gladiador foi facilmente “adestrado”, como Nic gostava de dizer. No segundo encontro entre eles três, Nic já tinha o controle absoluto do prazer de sua segunda vítima, pois a primeira já era dominada há mais de 8 meses. Ela quem determinava como e quando podiam chegar ao orgasmo, isso quando permitia que eles chegassem ao orgasmo. Usava de todos os seus “apetrechos” de tortura e dor (“clamps”, suspensão, aparelhos de choque, torturadores genitais...), para viciá-los em só conseguir o gozo através do sofrimento fisico ou moral. Vibrava cada vez que via que suas habilidades melhoravam a cada dia, aperfeiçoava o domínio fisico e psicológico sobre seus serviciados e parecia sentir-se mais forte e cheia de energia quando conseguia subjugar mais um.
E assim o tempo foi passando, com Nic procurando afogar o que sentia por Lori divertindo-se ora com Anette e Moly, ora com o Gladiador e uma delas, outras vezes apenas com uma delas. Apesar de adorar flertar com outras pessoas, não as trazia para seus divertimentos, já tinha “escravos” suficientes até que se cansasse deles, aí sim poderia começar a formar um novo time. Mas a relação sadomasoquista era baseada fundamentalmente em confiança e não poderia trazer estranhos para seus jogos até que pudesse sentir segurança por parte de seus dominados.
Numa tarde Anette chegou na casa de Nic com um telegrama nas mãos. Era do escritório de advocacia que representava ela e Lorena em assuntos diversos dos da Holding. Abriu imediatamente a carta e leu que dentro de uma semana, com dia e hora grifados em caixa alta vermelha, deveria ela e Lori comparecerem perante o Juiz Tutelar, a fim de cumprirem as entrevistas peculiares daquele tipo de tutela, pois os primeiros seis meses de convivência já haviam se passado. Nic sobressaltou-se! Não sabia o que fazer, uma vez que não tinha como contactar Lori para avisá-la daquela data. No último cartão postal que ela havia mandado, dizia que estava indo para a parte setentrional da Europa, Suécia, Finlandia, Noruega, mas Nic não tinha idéia de como encontrá-la. Anette então falou:
- No último cartão que ela mandou pra casa, disse que estava na Dinamarca e que não pretendia assistir a primeira semana de aulas na faculdade, pois estava aprendendo muito mais com essa viagem que nenhum curso poderia lhe dar.
- E você sabe quando começam as aulas?
- Justamente na semana que vem, daqui a exatos cinco dias!
Nic colocou as mãos na cabeça num gesto de impotência.
- Tinha me esquecido completamente dessa audiência a cada seis meses e nem me dei conta que o tempo passou tão depressa! Lori também se esqueceu pelo visto! Vou ter que ligar para o advogado e pedir um adiamento dessa audiência. Vou fazer isso agora!
Nic foi até o escritório de sua casa e ligou para o advogado.
- Dr. Johnson, aqui é Nicole MacGillian, acabo de receber seu telegrama. Acontece que minha tutelada está em férias pela Europa e não poderemos comparecer a audiência dos seis meses na data marcada pelo Juiz Tutelar. Gostaria de saber o que fazer.
- A Srta. não tem como contactar a Srta. Lorena para avisá-la da data?
- Infelizmente não!
Nic foi seca. O advogado então disse:
- Bem, Srta. MacGillian. Aqui no Estado da Florida as leis sobre tutela são bem rigorosas e os Juizes tutelares mais ainda. Temo que o Juiz ou o Promotor queira fazer uma série de perguntas mesmo que a Srta Lorena não esteja por aqui ainda. No entanto vou ver o que posso fazer. Vou ao Fórum pessoalmente conversar com ele e assim que tiver uma resposta ligo de volta para a Senhorita.
- Espero sua resposta o mais breve possível então. Obrigada Doutor.
No dia seguinte o telefonema do Advogado trouxe a notícia...
- Sinto muito Srta. Nicole, mas o Juiz quer vê-la assim mesmo. Tentei explicar que a Srta. Lorena estava na Europa, mas ele fez a mesma pergunta que fiz a Senhorita ontem....se não teria como entrar em contato com ela, e parece que ficou bastante aborrecido quando eu disse que não!
- Muito obrigada pela sua destreza, Doutor Johnson! Será que não poderia ter arranjado uma desculpa? Acho que a pequena fortuna que pagamos ao seu escritório mensalmente, deveria servir pra tornar seu cérebro mais ágil ! Se tem uma coisa que me irrita profundamente é incompetência!
- Mas eu tentei argum....
Nicole não esperou o advogado terminar. Bateu o telefone na cara dele extremamente irritada com a falta de “jogo de cintura” daquele homem!
Agora ia ter que enfrentar as perguntas do Juiz Tutelar e provavelmente do Promotor sobre o paradeiro de Lorena e o porquê de não conseguir falar com ela sobre a audiência.
No dia marcado para a audiência, coincidentemente outro cartão postal de Lorena chega. Dizia que ela estava deixando a Suécia, de onde seguiria para a Noruega e que sua última parada seria a Islândia, a terra do gelo. Não mencionava quando voltaria, mas Nic deduziu que ainda deveria demorar pelo menos uns 10 dias, pois ficava em média uma semana em cada lugar...deduzindo o tempo que o cartão leva pra chegar.
“É, ainda vai levar mais de uma semana pra ela estar de volta! Droga, não vou ficar pensando nisso, tenho que me preparar pra tal audiência!”
O juiz for implacável! Juntamente com o Promotor Público, sabatinou Nicole de perguntas dos mais diversos tipos, desde como era a convivência diária das duas, até chegar no fato que Nic não tinha como contactar Lori. E nesse ponto foi bastante incisivo...
- Acho impraticável que a Senhorita, como tutora legal e responsável pela menor Lorena MacGillian, não tenha meios de se comunicar com sua tutelada que se encontra do outro lado do mundo! Ouça bem, Srta. Nicole...ela não está logo ali na casa da coleguinha de colégio ou do namorado...está há milhares de quilômetros, sozinha e sem ter como ser encontrada se algo acontecer! Esses cartões que diz receber semanalmente, só deixam saber que ela está em algum lugar, em determinado País, mais nada! Isso é de uma irresponsabilidade sem fim! Como a Senhorita explica esse fato?
Nic estava pálida! O Juiz era um homem bem rigoroso e fazia as perguntas com muita contundência. Nic tentou se manter calma e no controle da situação, porém sabia que não tinha argumentos plausíveis para apagar a imagem de desleixo com sua tutelada que surgia diante do Juiz e do Promotor.
