Agora que Joanne é John e Julie é Julio irei tratar das irmãs as vezes no feminino e outras no masculino fiquem atentos.
Capítulo 2 - Os Smiths
A guerra se alongara tempo demais, já faziam mais de cinco anos, desde lá Joanne e Julie continuaram a viver como John e Julio.
Após a morte de seus pais e a fulga pela floresta, nada havia saído como planejado, no ponto de encontro onde seu pai havia indicado que teria um transporte seguro para levar elas até o Dr. Arthur na cidade, encontraram um homem morto em uma carruagem sem cavalo, ou seja, os inimigos do Oeste haviam encontrado o tal transporte antes, mas havia num papel no bolso do cocheiro o endereço de Arthur na cidade, John o guardou.
Viajaram como andarilhos buscando morada em qualqer casa abandonada, sempre se tratando como meninos, nunca mais haviam falado seus nomes reais uma pra outra. Julio sempre muito fraco naquele inverno rigoroso e sendo carregado nas costas por Jonh o que tornava a viagem mais impossível ainda, por mais que o irmão mais velho caçasse e entendesse das ervas pra fazer remédios naturais, nada surtia efeito, nenhum lugar era seguro, todas as noites novos abrigos, lá fora todos eram seus inimigos, o exército do oeste que já havia invadido muito terreno, as pessoas com fome e desesperadas, os animais perigosos e a mata.
Jonh sabia que se não parassem de viajar Julio não aguentaria, o mais jovem precisava de descanso, era preciso se alimentar todos os dias, dormir todos os dias em local seguro para fortalecer o corpo. Só uma solução foi vislumbrada por ele, já que a cidade estava fora de se alcance devido àquela situação.
Ele tinha nesse tempo de andarilho observado os campos, como funcionavam, campos de trabalho tinham médicos e as crianças eram claramente alimentadas ainda que só o suficiente. Se ele e o irmão se entregassem há um campo de trabalho para meninos e se Jonh mostrasse que era útil, poderia ganhar a confiança, fortificar o irmão mais novo e quando fosse possível fugir. E assim o fez.
Funcionou, com o plano de ter cada vez mais meninos trabalhando pela causa, deram o remédio que Julio precisava para se fortalecer e sobreviver, havia médicos no campo para manter a força de trabalho vivo, era interesse de todos, quanto mais produção mais poder para vencer a guerra.
Antes de entrar no campo com irmão mais novo, Jonh explicou que seriam os Smiths, órfãos de pai e mãe, ninguém podia saber a origem verdadeira de sua família, não poderiam ser os Stuarts por um bom tempo, pois todas as famílias tradicionais do leste estavam sendo cassadas, tinham a opção de se curvar ao oeste mudando de lado ou serem mortos.
Passaram a viver numa espécie de “orfanato” /campo de trabalho como Smiths, na qual cada um tinha uma tarefa específica, John e Julio trabalhavam na pedreira, o mais novo não agüentava muito peso, então o mais velho o ajudava, nunca se desgrudavam, nunca tomavam banho juntos com os outros, um tomava banho enquanto o outro vigiava, apesar de melhor alimentados do que na mata e como andarilhos, John comia o menos possível para manter o irmão mais novo mais forte e saudável, dando sempre parte de sua ração para ele, isso também mantinha o mais velho muito magro, só pernas e braços apresentavam músculos, o corpo de John quase não tinha gordura, devido à falta de alimentação adequada não havia o desenvolvimento corporal característico de uma mulher aos 15 anos, assim apenas com uma faixa os seios de Joanne desapareciam.
John era considerado um dos mais fortes na pedreira, uma espécie de líder nas tarefas, sabia lidar com as cobras o que era muito útil para proteger os meninos nos campos de lavoura, sabia caçar com arco e mantinha a mesa dos gerentes e funcionários do campo sempre com boa carne, isso dava pra ele menos tempo para dormir, pois tinha muitas tarefas, mas muita liberdade para andar por todo o campo em todos os setores e o principal: ninguém mexia com seu irmão mais novo.
