@mor.com por Carla Gentil
Capítulo 12
Laura tinha seguido Sam pelo saguão do aeroporto envolta em sentimentos paradoxais. Por um lado a surpresa e o inusitado de vê-la ali, a fazia duvidar que fosse ela mesma. Entretanto, o disparar de seu coração e uma emoção tão profundas que chegava a se parecer com dor, lhe dava certeza: outra pessoa não faria suas pernas, sua percepção, sua respiração se moverem por instinto, focada, concentrada, atraída.
Mas o fato de saber que estava assim tão próxima não a tinha preparado de jeito nenhum para a explosão de sentimentos que a soterraram ao tocar, ao se deparar com os olhos que se prenderam aos seus, à voz que cintilou e que morreu no ar, como que sugada por um buraco negro que também as atraia, numa força da qual nem uma nem outra conseguia ou pensava em querer sair.
- Senhora... – a atendente da companhia tentava chamar a atenção de Sam, que enfim olhou para ela sem, no entanto, vê-la. No momento, usava todos os seus sentidos, razão e emoção para outra pessoa. – Por favor, precisamos concluir aqui para a senhora poder embarcar.
- Por acaso... Você estava pensando em ir a algum lugar? – Laura perguntou, atraindo com facilidade os olhos verdes fascinados, confusos, brilhantes, para si.
- Eu... Ahn... Como é que você...?
- Senhora... – novamente interveio a atendente. – Realmente precisamos...
- Ela não vai mais... – Laura interrompeu. - Não é? – perguntou para Sam.
- Não...? – repetiu distraída. – Eu vou... Ver você... – falou sem firmeza, sem pensar, mais em resposta ao que tinha se dito desde que resolvera viajar: veria Laura.
De repente se deu conta de que Laura estava à sua frente. Não conseguia conceber como... Mas era fato. Ela estava ali, discutindo com a atendente que insistia em atrapalhar. E por mais incrível que pudesse parecer, era ela mesma!
Não sabia como, não entendia... Porém não desejava mudar nada. Era o momento perfeito, Laura estava à sua frente! O que poderia ser mais perfeito que isso?
A alegria, intensa, completa, como nunca tinha sido antes, invadiu Sam por inteiro, transbordando pelos seus olhos, no sorriso, no palpitar, no gesto instintivo de sua mão ao rosto de Laura.
- Então você veio...
- E como poderia não vir? Estava tão sozinha sem você...
Sam não respondeu, não com palavras. Deixou seus braços envolverem o corpo de Laura, num gesto reflexivo, que dava e recebia ao mesmo tempo. Uma troca de calor, de sons, de emoção, que por ser o primeiro, sabiam que seria inesquecível e, portanto, eterno.
Sem nem se dar conta do que faziam, Sam pegou de volta suas malas e abraçada à Laura, caminhou até a saída, onde pegaram um taxi.
Se Sam tivesse se lembrado que havia ido de carro ao aeroporto, se tivesse voltado pelo mesmo caminho que entrou, talvez cruzasse com Arthur, que caminhava rapidamente para o interior do aeroporto, procurando no telão informações sobre o voo para Madri. Teve tempo de ver a aeronave subindo:
- Maldição!
***
Não falaram absolutamente nada no percurso até o apartamento de Sam. O taxista, como a maioria deles, até tentou puxar assunto. Reclamou dos turistas, da “catinga” do mangue, mas não conseguiu uma palavra sequer daquelas mulheres que só se olhavam. Se devoravam com os olhos. Acabou resmungando uma coisa qualquer e seguiu também em silêncio.
Quando entraram no prédio, o porteiro brincou com Sam:
- Viagem rápida! – e depois, estranhando, perguntou: – Você bateu o carro?
- Hum? Ah, o carro! Outra hora eu pego... – diante do pigarrear do porteiro, informou: - Esta é... Laura. Ela vai ficar em casa. E Luís... Eu continuo viajando, ok?
- Certo! Não está aqui quem viu você – falou com um sorriso cúmplice.
Em seu território, Sam recuperou um pouco da ação, pegou a mão de Laura, que quieta, porém sorrindo, aceitou a condução de Sam.
