<3
Capítulo 52. Me abrace
“-- Cala a boca Harley. – O conjunto de palavras que saiu da boca de Alice, junto ao forte abraço que ela a deu, deixou Emily completamente sem jeito. E embora ela não conhecesse a linda mulher que a havia abraçado, o toque entre seus corpos a fez arrepiar, e foi impossível não sentir-se acolhida por ela.
O timbre de voz embargado pelo choro não passou despercebido pela ruiva, que mesmo após se entregar a aquele abraço, ainda franzia o cenho, confusa com todo aquele carinho que a mulher que a havia derrubado do cavalo demonstrava.”
Alice envolveu-a em seus braços, apertando-a de maneira acolhedora, e seus corpos unidos lhe traziam uma nostalgia e conforto imenso. Aquele toque gostoso a fazia sorrir e chorar, e seu coração, desordenado e ainda em choque por tê-la encontrado novamente, preencheu-se com uma gratidão e felicidade que há muito tempo não sentia. Suas mãos correram das costas da ruiva até a nuca, afagando seus cabelos.
Toda a intensidade daquele abraço e das mãos de Alice que apertavam sua nuca contra o seu corpo deixaram Emily completamente sem jeito, e embora, pela primeira vez, seu corpo inteiro estivesse em êxtase ela aproximação repentina de alguém, a ruiva pensou e até tentou acabar com toda aquela aproximação, que após perdurar tanto, parecia-lhe, de certa forma, estranha. Mas ouvir a advogada murmurar palavras próximas de seu ouvido deixou-a bamba.
-- Me perdoa Emily! Me perdoa por não estar aqui quando você acordou... Eu... Eu deveria estar aqui... Eu deveria estar com você. – A voz embargada pelo choro não deixou que a ruiva a assimilasse com sua lembrança, mas ficar sensibilizada com aquela aproximação foi inevitável. – Eu sou uma idiota!! Eu não sabia o que fazer sem você e... – As palavras foram interrompidas pelo choro que persistiu por alguns minutos, e mesmo sem conseguir dizer qualquer palavra que fosse, Alice a manteve ali, em seus braços, próxima de si. A advogada enviou o rosto entre o pescoço e ombro de Emily e entre uma respiração pesada e um soluço, disse-lhe o que estava engasgado em sua garganta. – Eu achei que nunca mais fosse ver você... – Seus braços envolveram-se ainda mais na ruiva, apertando-a contra si. – Eu estava com tanto medo... Meu Deus Emily... – O forte soluço que a dominou fez seu corpo todo se contrair, e naquele momento, a ruiva sentiu toda a dor da outra explodir, e retribuir-lhe o mais puro e carinhoso abraço foi inevitável. Emily rendeu-se a estranha vontade que sentia no seu peito de acolhe-la, e o fez, envolvendo-a em um abraço apertado, tão apertando quanto sentiu seu coração ficar ao ver o choro da outra se intensificar com a retribuição.
Alice desmanchou-se em choro e palavras de carinho quando sentiu os braços e mãos de Emily tocarem-lhe as costas, e a sensação de finalmente senti-la de novo foi tão boa, que junto ao choro ela deixou escapar um riso ainda incrédulo.
A vida havia lhe pregado uma grande peça, e depois de toda a dor que havia sentido e aprendido a conviver por estes longos dois anos e alguns meses, o alívio que tomou sua mente e coração a fez suspirar.
“Isso é real. Eu não estou sonhando. Dessa vez é real” – A advogada pensou e repetiu para si mesma aquelas palavras diversas e incontáveis vezes, e apenas para confirmar mais uma vez que aquela era a sua Emily, Alice afastou-se brevemente, tocando no rosto gelado da ruiva com as duas mãos. Seus olhos encontraram-se com os dela mais uma vez, e em seu coração, a advogada agradeceu a Deus por poder encontrar os olhos azuis e encantadores que tanto amava. Suas mãos afagaram o rosto de Emily, que naquela altura já estava completamente rubro pela timidez, mas que acabou passando despercebida pela advogada que fitava seus olhos tão intensamente que parecia querer arrancar de Emily todos os seus segredos.
A ruiva encarou-a por alguns instantes, e ela estava tão distraída com brilho intenso e único daqueles olhos dourados que mal havia se dado conta de que elas já se olhavam por um longo tempo, e aquela troca de olhares incomum fez seu coração palpitar sem motivo algum.
-- Meu Deus... Como eu senti a sua falta. – O ar pareceu faltar-lhe, fazendo-a respirar profundamente durante um lindo sorriso que escapou de seus lábios.