- Excelência, eu tento manter com minha tutelada uma relação de confiança e respeito. Ela manifestou o desejo de passar três meses na Europa por conta própria e sem a fiscalização permanente de ninguém. Pediu que precisava de um tempo afastada de tudo e de todos que faziam parte de sua vida, para melhor aceitar a dor da tragédia que viveu há pouco tempo. Lorena sempre foi uma menina muito ajuizada e responsável. Não vi motivos para não dar um voto de confiança a ela e fazer sua vontade.
- Os responsáveis legais por menores não podem ser complacentes o tempo todo. É exatamente aí que reside a diferença entre liberdade vigiada e falta de limites. A Senhorita como tutora legal da menor, deveria ter exigido dela que pudesse lhe dar alguma forma de contato com ela. É inadimissível para esta Côrte que uma responsável por uma tutelada menor de idade a deixe ficar três meses em algum lugar do mapa mundi, sem possibilidade de localizá-la imediatamente.
O Promotor manifestou-se pela primeira vez e de forma cortante. Nic não tinha argumentos para aquilo. Era um fato e ela começou a se sentir pressionada por aqueles dois homens que tinham o poder de tirar Lori de perto dela. Sentiu um frio por dentro ao pensar nisso e falou mais uma vez tentando demonstrar energia...
- Concordo com V.Exa., no entanto se conhecesse minha prima como eu conheço, não teria tanta convicção dessa regra que parece ser tão básica. Como disse antes, Lorena é muito responsável e tranquila, jamais deu qualquer tipo de problema, mesmo os normais de uma adolescente, para os Pais e muito menos pra mim. Se quiser comprovar o que digo, podem convocar qualquer dos empregados da casa ou suas amigas mais próximas, que dirão a mesma coisa sobre ela. Por certo que me preocupo com seu bem estar, mas convenci-me que ela era totalmente merecedora de crédito e que pode ser capaz de sair-se bem desta aventura, mais madura e responsável.
- O problema pode nem ser a própria menor, mas sim o que pode acontecer com ela! O mundo é bastante perigoso e muitas vezes cruel com moças tão jovens e desprotegidas. Foi não apenas uma temeridade, como também uma total falta de responsabilidade para com seu dever primordial que é zelar pelo bem estar de sua tutelada. Concordo com o Promotor, a Senhorita foi indulgente demais! Sua permissividade foi além da normalmente aceita para esse tipo de situação! Vou esperar que a menor retorne, em segurança, para avaliar melhor o caso! Mas aviso que não serei tolerante com novos deslizes! Sei que o desejo de seu primo foi que a Senhorita zelasse pelo bem estar da filha dele, portanto, como fiscal dessa tutela, não vou aceitar que não cumpra com suas funções de vigilância e cuidado para com ela.
Nic assentiu com a cabeça, mas o Promotor parecia ainda não estar satisfeito...
- Excelência, requeiro que a menor compareça com sua tutora nesta Côrte no dia seguinte a sua chegada, nem mais um dia de adiamento. Quero uma avaliação com a Psicóloga e uma sabatina em separado da tutora. É sabido pela sociedade local, que quando mais jovem a Srta. Nicole já meteu-se em várias situações irregulares e algumas bem suspeitas, inclusive com a morte de um jovem em uma festa na Europa por overdose. Sei que sua ficha policial é completamente limpa neste País, mas não sei até onde esses fatos do passado podem ainda ter alguma influência em sua personalidade hoje e principalmente sobre sua tutelada. Quero um acompanhamento estreito e rígido neste caso.
“Que filho de uma cadela, esse tal Promotor! Se pudesse quebraria sua cara de almofadinha agora mesmo! Mas tenho que me controlar, não posso perder essa tutela! É pelo dinheiro...só pelo dinheiro! E por Alex também!”
Nic tentava se convencer disso cada dia com mais veemência e convicção!
O Juiz se manifestou...
- Requerimento aceito. No dia em que a Srta. Lorena chegar a esta cidade quero ser imediatemente comunicado e que no dia seguinte compareçam ambas aqui para as entrevistas de praxe a avaliação psicológica. O horário direi quando souber de sua volta. Está dispensada Srta. MacGillian.
Do outro lado do mundo, Lorena nem imaginava o aperto que Nic estava passando. Assim como ela, não lembrava daquele detalhe de sua tutela e nem que tanto tempo já havia passado desde que Nic se mudara pra sua casa...sete meses! Procurava, a medida que se aproximava a data de sua volta, concentrar-se mais em fortelecer seu espírito para enfrentar o que descobrira naqueles meses de solidão...estava apaixonada por Nic, mas era apenas carnal, sex*, tesão...não podia negar isso pra si mesma...aceitava o fato de desejá-la e só! Além disso nada mais! Não se permitiria deixar abusar por ela, nem menosprezar um sentimento maior com seu desdém. Consciente da atração fisica que sentia, ficava mais fácil lidar com ela e controlá-la dentro de si.
“Mais três dias apenas e estarei frente a frente de novo com você, Nic. Só que dessa vez bem mais forte e melhor preparada pra enfrentar esse seu gênio intragável e o meu desejo por você! Saberei como dominá-lo e você não terá o poder que pensa que tem sobre mim!”
Lori olhou-se no espelho enquanto pensava. Era uma menina ainda, tinha perdido peso durante aquela viagem, e com isso parecia ainda mais frágil! Só que o olhar refletido não era de uma adolescente desprotegida...tinha a maturidade de alguém que conseguiu se fortalecer através de sua dor... a determinação de quem busca conhecer-se e encarar suas próprias emoções...e a serenidade de quem está convicta do caminho a percorrer e das dificuldades que pode encontrar!
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Nic acordou sobressaltada! Suava em bicas e o coração parecia que ia saltar-lhe pela boca! Tivera um sonho estranho...Lorena havia chegado durante a noite...entrava no seu quarto e deitava junto dela...passa então a despir-se e também a Nic logo em seguida...Nic está paralizada sem poder mover-se, como que sob o efeito de uma anestesia peridural...imóvel e sem ter como reagir ou mover um músculo sequer, assiste Lori aproximar sua boca da dela como se fosse beijá-la...mas ao invés do beijo, passa a aspirar sua alma...suga sua essência com força e energia para dentro dela, como uma vampira...e quando termina, Nic vê apenas um espectro tosco, enrugado e sem vida no lugar onde antes jazia deitada.