Quando entraram no apartamento, Laura correu os olhos ao redor. Desde que chegara, era a primeira vez que sua atenção se desviava de Sam. Isto porque se tratava do espaço dela. Com muito a dizer de sua moradora. E Laura queria saber tudo. Era tão diferente do seu próprio apartamento. Uma sala bastante ampla, mas com poucos móveis, uma porta que dava para uma pequena área, um sofá branco ultra confortável, tapete e cortina claros, piso de madeira, mesinha de centro baixa, algumas fotos em preto e branco espalhadas.
Sam esperava em expectativa algum comentário, sentia-se avaliada.
- Lugarzinho limpinho! Dá a impressão que quem mora aqui é um gatinho branco que vive se banhando – Laura brincou.
- O gato é amarelo. Serve? – Sam respondeu no mesmo tom.
Como que por encanto, sentiram-se à vontade uma com a outra. O silêncio que reinara até então não era de timidez, constrangimento... Mas sim de reconhecimento, contemplação.
Ambas sorriram, cúmplices como se sentiam.
- Você quer... Tomar um banho? – Sam perguntou de repente.
- Oh! Estou fedendo?? – Laura puxou sua camisa branca para cheirar por dentro. – Eu tinha planos, sabe? Ia chegar na cidade, tomar banho, ficar cheirosa, penteada, maquiada e ia comprar uma lasanha para você. Mas, se não fosse um anjo pelado, sei lá, talvez Cupido me gritar para olhar para trás, eu iria dar com a cara na porta! - Laura falava rápido, ainda se cheirando. Só então Sam se deu conta que elas quase se desencontraram.
- O que deu na sua cabeça para vir de surpresa?
- Eu... percebi que não queria estar em outro lugar no mundo além de ao seu lado – Laura olhava para Sam, tentando perceber na reação dela, se o sentimento era mútuo.
- Eu ia te fazer uma surpresa também. Estava morrendo de medo de chegar lá e... Encontrar aquelas espanholas salientes na sua casa. Talvez eu te ligasse do aeroporto, estava em dúvida ainda.
- Não ia ter nenhuma espanhola em casa. Ou talvez tivesse... – Laura fez um ar pensativo, viu um olhar apertado em Sam e emendou - Eu já me sinto meio espanhola às vezes. Sem contar que é minha ascendência.
- Palhaça! – Sam falou espontaneamente. Causando um efeito devastador em Laura. Mais do que uma palavra romântica poderia causar.
A emoção de Laura transpareceu em seu olhar, no tom do azul, no gesto de seus lábios...
- Eu poderia te olhar para o resto da vida, sabia? – Sam pensou alto, embevecida.
- Eu também poderia te olhar para o resto da vida, mas tem tantas outras coisas que gostaria de fazer agora... – Laura respondeu no mesmo tom.
- Ah! – Sam corou. – Eu posso continuar te olhando outra hora, não tem pressa!
- Vou tomar meu banho – Laura falou ao acompanhar os pensamentos de Sam. Estava já no banheiro que Sam indicou, em seu quarto, quando voltou e pediu: - Por favor, não fuja, não pegue nenhum avião. Eu já volto...
- Não vou a lugar nenhum...
Diante do olhar que recebeu Laura se apressou. Sentiu uma labareda se acender em seu estômago e se espalhar por todo seu corpo.
- Já volto.
Sam sorriu. Sim, ela esperaria. Percebeu que havia esperado por vinte e cinco anos, não fugiria agora.
Havia se proposto a viajar para a Espanha não só para estar com Laura, mas para compreender que tipo de sentimentos a morena sentia por ela. E a resposta estava clara. Ela estava ali, somente para ela. Somente por ela: "não queria estar em outro lugar no mundo".
Abriu um vinho, levou duas taças para o terraço, onde se sentou no balcão, encostada na parede.
- Eu sei que gatos gostam de altura e só caem em pé, mas não é muito altinho para você estar sentada ai? – Laura já tinha saído do banho, vestia um roupão branco, os cabelos molhados soltos nas costas.
- Os terraços aqui são feitos para a pessoa cair. Olha aqui, se eu cair, vou só assustar meu vizinho de baixo. Perigoso mesmo é te ver vestida assim!
