A fortiori por Bastiat
Capítulo 17 - Pós-bomba
Camila
Há poucos passageiros no avião, o que faz ficar tudo muito silencioso e deixa o ar melancólico tomar conta.
Não sei como tive coragem de tratar a Laura daquele jeito. As palavras saíam da minha boca como um trator que passa por cima de objetos sem piedade. Eu não imaginava que teria essa reação quando estivesse de frente para ela. Não tenho arrependimento algum, fiz o que acho que ela sempre mereceu. Eu nem sabia que existia toda essa raiva acumulada dentro de mim.
Quando ela apareceu na minha frente senti ódio. Aos poucos o ódio se misturou com uma espécie de desejo. Ela está tão bonita, com a aparência mais madura, mesmo com pequenos traços joviais. Seus cabelos estão mais longos, nunca tinha imaginado a Laura loira. Seu corpo eu consegui contemplar por alguns minutos, ainda mais belo do que antes, com mais curvas. Como consegui sentir desejo sentindo também ódio? Não sei explicar. Minha cabeça tornou-se uma confusão de sentimentos.
Olhei para o lado e a Diana dorme pesado. Então, me permiti chorar. Um choro silencioso. As lágrimas acumuladas banham todo o meu rosto. Senti raiva de mim por ter pensado na Laura de forma amorosa por um momento. Ela destruiu a minha vida. Eu só deveria odiá-la.
Carlos
- Andreia! Andreia, meu amor.
- Oi, querido.
Olhei para a minha mulher e não podia deixar de notar o quanto a Laura se parecia com ela. O cabelo castanho claro e os olhos cor âmbar são o que mais se destacam nas duas. Nossa filha Lívia também lembra muito a Laura, exceto pelos olhos escuros idênticos aos meus.
- Encontraram a Laura! Ela está em São Paulo.
- O quê? Você está brincando?! Não acredito.
Ela pulou de felicidade e caiu em meus braços. Eu sei o que significa encontrar a Laura para a minha esposa. Ela se sentia tão culpada por tudo. Procurou tanto pela nossa filha.
- Pode acreditar, meu amor! Encontraram a nossa menina.
- Temos que ir para lá!
- Sim, nós vamos, meu bem. Mas só amanhã e depois da primeira reunião. Pedimos folga até o final de semana e ficamos por São Paulo.
- Não vejo a hora de dar aquele um abraço apertado nela. Um só não, vários. Vários.
- Eu também.
- Mas quem a encontrou? Como você soube?
Falei para a minha esposa tudo que a Verônica explicou. Ela estava tão feliz que o brilho nos olhos voltou. Eu tentei compartilhar da total felicidade dela, mas estava preocupado demais com a história da Camila ir para São Paulo primeiro. Espero que a conversa entre elas hoje dê certo. Algo me diz que não. Todo mundo sabe o quanto a Camila sofreu. Espero que a Laura esteja bem. Que fique bem.
Camila
O caminho de casa foi rápido. Cheguei com a Diana lutando contra o sono nos braços e resolvi que seria melhor ela dormir comigo. Assim que eu a deitei na cama, ela fechou os olhos, virou de lado e dormiu novamente.
Saí do quarto para ir atrás da minha irmã. Preciso avisar que estava bem já que desliguei meu celular.
Abri a porta do quarto dela e vi a Marina dormindo com ela. Vero está abraçando-a como se estivesse fazendo uma proteção.
Toquei em seus ombros.
- Cah?
Ela abriu os olhos após despertar.
- Só vim te falar que estou bem. Volte a dormir, amanhã conversamos.
- A Diana veio com você?
- Sim. Boa noite.
Retirei-me do quarto dela antes que começasse um interrogatório ou que a Marina acordasse.
Deitei-me na minha cama e abracei a minha filha. Nada, nem ninguém, irá me separar das minhas filhas.
Sérgio
Algo de esquisito está acontecendo desde o momento que pisei no prédio onde moro. O porteiro falou que a Laura estava com visita na hora que eu cheguei e uma hora depois ele me disse que essa visita saiu com a Marina.
O celular da Laura só cai na caixa postal.
Estou achando tudo tão estranho que mesmo sendo quase meia-noite vou subir para ver se está tudo certo.
Quando cheguei no andar dela, de cara já estranhei a porta aberta. Ao entrar, ouvi um choro.
- Laura?
O choro vem da biblioteca. Será que a Laura é quem está chorando?
