LUZ por Marcya Peres
Capítulo 5
VIDAS PARALELAS...
- Flavio, querido! Saia da piscina, você vai ficar resfriado assim! Já está na hora de almoçarmos, venha tomar banho!
- Ah, mãe! Deixa mais um pouquinho, vai! Já tô sabendo nadar que nem um peixe, olha só! Sem bóia, Mãe!
- Eu não tô vendo, mas pelo barulho, tá parecendo um Golfinho! Venha logo, porque sem comida o Golfinho afunda!
- Saia já dessa piscina, Flávio! Obedeça sua Mãe! Ela já sabe que você já está nadando sem bóia. Agora venha comer!
Alberto era sempre mais rígido com Flávio. Ana preferia conversar, mimar o filho, já que ficava pouco com ele. Era nos finais de semana que mais curtia seu lindo menino, que estava para completar 6 anos no mês próximo. Alberto tinha um ar um tanto altivo demais com o filho, gostava de mostrar sua autoridade de Pai, que Ana achava desnecessária. Claro que ele amava o filho, mas não o acarinhava, nem fazia dengos como Ana adorava fazer. Talvez fosse ciúme por ter que disputar a atenção da mulher com o filho. Desde o seu nascimento, sentia que Ana não era mais sua apenas e isso o irritava. Essa competição por atenção com o próprio filho era muito desgastante e injusta afinal. Era muito auto centrado e gostava de atenção exclusiva. Fora criado assim pela Mãe e achava injusto que seu filho o tivesse roubado a mulher.
“O fato é que depois de tantos anos juntos, o casamento perde mesmo o seu encanto” – pensava Alberto – “Ainda amo minha mulher, a acho linda, gostosa, mas o tesão se perdeu com o tempo. Que uma boa novidade seria uma tentação, isso seria! Adoraria ter uma pequena aventura, sem compromissos, com alguma Ninfetinha desavisada. Acho até que isso traria um incremento ao meu casamento. Uma apimentada na relação!” – Alberto continuou com suas conjecturas meio cafajestes, mas que pareciam muito naturais para um homem àquela altura de sua vida. Chega uma fase em que esse tipo de questionamento vem para alguns, outros preferem pensar a dois e não a três.
Ana também achava que o casamento passava por um momento delicado. “Talvez fosse a tão falada crise dos 10 anos que já se aproximava” – Pensava. Mas ela imaginava uma solução diferente: “Uma segunda Lua-de-mel, poderia ser uma boa solução. Não viajamos juntos somente nós dois há muito tempo. E quem sabe, alguns dias sem nossos problemas, trabalho, sem a rotina fatídica, sem criança por perto, poderia renovar nossa relação. Trazer mais tesão mesmo pro casamento, tá tudo tão morno e sem graça. Mas ainda amo meu marido e quero muito salvar nossa vida de casal.”
- Beto, porque não tiramos umas férias e fazemos uma viagem pra um lugar bem especial, só nós dois? Acho que umas duas semanas ou três seria perfeito! Eu posso deixar o escritório com os outros sócios, tenho mais 3 afinal e tenho certeza que alguns dias não iriam afetar nossas causas. Ainda mais agora, que tenho uma Assistente que mostra muito interesse em aprender. Tenho certeza que ela deixaria tudo organizado com muito jeito. Vamos?
- Tá louca, Ana! Logo agora que meu chefe vai tirar férias depois de uns 10 anos! Vou substituí-lo e não posso me ausentar de jeito nenhum. Além do mais, fui promovido a Diretor Jurídico da Empresa e não posso nem pensar em tirar férias pelos próximos 12 meses. Me dê um tempo, tá! Já chega o estresse que vivo no trabalho, não me cobre coisas que não posso fazer agora!
Ana nada disse. Sentiu-se muito triste pelo fato de não ter sido bem compreendida. Queria mostrar ao marido o quanto estava empenhada em tirar o casamento da rotina, em tentar fazer renascer a vontade que tinham em estar juntos, em fazer Amor...mas ele não captou nada e ainda ficou irritado com a proposta. Desistiu desanimada. Não via perspectiva em melhorar a situação por ora. Então que assim ficasse, já estavam acomodados mesmo!
