LUZ por Marcya Peres
Capítulo 21
E A LUTA CONTINUA....
A sala de Audiências estava bastante gelada, parecia refletir o interior de Ana. Amparada por Márcia, que estava atuando como sua advogada, ela sentou-se e ficou esperando o início da leitura do processo. Sabia que Lívia não poderia entrar para assistir, pois processos de Vara de Família correm em segredo de Justiça e apenas as partes, advogados, o Juiz, Secretário e Promotor podem estar presentes, fora as testemunhas que por ventura existam. Até achou melhor que assim fosse, porque sabia que Lívia poderia ficar aborrecida com certos detalhes que seriam expostos.
Márcia falava baixo em seu ouvido a disposição em que cada um se encontrava no ambiente, para que Ana pudesse voltar-se para a direção correta de onde estavam, quando fosse preciso falar.
O Juiz começou a ler e fazer um resumo do conteúdo do processo, deu algumas instruções ao seu Secretário e começou com as perguntas de praxe. O advogado de Alberto era o Dr. Luiz Carlos, o mesmo que Ana havia enfrentado numa ação em Campos do Jordão a qual ganhara. Lembrou-se que aquele advogado havia dado em cima de Lívia, o que provocara muito ciúme em Ana na ocasião. Agora ele sabia porque ela não dera “bola” pra ele.
O Juiz era um Homem de meia idade, em torno dos 55 anos. Ana ouvira dizer que ele costumava ser bem justo nas suas decisões, mas rigoroso com o seu próprio conceito do que considerava justo. Tinha posições firmes e equilibradas, mas Ana não tinha conhecimento sobre uma situação como a sua ter sido julgada antes por aquele tribunal, pelo menos não tão explícita. Era muito difícil fazer uma previsão do que aconteceria ali naquela sala, pois não havia precedentes para comparar. Portanto, dependeria muito mais da discricionariedade do Magistrado, daquilo que ele entenderia como adequado, dos seus valores pessoais, que das provas ou depoimentos que fossem recolhidos no processo.
O advogado de Alberto começou a fazer a explanação dos motivos do seu cliente para ter ajuizado aquela ação:
- Excelência, o fato é que meu cliente está muito preocupado com o tipo de criação que seu filho pode ter com duas mulheres vivendo juntas como um casal. O Senhor há de convir que não é algo natural nem agradável que uma criança veja sua Mãe aos beijos e em demonstrações afetivas com outra mulher dentro de casa. Meu cliente diz que seu filho já começou a sofrer com as brincadeiras de mau gosto dos coleguinhas na escola. São piadinhas sobre ele ter duas mães, que ele é filho de sapatão e outras coisas do gênero. O menino já começa a dar sinais de estar abalado e seu rendimento no colégio caiu sensivelmente por conta dessa situação. Tudo está devidamente documentado nos autos.
Nós gostaríamos de arrolar testemunhas que irão corroborar o que meu cliente alega. E requeremos a V.Exa. uma liminar para que a guarda do menino seja dada imediatamente ao Pai, a fim de poupá-lo de maiores sofrimentos até a decisão final.
Ana percebeu que o Advogado era bom e não economizaria em palavras duras ou ironias preconceituosas para conseguir a vitória do seu cliente. Conversou meio minuto ao ouvido de Márcia, antes que ela começasse com suas alegações:
- Excelência, meu colega começa suas alegações com inverdades sobre o que se passa na casa de Ana Mendes. Antes de tudo, é bom que se saiba que minha cliente jamais trocou beijos com a Srta. Lívia em público, fosse em casa na frente do filho ou da empregada ou em qualquer outro lugar. Não que ache o beijo homossexual um crime ou uma agressão, mas porque sabe que por não ser algo convencional, ainda incomoda bastante muitas pessoas. Por esta razão e por uma questão de respeito a si e as pessoas que convivem com ela, decidiu que isso não acontecerá. Na minha petição que está acostada aos autos, eu trago provas que minha cliente tem condições financeiras tão boas quanto o Sr. Alberto de proporcionar uma vida excelente para seu filho, além de ter mais tempo pra se dedicar ao filho que o Pai aqui presente, pois trabalha bem próximo a sua casa e procura estar sempre presente nas refeições com o filho e nas atividades da escola. Também possuímos um rol de testemunhas que irão provar que a mãe tem toda a condição moral e social de criar seu filho adequadamente, independente da sua opção sexual. Pedimos que o menino continue na guarda da mãe até que a decisão final seja tomada por este tribunal, pois não há razão plausível, além de puro preconceito, para que isto ocorra.