Acordou com um grito preso na garganta e olhando para o relógio viu que eram ainda 5 horas da manhã. Não dormiu mais! Levantou-se e decidiu assistir um filme pra ver se o sono chegava novamente...nada! Às 7:00 horas resolveu descer e tomar logo seu café da manhã no jardim da piscina. Estava agitada e de nada adiantava querer ocupar sua mente com banalidades...não conseguia se concentrar em nada. Talvez olhar os pavões, as cacatuas, a água da piscina, os jardins, lhe trouxesse mais tranquilidade.
Relaxada numa espreguiçadeira, ouviu o barulho de um carro chegando na alameda de acesso, pensou ser Anette com as compras da casa, mas a voz dos empregados numa profusão de cumprimentos alegres, fez Nic levantar-se de súbito...
“Ela voltou!!!”
Respirou profundamente várias vezes seguidas para tentar reequilibrar seu corpo e reordenar as idéias. Tinha imaginado esse dia tantas vezes e tinha confiança de que conseguiria controlar seus impulsos recém descobertos. Daquele ponto do deck da piscina não conseguia ver a entrada principal da casa...decidiu ir até Lori! A vontade de voltar a vê-la imediatamente era maior que qualquer prudência.
Lori cumprimentava os funcionários um a um com um abraço, mas quando chegou a vez de Anette apenas deu um aperto de mão! Não conseguia mais olhar pra ela do mesmo jeito...sentia uma profunda irritação por saber que ela compartilhava da intimidade de Nic, mesmo que fosse de uma maneira tão vil. Antonio prontamente retirou do carro as duas enormes mochilas que Lori trouxera e ela falou alegremente...
- Uma dessas mochilas eu comprei só pra colocar os presentes que trouxe pra vocês e pras minhas amigas...e algumas coisinhas pra mim também...claro que só trouxe objetos pequenos, pois não tinha como carregar volumes grandes...mas primeiro preciso de um banho relaxante e um bom descanso dessa viagem tão longa. Judy, prepare minha banheira com água bem quentinha por favor...vou subir logo!
Lori então vê aproximar-se pela lateral oeste da casa, Nicole! Seu coração deu um salto e suas mãos ficaram instantâneamente geladas... “Nic!!! Por que você tem que ser assim tão linda a ponto de me afetar tanto?! Eu não queria te encontrar agora tão de repente!”....mas procurou esconder as mãos atrás das pernas e esboçou um pequeno sorriso.
Nic chegou bem perto dela e estava com um semblante sério e enigmático! Lori não encontrou naquele olhar a ironia costumeira! Tinha outro sentimento por trás deles, mas não podia decifrar o que! Não sorria, apenas fixava seus olhos de aço com tanto intensidade que Lori teve que baixar sua vista para um ponto mais abaixo do rosto de Nic...sua boca! Estava crispada, como se estivesse fazendo muito esforço de estar ali. Ela parou a um metro de Lori e ficou ali estática, apenas fitando-a, sem dizer palavra alguma!
Lorena apertou fortemente os bolsos laterais de sua calça cargo... “Ela não vai dizer nada?! Não vai me cumprimentar?! Será que pretende ficar parada aí me olhando até quando?!”...ergueu novamente o rosto para olhar Nic diretamente nos olhos... “preciso passar por esta prova!”...
- Olá Nic, como vai? - Disse tentando dar o tom mais natural possível a sua voz.
Nic pareceu acordar de seu transe hipnótico e respondeu com uma voz quase inaudível...
- Que bom que voltou!
Lori encabulou! Não era a resposta que esperava ouvir...muito menos era aquele olhar tão penetrante que pensava encontrar...se Nic estava fazendo com o propósito de embaraçá-la, estava conseguindo...mas resolveu pôr em prática o que havia decidido, manter-se distante de Nic!
- Pois por mim teria ficado mais uns seis meses no mínimo. Desculpe não poder conversar agora, mas estou muito cansada. Me dê licença que vou subir. Depois nos falamos!
E dizendo assim, deu as costas e entrou em casa. Nic ficou ali, imobilizada pelas próprias emoções que mais uma vez a traíram! Quando avistou Lori abraçando os empregados e sorrindo pra eles, teve vontade de correr pra ela e pedir um abraço também. Mas conteve-se principalmente quando olhou diretamente pra ela.
“Ela está tão mais magra!!! Não deve ter se alimentado direito nesses meses!!! Parece ainda mais delicada e frágil!!! Mas não me quer por perto, pude sentir isso!!! Ela com certeza já não se interessa mais por mim, nem por curiosidade!!! Será que conheceu alguém especial pelos lugares onde passou?! Nossa, já estava tudo esquematizado na minha mente pra não me deixar abalar pela presença dela, mas quando a vi, tudo se evaporou!!! Que atração tão forte é essa que sinto por ela!!! Controle, Nic!!! É só o que precisa...controle!!!”
- Anette, quando Lorena sair do quarto, quero que me avise. Preciso conversar com ela sobre a audiência de amanhã!
E decidiu voltar para sua ala. Aquele belo dia não a atraía mais!
Por volta das 5:00 horas da tarde, Lori levanta e decide descer para dar as “lembranças” que havia trazido aos empregados e dispensá-los pelo final de semana. O dia seguinte era uma sexta-feira e queria dar folga a todos eles no sábado e no domingo. Anette, assim que a viu peguntou:
- Quer que peça a Maria para preparar algo pra comer, Senhorita?
Anette estava mais formal ainda, parecia ter notado a diferença com que foi tratada pela patroa. Mas não dava a mínima pra isso. Não gostava muito daquela menina mimada mesmo!
- Não precisa, pode deixar que eu mesma peço a ela...
Quando Lori saiu da sala, Anette ligou imediatamente pra Nic avisando. Em poucos minutos, ela estava na cozinha olhando Lori entregar os presentinhos que tinha trazido. Esperou ela acabar e receber os agradecimentos e elogios, quando então falou com voz grave:
- Preciso falar com você um minuto, pode vir até a biblioteca comigo, por favor?
Lorena acompanhou Nic até o ambiente, que teve suas portas fechadas logo que entraram. O assunto parecia ser sério! Nic começou contando tudo o que havia acontecido diante de Juiz e do Promotor e finalizou com um tom preocupado...
- Liguei para o Juiz assim que você subiu e ele marcou nossa Audiência para amanhã, às 3:00 da tarde. Não gostaria de correr o risco de perder essa tutela, Lori!
- Sim, claro! O dinheiro!