Emily sequer havia prestado atenção nas palavras de Alice, mas a ternura daquele sorriso provocou-a uma reação inesperada, e quando a ruiva se deu conta, ela já esboçava nos lábios um sorriso sincero, tímido e completamente reciproco.
Os olhos da advogada percorreram todo o rosto da ruiva, desde os olhos perdidos e tímidos, passando pelas curvas do rosto que conhecia tão bem, até a boca em um tom já arroxeado pelo frio e que ainda exibia aquele sorriso com o qual Alice tanto havia sonhado e pedido desde o acidente, e embora ela quisesse beijá-la ali mesmo, ela tinha o conhecimento de que ainda havia muito a ser conversado, afinal, por culpa do acidente, Alice jamais pôde ouvir o que Emily tentou dizer ao telefone.
A advogada tentou uma nova aproximação, mas antes que seus braços envolvessem a ruiva novamente, Emily recuou, curvando seu corpo para trás.
-- Eu sei que você deve estar com um milhão de coisas para me falar agora e que talvez a gente tenha muito o que conversar... Mas será que nós podíamos sair da chuva? – Pressionou os lábios ao forçar um sorriso um tanto quanto sem graça.
Emily cruzou os braços a passou as mãos sobre os mesmos na tentativa falha de se aquecer, fazendo Alice soltar uma breve risada.
-- Essa não é uma má ideia. – Alice sorriu e logo olhou aos arredores, buscando pelos cavalos que à aquela altura já haviam desaparecido de lá. – Será que nós estamos mais próximas da fazenda ou da cabana? – A voz da advogada começava a melhorar, uma vez que ela deixava a vontade de chorar ser preenchida pela ansiedade de chegar à qualquer lugar no qual pudesse sentar e conversar com Emily sobre todas as coisas. – Porque pelo que parece, os cavalos não foram muito cavalheiros em nos esperar...
-- Eu não sei. – Franziu o cenho e olhou ao arredor, tentando avistar qualquer ponto conhecido. – Por quanto tempo você cavalgou?
-- Por uns dez minutos... – Uma expressão pensativa tomou seu rosto. – Eu acho.
-- A cabana então. – Confirmou ao balançar a cabeça.
-- Vamos para lá então, e quando essa tempestade acabar voltamos para a fazenda... – Alice iniciou a caminhada em direção a cabana, mas logo parou e olhou para a ruiva mais uma vez. – Mas antes... Você lembrou de trazer os seus remédios e a bombinha? Essa friagem toda não vai te fazer bem... – O olhar preocupado chamou atenção de Emily, que teve mais uma vez a certeza de que aquela mulher a conhecia muito bem.
A ruiva confirmou com um balançar de cabeça, e acompanhou Alice até a cabana. O silêncio perdurou por todo o percurso, e quando chegaram na cabana, trocaram duas ou três palavras antes de Alice entrar para o banho.
-- Tem algumas roupas aqui na cômoda... – Emily caminhou até lá ao ver a advogada sair do banheiro. – Vou pegar algo para você...
Alice não precisou responder, e enquanto a ruiva escolhia algumas peças de roupa, a advogada aproveitou para observá-la mais atentamente, afinal, com todas aquelas emoções a flor da pele, ela mal havia reparado no quanto Emily aparentava estar diferente. Seu cabelo estava claramente mais longo, e as curvas do corpo menos acentuadas. Ela estava mais magra do que de costume, o que levou Alice a concluir que deveria ser por causa do acidente, e embora o rosto, os olhos e o sorriso de Emily aparentassem ser os mesmos dos quais se lembrava, algo nela estava diferente, e a advogada podia afirmar isso com toda a certeza. Alice martirizou-se ao tentar entender o que havia mudado na ruiva, e o insucesso trouxe-lhe certo desconforto; Culpou-se por não ter estado ao lado dela desde o inicio, dizendo a si mesma que jamais a abandonaria de novo, e pensar naquelas palavras deixam-na com o coração apertado.
-- Aqui está. – Emily estendeu a mão, entregando a Alice um conjunto de roupas secas. – Estas devem servir.
Alice deu uma breve gargalhada ao ouvi-la, afinal, as roupas que “deviam servir” eram dela, então é claro que serviriam.
-- O que foi? – A ruiva franziu o cenho, confusa com a risada sem motivo da outra.
-- “Devem servir”... – Repetiu em um tom extrovertido. – Eu não engordei, se é o que quer saber...