Foi então ouvido o Promotor de Justiça, atuando como Curador de menores, sobre a guarda da criança:
- Lendo atentamente os autos, pude constatar que o Pai se preocupa com possíveis danos psicológicos que seu filho possa vir a sofrer, por estar sendo exposto a esta situação atípica em sua própria residência. Diz que a criança vem sofrendo com chacotas no colégio e que presencia gestos de afeto entre sua mãe e a companheira dela. No entanto, esta curadoria não vê motivos fortes o suficientes para que o pedido de liminar seja atendido e o menor fique na guarda do Pai até o término deste litígio, pois se há algum mal provocado pela relação homossexual de sua mãe, este já foi feito e ele provavelmente não deixará de sofrer com o preconceito de seus colegas de classe, caso fique na guarda paterna. Por este motivo, pede a Promotoria, que seja negada a liminar.
Ana ouviu aquela explanação com imensa alegria e alívio, mas ainda tinha a decisão do Juiz:
- Este Tribunal acata a promoção do Curador de Menores e rejeita a Liminar. O menor continua na guarda da mãe até que este processo tenha sua decisão final. Designo Audiência para o dia 20 de setembro, às 14:00 horas, daqui a exato um mês e que as testemunhas de ambas as partes sejam arroladas em cinco dias para as devidas intimações. Dou por encerrada esta sessão.
E todos levantaram, porém não com o mesmo humor. Ana estava muito feliz em manter o filho na sua guarda e não conseguia nem pensar na terrível possibilidade de perdê-la. Alberto demonstrou toda a sua fúria ao aproximar-se de Ana e comentar baixo:
- Você pode até ter ganhado esta pequena batalha, Ana, mas não vencerá a Guerra. Eu vou ter meu filho de volta e já tenho várias testemunhas que irão mostrar ao Juiz e a esse Promotor de merd* que você é uma irresponsável que colocou aquela lésbica vadia pra morar na nossa casa e expõe o nosso filho à sua safadeza diária com ela. Eu vou acabar com você!
Ana nada disse, pegou no braço de Márcia e ambas saíram para o corredor. Lívia estava do lado de fora esperando ansiosamente pelo resultado.
- E aí? O que foi decidido?
Márcia falou primeiro:
- Por enquanto, só foi decidido o pedido de liminar. O Flavinho continua com vocês!!!
- Que notícia maravilhosa!!! Mas eu pensei que ele fosse dar logo o veredicto!
- Não, Lívia, ele terá que ouvir as testemunhas para formar sua convicção. A Audiência definitiva está marcada pra daqui a um mês. Até lá, teremos que ter muito cuidado com Alberto. Ele está possesso com o resultado de hoje e não poupará esforços para nos prejudicar.
- Entendo, meu Amor! Vamos ter cuidado sim...agora vamos para casa relaxar um pouco e curtir nosso Lindão! Estou doida pra contar logo a novidade pra ele.
- Mas não vamos criar muita expectativa nele, tá?! Ainda tenho muito medo do que pode acontecer daqui a um mês. Vamos ser cautelosas, por favor!
E todos foram embora.
Nas semanas que se seguiram Ana e Lívia tentaram passar tranqüilidade para Flavinho.
Sabiam que o Juiz poderia voltar atrás e conceder a guarda ao Pai e isso seria um golpe muito duro para todos. O menino gostava do Pai e estava até se dando melhor com ele, agora que estava separado de Ana, que antes; mas gostava mesmo era de viver com a Mãe. Era nela que encontrava segurança, carinho, verdade!
Ana arrolou algumas testemunhas, como Cininha, a Professora de Flavinho e sua própria irmã, Alice. Lívia pediu ao Pai, Dr. Olavo, que testemunhasse em favor de Ana no tribunal para dizer ao Juiz que ela tinha plena capacidade de cuidar do filho, pois era independente e muito bem adaptada ao ambiente e às suas dificuldades. Num primeiro momento, Dr. Olavo não achou que deveria, não aprovava 100% o relacionamento de Ana com Lívia, no entanto, não podia ser injusto e deixar de dizer a verdade em favor de sua cliente mais especial. Alberto também tinha seus trunfos e Ana sabia que a luta não seria fácil.
Chegado o dia da Audiência definitiva, onde seria decidido o destino do pequeno Flávio e de seus Pais. Ana saberia, enfim, o que haveria de vencer...o Amor ou o Preconceito!
Primeiro foram ouvidas as testemunhas do lado do Pai. Alberto havia arrolado a Inspetora do colégio do filho, bem como seus Pais, a mãe de uma coleguinha de escola do menino e Caio, que se dispôs a contar ao Juiz tudo o que sua mente despeitada conjeturava sobre Ana e Lívia.