Deslizei a porta de correr e a vi com o rosto enterrado no chão frio e seus braços sob seu corpo. Ela chora tanto que chego a pensar que algo nela está doendo.
- Laura! O que aconteceu?
Ela notou a minha presença e o choro começou a cessar. Talvez esteja envergonhada pela situação deplorável.
- Sérgio...
Aproximei e a abracei no chão mesmo. Laura juntou todas as forças para me abraçar e dizer:
- A Camila esteve aqui.
- A Camila?
- Sim, ela levou a minha filha.
- Laura, fica calma.
- Sérgio, a Diana estava aqui nas últimas duas semanas.
- Você não está bem.
A Laura não fala coisa com coisa.
- Depois você entende. Só sei eu nunca mais verei as minhas filhas.
- Laura... cadê a Marina?
- Está com a Camila.
O choro desespero que parecia ter sido encerrado voltou. Impressionante a quantidade de lágrimas que jorra de seus olhos de uma vez. Percebi que ela não consegue se levantar daqui, não tem forças para nada. A peguei no colo e subi para o seu quarto.
Deitei a minha amiga na cama. O choro não para. Tudo o que eu temi todos esses anos aconteceu e eu não estava na hora para protegê-la como eu imaginei que estaria.
- Vou buscar uma água.
Fui até a cozinha e tudo parecia mais confuso. A Camila esteve aqui e levou a Marina? A Laura não conseguiu impedir? O que será que ela disse que deixou a Laura daquele jeito?
Voltei para o seu quarto e a fiz beber um pouco de água.
- Calma, fica calma e me explique tudo.
Vi seu esforço para se acalmar e falar.
- Você com certeza percebeu uma mudança na Marina.
- Sim.
- É porque não era a Marina, era a Diana. A Diana estava aqui esse tempo todo.
- Isso é impossível.
- No dia em que eu fui te levar e buscar a Patrícia no aeroporto, a Marina conheceu a Diana no banheiro e elas trocaram de lugar.
- A Marina fez isso? Ela foi para o Rio? É bem a cara dela fazer isso.
- Sim. Sérgio, a Marina descobriu tudo.... - a Laura demostrou preocupação.
- Tudo? Tudo mesmo? - Engoli seco.
- Camila deu a entender que sim.
- Lau... Laura...
Quem entrou em choque agora fui eu.
- Eu perdi a Marina. Anos atrás eu perdi tudo, agora eu perdi o meu tudo.
- Calma. Camila não pode chegar aqui, simplesmente levar a Diana e ficar com a Marina.
- Pode. Ela fez uma ameaça. Disse que se eu aproximar delas, ela aciona a polícia e me processa por sequestro de menor.
- Que absurdo! Ela não pode fazer isso.
- Ela pode, você sabe que pode.
- Você também é mãe delas!
- Sou uma desequilibrada que roubou a própria filha na calada da noite.
Aquela batalha estava perdida, mas ainda temos outras armas. Só preciso saber quais.
- Nós vamos resolver isso.
- Eu nunca mais verei as minhas filhas.
- Calma e dorme um pouco.
Peguei um remédio para dormir e dei para ela.
- Toma. Coloca na boca e bebe água.
- O que é isso?
- Remédio.
Ela nem fez mais pergunta, apenas tomou e se deitou. Eu fiquei fazendo carinho nela até dormir.
A vida da Laura está desmoronando e a minha junto.
Camila
Ouvi alguém chamando pela nome e passando a mão no meu cabelo.
- Camila...
Acordei e vi que é a Vero que me chama. Sentei-me na cama e olhei para a Diana que ainda dorme.
- O que foi?
- Precisamos conversar.
Balancei a cabeça concordando e levantei-me.
Chegamos na sala e ela já questionou:
- Como foi lá?
- Horrível.
- Horrível? O que aconteceu?
- Eu cheguei lá e fiz o que tinha que ser feito. Peguei a Diana.
- Disso eu sei, mas e a Laura?
- A Laura ficou lá chorando no chão. Patética. Covarde. Impressionante como o tempo passou e ela continua a mesma egoísta de sempre. Ridícula.
A minha irmã me olhava assustada.
- Como foi, Camila? Vocês conversaram?
- Eu falei tudo o que estava engasgado. Mas ainda falei pouco. Ela não tinha muita explicação para dar. Ainda teve coragem de pedir perdão, acredita? Depois de tudo que eu passei. Ela não mudou nada. A aparência pode ter mudado, mas a covardia ainda é a mesma.