Lori falou com um amargor na voz...Nic decidiu levar adiante o jogo...
- Sim, pelo dinheiro mesmo! Nunca escondi isso de você! Mas também gostaria de cumprir a última vontade de Alex, que foi praticamente meu irmão e o único que pelo menos entendia um pouquinho que fosse esse meu jeito de ser!
Lori virou-se de costas pra que Nic não visse a emoção nos seus olhos...
- Pode deixar, Nic! Como já te disse antes, não tenho nenhum interesse em prejudicar essa tutela. Pelo contrário, também penso que se esse foi o desejo de meu Pai, ele devia ter um bom motivo pra isso e pretendo realizar sua última vontade.
- Que bom que pensa assim! E como foi a viagem?
- Longa e cansativa!
- Eu me refiro ao tempo todo que passou por lá...os lugares por onde andou...conheceu muita gente?
Lori não percebeu o tom de curiosidade indisfarçada de Nic...
- Ah, isso eu vou levar muito tempo pra contar! Mas já que temos tanto tempo pra convivermos juntas ainda, oportunidades não vão faltar. Vou contando aos poucos.
- Conseguiu encontrar o que foi buscar por lá?
- Penso que sim, mas não foi lá que encontrei e sim dentro de mim mesma...o lugar foi o menos importante...o que mais precisava era estar só...afastar-me de tudo!
- Então valeu a pena cada dia longe daqui?
- Cada segundo!
- Que bom! - O tom de Nic era completamente oposto ao que as palavras diziam, sentia-se fora de cena!
Lorena saiu da biblioteca e pegou em cima de uma cadeira sua mochila de presentes, ainda falando com Nic...
- Trouxe algo pra você também, Nic.
- Pra mim?!
- Sim, não é um presente sofisticado como os que você deve estar acostumada a receber de seus fãs, mas espero que goste!
Pegou um pacote em sua mochila e o entregou pra Nic. Antes de pegá-lo, Nic ficou longos segundos sem erguer a mão, apenas olhando pra Lori, meio embaraçada...não costumava ganhar presentes! Então pegou-o e abriu a caixa de madeira, que apesar de pequena, era bem pesada! Dentro havia um belíssimo poliedro multifacetado de cristal, que emitia raios furta-cor conforme recebia luz de fora! Era um belo cristal polido que poderia servir como um luxuoso peso pra papel ou apenas um bibelô a enfeitar-lhe as vistas. Nic olhou encantada para aquele objeto e suas cores que moviam-se de acordo com o ângulo de visão. Não se lembrava de ter ganho presente mais bonito na vida!
Depois de um bom tempo, tirou os olhos do cristal e olhou para Lori...aqueles olhos que também pareciam um cristal do fundo do mar...a boca desenhou um leve sorriso de embaraço e dela saiu uma voz fraca...
- Obrigada, Lori! É muito lindo!
Lori percebeu que Nic era sincera e que realmente havia gostado do presente. No momento em que viu aquele cristal, Lori lembrou dos olhos de Nic e quis comprá-lo pra ela...recordou que teve que usar seu cartão de crédito, pois a pedra era muito cara e ela não teria o dinheiro, a não ser que fizesse uns 20 desenhos por dia, durante um mês seguido.
- Eu o comprei na República Tcheca! São os cristais mais belos que já vi. Foi a única vez que quebrei minhas próprias regras e usei o cartão de crédito.
Lori sorria e estava feliz em ver que Nic não tirava os olhos do pequeno objeto...brincava com ele, rodando-o de um lado ao outro, de encontro a luz, pra admirar os fachos multicoloridos que produzia...parecia uma criança!
Para não se deixar envolver pela cena, Lori emendou, tentando acabar com aquele encontro logo...estava ficando muito perturbada com a presença de Nic...
- Bem, amanhã então eu a encontro aqui no living principal as 2:30 h, tá bom?! Acha que chegaremos a tempo?
Nic pareceu acordar de seu devaneio e olhou Lori, com um jeito meio perdido...
- Não! Eu quero almoçar com você! Preciso saber um pouco do que se passou com você neste tempo todo. Pelo menos o principal. Não quero ser pega de surpresa pelo Juiz ou pelo Promotor. Descerei ao meio-dia pra comermos. Assim teremos tempo pra colocarmos o assunto em dia.
Não esperou a aquiescência ou não de Lori. Pegou seu cristal e sem tirar os olhos dele, foi embora pra seu quarto.
Ao meio dia em ponto, Nic entrou na sala de jantar. Lori já estava sentada diante da mesa posta, ajeitando displicentemente o arranjo de flores à sua frente. Olharam-se e, mais uma vez, se perderam naquele intervalo entre a troca de olhares e o encantamento mútuo. Sem deixar de encará-la, Nic sentou-se de frente pra Lori, afastou o arranjo de flores que lhe cobria parte da visão do rosto dela e tocou sem querer suas mãos que seguravam o vaso de cristal. Lori afastou-as imediatamente, como que atingida por um choque...baixou o olhar para seu prato ainda vazio...Nic falou com aquele tom de voz que Lori ainda não conhecia, profundo, grave, como se fizesse um grande esforço pra esconder uma forte emoção...
- Pode começar...
Lori voltou a fitá-la com ar de interrogação...
- Começar o que? A comer?
- Não! A me contar o que fez desde que chegou a Amesterdan. Quero saber de todos os lugares onde esteve e quem encontrou por lá.
Lori riu com cara de boba...
- Acho que será meio difícil te dar um relatório completo de mais de três meses de viagem em apenas duas horas. Os lugares foram muitos e as pessoas mais ainda, nem sei por onde começar...
- Já falei...comece por Amesterdan que foi seu ponto de partida na Europa...conte-me o que fez, os lugares onde foi, as pessoas que conheceu...
Lori percebeu que Nic frisava mais a parte das “pessoas” que encontrou...parecia estar bastante curiosa se Lori havia conhecido alguém interessante durante aquele período e ela decidiu instigar aquela curiosidade de Nic...deixaria no ar a suspeita de encontros que não aconteceram...e falaria de Pietro omitindo suas suspeitas...