Ele trabalhava por dois sempre cobrindo a cota que o menor não alcançasse para que não houvesse punição, isso no começo gerou muitos açoites e castigos em geral, pois ao cobrir a cota do irmão às vezes deixava faltar na própria, cotas de produção eram feitas por idade então ao passar dos anos ele precisava sempre dobrar para alcançar ambas as cotas de produção, já que Julio nunca conseguia alcançar a sua própria, o que fez com que John fosse de longe o mais rápido de todos em quebrar pedras e em todo tipo de atividade.
Tinha acesso às sobras das carnes que dava para os funcionários então apesar de comer menos ração que os outros e do extenuante trabalho, se tornava mais forte, ganhava músculos martelando aquelas pedras, ficava melhor ainda em caçar e depois de tantas picadas de cobra e de ter sobrevivido a todas era quase imune a inúmeros venenos, as picadas quase não faziam efeito, tinha aprendido na infância como tratar os ferimentos com plantas que conseguia na mata.
Em dias de festa sempre participava, sabia tocar alguns instrumentos e isso animava as festas, sendo assim sabia como ninguém quando todos no campo estavam apagados de tão bêbados, a desculpa para saber isso era que seus pais os Smiths eram uma família circense, claramente tudo mentira, mas funcionava, eram nesses momentos fim de festa que ele podia andar livremente onde só a gerência do tal orfanato podia e lia absolutamente tudo que encontrava pela frente.
Sempre que tocava um piano improvisado lembrava-se de sua mãe, ninando ela e a irmã menor e quando arranjavam um violino lembrava-se do pai acompanhando Rose, esses momentos eram os mais felizes naquele lugar de miséria.
Quem o olhasse bem conseguiria ver a menina Joanne escondida em alguns poucos gestos gentis para com os outros meninos do campo, os traços femininos do rosto e o olhar marcante a entregavam, mas absolutamente ninguém reparava nos meninos dos campos, enquanto servissem corretamente em tempos de guerra para ajudar a nação do Oeste nada mais importava.
Disfarçava perfeitamente, tão bem que Julio que era Julie, agora com nove anos não lembrava que John na verdade era Joanne (uma menina).
Aquela noite da morte de seus pais e a vida antes do "grande dia" havia sido apagada de suas memórias, por conta do trauma não se lembrava de quase nada que tinha acontecido antes do ataque, somente alguns flashes com os pais.
Obviamente Julie sabia o porquê de ter que se passar por homem ainda, mas achava que esse não era o caso do irmão.
John já tinha 15 anos e desde que entrara no “orfanato” planejava a sua fuga e da irmã, em segredo “é claro”, para isso foi migrando de campo a campo, buscando se aproximar cada vez mais da cidade, se mostrava muito forte e rápido sempre útil para fundar novos campos, sempre com Julio embaixo dos braços, todos os funcionários confiavam nele.
A todo tempo que viveu naquele lugar estudou todos os hábitos do povo do Oeste, ouviu cada conversa que poderia interessar tanto entre os meninos dos campos, todos de famílias do leste ou indígenas, assim sabia tudo que acontecia que terras e aldeias haviam sido devastadas, quem ainda lutava no leste, também ouvia dos homens do oeste, fingia que não sabia ler assim era visto como um ótimo mensageiro, mas roubava livros para ensinar a irmã mais nova a ler e lia absolutamente todos que conseguia alcançar, gravava cada mapa de locais conquistados, queria entender seus inimigos, os homens e o povo que matara seus pais.
Foi assim que salvou seu irmão conseguindo os remédios que precisava para se curar e foi assim que conseguiu o acesso às chaves de todos locais no campo (pois fingia concordar com as ideologias do povo do oeste), conseguiu fazer um trabalho na capital como mensageiro e lá encontrou o endereço do tal Dr. Arthur de quem o pai lhe falara.