- Eu entendi. Mas ela não disse nada? Nada?
- Eu não dei tempo para ela inventar uma história. Ela apenas chorava.
- Cah, eu não sabia que você guardava tanto rancor. Como vai ser agora? A Marina vai esquecer que tem outra mãe? Agora você está tão errada quanto ela.
- Errada? Eu sei muito bem o que estou fazendo.
Patrícia
Entrei feliz da vida na minha casa. O carnaval do Rio foi maravilhoso, mas estou morrendo de saudade da minha Laura.
Notei tudo tão silencioso. Será que elas saíram? Subi as escadas e fui na direção do quarto verificar se a Laura está dormindo, já não é tão cedo assim.
O meu sorriso sumiu quando entrei no quarto e dei de cara com o Sérgio deitado com a Laura. Ele está velando o sono da minha mulher. Já pensei outra coisa, mas sei ser impossível. Laura jamais me trairia com o Sérgio.
Limpei minha garganta chamando a sua atenção.
- Pati! - ele levou um susto.
A Laura aos poucos foi se mexendo e abrindo os olhos. Sérgio olhou para ela e não escondeu a sua cara de preocupação.
Já minha namorada olhou tudo em volta como se estivesse em um lugar desconhecido. Ela me ignorou completamente na sua análise. Voltou-se para o Sérgio e perguntou:
- Não foi um sonho?
- Infelizmente não, querida.
Laura começou a chorar como um bebê. O Sérgio só sabia repetir que tudo ia ficar bem.
Fiquei observando a cena e me senti excluída. Alguma coisa grave tinha acontecido, temi pela Marina.
- Sérgio, aconteceu alguma coisa?
Ele me olhou atentamente, hesitava em dizer alguma coisa. Quando viu que a Laura não falaria nada, disse:
- Aconteceu.
- A Marina está bem? - Minha pergunta saiu desesperada.
- Sim, não se preocupe.
- Então o que houve?
- Patrícia, isso é um assunto da Laura. Quando ela estiver bem, vocês conversam.
Ao me aproximar da Laura, ele se levantou e afastou-se da cama. Sentei-me bem próxima a ela e enxuguei suas lágrimas.
- Meu amor, conte-me o que aconteceu, estou preocupada.
Ela me abraçou forte e só chorava nos meus ombros.
Foram 30 minutos de carinho e silêncio. Esperei o tempo dela. Seja lá o que tivesse acontecido, é muito grave e a Laura precisa de mim mais do que nunca.
Aos poucos, seu choro foi diminuindo e a calma vinha com meus carinhos.
Laura saiu dos meus braços quando se sentiu pronta e olhou nos meus olhos.
- Você queria saber tudo sobre o meu passado. Acho que chegou a hora de responder todas as suas perguntas.
Estranhei sua atitude e percebi que a situação pode ser mais difícil do que eu penso. Este é realmente um bom momento para ela revelar o que aconteceu na sua briga com os pais? Não importa. É o momento.
- Quem é Laura? - Repeti a mesma pergunta de dias atrás.
- É... vou deixar as duas conversarem.
Sérgio saiu e a Laura entrelaçou as nossas mãos.
Laura
- Eu nasci no Rio de Janeiro. Sou fruto de um romance de uma noite da minha mãe com um cara desconhecido. Ela mesma nem sabe se ele contou o nome verdadeiro para ela. Minha mãe estava em uma comemoração no bar porque ela tinha conseguido o emprego na emissora e foi para cama sem pensar que poderia ter consequências. Ela disse que não estava bêbada, mas que queria ter uma noite quente e teve. A consequência fui eu.
Sorri fraco. A consequência que destrói a vida de todos, pensei.
- Durante a gravidez e depois que eu nasci, minha mãe continuou subindo de cargos na redação e então me entregou para os meus avós. Eu só tinha um ano quando ela me deixou. Morei aqui em São Paulo até os meus 14 anos de idade, pois ela me buscou para morar junto com ela e com o Carlos. Assim, sem nem perguntar a minha vontade. E não, o Carlos não é o meu pai de sangue, porém sempre me tratou como filha. Ele até me registrou para que eu tivesse um pai. Meu pai, esse de verdade, é uma das pessoas mais importantes da minha vida.
Vi a Patrícia sorrir. Ela percebeu a minha admiração pelo meu pai e ficou feliz.