Emily estreitou os olhos, olhando-a de forma tão perdida que deveria ter ficado mais do que óbvio que ela não tinha entendido nada do que Alice falou, mas a advogada já havia virado de costas e se despindo da toalha e vestindo-se logo em seguida, fazendo a ruiva, que ainda a olhava, estremecer e corar com a situação.
Emily desviou o olhar em um primeiro momento, mas seus olhos teimavam em retornar para a advogada, e durante essas curtas olhadas, a ruiva sentiu sua respiração pesar em consequência ao seu coração que havia respondido à aquelas cenas com batidas abruptas e aceleradas. Ela engoliu seco e por fim se virou, lutando contra a vontade que sentia de continuar olhando-a, e seu rosto logo assumiu uma faceta desorientada e incerta. Seus pensamentos haviam acabado de encontrar ali o primeiro grande dilema daquele reencontro: “Por quê diabos eu me senti assim?”. Emily respirou fundo quando confrontou tudo o que sentiu ao vê-la, e toda aquela mistura de desejos e o estranho comportamento do seu coração a deixou perturbada.
A ruiva olhou-a mais uma vez, e balançou a cabeça em negação, tentando se desvencilhar daqueles pensamentos.
-- Você não vai se trocar? – Alice olhou-a por cima do ombro, notando os olhos atentos da ruiva sobre o seu corpo.
-- Éhr... Eu... SIM! Eu já estava indo... – Gaguejou, fazendo com que a advogada segurasse o riso.
Emily adentrou ao banheiro, e assim que fechou a porta, atirou-se de costas na mesma e levou as duas mãos até o rosto, cobrindo os olhos e repreendendo-se por ter deixado tão na cara que estava a olhando.
-- Não tinha como você ter sido flagrada em um momento pior né? Puta que pariu Emily! – Seus pensamentos trouxeram novamente a imagem da advogada se vestindo, e por um breve instante, a ruiva pressionou os lábios em um sorriso discreto e contente por tê-la visto daquele jeito. – Mas que porr*. – A ruiva desencostou da porta em um impulso, e ao olhá-la completamente cheia de lama, reclamou outra vez. – Ah, mas é claro... – Suspirou pesado. – Onde é que eu estava com a cabeça?
O banho morno e demorado que Emily tomou naquela noite serviu para que pudesse colocar a sua cabeça de volta nos eixos, e embora ela tivesse se repreendido incontáveis vezes por ter agido de maneira impulsiva, ela também se organizou em relação à todas as coisas que teria que contar à mulher que a esperava lá fora. Emily sabia que precisaria dizer à ela que simplesmente não a conhecia, precisaria dizer que, a Emily que conhecia morreu no dia do acidente, e que daquele dia em diante, uma nova pessoa assumiu o seu lugar, e não saber como a outra poderia reagir à isso era até cruel. A ruiva não queria ser pressionada de novo, afinal, ela finalmente começava a se encontrar quando essa mulher apareceu em sua vida, e não seria fácil fazê-la entender que ela não pretendia e nem mesmo queria saber e lembrar sobre o seu passado. Ou melhor, partes dele. Emily também não queria mentir e muito menos esconder seus sentimentos a respeito das coisas, mas dizer que gostaria de lembrar de uma exata pessoa de seu passado não seria o melhor a fazer agora, e ela sabia disso. Nenhuma das pessoas que havia conhecido desde o acidente reagiu muito bem à respeito disso, e ela imaginou que com Alice não seria diferente, afinal, ela já havia deixado claro, momentos atrás, o quanto sentiu falta da tal Emily que conhecia, e mexer com sentimentos intensos como esse nunca foi fácil, ainda mais para ela que, de uma forma tão inocente e não intencional, não podia ser capaz de retribuir do mesmo jeito.
Embora Emily soubesse que não seria fácil encarar à mulher que a esperava lá fora, ela precisava sair, não podia passar a noite inteira dentro daquele banheiro, e ela já tinha consciência do quanto havia demorado naquele banho. – Um mal necessário para evitar um mal não necessário – Pensou antes de sair do banheiro, já vestida e repleta de coragem para dar inicio à uma conversa da qual provavelmente se arrependeria naquela noite, afinal, nenhuma das duas poderia deixar aquela cabana se as coisas não corressem bem – E cá entre nós, quando o clima pesa é extremamente difícil se sentir confortável estando no mesmo ambiente que a outra pessoa.