Não vamos aqui nos ater aos detalhes de todos os depoimentos, que levaram por volta de duas horas, mas é importante que se ressalte que é muito bom ver o bom senso prevalecer em detrimento de conceitos arcaicos e fósseis.
Cininha relatou ao Juiz o que de fato acontecia naquela casa no dia a dia. Ana e Lívia não se beijavam em público ou em casa na frente de outras pessoas, no máximo um olhar apaixonado que não se pode esconder e a felicidade que pairava no ambiente. Tratavam o menino com imenso amor a carinho e dedicavam a ele a atenção necessária que uma criança requer nessa fase da vida.
A Professora de Flávio contou ao Juiz que de fato o menino havia sofrido algumas chacotas de colegas de classe, no entanto teria se saído muito bem ao não dar incentivo para que as troças continuassem e os “amiguinhos” inconvenientes simplesmente haviam desistido de espezinhá-lo, cansaram de não ter repiques e fizeram como toda criança normal costuma fazer, esqueceram e voltaram às brincadeiras comuns com o menino. Que Flavinho estava completamente socializado na classe e nada havia que atrapalhasse seu desempenho escolar. Que realmente havia tido notas inferiores nos últimos meses, mas que isso se devia provavelmente à separação dos Pais e às novas mudanças em sua vida, coisa que é comum acontecer entre crianças de Pais separados heterossexuais também.
Alice deu seu apoio público à escolha que a irmã fizera, era o suporte de alguém da família que poderia ajudar na formação da opinião do Juiz.
Dr. Olavo foi crucial quando, com suas observações de especialista, fez o Juízo entender que alguém com a deficiência de Ana poderia ter uma vida plena e normal, sendo completamente capaz de cuidar e criar uma criança.
As testemunhas de Alberto fizeram aquilo que se esperava de cidadãos médios comuns: A Inspetora do colégio em que Flavinho estudava salientou o quanto o menino foi debochado por alguns colegas de escola, e das vezes em que ele brigou com outras crianças por conta de sua mãe namorar outra mulher. Que apesar das chacotas terem cessado, ela conhecia bem as crianças e sabia que quando o menino discutisse com algum colega, certamente as piadinhas e ofensas viriam à tona novamente; bastaria um deslize para jogarem na cara dele que sua mãe era uma lésbica.
Os Pais de Alberto deram seus respectivos depoimentos bem parecidos, demonstrando toda a indignação que sentiam ao saber que a ex-nora havia deixado seu filho por outra mulher.
A mãe de uma amiguinha de escola de Flávio disse que a filha chegou em casa numa tarde perguntando se era normal uma mulher namorar outra, se ela podia fazer aquilo com uma colega de classe. Ela acrescentou o quanto achava aquela situação um mau exemplo para as crianças e adolescentes e que esse tipo de anormalidade não deveria ser considerado algo comum; se existe, deveria ficar com cada um e não ser exposto a todos.
Caio foi ainda mais contundente em sua opinião sobre a relação de Ana e Lívia. Disse ao Juiz o quanto Lívia era amorosa e boa namorada até ir trabalhar com Ana Mendes e que, provavelmente pela sua pouca idade, havia sido seduzida pela advogada. Que achava que Ana traía deliberadamente o marido há muito tempo assim como era traído por Lívia. Que as duas não tinham como criar uma criança juntas, pois seria uma imoralidade e uma coisa fora da natureza.
Por fim, o Juiz e o Promotor quiseram ouvir a opinião da Assistente social que por três vezes havia ido à casa de Ana e ao colégio para conversar com Flavinho.
Ouvidas as testemunhas, os advogados apresentaram suas alegações finais oralmente e uma repetição condensada de tudo que havia sido dito pelas testemunhas foi exposta, com cada um dando ênfase aos pontos que julgavam mais importantes para o êxito de seus clientes.
Alberto parecia bastante satisfeito com seu Causídico e Ana estava muito nervosa com o que seria decidido ali naquela tarde. Confiava em Márcia, sabia que ela tinha dado o melhor de si para aquela causa e em defesa da amiga Ana, talvez ela mesma não tivesse feito melhor. Porém receava que o julgamento pessoal daqueles dois homens à sua frente pendesse para o lado do tradicionalismo e da intolerância; e não apenas o modo como levaria sua vida dali em diante estava em jogo, com também de seu pequeno filho.