- Quando os meus irmãos nasceram, eu me senti muito excluída. Doía ficar vendo a minha mãe cuidando deles de um jeito que ela nunca fez comigo. Hoje eu sei que é bobagem, mas na época era como uma traição. "Por que ela não cuidou de mim como cuida deles? ", era só o que eu pensava. Eu era apenas uma menina com problemas com a mãe quando resolvi fazer faculdade aqui em São Paulo, na USP, junto com o Sérgio. Neste período eu descobri que era lésbica e minha mãe implicou muito na época. Acho que ela tinha muito medo da imprensa descobrir. Imagina a grande jornalista Andreia Dopollus ter uma filha fora dos padrões que ela lutou tanto para alcançar. Sim, ela ficou mais preocupada com a carreira dela do que comigo. O meu pai, maravilhoso que é, deu-me todo o apoio e ainda fez a cabeça da minha mãe para aceitar numa boa. Crê que ela até mesmo tentou fazer disso um evento? Sempre foi sobre ela, como tudo gira em torno dela.
Foi difícil lembrar desses tempos sombrios. Mas o pior estava por vir.
Patrícia
A Laura foi mudando a expressão conforme a conversa ia se aproximando de algo que ela escondia. Sua história de vida era totalmente diferente do que eu imaginava.
- E assim a minha vida seguiu, terminei a faculdade e voltei para o Rio. Além de volta a morar com os meus pais, ainda fui trabalhar como repórter na emissora. Não reclamo, foi uma ótima oportunidade e consegui ter autonomia no meu trabalho.
De repente silenciou-se. A vejo procurando tomar coragem para prosseguir. Continuei quieta, apenas apertei suas mãos dando forças para que continuasse
- Patrícia, na redação eu conheci uma mulher. Uma mulher que tem um laço muito forte comigo. Ela é a mãe da Marina.
Tentei soltar as minhas mãos, mas ela segurou firme. É uma informação muito grave para ser omitida. Ela sempre disse que resolveu ter uma filha independente. Talvez se ela me dissesse que namorou e engravidou de um homem eu não estaria tão chocada. Mas ela teve alguém e escolheu ela para ser a outra mãe da sua filha. Então foi uma pessoa muito importante para ela.
- Não, por favor, escute-me. Por favor, deixe-me continuar com a explicação - assenti positivamente. - Você provavelmente a conhece. Eu fui casada com a Camila Sullivan.
- O quê? - Deixei escapar a minha surpresa.
- É, ela é a outra mãe da Marina. Mas não é só isso. Eu tenho outra filha, a Diana. Marina e Diana são gêmeas - ela sorriu. - Bem, como disse, me casei com a Camila e tivemos duas meninas. Como você pode ver o nosso casamento não deu certo. Ela nunca aceitou o meu trabalho jornalístico, dizia que era arriscado e que eu trabalhava demais. As coisas pioraram depois daquele atentado que você já sabe, porque logo depois nasceram as meninas. Ela dizia que eu as colocava em risco. As brigas também eram constantes, mas a máxima foi ter me jogar em uma nova investigação depois de ter dito que não faria mais. Eu tentei fazer tudo escondido, mas ela descobriu - seus olhos encheram de lágrimas - e pediu a separação. Ela... ela disse que eu nunca mais veria as nossas filhas. Foi aí que eu fiz a maior loucura da minha vida.
- O que você fez? - Fiquei com medo da resposta.
- Eu... eu... Patrícia, na época parecia a minha única saída. A Camila pediu a separação, meus pais ficariam do lado dela e a minha vida seria um inferno. Pensei que um afastamento das minhas filhas as faria me odiar no futuro, foi o que mais temi. Então, eu fugi com a Marina.
- Como assim fugiu?
- Eu peguei a Marina de madrugada e nunca mais voltei. Eu queria reconstruir a minha vida, com uma lembrança dela. Eu só não levei as duas porque a Diana estava com febre e achei justo deixar uma com ela. Patrícia, eu era tão imatura. Na minha cabeça era o certo, mesmo sabendo no fundo que era errado. Eu pensei esses anos todos em voltar, mas nunca tive coragem. Como me arrependo.
Ela começou a chorar e eu não segurei algumas lágrimas. É complicado escutar os absurdos e ao mesmo tempo sentir sua dor. A Laura que eu conheci era centrada e correta, jamais faria uma besteira como aquela. Porém, Laura é muito mais complicada do que eu pensei. Ela não só omitiu de mim tudo sobre a sua vida, como também cometeu um crime. Mas a Laura que ela estava falando era do passado e o passado de todo mundo pode ter manchas.