Iniciaram a refeição e Lori começou uma narrativa lenta como que escolhendo as palavras certas pra descrever os lugares por onde havia passado. Foram tantos países diferentes e suas cidades cheias de novas descobertas...Holanda, Bélgica, Alemanha, França, Itália, Austria, República Tcheca, Polônia, Dinamarca, Finlândia, Suécia, Noruega e por fim Islândia. Deixou para uma outra oportunidade o Mediterrâneo e a península Ibérica, bem como o Reino Unido, que já conhecia. Descrevia suas aventuras com gestos alegres e joviais. Nic a olhava embevecida pela sua narrativa. Contou alguns fatos inusitados, outros engraçados, costumes estranhos e diferentes dos seus e falou de maneira geral sobre as pessoas que conhecera, inclusive Pietro...fez questão de dizer que ele a acompanhou por outras cidades da Itália e que haviam ficado bem amigos, tendo inclusive o convidado pra vir visitá-la no final do ano.
Nic não escondeu o desagrado com a revelação de Lori... “Sabia que ela tinha topado com alguém e se interessado! Ela é linda demais pra não ser assediada e logo um garoto Italiano, não iria deixar passar!”...Nic a olhou séria e comentou:
- Então suponho que seu lugar preferido tenha sido a Itália, especialmente Florença?
Lori sorriu com uma leve malícia nos olhos, como a ter doces lembranças e respondeu:
- Não posso negar que a Itália foi um lugar ímpar, especial realmente...tanto pela beleza de sua história e de seus monumentos, bem como pela simpatia e acolhimento dos nativos...eles são adoráveis!
- Ainda mais esse tal Pietro...quantos anos disse que ele tem mesmo?! Dezenove?! Hahahhaha...outro fedelhinho pra ficar atrás de você que nem um pajém...já não chega aquele idiota do seu namorado?!
Lorena resolveu continuar com a provocação! Não esqueçamos que, apesar de muito determinada e madura para sua idade, ela é apenas uma adolescente ainda, e adora desafiar e testar os limites alheios...
- E qual o problema com eu me relacionar com meninos da minha faixa etária?! Não é o normal?! Esperava por acaso que eu me envolvesse com alguém com mais de trinta anos por exemplo?! Não acha que seria muito pior estar ás voltas com um sujeito com o dobro da minha idade?!
Nic ficou lívida! Tinha sido atingida no seu brio com uma palmatória estalando na face! Sem conseguir disfarçar sua irritação falou...
- E o que pretende fazer com esse garoto? Trazê-lo pra cá e sustentá-lo? Quem sabe você não arruma uma bolsa de estudos pra ele na sua faculdade, ou então paga do próprio bolso!!!
Lori sorriu de satisfação! Conseguia mexer com Nic!
- Ah, muito boa idéia essa sua, Nic! Não havia pensado nisso! Quem sabe?! Pietro é extremamente talentoso e domina a pintura à óleo como ninguém! Pode vir a ser um excelente orientador! Além do mais tenho dinheiro mais que suficiente para ser uma Mecena das artes!
Nic levantou-se e bateu com força as mãos sobre a mesa! O rosto não escondia sua ira, Lori estremeceu levemente...disse entredentes...
- Não enquanto eu for sua Tutora legal! Você esbanje o seu dinheiro sendo Mecenas de pintorezinhos de quinta categoria quando estiver da posse plena dos seus bens! Até lá, quem diz como deve gastá-los sou eu!
Nic estava confusa, irritada, com ciúmes e muita raiva de si mesma por não conseguir disfarçar o que sentia diante de Lori...esta, por sua vez, apesar do temor que tinha de provocar tão acintosamente aquele vulcão na sua frente, não conseguia deixar de provar um grande prazer em ver Nic descontrolar-se de ciúmes...ciúmes dela!
- Você acha que patrocinar novos talentos nas artes é esbanjar dinheiro?! Pois eu acho que bancar orgias sexuais em lugares exóticos, gastar com drogas, álcool e jogo, isso sim é jogar dinheiro no lixo! Faça com o seu dinheiro o que quiser, mas não se meta com o meu! Você já demonstrou o quanto é incompetente pra cuidar de cifrões!
Nic pegou o vaso de cristal com as flores e atirou longe quebrando-o em centenas de pedaços! Pegou Lori pelo braço e a levantou com se fosse uma criança birrenta...sob os olhares atônitos de uma Anette que chegava correndo na sala para ver o que acontecia...
- Suma daqui agora mesmo!!! Ninguém te chamou!!! Desapareça!!!
Nic esbravejou quase espumando pela boca! Anette de olhos arregalados obedeceu imediatamente e, mais rápida ainda que chegou à sala, saiu! O dedos de Nic apertavam impiedosamente a carne do braço de Lori e ela, apesar do medo que sentia por dentro, sustentava o olhar de ira de Nic e a desafiava com o seu!
- Eu ainda não acabei de comer!
- Acabou sim! Vamos para o carro imediatamente, sua pirralha mimada! Vá diante daquele Juiz e diga o que me disse agora! Ele com certeza me fará arrumar minhas trouxas e partir dessa casa hoje ainda! E isso o que quer, Lorena?! Acho que sim, pois terá toda liberdade pra trazer e bancar quem quiser nesta casa! Pode até mesmo criar seu pequeno Harém de jovens talentos Europeus, que nas horas vagas saciam a curiosidade sexual de sua Mecena!
E saiu arrastando Lori pelos espaçosos cômodos daquela casa até o jardim principal ! Ela tentava desvencilhar-se do aperto de Nic, mas só conseguia fazer com que ela fechasse mais a mão e machucasse ainda mais seu braço...com certeza ficariam marcas roxas naquela pela tão clara!
- Me solte, Nic! Você está me machucando! No fundo é isso o que quer não é? Que eu peça ao Juiz que tire o peso da minha responsabilidade de suas costas? Quer me deixar marcada para que ele veja que sofro maus tratos de você e a destitua dessa tutela!!! Você quer é encontrar uma desculpa pra se livrar de mim e voltar pras suas orgias!!! Pensa que não sei o que anda fazendo nos seus aposentos com minha Governanta?!
Nic estancou na frente do carro, com a porta do carona já aberta! Olhou pra Lori com os olhos vidrados! “Meu Deus, ela descobriu! E agora?!”
Lori notando que conseguira atingi-la, soltou-se de sua mão com um movimento brusco, aproveitando que ela afrouxara o aperto, falou exasperada...
- Acho que o Juiz e o Promotor irão adorar saber de seus gostos estranhos durante o ato sexual, principalmente dentro de minha própria casa e com uma empregada minha!
Dito isso entrou no carro e esperou que uma Nic completamente atordoada, tomasse seu lugar ao volante e começasse o caminho em direção ao Fórum. O silêncio era absoluto e o que vinha à mente de Nic era que ela teria que voltar pra sua casa naquele mesmo dia.
