Estou concentrada prestando atenção na explicação do professor Luís, quando escuto batidas na porta da sala. Olho na direção da porta e vejo dois veteranos, eles cumprimentam o professor, pedem desculpas por atrapalhar a aula e perguntam se podem dar um lembrete para a turma. Logo após o professor liberar, os dois viram-se para nós.

-           Bom dia bichos, digo, calouros! - Começa falando um rapaz loirinho de olhos azuis. Até que bem bonito.

  Respondemos o cumprimento e ele prossegue.

 -          Meu nome é Oliver e essa aqui é a Augustine. - Ele diz e a moça que está ao seu lado acena com a mão. - Bem, somos os veteranos de vocês e estamos aqui para lembrá-los de algo muito importante. Alguém têm algum palpite? - Todos balançam a cabeça em negativa.

-           Está vendo Augustine, como que pode eles não terem ideia de algo tão importante? - Continua ele em tom de gracejo.

-           Inacreditável mesmo Oli. - Se pronuncia a moça que também era loira e bonita. - Mas viemos tirá-los nesta inércia. O assunto super importante que temos que tratar com vocês refere-se a... FESTA! - Gritaram juntos. - Nossas boas vindas pra vocês, para ser mais específica. - Finaliza ela.

-           E não é qualquer festa. É a festa! Sim, não sou modesto. Todos no campus sabem que as melhores são as nossas. - Explica Oliver com um sorriso de orelha a orelha.

-           Sim, somos os melhores. - Repete orgulhosamente a loirinha. - Então é isso pessoal, não vamos mais atrapalhar a aula de vocês. Estão todos convidados, ou melhor, intimados, para comparecer nesta sexta-feira às 22h à nossa confraternização. - Finaliza Augustine.

-           Obrigada professor. Obrigada a todos pela atenção e até sexta-feira, bichos. - Diz Oliver sorrindo. Logo após, os dois se despedem e saem.

Nossa, eu até tinha esquecido que teríamos uma festa. Depois da saída dos dois, os alunos ficaram alvoroçados. A conversa era generalizada, até o professor pedir atenção e dizer pra guardarmos as energias para a tal confraternização.

-           E aí Gabi, animada para festa? - Tomas me pergunta assim que o professor finaliza a aula.

-           Claro que sim Tom, amo festas. E, além do mais, estou precisando me distrair de umas coisas aí. - Respondo sorrindo.

-           Bem, também estou muito animado. Então assim, sei que essas confraternizações não precisam de par, mas… será que você me daria a honra de ser o meu? - Ele finaliza tão baixo, que quase não escuto a última parte.

-           Tenho certeza que não é obrigatório um par, porém, aceito ir como sua acompanhante Tom. Será um prazer, afinal já somos amigos não é? - Ele me sorri, de um jeito, ao mesmo tempo, feliz e decepcionado. E confirma com a cabeça.

-           Sim, claro que somos. Como faremos? Quer que  a busque ou nos encontramos na festa? - Pergunta ele, aparentemente já com o bom humor habitual de volta.

-           Bem cavalheiro, para fazermos as coisas como manda o figurino, creio que o senhor deva me buscar. - Gracejo.

-           Certamente que sim, senhorita, tem toda razão. Estarei às 21:30h, te esperando, em frente a seus aposentos com a minha carruagem. - Comenta ele sorrindo.

-           Perfeito, seu bobo! Almoça comigo?

-           Só se for agora.

Seguimos conversando e sorrindo até o restaurante. É impressionante como tudo fica leve com o Tom. Ele é uma companhia super agradável, os assuntos fluem naturalmente com ele. Fizemos nossos pedidos e nos sentamos. Entre uma risada e outra, meu sorriso morre, de repente, quando olho para mesa em frente a nossa e me deparo com Eloise, sentada distraída lendo algo, de frente para mim.

Como que por uma força invisível nossos olhares se encontram. Tento desviar mas não consigo. Meus olhos parecem que são atraídos pelo dela como um imã. Ela me olha com tanta intensidade que parece querer enxergar muito além do que os olhos podem ver.

-           Ei Gabi, o que foi? Você está pálida, até parece que viu uma fantasma. - Tom fala, me trazendo de volta a conversa.

-           Bobo. Não foi nada, apenas me distrai. Me desculpa. - Digo e tento forçar um sorriso.

-           Tudo bem, se não quer contar não conta. - Ele se vira e enxerga Eloise. - Espero que não tenha ficado assim por causa da professora. Sabe Gabi, pode não parecer, mas ela é uma boa pessoa. Meu irmão já teve aula com ela e me falou algumas coisas. Ou melhor, contou um pouco da história dela.