- Eu viveria até agora escondida se não acontecesse o que aconteceu ontem.
Mais está por vir. Não dará tempo nem de refletir mais sobre o assunto.
- O que aconteceu, meu amor?
- Lembra do dia que eu fui te buscar no aeroporto? - Confirmei com a cabeça. - A Marina conheceu a Diana no banheiro. Elas trocaram de lugar e a Diana veio parar aqui em casa. Esses dias todos eu estive com a Diana, é por isso que ela agia de forma estranha.
- Que loucura, amor!
- Sim. A Marina foi para o Rio e descobriu tudo. Todo o passado. Descobriu o que eu fiz. Ontem a Camila esteve aqui e levou a Diana para o Rio.
- E trouxe a Marina?
- Não... ela levou as minhas filhas. Eu nunca mais verei as meninas.
Ela se jogou para trás e recomeçou a chorar. Parecia que ela sentia uma dor insuportável. Eu tentava refletir sobre tudo o que tinha ouvido, mas eu só sentia compaixão pela Laura.
- Ei, calma. Não adianta se entregar ao desespero.
Ela se sentou ao meu lado e fez um carinho no meu rosto.
- Eu sou um monstro. Desculpa.
- Não, Laura! Claro que não! Não fale assim de você mesma.
- Eu destruí a vida de todo mundo, inclusive das minhas filhas. Patrícia, afaste-se de mim enquanto eu ainda não destruí a sua vida.
- Não diga uma coisa dessas. Você errou, errou muito. Errou como só uma pessoa desesperada pode errar. Mas na época você era imatura, eu nunca vou te julgar por isso. Eu sei que no fundo você só agiu por desespero. O que me interessa é a Laura de hoje, a Laura que eu conheço.
- Mas eu tenho esse passado, Patrícia. Esse passado sou eu também.
- Você se arrepende, não é?
- Muito.
- Desde os nossos primeiros contatos eu sabia que tinha acontecido alguma coisa que você se envergonhava de dizer. Você nunca falou nada sobre o seu passado, justamente porque se sente culpada. Você poderia simplesmente me colocar para fora da sua vida sem nenhuma explicação, mas teve coragem de me contar tudo isso. Acho que querendo ou não me tornei alguém importante para você, e por isso não vou me afastar. Não vou te abandonar no momento que você mais vai precisar de ajuda na sua vida.
Laura me abraçou apertado.
- Patrícia, não. Eu não te farei feliz.
- Laura...
- Eu não estou à altura do seu amor.
- Laura...
- Você sabe, eu não sou completamente louca por você.
- Você não foi completamente louca pela Camila e deu tudo errado? Eu nunca entendi esses amores loucos. O meu jeito é esse, amar na medida certa.
- Você tem certeza?
- Que eu te amo? Absoluta. Mas eu não vou ficar com você apenas por amor. Se eu ver que você não mudou, não vou ficar do seu lado. Só vou ficar porque eu tenho certeza que hoje você é uma pessoa diferente.
- Eu mudei de verdade. Desculpa, agora eu vejo que eu tentei te afastar de todas as formas todo esse tempo porque eu tive medo do seu amor. Eu vou fazer valer a nossa relação, Patrícia.
Sorri.
- Você pode consertar as coisas. Primeiro precisa conversar com as suas filhas.
- A Camila nunca vai permitir isso. Se eu me aproximar delas, serei incriminada por sequestro de menor.
- Céus! Laura, ela não pode fazer isso.
- Não só pode como fará. Eu nunca mais verei minhas meninas.
- Vamos dar um jeito, Laura.
- Patrícia, não tem jeito.
Abracei e beijei seus lábios com carinho.
- Eu vou ficar do seu lado, vou te proteger e serei seu ombro para essa grande batalha.
- Não se preocupe com isso, você não precisa carregar uma cruz que não é sua.
- Eu te amo, você até agora não entendeu isso?
- Eu também te amo. Obrigada por me ouvir e não me julgar.
Laura precisa de meus carinhos e cuidado.
Camila
Entrei no meu quarto e vi a cena que eu esperei por anos. As minhas filhas estão juntas e abraçadas. Fiquei em silêncio admirando o momento até elas se separaram.
- Bom dia, meus amores - sorri para elas.