“Como ela conseguiu descobrir isso?! Será que Anette havia deixado escapar algo?! Não, ela não era tão burra assim! Lori deve ter visto ou ouvido alguma coisa e guardou pra si! Ela vai contar pra eles, com certeza! Está com raiva de mim, deve ter nojo até!”
Quando Nic parou o carro em frente ao imponente prédio da Côrte Estadual, olhou pra Lori por intermináveis segundos...esta manteve o rosto olhando pra frente, para o nada, e foi a primeira a abrir a porta e sair do carro, dando as costas para Nic.
Chegaram na sala de Audiências e logo entrou o Promotor público, a psicóloca e finalmente o Juiz anunciado pelo Meirinho. Doutor Jonhson acompanhava suas clientes. O Juiz começou sua esplanação criticando mais uma vez a anuência de Nic para com a viagem longa e sem possibilidade de comunicação de Lori. O Promotor voltou a pedir uma avaliação em particular da menor com a psicóloga e Nic foi obrigada a retirar-se do recinto.
Ficou do lado de fora, sabendo que seu destino já havia sido sacramentado por aquela discussão imbecil com Lori.
“Tinha que ter controlado mais o meu gênio! De que adiantou todo aquele descontrole se agora ela estará à vontade pra fazer o que quiser com quem bem entender?! Eu sou uma estúpida mesmo! Não queria ir embora! Não posso querer controlá-la, ela não vai deixar! Eu quero sumir daqui! Acho que já vou...”
Mal acabou de concluir seu pensamento, quando o oficial de justiça a chama para a sala novamente. Mais de meia hora já havia se passado.
Quando entrou, olhou imediatamente pra Lori e esta não virou-se pra ela, continuou olhando para o Juiz à sua frente, sem demonstrar nenhuma emoção...este começou a dizer:
- Apesar das irregularidades encontradas nesta tutela, tais como: a falta de energia e pulso firme que observei entre a responsável legal e a menor aqui presentes, bem como a irresponsabilidade em não cumprir a regra do relatório dos 6 meses dentro do prazo; mantenho, por orientação da Psicóloga e do Promotor deste caso, a tutela nos moldes em que se encontra. Parece ser da vontade da menor que a tutela continue nos exatos termos em que foi determinada pelo Testamento de seu falecido Pai, e como seu bem estar é o objetivo principal deste Juízo, acolho a manifestação de sua vontade e defiro o prosseguimento desta tutela na forma em que está.
E virando-se para Nic completou:
- Quanto a Senhorita, espero que daqui em diante seja menos condescendente com sua tutelada e tenha mais firmeza. Ela é ainda menor de idade e precisa que alguém a oriente para o mundo e não de uma “colega” permissiva. Tome ciência de suas responsabilidades legais e saiba que este Juízo não irá tolerar mais atrasos nos prazos determinados. Estão todos dispensados.
E bateu seu martelo, retirando-se da sala e deixando pra trás uma Nic aturdida e feliz! Estava com os nervos em frangalhos e ouvir aquela decisão a livrou de um enorme peso da tensão que pressionava suas costas e nuca! Olhou para Lori e esta continuava fitando algum ponto imaginário na sua frente, sem voltar-se para Nic, apesar de sentir o peso do seu olhar sobre si. Ouviram a voz do advogado dizendo que as avisaria da próxima audiência dali a 6 meses com pelo menos duas semanas de antecedência, para evitarem problemas futuros...a voz estava tão longe...quem ligava pra ele?!
Lori levantou-se e se encaminhou para a saída do Fórum. Andava uns dez passos na frente de Nic. Não queria falar com ela. Estava ainda magoada em saber que ela não ligava a mínima em perder aquela tutela! Disse isso com todas as palavras!
Nic por sua vez não tirava os olhos da silhueta delgada, que caminhava a passos firmes e de cabeça ereta à sua frente. Os cabelos avermelhados refletiam os últimos raios daquela tarde de sol e Nic sentiu uma dor física em não poder alcançá-la e afundar seu rosto naquela cascata de perfume e pecado. Mil pensamentos desconexos invadiam sua mente… “Por que ela ainda quer continuar convivendo comigo mesmo depois de tudo que sabe sobre mim? Mesmo depois de todas as grosserias que fiz? Por que, Lori? Eu vou acabar te machucando de alguma maneira! E pior que agora eu sei que cada ferida que provocar em você, terei outra aberta e dolorida em meu próprio corpo!”
Entraram no carro, o advogado se despediu das duas que nem notaram a presença do tal homem. Nic dirigiu por algumas milhas em silêncio até que não se controlando mais, perguntou com voz baixa e tensa...
- Por que não disse a verdade e me entregou pra eles?
Lori não respondeu e nem mesmo virou o rosto da direção da janela. Nic se via diante de uma situação a qual não estava acostumada. Não sabia lidar com sentimentos tão confusos e tão inconvenientemente fortes. Queria poder dizer pra ela que estava feliz pelo fato de continuar na casa, ao lado dela, apesar de saber o quão arriscado era pras duas aquela proximidade...mas não sabia como expôr o que sentia, tinha medo de parecer piegas, ridícula, sentimentalóide...ainda por cima tinha que tentar manter-se distante, era isso que tinha prometido a si mesma, pelo bem de Lori.
- Obrigada por não ter dito nada! Eu não deveria, mas confesso que estou feliz em ter podido ficar! Quero ter outra chance de levar adiante esse legado!
Lori continuava em silêncio... “Claro! Pelo dinheiro!”...pensava com melancolia.
Nic queria ouvir a voz dela, saber o que ela estava pensando...
- Não vai mais falar comigo?
Nada! Nic então olhou para o braço de Lori e viu as marcas de suas digitais que tinha feito há poucas horas atrás...já estavam roxas! Sentiu remorso...
- Desculpe pela minha truculência na hora do almoço, eu não queria machucá-la...estava irritada com o que me disse e com o fato de ter convidado um estranho pra vir pra cá...
Silêncio. O carro foi estacionado na garagem da casa e Nic desligou o motor e ficou parada, esperando que ela dissesse algo. Lori lentamente virou o rosto pra frente, ficou algum tempo olhando pelo vidro dianteiro do carro e depois olhou pra Nic! Os seus olhos estavam foscos, tristes e ela parecia profundamente abatida...começou a falar e mostrar com suas palavras e tom de voz o quanto estava magoada com Nic...