Alice já estava impaciente pela demora da outra, e embora ela tivesse caminhado até a porta do banheiro diversas vezes, ela não conseguiu bater e muito menos perguntar se Emily estava bem. Seu coração estava preenchido por sentimentos que a deixavam em completa agonia, e o receio do ponto em que a conversa poderia chegar transparecia em seus olhos, e embora ela tivesse certeza de que essa segunda chance de ter Emily ao seu lado era um presente divino, o medo de, de certa forma, ainda perde-la a deixava apreensiva e um tanto quanto nervosa, fazendo com que as batidas de seu coração ficassem desordenadas.
-- Que demora... – A advogada olhou no relógio, e após longos trinta minutos, ela não se conteve. Levantou do sofá decidida a bater na porta que a separava de Emily, mas antes que ela pudesse o fazer, a ruiva abriu, e foi um susto para ambas, que tão involuntariamente travaram.
Olhos azuis e dourados cruzaram-se mais uma vez, e antes que qualquer palavra pudesse ser dita, a tensão seus corpos transpareceu.
Emily franziu o cenho ao ver a advogada parada tão próxima dela e com uma de suas mãos levantas, prontamente preparada para bater na porta. E embora seus olhos teimassem largar os de Alice, ela precisou desviar o olhar em uma tentativa falha de esconder a vergonha da situação, afinal, estava claro para a advogada o que Emily também já sabia, ela tinha demorado bastante.
-- Éhr.. Eu.. – Pigarregou, desviando o olhar também. – Eu só queria saber se você estava bem porque...
-- Eu demorei, eu sei. – Interrompeu, forçando um sorriso tímido. – Desculpa.
-- Emily, imagina, você não tem que se desc... – Alice tentou se aproximar para tocá-la, mas a ruiva se desviou, passando por ela as pressas enquanto a interrompia.
-- Então... – Respirou fundo ao passar pela advogada, sentindo um alivio por evitar aquele contato. – Nós temos muito o que conversar, eu imagino. – Emily recostou sobre a cômoda e a olhou, certificando-se de que ela não tentaria um novo contato, afinal, ela já havia entendido do que o toque daquela mulher era capaz, e ela não ousaria deixar seu coração ser controlado por aquilo de novo. Emily precisava manter a coragem e disposição para fazê-la entender seu atual estado, e ser dominada por sentimentos desconhecidos e intensos não a ajudariam agora.
Alice engoliu seco, sentindo uma pontada no estomago quando foi cortada por Emily.
-- Eu sei Emily. – O olhar tristonho de Alice foi ao encontro da ruiva, e sua voz logo embargou durante um choro que parecia querer escapar a qualquer momento. – Foi um erro. O que aconteceu... Foi um grande erro. Você precisa acreditar em mim. Eu não queria te mag... – Emily interrompeu.
-- Calma. – Respirou fundo. – Antes de você dizer qualquer coisa a respeito do que aconteceu, você precisa saber de uma coisa. – O semblante sério chamou a atenção da advogada, e foi fácil captar que o que estava por vir não seria fácil de ouvir quando notou que a ruiva apertava e repuxava a borda do moletom.
Alice consentiu em um balançar de cabeça, e o silêncio que manteve foi consequência do fôlego que a fugiu quando seus olhos encontraram os de Emily, e o azul antes tão brilhante e misterioso revelavam agora um desapontamento.
“Eu o odeio por me fazer passar por isso tantas vezes” – Pensou consigo mesma antes de continuar.
-- Como você me achou aqui? – Emily analisou os movimentos da advogada, que colocou uma mexa de cabelo para trás da orelha antes de responde-la.
-- Sua mãe... Ela me disse que estava aqui. – Apontou para o sofá na frente da cômoda. – Posso? – Alice se aproximou, sentando-se após o consentimento da ruiva. – Eu fui até a sua casa para vê-la e saber noticias tuas... Então ela me contou e... Bom, eu não poderia espera-la voltar para a cidade, Emily. – A morena apoiou as mãos sobre as coxas, apertando-as.
Os olhos da ruiva percorreram o ambiente e logo retornaram ao encontro de Alice, que estava sendo devorada pela ansiedade de saber o que Emily precisava conta-la.
-- Então ela... Ela te contou tudo? – Cruzou os braços sem evitar o timbre receoso daquela pergunta.
-- Acredito que ela não teve oportunidade para isso... – O semblante questionador de Emily a fez completar. – Quando ela me disse que você tinha acordado, eu só quis te ver e... Bom, eu não prestei atenção no que ela disse depois. – Deu de ombros.