-           Mesmo? E o que ele contou para que você chegasse a conclusão de taxá-la de uma boa pessoa? - Respondo sem demonstrar muito interesse, porém, super curiosa pelo que ele tinha a dizer.

-           Vou te contar e você tira suas próprias conclusões.

Tom começa a me contar e eu simplesmente não consigo acompanhar . Eloise foi casada, com uma mulher e a perdeu em tão pouco tempo de casamento. Enquanto tento digerir essas informações, olho para a outra mesa e ela não está mais lá. Não sei o que pensar a não ser, como ela deve ter sofrido. Como é doloroso perder alguém querido. Então essa é a razão do sofrimento que vejo em seus olhos. Ela amava sua esposa e a perdeu sem nada poder fazer.

-           O que você me diz Gabi? – Ele me pergunta.

-           Nossa. Eu estou… não sei nem o que dizer. Tem certeza que essa história é verdadeira Tom? - Sussurro, ainda tentando me recuperar.

-           Tenho certeza, claro. Meu irmão conheceu as duas.

-           Entendi. Cara, que barra que ela deve ter passado.

-           Pois é, pelo o que ele falou, ela sofreu e ainda sofre muito. Disse que o amor delas era admirado por todos. E então, ainda acha que ela é uma pessoa ruim?

-           Já disse que não sei o que achar Tom. Não é nem justo tentar dizer que imagino o que ela sentiu e sente, porque a dor dela, só ela é capaz de mensurar. Entretanto, não acho justo ficar descontando seu sofrimento nos outros. - Me altero, e nem aos menos entendo o porque.

-           Nisso você tem razão. Não tem que descontar em ninguém, até porque, ninguém tem culpa. Porém, ela merece um desconto vai… - Completa ele com uma carinha fofa.

-           Sim, merece.

Depois dessas revelações nos despedimos e eu sigo pra casa envolta em pensamentos. Eloise é lésbica! Foi casada! Não sei ao certo o motivo te ter me chocado tanto com essas informações, só sei que me deixaram mais confusa do que  já estava.

Eloise

Acabo a minha aula e vou almoçar na cantina, hoje sem meu fiel escudeiro Nicolas. Faço o meu pedido, depois de recebê-lo me sento na mesma mesa de sempre. Enquanto tento revezar entre a refeição e a leitura, sinto alguém me olhando, levanto meus olhos e lá está ela. Gabriela. Sentada na mesa à minha frente, acompanhada por outro aluno, Tomas, se não me engano. Não sei porque seu olhar me atrai, quanto mais eu olho, mais quero olhá-la. Nos encaramos até que ela foi chamada à atenção pelo acompanhante e, então, voltou seu olhar para ele. Não sei definir quanto tempo fiquei parada os observando. Conversando tão intimamente. Será que são namorados?! Não, não pode ser, acabaram de se conhecer. E também o que isso me importa?! Resolvo ir embora, definitivamente, não sei porque, mas aquela cena não estava me agradando nem um pouco.

  Chego em casa, tomo um banho, alimento o Black, coloco uma música suave e me deito no sofá.

-           Ah Claire, como sinto sua falta, meu amor. – Mais uma vez meus pensamentos me levam até o meu amor.

Disperso essa lembrança e busco pensar em outra coisa. Me lembro do alvoroço de mais cedo, quando os calouros foram avisados da data da confraternização. Há uns três anos atrás, estaria tão empolgada quanto eles. Tudo fazia sentido quando eu tinha você, meu amor. Agora sou obrigada a comparecer como responsável pelo curso e tenho que ver a felicidade estampada nos rostos dos alunos. Não que eu me incomode com a felicidade alheia... apenas machuca, por me lembrar que não tenho mais a minha.

Gabriela

Aqui estou eu na quarta loja consecutiva tentando  escolher um vestido para a confraternização. Na dúvida, o pretinho básico  sempre nos salva, pego um e me encaminho ao provador. Com tantas portas disponíveis, eu tinha que escolher justo uma que não estava trancada, porém, ocupada. Gabriela, sendo Gabriela.

-           Oh, me desculpe senhora, eu não vi que a cabine estava ocupada. - Tento me desculpar, constrangida, olho para o chão, logo após entrar na cabine e dar de cara com uma ruiva de lingerie. Pera, uma ruiva?!

-           Mas só pode ser perseguição! Até aqui  sou obrigada a dar de cara com você brasileira? - Essa voz... Meus olhos percorrem o corpo dela, me deparo com uma calcinha preta de renda e um sutiã também preto e de renda. Sinto um frio estranho em meu estômago e, ao mesmo tempo, um calor em meu corpo. Paro alguns segundos para pensar nisso, me dou conta da situação e subo meu olhar até encontrar o seu.