- Em nenhum momento passou pela minha cabeça dizer alguma coisa que prejudicasse essa tutela. E sabe porque, Nic?! Porque eu devo ser uma burra, uma idiota! Você diz com todas as letras que só se interessa pelo dinheiro que ganha e que ganhará com essa responsabilidade…depois demonstra que não está nem aí se vai continuar ou não…e eu me preocupando em esconder essas marcas e fazer aquelas três pessoas que estavam me entrevistando se convencerem que eu estou feliz com você como minha tutora! Eu sou uma imbecil mesmo! Deveria ter aproveitado a oportunidade e me livrado de você de uma vez por todas! Mas o pior é que eu não quero! Não quero me livrar de você! Não quero que se vá! Idiota…idiota...idiota!
Lori falava com dor na voz e deu vários socos no painel do carro à sua frente. Nic se desconcentrou do seu propósito de se manter longe do corpo dela...perdeu totalmente o senso e segurou os braços de Lori para fazê-la parar com aqueles socos...Lori então passou a socar a própria Nic, esmurrava seus braços, ombros, pernas...queria descarregar nela sua frustração por se sentir rejeitada, por não ser capaz de entendê-la, de compreender seus próprios sentimentos, de não ter controle sobre o que Nic a fazia sentir...medo, raiva, ciúmes, paixão...até que abaixou a cabeça e começou a chorar baixinho, entregando-se sem forças...estava triste, sensível, a única coisa que queria era que Nic quisesse ficar por vontade própria e não por obrigação ou pelo dinheiro!
Nic nunca antes havia se sensibilizado pelo choro de alguém...nunca havia sentido aquela dor apertar-lhe a garganta por ver que era a causa daquelas lágrimas...nunca havia sentido tanta vontade de abraçar e beijar profundamente alguém....fazer secar aquele pranto...não deixá-la ir nunca mais do seu abraço! Sem raciocinar direito, puxou Lori e a trouxe pra junto de si! Deslizou uma das mãos pelas costas dela e a outra subiu pela nuca e apertou os cabelos espessos. Aproximou seu corpo e avançando os obstáculos do interior do carro que as separavam, colou seu corpo ao de Lori até sentir seu choro como se fosse o dela própria...as lágrimas de Lori molhavam seu pescoço e desciam para o colo, provocando um arrepio de prazer naquele banho de pranto incontido.
Lori apertou-se a Nic com todas as forças que ainda possuia...era tudo o que queria naquele momento, estar nos braços de Nic...aninhar-se neles como se fossem o lugar mais aconchegante e gostoso de se estar no mundo! Nic nunca a havia abraçado! Não daquele jeito...protetora, acolhedora, cheia de cuidado e carinho! Era aquele abraço que sempre desejara, que tantas vezes chegou a pensar em dar a Nic, o melhor abraço que podia querer e sonhar! Deixou o pranto rolar livre e expurgar tudo o que machucava sua alma! Precisava livrar-se daquela dor de ter que reprimir sempre seu desejo! E o abraço de Nic era seu melhor conforto, mas também sua maior tentação!
Nic está de olhos cerrados, apenas deixando-se levar por aquela turbulência que a fazia querer incorporar-se dentro de Lori...era o cheiro dela invadindo suas entranhas...aquela pela macia que parecia uma pétala de flor sob suas mãos...as lágrimas que lhe molhavam e a fazia querer banhar-se toda naquele choro...os dedos dela que apertavam suas espáduas como se nunca mais fossem deixá-la se afastar...então Lori começa a dar beijos leves pelos ombros, omoplata, base do pescoço e sobe numa trilha até colar seus lábios no ouvido de Nic...sussurra cheia de paixão...
- Não quero que se vá! Fica comigo pra sempre, Nic!
Nic sente o arrepio na alma! Sua razão diz pra livar-se daquele abraço, mas seu corpo não obedece! Está fraca, totalmente dominada pelo seu desejo! Junta-se ainda mais a ela como se isso ainda fosse fisicamente possível...e era! Lori avança sobre o espaço que separa os dois acentos do carro e vem para o colo de Nic...os beijos de Lori então começam a se multiplicar pelos cabelos, pescoço, ouvido...Nic mantém os olhos fechados, sabe que se olhar pra ela naquele instante não terá mais como resistir. Lorena está sentada sobre seu corpo totalmente encaixada num abraço de pura sensualidade...os braços se apertam com tanta força que os músculos estão retesados...Nic fala com a voz carregada de emoção represada...
- Eu vou ficar! Até quando você quiser, eu vou ficar! Senti tanto a sua falta!
Com o rosto enterrado nos cabelos de Nic, Lori diz num suspiro...
- Eu também! Quantas vezes eu quis ligar só pra ouvir sua voz! Mas tinha que ser forte!
Ao ouvir isso, Nic caiu em si e percebeu a gravidade da situação em que se encontravam. Se alguém as visse daquele jeito, com certeza não entenderia e teria uma imagem distorcida da verdade...mas qual era a verdade?! Veriam o que realmente a cena mostrava....duas mulheres apaixonadas se entregando a um abraço quente e interminável! “Ser forte!”...pensou! Mas não queria deixá-la ir...sem afrouxar o abraço disse...
- É isso! Temos que ser fortes e você sabe disso! Não podemos deixar acontecer nada que nos traga amargura depois!
- Eu sei! Mas me deixe ficar aqui mais um pouco!
Lori falava num fio de voz e sua boca continuava beijar o rosto e o pescoço de Nic...esta por sua vez desceu as mãos pelo corpo de Lori, sentindo toda sua textura, até chegar nas pernas longas e firmes...deslizou as mãos por baixo do vestido e sentiu as coxas nuas e rijas arrepiar-se ao seu toque...segurou firme suas ancas e foi percorrendo aquele caminho sinuoso que era o corpo de Lori...tateou cada linha, a curva dos quadris, a cintura afilada, o desenho das costelas, a lateral dos seios fartos! Não resitiu! Tocou-os com toda devoção que jamais havia tido em toda sua vida com um corpo antes...passou os polegares pelos mamilos duros e ouviu um suspiro de tesão sair da boca de Lori junto ao seu ouvido...era o sibilar de uma fêmea no auge de sua “brama”...seu sex* doía e não conseguia mais conter seu desejo...abocanhou um dos mamilos por sobre a tecido fino do vestido e o sugou faminta...aqueles seios que tantas vezes povoou seus devaneios, dormindo ou acordada, provocando sua libido, atentando contra sua já tão escassa paz!
