O celular de Júlia vibrou em cima da mesa da cozinha, seu coração acelerou ao ver a foto de Alex piscando repetidamente na tela. Pensou em como sentira falta daquela sensação. Ouvir a voz de Alex lhe trazia lembranças das tardes no parque, onde tudo era realmente mais complicado, mas o fantasma do abandono ainda não existia entre elas. Elas eram apenas duas garotas vivendo um intenso amor proibido.

- Oii, como está o seu pai? – Júlia atendeu no segundo toque.

- Ele está bem, foi só um susto. Natasha está tentando convencê-lo a passar uns dias com a gente em São Paulo para ficarmos de olho nele.

- Que ótimo – Júlia respirou aliviada. Gostava muito de Eduardo, e sabia da importância dele na vida das meninas.

- E como estão as coisas por ai? Paçoca e Shoyu estão se comportando?

- Como dois vira-latas, e estão destruindo meu apartamento. Escuta, Alex – Júlia tomou coragem para dizer as palavras que estavam presas em sua garganta desde que a veterinária saíra de São Paulo. – Agora que o Eduardo está bem nós precisamos conversar. Tenho que te contar uma coisa importante.

- Eu já sei o que vai dizer. 

- Sabe?

- Sim, e está tudo bem.

- Está? – Júlia perguntou com um misto de insegurança e surpresa.

- Sim, eu sempre quis estar perto de você e te apoiar em seus sonhos. E agora eu tenho a chance de poder fazer isso. Eu te amo e não vou mais te perder. Principalmente por alguma bobeira como onze mil quilômetros entre a gente. Jogar no Eczacıbaşı é o seu sonho e eu vou estar aqui torcendo e esperando você voltar.

- Ai Alex, você não faz ideia do quanto estou aliviada em ouvir isso. Eu queria te contar há um tempo, mas não sabia se era a coisa certa. Ainda não tinha certeza de como as coisas aconteceriam entre nós.

- Tudo bem, Juh. Eu entendo que tudo o que estamos vivendo é muito novo, mas as coisas ficarão mais fáceis quando nos reconectarmos. Ainda somos as mesmas pessoas e o nosso amor não mudou.

 - Eu estava com medo de como você reagiria.

Alex lembrou-se de algumas horas atrás quando por pouco não surtara. Deu um sorriso leve e intimamente agradeceu por ter sido levada pelo bom senso de Natasha.

- Juntas nós vamos fazer dar certo. Quando você precisa ir?

- A apresentação oficial é no final do mês.

- Uau, isso significa que não teremos muito tempo. Assim que as coisas se acalmarem aqui eu volto para São Paulo, pego umas folgas na clínica e vamos aproveitar todos os dias juntas, o que acha?

- Eu acho ótimo e realmente adoraria isso – Júlia disse com cuidado. - Mas o patrocinador do time quer que eu esteja presente em um evento antes da apresentação. É uma festa muito popular por lá.

- Ok, e quando é esse evento? – Alex perguntou fechando os olhos para manter sua calma.

 - Semana que vem – Júlia disse de uma vez.

- Semana que vem? – Alex deu um pulo e quase deixou o celular cair no chão, sentia toda a calmaria indo embora. – Júlia, isso é muito cedo.

- Eu sei, eu sei. Estou tentando achar alguma coisa no meu contrato que não me obrigue a ir a este evento.

Alex respirou fundo. Aquele era o momento em que precisava provar para Júlia que estava falando a verdade. Nada iria separá-las outra vez.

- Não precisa fazer isso. Esse evento pode ser uma oportunidade grande, é melhor você não a perder.

- Alex...

- Júlia, é o seu sonho. Quero que você o viva intensamente, sem perder nenhum detalhe, ok? Faça isso, você merece. Daremos um jeito.

- Eu te amo – Júlia disse com a voz embargada.

- Meu pai terá alta em 48 horas e eu volto para casa. Vamos fazer nossos últimos dias valerem pelos próximos meses.

- Gostei dessa ideia – Júlia respondeu com um sorriso. – Estarei te esperando.

- Conversamos depois, deixei a Natasha sozinha com meu pai, preciso ver o que eles estão aprontando.

- Tudo bem, eu te ligo mais tarde.

Alex entrou no quarto do pai e encontrou Natasha dormindo na cadeira de acompanhante ao lado da cama.

