Capítulo 36
O Jardim dos Anjos -- Capítulo 36
Alisson tamborilou os dedos na mesa, olhando fixamente para o envelope que tinha em mãos.
-- Depois eu vejo isso -- guardou o envelope na mochila e levantou-se para receber o primeiro paciente.
-- Alisson! -- Nádia parou ofegante, junto à porta entreaberta.
-- Nádia? -- a pediatra, olhou surpresa -- Você parece nervosa, aconteceu algo?
Nádia enrijeceu.
-- Precisamos conver...
-- Desculpa! -- Melissa falou, meio sem jeito, para as duas -- Eu trouxe o primeiro paciente.
-- Sem problemas, Melissa -- Alisson afastou-se do caminho para a mãe entrar com a criança no colo -- Bom dia, mamãe. Por favor, coloque a neném sobre a maca e tire toda a roupinha dela para que eu possa examiná-la -- Alisson voltou o olhar para Nádia -- É urgente?
Nádia balançou a cabeça. Era urgente. Era extremamente urgente. Alisson não fazia ideia, de como era urgente, porém, não era o momento. Respirou fundo para controlar o ímpeto e neutralizar a ansiedade que lhe secava a boca e queimava o peito.
-- Eu te espero em minha sala -- falou um pouco frustrada.
-- Tem certeza? -- Alisson perguntou, sorrindo de leve para ela.
-- Tenho. Pode ser na sua folga.
Alisson assentiu meneando a cabeça.
Nádia saiu do consultório de cabeça baixa e foi em direção ao corredor, arrasada, estava carregando peso maior que seus ombros aguentavam.
-- Meu Deus! -- ela sacudiu a cabeça, tentando organizar os pensamentos -- Como será difícil contar para ela...
Lorraine atravessou a sala e sentou-se no sofá. Pegou um copo com Whisky e com as mãos trêmulas examinou-o atentamente.
Lucia entrou na sala naquele momento e ficou olhando para ela com as sobrancelhas erguidas e a boca aberta.
-- Whisky puro -- Lorraine informou -- E não está envenenado, se é por isso que você está com essa cara de boboca.
-- Ah, tá! Que susto! -- murmurou Lucia, aliviada -- Achei que estivesse pensando em suicídio.
-- Imagina! -- Lorraine tranquilizou-a -- Estava pensando em jogar o copo na sua cabeça.
-- Meu Deus! Você estava mesmo pensando em atirar o copo em mim? -- repetiu Lucia, indignada.
-- Diz: duvida! - Lorraine levantou o copo no ar.
Lucia, encolheu-se.
-- Não duvido, doutora Lorraine, não duvido -- apressou-se em dizer.
-- Ah, bom. Então não me incomode mais -- nem o jeito desesperado e engraçado da empregada, foi capaz de animar Lorraine -- Quero ficar sozinha. Se é que você me entende?
Lucia girou nos calcanhares e saiu rapidinho sem dizer mais uma palavra.
Lorraine permaneceu sentada onde estava. Suspirou longamente, resignada, preparando-se psicologicamente para a difícil conversa que teria com Alisson. Esperava não prejudicá-la, jamais se perdoaria se isso acontecesse. Havia passado longos anos treinando a si mesma para fazer suas escolhas com bases racionais, e não sentimentais, e agora estava alí, novamente sentindo-se um farrapo humano.
Não resistiu ao impulso de abrir a bolsa e pegar o maldito anel de noivado. A peça de enorme valor monetário, mas sem nenhum valor sentimental, brilhou sob a luz da sala.
-- Eu juro por tudo o que é mais sagrado, juro, por mim, pela Alisson... -- Ela virou a mão, fazendo brilhar o diamante -- Eu vou fazer você engolir esse anel, Andras. Demore o tempo que for.
Nádia estava autorizando alguns exames, quando ouviu uma batida na porta. Era Felipe que ficou parado olhando para ela.
-- Encontrou a Alisson? -- perguntou ele, quando Nádia levantou a cabeça para fitá-lo -- O Fael me contou que você estava procurando por ela, bastante apressada.
-- Sim. Encontrei ela no PS -- Nádia fixou o olhar no irmão firmemente e imaginou se Lorraine já o teria informado do seu noivado com a megera -- Encontrei-me com Andras, também.
-- Por acaso a empurrou da janela do décimo andar? -- perguntou, divertido.