Lorena gemia sobre o corpo de Nic meneando os quadris num cavalgar lento e cadenciado...o sex* pulsava completamente encharcado, embriagado pelo toque de Nic em seu corpo, pela boca que não tocava sua pele, mas que arrebatava seu seio e o louvava à categoria de relíquia. Queria sentir Nic toda pra si, tomando seu corpo da maneira que ela quisesse, que abusasse dela, que a fizesse submeter-se às suas loucuras, mas que não a deixasse ir...murmurou com a voz embargada pelo desejo mais intenso que já sentira até então...
- Me toma Nic!!! Faça de mim o que quiser!!! Eu quero você pra mim!!!
De repente Nic sentiu uma dor lancinante no peito! Não podia fazer aquilo! Segurou o rosto de Lori com as duas mãos e falou num tom de dor...
- Não posso! Você bem sabe que não podemos nos permitir essa loucura! Não era isso que Alex esperava de mim, de nós!
Lori segura as mãos de Nic que tocam seu rosto e com as lágrimas insistindo em voltar suplica...
- Não faça assim! Não seja cruel com nós duas!
- É exatamente isso, Lori! Eu sou cruel, é o meu instinto básico e vou acabar arruinando sua vida como faço com a de todos que se aproximam demais de mim! E eu não posso fazer isso com você!
- E se eu quiser que faça?!
- Eu não vou deixar! Você é uma menina ainda! Pela primeira vez na minha vida tenho que agir como uma adulta que sou! Não vou permitir que se entregue a essa loucura!
Lori não conseguiu mais segurar o pranto que rolava novamente pelo belo rosto, molhando as mãos de Nic e as dela! Nic tinha o rosto crispado pela dor que sentia e os olhos pela primeira vez na vida imploravam por algo...pra que Lori desistisse dela!
- Saia de cima de mim!
- Não!
Lori falou com firmeza e soltando as mãos de Nic, segurou-a pelos ombros a prendendo contra o encosto do banco! Nic ficou estática, admirando o quanto ela era linda naquela pose de superioridade! Parecia uma mulher segura de si, ciente do que quer, determinada em conseguir! Teve completa noção do que ela iria fazer em seguida e reunindo seus últimos resquícios de razão, desviou o rosto pra o lado, erguendo-o o quanto pôde, para arredar-se do beijo de Lori. Ela acertou o queixo de Nic com sua boca sedenta e ali fez o que teria feito com aquela boca que tanto ansiava...sugou o queixo de Nic, lambeu seu contorno de linhas firmes, mordiscou o leve feixe que o dividia, fez com que sua língua delineasse todo o contorno daquele ponto tão próximo de seu objeto de desejo e fixou-se em saboreá-lo como a melhor das iguarias.
Nic sentia o corpo todo tremer com o vibração que aquele toque lhe proporcionava! Nunca havia sentido tanto prazer com um simples beijo no queixo! Mas a verdade era que aquilo não era apenas um beijo...era um arrebatamento, um êxtase completo, um assalto ao seu corpo! Lorena devorava aquele pedaço de seu rosto com uma volúpia que arrancava calafrios até de seus pêlos!
Nic num sobressalto, empurra Lori para o lado e consegue abrir a porta do carro, saltando dele como se estivesse pegando fogo! E realmente estava! Um fogo interno que a fez apertar seu sex* com raiva e olhar pra Lorena como se ela fosse uma criatura do inferno! Bradou sua ira...
- O que pretende, hein Lorena? Me seduzir, saciar sua curiosidade às minhas custas, se divertir e depois me entregar ao Juiz tutelar? Quer que eu vá presa, é isso?!
Lori saltou do carro pelo mesmo lado que Nic e tentando aproximar-se dela falou com o desejo ainda estampado na voz...
- Nada disso, Nic! Eu quero apenas você! Deixe eu me entregar toda pra você! Seja minha também! Páre de lutar contra isso!
Nic a olhava com um misto de raiva e medo! Não acreditava no que estava acontecendo!
- Sua louca! O que está dizendo?!
- É verdade, Nic! Eu a quero e sei que me quer também! Podemos até tentar fugir, mas essa verdade vai nos acompanhar sempre!
Nic colocou as mãos em volta das orelhas e bradou...
- Cale essa boca! Não quero mais ouvir você me dizer essas coisas! Sua bruxa maldita! Você quer é me arruinar antes que eu faça isso com você, não é?!
- Claro que não! Eu já falei...eu só quero você pra mim!
Disse isso num tom de voz tão doce e suave que parecia um canto...pegou as mãos de Nic e as tirou dos ouvidos...disse mais uma vez...
- Eu quero você inteira pra mim! Ouviu bem?! Só isso! Quero você in-tei-ra! Toda só pra mim!
Nic viu naqueles olhos o quanto ela sabia o que estava dizendo...tinha consciência do seu poder sobre ela...sabia o que queria e estava disposta a tomar pra si, com ou sem a ajuda da própria Nic!
Nic puxou suas mãos das de Lori e saiu apressada, quase correndo, para a sua ala! Tinha que sumir dali, daquele olhar, daquele toque, daquele feitiço! Lembrou do seu sonho e de como Lori sugava a sua alma! Viu-se do mesmo jeito, decrépita, encolhida, sem vida, como um fruto seco!
“Ela também é uma vampira, assim como eu! Só que dissimula em forma de ternura o sentimento de posse do que quer arrematar pra si! Ela me quer e vai usar de todas as suas armas pra me subjugar, me fazer capitular e perecer diante de sua vontade! Eu vou lutar, Lori! Porque nós somos iguais! Queremos tomar, dominar, possuir a alma! E eu não vou te dar a minha, a menos que tenha a sua!”
Lori olhava Nic sumindo através dos jardins já cobertos pela luz da noite. Passara três meses inteiros tentando fortalecer-se pra conseguir resistir a seus impulsos diante de Nic, e o que acontece?! Na primeira oportunidade, entrega-se daquele jeito tão sem reservas, tão vulnerável, tão louco! Havia confessado sua paixão por Nic, com todas as letras! E mais uma vez havia sido rejeitada! Mas, sabia que Nic também a desejava e não do mesmo jeito que queria a seus “escravos”! Por isso fugia, por isso tinha medo!
“Eu vou tomá-la pra mim, Nic! Eu não posso mais fugir disso que sinto! Eu sei que você é perigosa e pode arruinar minha vida, como disse! Mas estou disposta a arriscar! Eu tenho tempo, posso esperar! Mesmo que pra isso, tenha que descer ao inferno pra te alcançar!”
Fim do capítulo
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