Capítulo 27: Celebrar a vida é somar amigos, experiências e conquistas, dando-lhe sempre algum significado especial em sua vida!"
Capítulo 27
Ficamos mais trinta minutos juntas, depois voltei para a mansão. No táxi, resolvi consultar meu celular. Havia duas chamadas de Márcia. Meu Deus! Tinha até me esquecido dela. Apertei a tecla retorno de chamada e esperei.
- Val? - ouvi sua voz. - E aí, tudo bem?
- Tudo, Má. Tudo ótimo! - não consegui esconder minha felicidade.
- Que bom. Pelo jeito conseguiu falar com Marina... - ela não conseguiu esconder sua tristeza.
"Não só falei como fiz amor com ela!" - quis gritar, mas me calei. Melhor seria Márcia não saber.
- Tem algum compromisso esta noite? - perguntei-lhe.
- Bem, - sua voz soou um pouco mais divertida. - Achei que seria convidada para jantar na mansão esta noite. Seu pai ainda não chegou?
- Sim, chegou. E sim, para o jantar. - o correto era levar Márcia comigo. Afinal, para papai, nós estávamos namorando. Mas já podia imaginar como seria, mais uma vez, encontrar Marina estando "de mentirinha" ao lado de Márcia. - Má?!
- Diz, Val.
- Não precisa me buscar porque já estou na mansão, ok?
- Ok, linda. Nove horas, tá bom? - ela me perguntou.
- Está ótimo. - respondi enquanto pagava o taxista. - Estarei te esperando.
- Então, beijo!
- Outro, Má.
Desligamos. Saltei do carro, respirei fundo e entrei.
Passei a hora seguinte abraçando, beijando e querendo saber dos últimos dias de papai. Agora eu era a "grudenta" e papai estava adorando.
- Vá se arrumar, garota. - ele ralhou enquanto se ajeitava melhor na poltrona e ajeitava uns documentos por cima da maciça mesa de carvalho, no escritório. - Teremos convidadas especiais para o jantar.
- Teremos? - perguntei fazendo-me de desentendida.
- Sim. Marina Cintra! - ele me olhou. - Aquela minha amiga consultora de arte... - fiz um gesto com a cabeça. - E ela vira com uma amiga.
- Está certo, todo-poderoso! - mandei-lhe um beijo voador. - Estarei pronta às nove em ponto. - pisquei e saí.
Teria sido tão mais fácil se aquela nossa intimidade de pai e filha sempre tivesse existido. Não sei dizer quem era mais culpado naquela omissão de carinho, cuidado, afeto. Mas agora já não dava mais tempo de tentar encontrá-lo. Precisávamos viver com intensidade os últimos acontecimentos e isso seria toda lembrança boa que eu teria de papai.
Com lágrimas nos olhos, subi os degraus de dois em dois, entrei em meu quarto, tomei um banho rápido e me troquei. O relógio marcava 20h45 quando desci.
Guto, no seu habitual traje esporte chique, estava lindo.
- Oi, maninho. - cumprimentei-o com um beijo estalado e um abraço cheio de saudades. - Tudo bem?
- Tudo, Val! - ele retribuiu o beijo.
- E Suzana? Não vai buscá-la? - aceitei o drinque que ele me oferecia.
- Hoje não. Passaremos o dia de amanhã juntos... - ele respondeu, sentando-se à minha frente. - Papai ainda não desceu?
Senti que Guto parecia ainda mais preocupado com papai, mais apreensivo. Tomei um gole do drinque e o encarei, meneando a cabeça.
- Papai não passou nada bem esta semana! Passamos duas noites no hospital...
- E por que não ligou, Guto? Eu teria ido a Brasília...
Guto me olhou. Seus olhos estavam úmidos.
- Não sei se serei forte quando a hora chegar, Val! - ele desabafou bastante emocionado.
Pela primeira vez na vida, senti que poderia ajudar alguém. E Deus me permitiu que esse alguém fosse uma das pessoas que mais admiro e amo neste mundo: meu querido irmão Augusto.
Levantei-me e sentei a seu lado. Segurei suas mãos, elas estavam geladas.