Voltou sua atenção ao filho querido, ele sim lhe dava prazer com sua risadinha infantil, sempre alegre e carinhoso. Sabia que a Mãe adorava ser tocada por ele, com suas mãozinhas pequenas e delicadas e também adorava ser acarinhado por ela. Aprendera que a melhor forma de demonstrar seu afeto era através do toque e muitas vezes fechava os olhos para sentir como era o mundo em que sua Mãe vivia. Nessas horas, tocava seu rosto para senti-lo da maneira que ela o sentia e saber como ela o enxergava. Gostava muito de se transportar para o universo escuro e saber como sua mãezinha andava pela casa sem esbarrar nos móveis, como arrumava seu prato de comida, como ajeitava as coisas em casa sem poder vê-las. Era pequeno, mas compreendia perfeitamente bem as dificuldades e os obstáculos diários que sua Mãe tinha que transpor para levar uma vida normal. Muitas vezes até esquecia que ela não podia ver, e mostrava a ela os desenhos que gostava de fazer, os deveres de casa e as fotos que o Pai tirava dele e da família. Era engraçado como ela sempre sorria e pegava nos papéis como se pudesse realmente enxergá-los. Aprendeu na escola fazer desenhos com texturas, para que sua Mãe realmente pudesse vê-los. Fazia o mar com ondas em relevo de cola e areia de verdade colada ao papel. Casinhas com palitinhos de sorvete e bandeirinhas de verdade. Tudo para que a Mãe pudesse “ver” aquilo que ele fazia pra ela com tanto gosto. E ela retribuía com gestos de Amor e palavras de incentivo. “Pena que Papai não seja como ela! Anda sempre brabo e irritado comigo ou com alguma coisa. Não ligo, ele é bobo e chato! Mas gosto dele mesmo assim.” – Pensava o pequeno.
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Lívia gostava de passar os finais de semana curtindo suas coisas em seu pequeno mundinho chamado Quarto! Claro que adorava também aproveitar o dia ao ar livre ou sair à noite pra papear com os amigos, namorar, dançar. Mas aquele pequeno canto de sua casa, continha tudo que era importante pra ela em sua nova fase: o computador, os livros, os papeis de estudo, suas anotações e principalmente, seus pensamentos. Andava muito introspectiva mesmo, apesar de ser extrovertida e nem um pouco tímida, estava vivendo um período de muito silêncio e auto-análise. O pior de tudo é que quanto mais pensava, menos respostas lógicas encontrava para os sentimentos que vinham aflorando ultimamente. Admirava Dra. Ana, seu jeito em lidar com suas dificuldades, com o trabalho, com os clientes, os sócios, os empregados, o modo como a tratava sempre com cortesia e educação; seus olhos como brilhavam quando contava alguma gracinha que o filho tinha dito. Era uma mulher fantástica e despertava em Lívia sentimentos que ela desconhecia até então.
Nunca havia admirado ninguém assim, amava seus Pais, adorava a irmã, teve vários professores, namorados, mas ninguém nunca despertara em Lívia tamanho interesse e admiração quanto Ana. O pior era a confusão de sentimentos, não apenas admiração, mas algo mais forte que a fazia ter vontade de ficar com Ana além do normal. Queria estar perto dela nas horas vagas, nos momentos de lazer, nos finais de semana. Era o primeiro final de semana depois de ter começado no novo Estágio e percebia que o que mais desejava era que chegasse logo a 2ª feira para voltar ao Escritório. Antes, seu dia preferido era a 6ª feira, pois sabia que poderia sair, aproveitar a noite à vontade, farrear bastante, e teria o sábado e domingo para fazer nada e tudo ao mesmo tempo. Agora, este final de semana parecia tão sem graça.