- Tem muito mais de onde veio isso! – Laura passou a mão pelo corpo, erguendo uma sobrancelha. – Que tipo de pensamento te deixa com este ar tão... Tão absolutamente encantador?
- Estava olhando esta lua, parece que faz um século que conversamos sobre ela.
- Verdade! – Laura também olhou para a lua. – Eu me senti tão ao seu lado só por olharmos para ela ao mesmo tempo.
- Eu senti a mesma coisa. E, por outro lado, senti uma falta terrível de você... Mas agora vem aqui, deixa eu ver se tomou banho direitinho, foi tão rápido!
Laura se aproximou, passou a mão por volta da cintura da loira e baixou o rosto na frente dela.
- Pode conferir!
Sam passou a mão pelo rosto de Laura suavemente, depois, segurando-a pelo queixo, deixou seus rostos a poucos centímetros de distância. Ficaram assim por um tempo, alguns segundos ou alguns séculos, quem estava contando, afinal?
Sam não tinha noção, mas seus olhos estavam de um verde intenso, refletia neles o brilho da lua-cheia. Seu ar de deslumbramento, o toque de sua mão no rosto. Laura estava perdida no encanto do momento, ainda mais quando Sam aspirou, muito perto de sua pele, provocando sentimentos inomináveis.
Aproximou seu rosto do de Sam, fecharam os olhos, ela segurou, com a mão que estava livre o rosto da loirinha, chegou ao seu ouvido e disse simplesmente:
- Te amo...
Sam encostou o rosto no de Laura e, imitando o gesto da outra, disse:
- Também te amo.
E enfim, o sentimento que até então elas não conseguiam definir, ganhou nome.
Uniram seus lábios, muito suavemente. Laura trouxe Sam mais para perto, abraçando-a. Sam dava beijinhos por toda a extensão dos lábios da morena. Aspiravam o perfume da outra, sentiam os sabores que há muito desejavam.
Aprofundaram o beijo, Sam tinha envolvido Laura com um dos braços, com a outra mão, acariciava os negros cabelos ainda úmidos.
O interfone tocou, mas não conseguiu acabar com a mágica que as tinha envolvido. Continuaram se beijando, se abraçando. Conheciam-se há algum tempo, sabiam como se provocar, conheciam a voz da outra, os tons, sabiam identificar os olhares. Agora estavam aprendendo a conhecer a temperatura, os batimentos do coração, estavam descobrindo que este contato físico tinha feito tanta falta!
- Tenho a sensação de ouvir sinos...
- Mas é só a campainha, vem comigo! – Sam pulou do balcão, puxando Laura consigo, para buscar a pizza que pediu quando Laura entrou no banho.
- Pelo jeito está com fome.
- Faminta! – a resposta voltou no mesmo tom de duplo sentido que tinha vindo a afirmação.
- Acho bom deixar a pizza pra depois, então!
- E... Você vai matar minha fome?
- Tenta me impedir... – falou já colada ao corpo que tão bem se encaixava ao seu.
Fim do capítulo
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Photographer_SP
Em: 17/05/2017
Meu, que coisa mais linda esse capítulo do aeroporto, uau!
Essas fotógrafas são apaixonantes!
Muito, muito obrigada!
Beijos
Monica Franca
Em: 17/05/2017
Tem mais hoje ??? rsrsrsrsrs
Acho que estou ficando viciada de novo.
Bjos
Resposta do autor:
tem sim, senhora! Só que mais tarde um cadim que agora to de saída pra bater perna por ai. Bjins!
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IzaHass
Em: 17/05/2017
Uau! Você limpou a cena do aeroporto... Adorei!! Minha aflição não despertada agradece hehe. Lindemais o (re)encontro dessas duas <3
P.s: Sou leitora assídua daqui, mas meu primeiro comentário foi teu primeiro feedback sobre "robô"... dia de estreia dupla pra mim :D Feliz por isso!
Resposta do autor:
acho que não limpei, tem mais uma cena de aeroporto, essa outra que é a 'sujinha'. :-P
Ok, fiquei mais orgulhosa ainda por ter merecido seu primeiro comentário *.*
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