- Vamos ter que ser fortes, meu irmão. Por ele! - disse-lhe fazendo um afago em seu braço. - Mas quero te pedir uma coisa: apesar de ter sido, sempre, tão relapsa com relação a papai, deixe-me ajudar agora. Preciso muito fazer algo por ele, por favor.
Guto me olhou, limpou com as costas das mãos as lágrimas que não conseguiu conter e, dando um sorrisinho triste, disse:
- Você está tão diferente, Valentina. Está mais madura! Perdeu aquele ar superior e parece mais humilde! - me estudou um pouco, para depois continuar. - Deixou de ser esnobe.
Dei um tapa em seu ombro e resolvi brincar com aquilo, embora soubesse exatamente ao que ele se referia.
- Então é isso que você pensa de sua irmã, rapaz?
Guto, mais relaxado, tentou se esquivar do tapa.
- É, o que o amor não faz, não é mesmo?
Haroldo entrou, neste momento, anunciando que as convidadas começavam a chegar.
Gelei. Seria Marina?
De repente me dei conta de que Guto deveria saber o que estava acontecendo comigo. Pelo menos ele.
- Guto, eu...
Mas fui interrompida com a entrada de Márcia que, naquela noite, parecia ainda mais linda!
- Meu Deus! Que visão do pecado! - Guto exclamou, deixou o copo sobre a mesa de centro e se levantou para recebê-la. - Boa-noite, linda morena!
Márcia chegou perto e eles se abraçaram.
- Boa-noite, doutor Augusto Terceiro!
Se eu disser que não fiquei embasbacada com a beleza estonteante de Márcia, seria digna de perder a carteirinha da irmandade. Porém, algo dentro de mim pareceu estar diferente naquele momento. Profunda e irremediavelmente DIFERENTE!
Levantei-me também e fui beijada e abraçada por aquela deusa em forma de mulher.
- Boa-noite, Má. - respondi retribuindo seu beijo. Seu perfume era o mesmo que mexia com os meus sentidos.
- Boa-noite, Valentina. - Márcia deu uma piscada. - Está ainda mais linda esta noite...
Olhei fundo naqueles olhos. Márcia não fingia me namorar... Ela me namorava mesmo!
- E aí, doutora Márcia, - Guto voltou trazendo um drinque para ela. - Me conta as novidades. O que anda acontecendo nos tribunais e fóruns desta cidade?
Márcia, aceitando o drinque e agradecendo, sentou-se ao meu lado. E esses foram os piores minutos daquela noite. Marina não chegava... papai não descia...
- Com licença, - levantei-me. Eles me olharam. - Vou ver por que o todo-poderoso está atrasado.
Eles concordaram com um gesto de cabeça e voltaram a falar sobre o assunto que discutiam. Subi lentamente as escadas e, quando bati na porta de papai, ele abriu instantaneamente.
- Olá, filha, já estava descendo...
Sorri, aliviada. Papai estava tão lindo e elegante, parecia mentira que estava "condenado à morte".
Ele me deu o braço e descemos lentamente as escadas.
Haroldo estava na porta e, no instante que chegamos ao final das escadas, Marina apareceu em nossa frente. Linda... Maravilhosa... Deslumbrante!
Meu coração deu um salto no peito e ameaçou parar, para depois voltar a bater feito uma bateria de escola de samba.
- Marina Cintra, minha amiga! Seja bem-vinda a esta casa! - papai soltou-se de mim para recebê-la calorosamente. - Então, esta é a linda jovem que tenho a honra de receber em minha casa está noite!
Louise se adiantou e, estendendo a mão direita, disse em seu forte sotaque britânico:
- Louise Algarve. É um prazer conhecê-lo, senhor Norberto!
Meu pai, pegando a mão estendida da menina, puxou-a para um abraço.
- O prazer é todo meu, minha querida!
- Boa-noite, Valentina.
A voz de Louise me tirou do transe "Marina".
- Ah... oh... Boa-noite, Louise! - respondi completamente abobada. - Boa-noite, Marina.
Marina, sorrindo, aproximou-se de mim e, beijando-me a face, sussurrou em meu ouvido:
- Você é a visão do pecado, minha princesa Valentina.
Lógico que tremi toda e senti uma parte específica de meu corpo latejar e... Umedecer!