Caio logo chegaria para que pudessem almoçar e passar juntos o resto do dia. Gostava dele, o sex* era bom e achava até que era esse detalhe que os mantinha juntos ainda. Nunca havia amado nenhum namorado, pelo menos não como se lê nos livros e na poesia. O que a ligava a eles era puramente a parte física, enquanto a vida sexual fosse boa e quente, ela os aturava, quando começava a esfriar, pronto! Já perdia o interesse e passava a buscar novos amores. Era frívola, sim! Mas não julgava ser culpada disso. Eram assim que as coisas se apresentavam a ela, que tudo se passava em sua mente e em seu coração. Não ficaria com ninguém por compaixão. Acabou o tesão, acabou a relação, sem conversa fiada ou “mas” e “porquês”. Não tinha paciência para sentimentalismos tolos e não iria fingir para agradar a ninguém. Achava por demais piegas esses sofrimentos e dores que as pessoas diziam sentir por Amor. O Amor deveria ser simples assim: sentiu, viveu, acabou, morreu, tchau! Sem devaneios desnecessários que tornavam as coisas tão risíveis!
E por falar em risível, havia coisa mais ridícula que esse seu encantamento pela Dra. Cega? Uma mulher que só possuía de diferente, uma cegueira que a tornava mais obstinada para sobreviver num mundo competitivo e predador como o nosso. Era isso! Admirava apenas sua perseverança em ultrapassar os obstáculos que se apresentavam em sua vida. Só isso! Sim, também a achava bonita, mas nada excepcional! “Aposto que alguns meses de convivência e toda essa admiração cai por terra! Daqui a pouco já vou estar achando ela uma chata de galochas, a beleza não verei mais, por se tornar comum pra mim, e vou acostumar com seu jeito. Com o tempo, tudo perde o seu encanto! É só deixar que ele passe e afastar os pensamentos incômodos quando eles chegarem. Não vou permitir que meu final de semana fique comprometido pensando no trabalho e na Dra. Ana Mendes. Que se dane tudo e vamos à diversão!!!”
Saiu e foi encontrar Caio para curtirem juntos aquele sábado de sol e muito calor.
No domingo Lívia acordou cedo e foi correr na trilha do Rio, como adorava fazer. No mesmo momento, Ana corria em sua esteira em casa. Gostavam da mesma atividade física, mas era tão diversa a forma como a praticavam. Lívia podia sentir o ar fresco da manhã, ouvir o Rio correr um pouco menos que ela, sentir o cheiro verde da mata ao redor e, vez por outra, parar no meio do caminho pra admirar algum pássaro mais exótico ou uma cotia correr entre os arbustos. Já Ana, em sua esteira, ouvia música e usava sua imaginação para trazer pra si todo o mundo que Lívia tinha e muitas vezes não se apercebia. As lembranças que Ana tinha de como era a natureza, a cor do céu num dia úmido e quente como aquele, os pássaros multicoloridos, as orquídeas grudadas nas árvores em sua forma e beleza ímpares. Sim, trazia tudo para sua mente e as transformavam em imagens ao longo do caminho que imaginava percorrer em sua esteira.
Eram vidas paralelas, cada qual com suas emoções próprias e modos únicos de ver e sentir. Ambas passavam por mudanças, nos sentimentos que até então eram bem conhecidos e definidos em cada uma. Mas que de alguma forma se convergiam mais adiante, por um capricho do destino ou brincadeira de Deus com seus pequenos Títeres de carne.
Fim do capítulo
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Lea
Em: 26/05/2022
Então o marido "perfeito" traí a esposa,tem ciúmes do próprio filho,acha que a mulher é um troféu para exibir, não se importa em mudar a rotina do casamento deles;com certeza ele acha que a Ana jamais se separara dele,afinal eles tem 10 anos de casados,um filho,tem uma vida financeira boa. Nem um vestígio,até então,sem contar com essa "esfriada" entre eles,de uma suposta separação.
Lívia está começando a se negar,até pq sempre admirou a Ana,os sentimentos confusos ainda vão persegui-la por algum tempo até que ela se depare com o tão falado sentimento chamado AMOR.
Obs: já estou começando a fantasiar as duas correndo juntas,pela trilha que a Lívia faz sua corridas! Hahaha
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