Charlie sempre o havia ensinado de tudo, táticas militares, matemática, astrologia, caça, história, cartografia entre outras ciências sobre o corpo e a floresta e Rose também passava seus conhecimentos, ensinou inclusive outros idiomas, tocar instrumentos, cozinhar de tudo, uso de ervas para saúde, costurar e fazer roupas entre tantas outras inúmeras atividades, se tivesse tido mais tempo com os pais teria ainda mais educação.
Sabia que seu pai Charlie lhe deixaria fortuna, mas se assumisse ser mulher após sua fuga, não conseguiria se apoderar do dinheiro e nem teria a guarda da irmã. Afinal as mulheres atingiam a maioridade plena aos 21 anos e os homens podiam ser emancipados aos 16 anos (caso houvesse morte dos pais) havia lido em um livro de leis do leste todo surrado e danificado que encontrou na sala da gerência em um dos campos, faltavam algumas folhas, tinham traças comendo as páginas que estavam cheias de furos, assim era impossível ler a maior parte, qualquer informação poderia ser útil para sair de lá, então gravava tudo e mantinha uma espécie de caderno/diário enterrado no qual escrevia sempre que possível assim como seu pai havia ordenado.
Era sexta-feira á noite a última do mês e todos os funcionários festejavam bebendo para comemorar o fim de mais um mês exaustivo, era uma rotina previsível, sempre acontecia da mesma forma e Jonh sabia disso.
Ele sabia que era a hora certa, havia planejado e esperado aquele momento por anos, passou como vulto pelos corredores dos dormitórios, chegou onde sua irmã dormia acordou-a rapidamente puxando-a pelo braço, caminhou por todo campo pelos lugares mais ermos até chegar à saída, só ele poderia fazer isso, anos andando por cada canto fez com que entendesse toda rotina e padrões comportamentais dos guardas e todas as saídas, conseguiram sair daquele mausoléu que era o “orfanato”, através de uma carroça de carga que passaria perto da estrada para a cidade, se esconderam em meio às pedras, lembrou-se de cada menino que conhecerá no campo, em suas histórias, nas crueldades que viveram e seus sonhos, naquele momento prometeu a si mesmo que faria algo para mudar aquela realidade, que ajudaria todos no seu caminho, mas nada podia fazer por eles, não por enquanto.
As irmãs dormiram na caçamba daquela carroça, finalmente quando acordaram estavam perto de seu destino, desceram na primeira parada ao anoitecer para que não fossem vistas e correram para a mata se escondendo.
Dali ao acesso da estrada de terra que levava a cidade era cerca de cinco horas de caminhada, depois mais um dia inteiro caminhando sentido a cidade, eles não podiam parar e correr o risco de ser pegos, John tinha estudado cada mapa da região e decorado os caminhos e a direção correta a seguir.
O irmão mais velho havia roubado duas mudas de roupas limpas para trocar no lugar dos velhos uniformes surrados que trajavam, assim não seriam identificados como meninos dos campos de trabalho do Oeste.
Quando chegavam aos orfanatos os meninos tiravam suas roupas e bens pessoais e trocavam por uniformes, tudo que pudesse ser vendido era para lucro da gerência, então havia uma sala com roupas limpas e em melhor estado, que posteriormente seriam revendidas, John sabia e foi de lá que pegou, assim mesmo na estrada não pareceriam órfãos e sim dois meninos em direção à cidade.
Estavam exaustos, mas finalmente depois de mais de um dia caminhando, naquela noite avistaram as luzes da cidade acessas.
Depois de anos de trabalho forçado e se escondendo de tudo e todos, finalmente respiraram liberdade, porém com incerteza do que viria a seguir.
Finalmente deixaram de ser os Smiths.
Fim do capítulo
Comentar este capítulo:
Moura
Em: 18/08/2017
Thata, bom dia!
Sua história me chamou atenção, logo no resumo!
Fiquei feliz em saber que resolveu escrever um conto inusitado.
Desejo sucesso, porque talento você tem de sobra!
Abraços
ps. já adicionei na minha conta de favoritos.
Resposta do autor:
Moura obrigada pelo comentário!
Farei meu melhor, seja sempre mt bem vinda <3
ThataP
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