O Promotor começou sua explanação resumindo os pontos cruciais que ambos os advogados destacaram, salientando as coisas positivas e negativas que aquele relacionamento trazia para o cotidiano dos envolvidos. Após uma longa pausa, fez sua promoção final:
- Esta Promotoria tem como função precípua a proteção aos direitos do menor aqui envolvido. Sabemos que uma separação traz dores e sofrimento, ainda quando necessária ao bem estar das partes. Quando se tem filhos dessa relação, todo o sofrimento fica ainda maior e mais cuidados devemos ter para que esses filhos sejam protegidos e não sirvam de joguete aos interesses dos Pais. Temos aqui em questão, um casal que já não vivia uma vida plenamente harmoniosa, senão provavelmente outra pessoa não teria o espaço suficiente para interpor-se entre eles, fosse homem ou mulher. Temos também uma criança de apenas 7 anos que sofre com esta separação como tantas outras em nossa sociedade. A mãe refez sua vida amorosa rapidamente com outra mulher e o Pai aparentemente encontra-se só. A questão é saber se o fato da mãe ter um relacionamento amoroso com outra mulher e não um homem, traz mais sofrimento ainda para esta criança. Na opinião desta Promotoria, o sofrimento maior para esta criança é a intolerância que presencia contra sua mãe...é o fato de perceber, apesar da pouca idade, o quanto cruel podem ser as pessoas com aqueles que julgam diferentes de si ou fora do padrão normalmente aceito pela sociedade. O sofrimento com a separação dos Pais é natural e superável, como acontece todos os dias no mundo todo. Mas o sofrimento com a intolerância será permanente se as posturas não forem modificadas aos poucos e nas pequenas decisões. Não creio que privá-lo do convívio com a mãe irá tornar essa criança mais feliz. A própria assistente social pôde constatar em suas conversas com o menor o quanto feliz ele se sentia por viver com a mãe e sua companheira e que seu maior incômodo era justamente não compreender porque as pessoas se incomodavam tanto com o fato de sua mãe ter uma namorada e não um namorado. Esta Promotoria não acha que colaborando para fomentar esse sentimento de segregação com o que é diferente irá colaborar com o bem estar do menor em questão. Não importa qual é a opinião pessoal deste Curador em relação à homossexualidade ou se é viável que um casal homossexual crie uma criança. Devemos saber quando quebrar os tabus que a comunidade nos impõe e nos despojar de opiniões pré-concebidas sobre o que é normal ou não. Os “pré-conceitos” apenas sombreiam os nossos olhos e nos impedem de enxergar algo muito mais simples e que realmente importa na vida de um ser humano: que é a capacidade de se criar uma pessoa com dignidade e Amor, independente de pra que lado pende a sua sexualidade. E neste ponto, a mãe aqui presente, mostrou-se sempre uma pessoa idônea e respeitável, sendo reconhecida como uma mulher de caráter e fibra e admirada por seus pares e pela comunidade que bem a conhece. Por esta razão, esta Promotoria opina pelo indeferimento do pedido do Autor e que a guarda do menor Flávio Mendes Figueira, continue com sua mãe Ana Mendes, ficando o Pai autorizado a visitação conforme decisão já anteriormente tomada.
O coração de Ana pulava de alegria! “A primeira etapa havia sido transposta, agora é com o Juiz!”
Quando o Magistrado finalmente falou, causou grande surpresa para alguns e alívio para outros:
- Após ouvidas atentamente cada uma das testemunhas, os advogados aqui presentes, a opinião tão bem lançada da Douta Promotoria e analisar cada peça do processo, este Juízo decide para que o menor continue na guarda de sua mãe, Ana Mendes, acatando a promoção do Ministério Público, como Curador dos interesses do menor em tela, com seus fundamentos tão bem expostos e que em muito ajudou a esclarecer as dúvidas que por ventura tenham acometido este Magistrado. Intimem-se as partes em Audiência. Transitada em julgado. Arquive-se.
E assim foi! Rápido e sucinto como ninguém imaginava que fosse ser! O Juiz decidiu sem rodeios e deu a Ana a maior felicidade de sua vida: poder viver em paz com a pessoa que escolhera para dividir a vida e seu querido filho, eram as duas pessoas que mais amava e que completavam sua existência. Enfim, a luta entre a intolerância e o respeito à dignidade humana havia tido um final e, felizmente, um final bastante esperado por tantos que sofrem discriminação como elas. Pelo menos, naquele pequeno caso, naquela pequena cidade, no interior do mundo, alguém havia reconhecido que o Amor e o caráter deveriam prevalecer ao “Apartheid” das minorias.