-- Entendi... – Emily evitou o olhar intenso da advogada mais uma vez, e resmungou algumas palavras. – Eu acho que preferiria que ela tivesse te contado...
-- O que disse? – Não conseguiu entender.
-- Você sabe há quanto tempo eu sai do coma? – Emily sentiu um frio na barriga ao tocar no assunto que lhe trazia tantas lembranças desagradáveis do seu período de recuperação e quando Alice negou, ela prosseguiu. – Hoje fazem exatamente sete meses... – Ouvir aquelas palavras fez o mundo da advogada perder toda a sua cor. – E três dias. – A ruiva atentou ao semblante de Alice que se penalizou.
-- Emily... – A voz fraca e angustiada chamou a atenção da ruiva. – Eu não sabia... – As palavras se perderam em meio a tantos pensamentos severos e cheios de culpa.
-- Eu não te culpo. – Seus ombros murcharam. – Olha... Eu sei que isso pode ser duro de ouvir, eu... Eu já machuquei tanta gente com isso que... – Emily lutava contra a realidade em que se encontrava, e por mais uma vez ela odiou que isso tivesse acontecido logo com ela... As pessoas ao seu redor pareciam não merecer isso, e por essa, Emily não conseguia se perdoar. – Eu sinto muito que você tenha que se machucar também... – Alice ajeitou-se no sofá, recostando as costas enquanto dava uma séria olhada na expressão da ruiva, e vê-la tão tensa fez seu coração palpitar.
-- Do que está falando Emily? – Sua voz estava trêmula.
-- Eu não me lembro de nada antes do acidente. – Emily respirou aliviada por ter falado.
-- Emily, mas é normal as pessoas não se lembrarem dos momentos antes d... – A ruiva a interrompeu.
-- Eu não me lembro de nada. – Seus olhos transbordavam impaciência e medo quando encontraram com os da morena novamente. – Eu não sei quem você é. – Cuspiu as palavras que estavam engasgadas na garganta.
Naquele momento Alice gargalhou, crendo estar caindo em uma grande brincadeira da ruiva.
-- HARLEY! Você não deveria brincar com essas coisas. – Alice sacodiu a cabeça, negando-se a acreditar. – Ainda mais depois de tudo...
A advogada persistiu com o riso por alguns segundos, esperando que a outra a acompanhasse a qualquer momento, mas vê-la permanecer tão séria fez seu coração vacilar, e por breves segundos ela permitiu-se questionar a possibilidade daquelas palavras serem verdade.
“Será que... Não... Não é possível. Ela não pode estar falando sério... Não depois daquele abraço, não depois daquele toque... Eu vi o quanto ela ficou mexida quando me viu... Eu vi nos olhos dela... Ela ainda é a minha Emily, tem que ser... Isso não pode ser verdade.”
Os pensamentos aguçados e desorientados da advogada a levaram novamente para o momento em que colidiram com os cavalos, e pensar naquele reencontro sem todas emoções explodindo dentro de si a permitiu entender tudo com mais clareza. Emily não havia a chamado pelo nome uma vez sequer, e embora ela tivesse se entregado durante o abraço, seus olhos estavam obscuros e confusos o tempo todo. Alice se lembrou de quando a ruiva a entregou as peças de roupa que usava agora e tudo cruelmente se encaixou: Emily não sabia que aquelas roupas eram dela, por isso ela havia feito aquela cara. Emily também havia corado ao vê-la nua, e isso era inaceitável para alguém que já a havia visto assim várias vezes.
Alice fechou os olhos quando, por um momento, acreditou nas palavras da ruiva, e crer naquilo fez seu coração apertar e sua respiração falhar. Quando tornou a abrir os olhos, aquele dourado brilhava pelas lágrimas que formavam e suas mãos inquietas procuravam por qualquer coisa que lhe tirasse o nervosismo.
-- Você não... – Engoliu as próprias palavras, e respirou fundo, tomando coragem para perguntar o necessário. – Você não estava brincando? – Uma respiração trêmula a fez segurar o choro.
Emily confirmou em um balançar de cabeça, e bastou aquelas palavras e a seriedade em seu rosto para que a ficha da Alice finalmente caísse, fazendo-a apertar as próprias mãos. A ruiva a observava atentamente, e já esperava que a mesma desabasse em choro.
Foi uma surpresa para ela quando Alice esfregou os olhos, negando-se a mostrar sua fraqueza em um momento desses.
-- Eu sinto muito. – Abaixou o olhar, escondendo em seus olhos o quanto estava chateada.