- Pai, o horário da visita está acabando, eu perguntei para o Gustavo se nós poderíamos ficar mais um pouco, mas a equipe de enfermagem não autorizou. Vamos para casa e voltamos amanhã? Você acha que vai ficar bem?

- Tudo bem, filha. Eu estou ótimo. Você ainda tem a chave de casa?

- Tenho – Alex exibiu o chaveiro cheio de penduricalhos que carregava na mochila e com carinho alisou uma das chaves. – Ainda me lembro de quando abria aquela porta com cuidado para você não me ouvir chegando e me dar uma bronca por passar a noite fora. Parece que foi ontem.

- Você teria levado mais broncas se sua irmã não tivesse te acobertado tanto. Eu tenho certeza que ela me enganou fingindo ser você diversas vezes.

- Eu posso te garantir que fiz o mesmo por ela. Era muito fácil te enganar, pai.

- Eu fui um péssimo pai de adolescentes – Eduardo levou as mãos ao rosto fingindo estar desolado.

- Nam, nós que fomos péssimas filhas adolescentes, você foi ótimo. Não sei o que teríamos feito sem você.

- Como foi a conversa com a Júlia?

- Foi boa, eu acho – Alex repassou mentalmente o que conversara com Júlia e concluiu que apesar de tudo as coisas estavam bem.

- Isso é ótimo, meu bem. E por que essa cara triste?

- Ah, eu pensei que teríamos mais tempo antes dela ir embora, mas o patrocinador do time quer que ela esteja presente em uma festa. Isso vai diminuir nosso tempo juntas.

- Quem vai dar uma festa? – Natasha espreguiçou-se e entrou na conversa.

- Um dos patrocinadores do Eczacıbaşı, e a Júlia precisa ir para Turquia na semana que vem.

- Semana que vem? – Natasha e Eduardo perguntaram juntos.

- Sim.

- Alex, o que você ainda está fazendo aqui? Você precisa voltar para São Paulo agora.

- Eu não vou voltar e deixar você sozinho no hospital, pai – Alex revirou os olhos.

- Eu não estou sozinho – Eduardo disse contendo a exasperação. Não podia deixar que Alex perdesse os últimos dias com Júlia. – Enfermeiros e médicos passam por esse quarto o tempo inteiro e alguns amigos do trabalho vão me visitar, não precisa se preocupar comigo.

- Hey! – Natasha interrompeu o pai. – Caso vocês não tenham percebido, eu estou bem aqui! É claro que ele não vai ficar sozinho, Alex.

- Ahn, sem querer ofender, mas deixar você responsável por uma pessoa doente não é bem a melhor definição de bom senso.

- Eu sei me cuidar e já disse que não estou doente.

- O que você está fazendo nessa cama de hospital então? Curtindo férias? Praia é superestimada demais para você? – Alex alfinetou.

- Já chega, eu quero as duas fora daqui.

- Mas eu não fiz nada – Natasha disse aborrecida.

- Vá para casa e ajude a sua irmã, não deixe que ela estrague as coisas.

- Eu não preciso da ajuda da Natasha! – Alex revirou os olhos, Natasha a encarou com as duas mãos na cintura. – Tá legal, eu preciso da ajuda dela – admitiu.

- Ótimo, agora caiam fora daqui. Eu aviso quando receber alta.

Eduardo passou os últimos minutos do horário de visitas convencendo as meninas a voltarem para Brasília. Somente quando Gustavo apareceu para expulsá-las do quarto e garantiu que ficaria de olho nele foi que elas concordaram em ir embora.

- Será que fizemos a coisa certa? – Alex perguntou apreensiva assim que desembarcaram em Brasília.

- Ele vai ficar bem, aposto que estava louco para se livrar da gente e além do mais...

- Eu vou pedir a Júlia em casamento – Alex interrompeu Natasha.

- Como é?

- Vou pedi-la em casamento - Alex repetiu mais alto dessa vez.

- Alex, a seca de Brasília afetou o seu juízo? Casamento? Você ficou maluca?

- Não, eu deveria ter feito isso há muito tempo e não tente me impedir, estou certa do que estou fazendo. Não posso mais viver duvidando do meu lugar ao lado dela.

- Eu nunca tentaria te impedir, só estou surpresa que você tenha decidido isso justo quando a Júlia está deixando o país – Natasha disse pensativa – espera um pouco aí, você não está pensando em ir com ela, está?

Fim do capítulo