E a cidade inteira falou sobre o assunto. O tema foi até mesmo objeto de várias crônicas e resenhas no principal jornal da cidade, tendo direito até mesmo a um editorial na edição de Domingo. Outros periódicos também publicaram reportagens sobre o assunto, não apenas na cidade como também fora dela e em algumas grandes capitais.
As opiniões se dividiam, mas uma coisa era comum...era uma decisão ímpar e não havia precedentes, até então, em nenhuma outra cidadezinha dos arredores. O Promotor e o Juiz ganharam instantânea notoriedade e passaram a ser ainda mais respeitados por terem gerado uma jurisprudência num caso atípico. Podiam concordar com eles ou não, mas o importante era que tiveram coragem de quebrar uma barreira invisível que impedia o exercício completo dos direitos de todos, sem distinção de opção sexual. Virou até objeto de monografia de colação de grau e Ana e Lívia viraram quase celebridades na pequena cidade.
Claro que tudo que é exposto, acaba gerando controvérsias...algumas pessoas demonstravam apreço e admiração pela coragem de ambas, mas outras as olhavam com reprovação, como se fosse impuras.
Elas não se importavam com essa parte da população. A felicidade por estarem juntas e terem Flavinho compensava qualquer olhar “torto” que pudessem receber vez ou outra.
Alberto ficou bastante chateado com a decisão do Juiz, mas depois de algum tempo, decidiu não interferir na vida pessoal da ex-mulher, em consideração aos anos de boa convivência que tiveram e principalmente ao filho que estava muito feliz por viver com a mãe. Decidiu respeitar a vontade dele, pois também o amava e sabia que brigar com Ana só traria mais sofrimento para ele. Ser preterido é muito ruim e o despeito é o sentimento mais comum nesses casos, mas passa...especialmente quando nosso Amor próprio é forte e nos move pra frente e assim foi com Alberto.
Meses depois já desfilava pela cidade na companhia de belas mulheres e um dia, provavelmente encontraria novamente alguém com quem dividir a vida.
Ana cumpriu o prometido a Lívia e logo que a situação se normalizou e o assédio a elas passou, compraram uma nova casa, no mesmo estilo da anterior, decoraram juntas e foram morar. O sonho das duas estava realizado!
Uma manhã de Domingo, os Pais de Lívia foram almoçar na casa delas e Dr. Olavo começou a conversa com um certo tato:
- Ana, estou há bastante tempo pra ter essa conversa com você, mas você sempre se esquiva ou não me deixa completar o que quero te dizer...
- Já sei sobre o que vai falar, Dr. Olavo, mas é que eu não estou interessada...
Ana estava um pouco incomodada com o rumo daquela conversa e sabia exatamente aonde aquilo acabaria.
- Ana, me deixe terminar, por favor! – Dr. Olavo falava firme.
- Deixe Papai falar, Ana. Talvez depois você pense diferente. - Lívia ponderou.
Ana deu um suspiro longo e aquiesceu com a cabeça. Dr. Olavo continuou:
- Ana, como já te disse antes, a medicina teve enormes avanços na área oftalmológica desde a sua última operação. Sei das vezes em que você ficou cheia de esperanças de voltar a enxergar e nada aconteceu! Entendo que a decepção te abateu muito e tirou suas esperanças de uma pequena melhora que fosse. Só que agora, as chances são bem maiores. Não há promessas fúteis e acho que uma pequena recuperação, que seja, na sua visão, já trará excelentes benefícios para sua qualidade de vida e das pessoas que a cercam. Pense nisso e deixe sua intransigência de lado um pouco. Faça por você essa tentativa, mas também faça por Lívia e pelo seu filho! Imagine o quão felizes eles ficarão se você voltar a enxergar mesmo que pouco! E se por acaso não der certo outra vez, eles estarão do seu lado para confortá-la e tudo continuará igual. As chances de você voltar e ver são grandes, mas a qualidade de sua visão é que pode ficar abaixo de suas expectativas, portanto, quero que você tenha plena consciência que poderá ver sim, mas não perfeitamente. Na minha opinião pessoal, como amigo, acho que pra você só haverá lucro. Mesmo que a visão venha fraca, é melhor que a escuridão total. Pense nisso, Ana. Na pior das hipóteses você continuará como está, pior não tem como ficar.
Ana estava confusa, não sabia se valia à pena arriscar, mas como Dr. Olavo mesmo dissera, o que tinha a perder se não enxergava nada? Seu maior sonho era poder ver o rosto do filho e de Lívia e seria muito bom se isso pudesse acontecer, mesmo que com uma visão fraca.
Lívia segurou sua mão de um lado e Flavinho de outro e ambos disseram quase que simultaneamente:
- Tente!
Fim do capítulo
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