-- Não diga uma coisa dessas, Emily. – A advogada levantou e caminhou até a ruiva. – Você não tem culpa. – Seu coração relutava contra a vontade de se entregar ao choro, mas Alice se manteve forte e controlou sua respiração. Ela sabia que se isso era uma droga para ela, para Emily seria muito pior. Ela tentou se colocar no lugar da outra, e pensar na possibilidade de não se lembrar de nada da sua vida, nem de seus pais, dos seus amigos... De se olhar no espelho e não saber quem você é... Isso deveria ser horrível, e ela não tinha o direito ser egoísta agora. Ela precisava ser forte pela ruiva, e não importa o quando aquilo lhe doesse, ela não podia desmoronar agora. – Esse acidente não foi culpa sua... E... Bom, pode ser que ela volte algum dia.
-- E se eu não quiser que ela volte? – Emily levantou o olhar, e encontrar com aqueles olhos dourados tão próximos dos dela a estagnou, e o pouco vento que adentrava a cabana e as atingia, permitiu a ruiva sentir o cheiro maravilhoso da advogada, deixando-a completamente ludibriada.
-- Como... Como você pode dizer isso, Emily? – Estranhou. – Você não quer se lembrar da sua vida? Das pessoas que você ama e...
Emily segurou nos ombros da advogada e a afastou de si.
-- Eu quis. Eu quis me lembrar tantas vezes! Eu tentei fazer de tudo por eles, e eu cansei! – Esbravejou, apertando suas mãos. – Eu cansei de tentar ser o que todo mundo espera de mim. E eu cansei de decepcionar todo mundo por não conseguir me lembrar... – Emily passou o braço sobre os olhos, enxugando-os com o moletom. – E eu cansei de me decepcionar... De sentir essa culpa de não conseguir retribuir o que eles querem e até mesmo merecem... NÃO É JUSTO! NÃO É JUSTO COM NINGUÉM!! – Emily estava vermelha de raiva, e lá estava mais uma vez a sua vontade de bater nas coisas.
Emily socou a parede uma, duas vezes, e na terceira, para sua surpresa, foi interceptada por Alice que a envolveu em um abraço apertado e imediato. A advogada segurou-a enquanto ela se debatia na tentativa de se soltar e quando a ruiva pareceu se acalmar, ela tratou de passar as mãos por debaixo dos braços dela, dominando-a através de um abraço mais calmo e que transpassava confiança.
-- Eu sinto muito. – Foi o que Alice murmurou para fazê-la entender que havia se arrependido da pergunta, e senti-la enfiar-se entre seu pescoço e ombro durante o inicio de um choro sofrido a pegou de surpresa.
Ver Emily ir a dois estremos tão diferentes como a raiva e a dor mexeu com Alice, que por mais que houvesse tentado se segurar, acabou acompanhando-a no choro.
Suas mãos transcorreram até a nuca da ruiva, afagando seus cabelos durante todo o tempo em que ficaram ali abraçadas, e quando o choro pareceu cessar das duas partes, foi o conforto e o envolvimento gostoso de seus corpos que as fizeram permanecer no abraço por mais algum tempo.
Emily sentiu-se segura nos braços da advogada, e embora ela achasse as atitudes dela um tanto quanto malucas, talvez fosse exatamente disso que ela precisava: De alguém que a mandasse calar a boca, que a segurasse contra a própria vontade durante uma crise existencial de fúria, e que principalmente a fizesse se sentir tão livre, como se não devesse tentar ser alguém rotulado, alguém que já existiu. A ruiva suspirou, e se afastou do pescoço de Alice. Seus olhos buscaram pelos dela, e dessa vez não havia timidez, não haviam medos, receios e muito menos dor. Emily apenas sentiu-se grata por tê-la conhecido.
A advogada retribuiu aquele olhar que a arrancou o fôlego, e sem se conter, levou uma das mãos até o rosto da ruiva, secando as ultimas lágrimas que ainda umedeciam as bochechas dela. Ver aqueles olhos que tanto amava tão vermelhos e inchados pelo choro lhe cortava o coração, e embora ela quisesse tirar toda aquela dor e bagunça que deveriam estar preenchendo o coração de Emily, ela sabia que tudo que estava ao seu alcance era ficar ali, ao lado da mulher que prometeu, naquela mesma noite, jamais abandonar.