Seguimos para a sala de estar, onde Márcia e Guto, sentados lado a lado, ainda conversavam animadamente.
Quando entramos, Guto levantou-se e veio em nossa direção.
- Boa-noite, Marina! Seja bem-vinda a esta casa! - beijou-lhe as faces e, então, olhou para Louise. - Meu Deus! Fadas ainda existem?
As faces de Louise coraram instantaneamente. Ela baixou o olhar encabulada.
- Claro que existem, meu amigo. - Marina respondeu divertida. - Louise é uma delas!
- Então o nome da fada é Louise? Lindo nome! Linda fada! - Guto aproximou-se, tomou sua mão, beijou-a galanteador e terminou seu cumprimento. - Seu súdito, Augusto. - e fez uma reverência.
Márcia, sem qualquer cerimônia, postou-se ao meu lado e, com simpatia e elegância, cumprimentou Marina e Louise. Marina, também com elegância e simpatia, devolveu o cumprimento com sinceridade no olhar.
Caminhamos todos para o centro da grande sala e, enquanto sentávamos, papai educadamente se dirigiu a Márcia.
- Você está muito bonita esta noite, filha!
- Obrigada, senhor Norberto. O senhor também está muito elegante. - Márcia parecia estar bastante relaxada na presença de papai naquela noite. O que era bastante estranho...
- Por favor, Márcia - papai a chamou. - Você poderia me acompanhar até o escritório?
Márcia balançou sutilmente a cabeça e, pedindo licença, acompanhou papai, que lhe ofereceu o braço. Meu olhar curioso seguiu os dois. O que papai poderia querer com Márcia?
- Essa mulher mexe muito com você, não é Valentina?
A voz de Marina era tão baixa que, nem Guto nem Louise, que estavam entretidos num papo divertido, escutaram.
- Mexia! - respondi com toda sinceridade e sentimento do momento.
Os olhos de Marina pareciam querer penetrar meus pensamentos e descobrir se o que eu dizia era verdade mesmo.
- Pode acreditar em mim, amor. - sussurrei baixinho sem desviar o olhar.
- E então, Marina... - Guto nos interrompeu - Muito trabalho em Londres?
- Mais ou menos, meu amigo... - Marina respondeu com a calma que lhe é peculiar. - Na verdade, consegui remanejar minha agenda e, assim, consegui um tempo para visitar seu pai.
Uma sombra triste turvou um pouco o olhar de Guto.
- Valentina contou-me sobre a doença de Norberto, Guto... - ela falou. - Sinto muito!
Guto apenas meneou a cabeça e me olhou. Não havia repreensão em seu olhar, apenas uma tristeza enorme.
- Será que não existe algum tratamento alternativo para esse tipo de tumor? - Marina quis saber.
- Não! - Guto parecia cansado. - Já tentamos tudo. Já visitamos milhões de lugares e os melhores especialistas... E nada! Infelizmente, não existe nada mais para ser feito.
Marina levantou-se do meu lado e foi para o lado de Guto. Segurou sua mão e disse:
- Para Deus, Guto, nada é impossível. Devemos acreditar em sua bondade e misericórdia.
Não imaginava que Marina tivesse alguma religião e fosse tão fervorosa. Nunca conversamos a esse respeito... Aliás, nunca conversamos muito a respeito de outras coisas que não fosse... sex*! Marina era tão adulta e tão resolvida que, naquele momento, tive a sensação de ser como Louise em sua vida. Ou seja, uma adolescente! Será que era assim que ela me via?
Perdida nesses pensamentos, nem notei papai e Márcia voltando do escritório e Guto e Marina disfarçando a conversa que estavam tendo.
- Meus amores... - papai começou enquanto Márcia sentava ao meu lado. - Quero que saibam que estou muito feliz esta noite! - ele tomou uma taça de champanhe que Haroldo trazia e me entregou. Depois, gentilmente, serviu todos que estavam na sala. - Por isso, proponho que brindemos à vida, à amizade, ao amor e à felicidade! - papai era todo sorriso.
Uma vontade louca de chorar me invadiu a alma, mas acompanhando o gesto de todos, engoli o choro e ergui minha taça para brindarmos... ao que restava da vida de papai!
Fim do capítulo
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