- Bom dia, mamãe.
Apenas a Diana respondeu. Marina olhava para suas próprias mãos, ali tive a certeza de que não será fácil uma aproximação.
- Dormiram bem?
- Sim - Diana respondeu novamente.
- Marina? Está tudo bem?
- Você mentiu para mim.
- Calma, nós vamos conversar. Eu vou explicar tudo e você vai me entender.
- Mãe, a Marina já me contou tudo. Por que você escondeu que eu tinha outra mãe? - Diana perguntou-me.
- Bom, - sentei-me de frente para elas - eu e a Laura fomos casadas, mas não deu certo a nossa união.
- Por que não? - foi Diana que perguntou novamente.
- Porque a Laura trabalhava muito, a gente brigava sempre e resolvi que seria melhor a separação. Coisas de adultos.
- Você resolveu separar a gente também? - Diana voltava a perguntar.
- NÃO! Nunca. Eu jamais faria isso. Foi a Laura que não aceitou muito bem a separação e levou a Marina com ela. Eu jamais permitiria uma loucura dessas. Nunca compartilhei dessa ideia. É complicado filhas, às vezes nem eu consigo entender.
- A Marina vai morar aqui com a gente?
- Vai - sorri emocionada segurando as lágrimas. - A Marina vai morar aqui como sempre deveria ter sido.
Finalmente Marina olhou para mim e perguntou:
- E a minha mãe?
Lembrei da Vero pedindo para que eu ponderasse as palavras quando falasse da Laura.
- A Laura, meu anjo, fez uma coisa muito grave levando você para longe. Ela fez a escolha errada e te tirou de mim. Por isso eu decidi que o melhor é você viver aqui comigo. Nós precisamos reencontrar o nosso laço de mãe e filha perdido. Quero te conhecer, te dar todo o carinho que guardei, ver você crescer...
- NÃO! EU QUERO A MINHA MÃE!
- Marina, não faz assim. Eu também sou sua mãe.
- VOCÊ NÃO É A MINHA MÃE. A MINHA MÃE É A LAURA! VOCÊ PODE REPETIR MIL VEZES QUE É A MINHA MÃE QUE EU VOU REPETIR DEZ MIL VEZES QUE A MINHA MÃE É E SEMPRE SERÁ A LAURA.
Ela se levantou nervosa da cama.
- Marina, calma - foi Diana quem pediu.
- Calma nada. Diana, você conheceu a minha mãe, sabe que ela é a melhor mãe do mundo. A Camila que não gosta mais dela e não quer ela por perto.
A melhor mãe do mundo? A Laura? Por que a Marina está invertendo as coisas?
- Não é nada disso! Eu sei o que é melhor para vocês.
Comecei a perder o controle.
- Você não sabe nada. EU QUERO A MINHA MÃE. Por favor, Camila, vamos voltar tudo como era antes, eu prefiro viver com a minha mãe.
- Você só está assustada e com medo de mim. Eu sou sua mãe, não tem o que temer, não foi legal esses dias aqui em casa?
- Foi, mas eu prefiro voltar para casa.
Nem tive tempo de responder pois Verônica entrou no quarto e a Marina correu para o lado dela.
- Tia Vero, eu quero a minha mãe.
- Calma, coisinha linda. - Vero olhou para mim - Cah, deixe-me conversar com elas.
Concordei com a cabeça e quando passei por ela, a escutei sussurrar:
- Você desse jeito nunca vai conseguir o amor da Marina.
Segui em frente. Estou arrasada com a reação da Marina. Eu achei que ela ia me agradecer por ter a resgatado da louca da Laura.
Verônica
- A mamãe de vocês está um pouco nervosa por causa dos últimos acontecimentos, relevem.
- Tia Vero, eu nunca mais vou ver a minha mãe? - Marina estava desesperada.
- Vai sim. Dê só um tempo para a Camila, ela sofreu muito com a sua ausência.
- A Camila falou que elas brigavam muito, é verdade? - Diana perguntou.
- Ah sim. A Laura não é fácil, não é? Tem um gênio difícil que lembra muito alguém - olhei para a Marina.
Ela sorriu. Marina admira a mãe e gosta da ideia de ser parecida com ela.
- Está tudo bem com você, Di?
- Sim, só é muita informação. A Laura é a minha outra mãe, minha mãe gosta de meninas como você e eu agora tenho uma irmã.
Eu e a Camila preocupadas com a Marina, mas a Diana também tinha as suas dúvidas.