-- Você não deveria chorar assim... – Alice passava os polegares pelas bolsas dos olhos da ruiva. – Fica parecendo um pimentão... – Emily não pôde conter o riso cansado, que não passou despercebido pela advogada. – Porque você não descansa um pouco?
-- Mas nós ainda não terminamos... – A proximidade de seus rostos deixou-a completamente vulnerável aos desejos que já vinha sentindo desde que se esbarraram, e sentir a respiração quente de Alice atingir-lhe o rosto junto à aquele toque macio da mão dela não ajudava. Seus olhos transcorreram o rosto da advogada até o alcance de seus lábios, e os traços singelos do sorriso que se formou neles fez seu coração acelerar.
A respiração ofegante da ruiva não passou despercebida por Alice, que rapidamente notou o desviar de seus olhos. Seus corações entraram em completa harmonia quando tão igualmente batiam apressados e ansiosos, compartilhando seus desejos e sentimentos. Alice sabia exatamente o que queria. Ela amava a mulher que estava a sua frente e por mais que Emily pudesse negar para si mesma, Alice conseguia enxergar um forte sentimento através do azul de seus olhos, e por mais que isso pudesse parecer impossível depois de descobrir sobre a memória de Emily, ela sabia que provocava na ruiva sentimentos dos quais ela mesma deveria se questionar. A troca de olhares intensa entre elas provocava-as um frio na barriga, e em algum momento elas até chegaram a aproximar seus lábios, trazendo à Alice uma vontade quase que incontrolável de beijá-la. Sua respiração pesou quando os olhos da ruiva encontraram-se com os dela novamente, depois de tanto minuciar seus lábios, mas antes que ela pudesse tomar qualquer decisão precipitada que afetaria toda a forma como elas se conheceriam a partir dali, Alice se afastou, respirando aliviada por conseguir se controlar.
-- Eu não vou embora, Emily... – Sorriu desconsertada. – Nós podemos falar disso amanhã... – A ruiva consentiu, também sem jeito pelo clima que havia rolado entre elas. – Vem, vamos deitar.
Emily passou parte da noite tentando entender o que havia acontecido naquele dia, tentando entender a paz que aquela mulher havia trazido à ela de uma forma tão honesta e pura e por mais que ela não quisesse acordá-la, seu coração incendiava uma vontade de senti-la mais perto.
Do outro lado da cama, Alice encontrava-se na mesma situação. E pensar sobre todas as informações que aquele dia havia lhe fornecido foi difícil. Ela questionou o destino mais uma vez por não conseguir entender o que a vida queria provar para ela. – Um dia, decidiram mostrar a Alice o que era perder alguém. Ensinaram-na o quanto era doloroso o processo da superação, e o quanto um amor podia perdurar mesmo depois de acreditar que a outra pessoa jamais poderia voltar para ela, e de repente, devolveram-na tudo que ela havia pedido por tantos anos, e neste meio tempo, Alice caminhou desde o alívio e felicidade de tê-la de volta, até o choque que foi descobrir que as coisas não seriam mais como antes. Ela tinha consciência de que Emily poderia nunca mais ser a pessoa que conheceu, ou que poderia não amá-la como antes, e mesmo vivenciando possibilidades de futuros e alternativas incertas e de certa forma, assustadoras, a advogada apenas agradeceu. Agradeceu por Emily estar viva. Agradeceu por pode ouvir aquela voz rouca mais uma vez, por tê-la visto sorrir e até mesmo chorar.
-- Você está acordada? – Emily sussurrou depois de observar Alice por longos minutos.
-- Uhum... – Alice e Emily mal sabiam que seus olhares durante a noite haviam sido correspondidos uma pela outra.
Emily deslizou os dedos pelo lençol da cama até encontrar a mão de Alice, e entrelaçou seus dedos aos dela.
Sentir o toque da ruiva fez os pelos de Alice se ouriçarem. – Fazia tempo desde a ultima vez em que a tinha assim, tão perto. – A advogada fechou os olhos por longos segundos, e a respiração profunda que deu a fez emergir em lembranças nostálgicas. – Sentiu um frio na barriga e logo abriu os olhos. – Ela precisava verificar se não estava em um dos tantos sonhos que teve no tempo em que Emily ficou em coma.
Alice aprumou-se na cama, aproveitando a confiança daquele toque para aproximar seus corpos. – A respiração pesou, acompanhada pelas batidas aceleradas de um coração ansioso. – Emily sentiu a mudança da outra, mas não haveria insegurança que a faria recuar agora. Ela não se sentia bem assim há meses e estava decidida a explorar até onde se sentiria confortável com aquela mulher.