-           Nossa! - Sim, foi a primeira palavra que saiu da minha boca, sem que eu pudesse controlar.  Seus olhos brilhavam, indecifráveis, eu sentia que eles me convidavam e ao mesmo tempo me fuzilavam. Convidavam para que, Gabriela? Tá louca?! - Digo, já me desculpei, ok? E quer saber mais, não posso fazer nada se a senhora não teve a menor preocupação de travar a porta. Estava era querendo ser pega neste estado. - Falo e aponto para o corpo dela, mais uma vez me perco naquele corpo e sinto o meu cada vez mais quente. - Que mulherzinha antipática. – Falo, tentando abstrair.

-           Acontece que eu não imaginei que  com tantos provadores vazios, alguém iria entrar justamente no que eu estou, que por sinal, estava com a porta encostada. Mas claro que isso funcionaria com qualquer pessoa, menos com a brasileira. - Reviro meus olhos depois de ouvi-la. E juro que vi o resquício de um sorriso no rosto dela.

-           Pois não tinha que imaginar nada, mesmo. Tinha era que ter se precavido. E como não o fez, aqui estou eu. - Gracejo.

-           Ainda é abusada. Vai ficar ai parada me olhando? - Provoco e me arrependo logo em seguida, ao me deparar com seus olhos. Percebo ela levantar a sua sobrancelha como que em desafio.

-           É, acho que vou, até que a visão não é das piores. - Ela estreita os olhos e me olha intensamente. Deve ser agora que ela me dá um nocaute, ai minha cara até que é bonitinha demais para ficar amassada.

-           Mesmo? Gostou do que está vendo? - Ela diz provocante.

-           Ah… prendo o fôlego. - Antes que eu pudesse responder, chega uma vendedora pedindo mil desculpas e me encaminha a outro provador. - O que foi aquilo God? Respira Gabriela, respira!

Saio da loja e não encontro mais Eloise. Estou até agora sem entender o que se passou naquele provador.

Eloise

Depois que Gabriela virou as costas me dei conta da loucura que fiz. Eu estava flertando com ela?! Entrando no joguinho perigoso dela?! Sim, foi exatamente isso que aconteceu. Tentei responder a altura e acabou que  extrapolei. Ah Eloise, não deixa essa abusada te fazer perder a razão.

Finalmente o dia da tal confraternização chegou. Não que eu estivesse ansiosa, porém,  quero me livrar de uma vez por todas dessa obrigação. Os alunos estão começando a chegar. Alguns já estão até alegres demais pro meu gosto. Me distraio olhando para uns garotos tomando tequila como se estivessem bebendo água, quando olho para entrada e a vejo chegando acompanhada. Gabriela e Tomás, de braços dados. - Ela está tão… linda. -  Minha mente me traí e não consigo controlar esse pensamento. Nossos olhares se encontram e parece que o tempo para. - Se concentre Eloise, pare de olhar para ela. Antes que meu olhar consiga desviar do dela, eles já estão parados na minha frente.

-           Boa noite professora Eloise.

-           Boa noite Tomás. Não estamos em sala, então sem o professora. - Respondo sorrindo.

-           Ok, Eloise. - Ele diz e me devolve o sorriso.

-           Boa noite! - Gabriela enfim, se pronuncia.

-           Boa noite Gabriela. - Respondo tentando não descer meus olhos pelo corpo dela, mas sem sucesso. Ela está com um vestido de mangas três quartos, colado em seu corpo e que cobria uma parte mínima de suas pernas. E que pernas! Para de pensar nas pernas dela, Eloise. - Espero que vocês aproveitem a festa, com  licença. - Finalizo e saio o mais rápido possível dali. O que está acontecendo comigo?! Por que meu corpo está reagindo a presença dessa menina?!

A noite chega sem maiores problemas, a  não ser, é claro, pela senhorita Gabriela que está tentando acabar com as bebidas da festa.  Tomás parece estar se aproveitando da situação. Sempre que pode arruma um jeito de tocá-la. - Olha para outro lugar Eloise, esquece essa garota. Droga, não consigo, por que dançar tão colados?! Ele precisa mesmo se esfregar desse jeito nela?! Por que ela está olhando para mim?! Não aguento mais essa situação.

Resolvo ir ao banheiro para lavar meu rosto e tentar clarear minhas ideias. Olho para o espelho e lá está ela, encostada na porta, bem atrás de mim.

-           Gabriela você está…

Antes que consiga concluir sinto seu corpo me prenssado contra a parede, suas mãos apertando a minha cintura e sua boca colada a minha.

Fim do capítulo