- Parece ser complicado, mas depois você se acostuma.
Ela balançou a cabeça sorrindo. Para nossa sorte, Diana é fácil de lidar. Compreensiva e amorosa, lembra muito a Camila quando criança.
- Como foi sua estadia em São Paulo?
- Foi muuuuuuito legal! Tirando o sufoco que foi ter que me passar pela Marina, é claro. A Laura, a namorada dela e o tio Sérgio são muito legais.
A informação que me apeguei foi surpreendente.
- Namorada, é? Que interessante. Há quanto tempo elas estão juntas?
- Depois de uns meses que cheguei para morar em São Paulo, elas começaram a namorar. - Marina respondeu com tédio.
- É, mas elas agora estão morando juntas. Ela é muito legal, tia. - Diana como sempre achando tudo lindo.
- Eu não acho - Marina deu de ombros.
- Você implica com ela só porque ela namora a nossa mãe.
"A nossa mãe"? A Diana se adapta rapidamente as mudanças mesmo.
- Ei, não precisam brigar. Vamos tomar café da manhã porque saco vazio não para em pé.
- Não quero - Marina se deitou na cama.
- Você não precisa descer se não quiser, eu trago alguma coisa para você daqui a pouco.
- Tia, conversa com a Camila, por favor. Me leva para casa.
Fiquei de coração partido com o pedido que eu sabia que seria difícil de atender tão rápido como ela quer.
- Eu vou conversar com ela, meu bem, agora descansa.
Desci apenas com a Diana. Não estava sendo fácil para a Marina. Será um longo trabalho pela frente.
Laura
Minha vontade é de morrer. As palavras da Camila ecoam dentro da minha cabeça a todo instante. "Você jogou fora as pessoas que te amavam". "Só te restou uma filha que você arrancou na calada da noite". "Eu quero que você morra afogada com as suas próprias lágrimas".
Minha maior preocupação são as minhas filhas. Hipocrisia para quem fugiu apenas com uma, talvez. Mas sou mãe. Conhecendo bem a Marina como conheço, ela deve estar com raiva do mundo. Meu coração está amassado de tão apertado. Eu sentia que ela precisava de mim. Pior que nunca terei a chance de conhecer direito a Diana.
Patrícia está deitada comigo. Faz carinho, beija-me, olha em meus olhos passando firmeza. Não possui um olhar de pena, parece mais um olhar de cumplicidade, procura entender o meu lado. Ela é realmente apaixonada por mim, muito mais do que eu previa. Não era justo eu mantê-la ao meu lado com tantos problemas, mas eu sei que sua presença poderá ser importante. Suas atitudes estão fazendo com que eu tenha um sentimento maior e mais carinho por ela.
- Está muito gostosa essa cama, mas vamos tomar um banho? Vou preparar a banheira com sais relaxantes para você.
- Eu prefiro ficar aqui.
- Uma hora você vai ter que levantar-se dessa cama, que comece agora.
Minha namorada se levantou e foi na direção do banheiro.
10 minutos depois ela apareceu e me tirou da cama a força. Tirou as minhas roupas e depois as dela. Me fez deitar na banheira e em seguida entrou por trás.
- Está boa a água?
- Sim, mas você atrapalhou meus planos de me afogar ficando aqui comigo.
- Não fala besteira, Laura. Pode tirar esses pensamentos suicidas da cabeça. Está na hora de você ao menos tentar consertar os erros. Você fugiu, não adiantou. Atentar contra a própria vida não vai ser a solução.
- Você é maravilhosa, sabia?
- Faça isso pelas suas filhas.
Tomei seus lábios para um beijo. Ficamos um bom tempo em silêncio, aquela água parecia realmente relaxar e eu estava ficando mais calma.
...
- Vamos sair.
- Ah não...
- Você não queria entrar e agora não quer sair?
Saí pela insistência e a Patrícia passou a me enxugar.
- Você prefere Patrícia ou Pati? - Perguntei.
- Você eu prefiro que continue me chamando de Patrícia.
- Por quê?
- Porque você é a única pessoa que me chama assim.
- A única?
- Sim, todo mundo me chama de Pati. Eu adoro essa sua aversão a apelidos. Né, Lala?
Consegui soltar uma pequena risada. Não me canso de pensar que Patrícia é realmente maravilhosa.
- Nem pense em me chamar assim, Patrícia Layola.
- Vamos tomar café da manhã.