O sono a fugia, mas Emily recusava-se a fazer qualquer pergunta para a outra. – O silêncio não era constrangedor. – Ela não queria saber quem ela era, não queria saber de suas histórias juntas, nada. Emily sentia-se melhor assim. – “Sem passado, sem cobranças” – Afirmou para si.
A luz do luar que transpassava a vidraçaria da janela permitia que os olhos minuciosos da ruiva encontrassem com os de Alice, e a batalha misteriosa que travaram ali foi longa. – Cada uma delas perdida em sua própria realidade. – Vez ou outra um sorriso, discreto demais para ser percebido, se formava nos lábios da advogada que ainda encontrava-se encantada e ao mesmo tempo incrédula com o milagre que tinha diante dos olhos. – E somente depois de muito tempo analisando-a, Emily foi capaz de se virar para o lado oposto da cama, trazendo consigo a mão da advogada. – Ajeitou-se após a clara proposta da ruiva, e tão prontamente a abraçou, aconchegando o rosto entre o pescoço e ombro de Emily. – Retirando antes, em um toque calmo, os fios de cabelo que lá se alojavam.
Emily levou a mão da advogada até o alcance de seu busto, segurando-a com um carinho irreconhecível aos próprios olhos, e deixou-a lá durante toda a noite. – Desfazendo-se de um suspiro relaxado pouco antes de pegar no sono.
Fim do capítulo
Espero que tenham gostado do capitulo <3
Obrigada mais uma vez por todo apoio e carinho!
É muito importante todo o incentivo de vocês, isso me motiva a escrever!
Um grande beijo e até a proxima!
Comentar este capítulo:
lay colombo
Em: 10/08/2017
Eu sabia q a Ali ia ser a única a se colocar no lugar da Em e saber lidar com ela, afinal as duas se conhecem de alma e não só de memórias compartilhadas (e a Ali é perfeita, então...). E é claro q a Ruiva ia Reconhecer o amor da vida dela, digo, a Ali, mesmo não lembrando dela, elas se pertencem.
Jenny minha princesa a cada capítulo eu me apaixono mais por essa história e pela autora incrível q vc é, meu Deus.
Bjos meu amor e até o próximo.
Resposta do autor:
Oi lay!!! Tudo bom contigo? Espero que sim!
Você sacou a nossa advogada muito bem. Não tem jeito, Alice sempre vai ser essa pessoa incrível, amorosa e até mesmo compreensiva com a ruiva. É um amor que transpassa a alma.
É com muito carinho que leio estes comentários. Muito obrigada por todo o apoio, carinho e amor para comigo. É muito bom vir aqui, ou até mesmo receber uma notificação no celular, e dar de cara com esses comentários lindos.
Vocês não fazem ideia do quanto é importante receber o apoio e incentivo de vocês.
Um grande beijo, e até breve.
P.s. Desculpa o atraso do capitulo que eu prometi para essa semana, mas acabaram marcando prova em duas matérias do meu curso e puf, tive que estudar para não tirar o famoso zero né. Espero que entenda e, se serve de algum consolo, estou escrevendo o mais rápido possível e com todo o coração para trazer o proximo capitulo o mais breve possível.
Mille
Em: 10/08/2017
Olá Jenny
Ameiiiiii o capítulo, e acho que a Emíly pode não lembrar do passado mais a Alice está no coração, e quando? a advogada falar o nome ela vai se sentir melhor ainda mais.
Alice vai precisar ser forte e talvez a perda da memória seja como uma segunda chance para as duas.
E claro que a Emily não guardou mágoas do que o Matheus falou, sobre ela ter passado a noite com a Anne.
Bjus e até o próximo capítulo
Resposta do autor:
Oi Mille!! Fico muito feliz em saber que curtiu!
E tenho que dizer que concordo contigo, está mais do que na cara que Alice ainda está no coração da ruiva, mesmo que ela ainda não entenda como ou até mesmo o porquê.
Espero que continue acompanhando porque tem muitas surpresas pela frente.
P.s. Desculpa o atraso do capitulo que eu prometi para essa semana, mas acabaram marcando prova em duas matérias do meu curso e puf, tive que estudar para não tirar o famoso zero né. Espero que entenda e, se serve de algum consolo, estou escrevendo o mais rápido possível e com todo o coração para trazer o proximo capitulo o mais breve possível.
[Faça o login para poder comentar]
Deixe seu comentário sobre a capitulo usando seu Facebook:
[Faça o login para poder comentar]