- Não tenho fome.
- Não perguntei se está com fome. Vamos botar alguma coisa no estômago, já passam das 14 horas.
Desci as escadas e o Sérgio nos aguardava ansiosamente.
- Está tudo bem?
- Não - respondi desanimada.
- Pati?
- Está sim, fique tranquilo.
Eu conheço o Sérgio, ele não estava satisfeito com aquela resposta.
- Ele quer saber se depois de eu ter contado tudo você ainda continuará comigo.
- É claro que continuarei! - Patrícia foi enfática.
- Não era exatamente isso que eu queria saber, mas era - ele sorriu sem jeito.
- Obrigada, meu amigo. Obrigada por cuidar de mim ontem.
Nos abraçamos e ficamos assim por um tempo.
- Já que está tudo bem entre vocês, tenho que ir para a redação, já me ligaram até.
- É verdade. Você já deveria estar lá, deixei tudo no seu comando até hoje.
- Desculpa, chefa. Serei demitido?
- Dessa vez passa.
Demos risada e nos despedimos.
Camila
- Você não deveria ter levado o café da manhã para a Marina no quarto - disse nervosa à Verônica.
- Levei e vou levar quantas vezes ela quiser, até ela se sentir bem para descer e sentar-se na mesa com a gente. Você não está fazendo as coisas direito, Camila. A Marina nunca vai entender esse afastamento da mãe dela.
- E o que você sugere? Que eu deixe a Laura ficar com a Marina e a gente troca nas férias? Ou que eu entregue as duas para viver com ela como prêmio pela besteira? Dar chance para ela fugir de novo, só que com as duas agora?
- Você está querendo se vingar dela!
- Não, Vero. Eu estou protegendo as minhas filhas.
- Protegendo da própria mãe delas? A Diana adorou a Laura e a Marina tem um verdadeiro fascínio por ela.
- Ela vai gostar de mim também, eu só preciso de um tempo para mostrar à ela quem é a verdadeira Laura.
- Ela não vai gostar de você se continuar agindo desse jeito. Deixe pelo menos a Laura visitar as meninas de vez em quando. Além disso, ela não vai sossegar e vai correr atrás das filhas.
- Ela não vai correr atrás.
- Como pode ter tanta certeza?
- Deixei bem claro que se ela fizer isso vou colocá-la a justiça por sequestro de menor.
- Ca... Camila, você não está fazendo isso porque ela seguiu com a vida dela, está? Você ainda gosta dela?
- Como? Como ela seguiu com a vida dela?
- As meninas disseram que ela tem uma namorada. Parece que tem quase um ano de namoro.
Como assim namorada? Como aquela vagabunda tem coragem de enterrar a nossa história tão fácil assim?
Tentei disfarçar o meu espanto, mas foi em vão. Atônica, voltei a questionar:
- A Laura está namorando? Ela refez a vida dela?
- Está, achei que soubesse.
- Deve ser uma desequilibrada como ela.
- Você não respondeu... você ainda gosta dela?
- Claro que não! Laura para mim está morta e enterrada.
- Camila, não fala assim.
- Por que você não está do meu lado?
- Eu estou do lado das minhas sobrinhas. O melhor para elas é vocês acharem a melhor maneira de conviver sem prejudicá-las.
Enquanto eu chorava pela Laura aqui, ela se entregava à outra e Verônica ainda quer que eu conviva com isso. Nunca acontecerá.
Fim do capítulo
Algumas revelações sobre a Laura.
A Patrícia apoiando-a.
A Marina não aceita a Camila como mãe.
Camila entre ódio e amor pela Laura.
E agora?
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mtereza
Em: 30/07/2017
Depois de tudo que ela fez a Laura ainda vai sai de vítima é a Camila que será a vilã todo mundo está não me espanto nada que se a Diana escolha ficar com a Laura junto com a Marina que não dar uma única chance a sua outra mãe pelo jeito a Camila vai ser responsabilizada por todos os erros da Laura já que nem raiva e magoa de ter sido privada da presença da filha durante nove anos ela tem direito de ter.
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NovaAqui
Em: 27/07/2017
Agora é hora da Laura correr atrás e fazer valer seu direito de mãe. Sem joguinho, apelação ou querer fugir. Já dei , Laura, haja como uma mulher adulta e que tem que consertar a merda que fez no passado
Camila, vamos pensar nas meninas. Depois você pensa na sua ex
Abraços fraternos procê!
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