-- Por quê? Deveria? -- sem esperar resposta, continuou: -- Você sabe de tudo, não é mesmo?
-- Que bobagem! -- murmurou, com um meio sorriso -- Saber de tudo o quê?
-- Que Lorraine vai se casar com Andras.
-- O quê? -- exclamou Felipe, estarrecido -- Quando?
Nádia olhou para ele, com uma expressão de incredulidade. Piscou os olhos lentamente, como se estivesse reunindo paciência para continuar a conversa.
-- Não se faça de bobo, Felipe. O seu papo de hoje pela manhã, em minha casa foi muito suspeito e, agora pensando com mais calma, consigo ver com mais clareza o que suas palavras queriam me dizer.
-- Bem -- O médico parecia confuso -- Digamos que eu sabia da metade da história -- Felipe não conseguia disfarçar o nervosismo - Dessa outra metade da história, eu não fazia a menor ideia.
-- Não sei porque, mas não acredito em você -- Nádia foi dura com o irmão. Estava decepcionada e não tinha mais energia para continuar o assunto.
Alisson acabava de guardava seus equipamentos em uma valise quando Beca entrou no consultório, pálida e assustada.
-- Alisson, dona Helena acabou de ligar -- disse com a fisionomia apreensiva e passando a mão pelos cabelos, como se fosse um tique nervoso -- A Priscila não está passando bem.
-- Ela falou mais alguma coisa além disso? -- Alisson encaminhou-se para os elevadores enquanto falava -- O que ela está sentindo?
Enquanto as portas do elevador se fechavam, Beca relatava o que Helena havia lhe adiantado.
-- Diarreia, vômito, dores abdominais e, febre. O que você acha?
-- Que pode ser desde uma atresia ou estenose duodenal, frequentes em indivíduos com síndrome de Down, a uma virose.
Elas saíram do elevador. Atravessaram a imensa recepção e pararam diante da porta de vidro.
-- Faz um favor para mim? -- ela inclinou a cabeça para Beca e pediu com a voz doce, sorrindo -- Avisa a Nádia. Conta para ela o que está acontecendo -- ela piscou para a amiga -- Faça isso agora, por favor. Ela deve estar me esperando na sala dela.
-- Deixa comigo.
Alisson beijou-a nos cabelos.
-- Fica com Deus!
-- Você também, minha irmã.
Meia hora depois, Alisson entrou com os faróis acesos e estacionou em frente ao prédio do orfanato. Ao menos dessa vez o vigilante estava em seu posto. A pediatra riu, para depois soltar um suspiro nervoso.
-- Vamos Lá!
A porta dos fundos estava trancada e ela foi obrigada a entrar pelo hall. Parou por um instante, escutando as vozes de sua mãe e de vó Belinha, que estavam no quarto da menina.
Ela entrou no quarto, sob os olhares amainado das duas.
-- Boa noite, mãe.
-- Boa noite, querida -- cumprimentou Helena -- Aproxime-se.
Alisson fixou o olhar em Priscila, fez um ar de preocupação.
-- O que aconteceu com você, princesa? -- largou a mochila no chão. Deu a volta na cama e sentou-se em sua beirada.
--Tô com dô na baliga, Alis -- a menina choramingou. Os pequenos olhos amendoados de sua garotinha estavam excepcionalmente brilhantes, como se estivesse com febre.
-- Eu sei, meu bem, mas a Alis vai ter que tocar em você. Pode ser?
Decidida, a menina ergueu o rostinho e concordou.
-- Tá bom!
Alisson fez um exame completo em Priscila para enfim, chegar ao diagnóstico:
-- Ela está com uma infecção, não é mesmo? -- Helena perguntou, preocupada.
-- Ela está com as glândulas inchadas e com a garganta inflamada. Temperatura de 39 graus, tudo provavelmente, devido a uma virose que é comum nessa época do ano. É branda, mas precisamos cuidar bem dela. Vou passar um remédio para a febre, um xarope para a tosse e um antibiótico para a infecção na garganta.
-- Tô dodói, Alis? -- a menina perguntou tossindo.
-- Está, mas logo, logo se sentirá melhor. Eu prometo -- Alisson apertou-a contra o peito e beijou sua cabeça -- Que susto você me deu, garota.
Alisson preparou uma seringa com dipirona e aplicou na menina. O choro foi inevitável, mas a medicação era necessária.
-- Pronto, pronto -- a loira confortou-a com carinho -- Eu sei que dói, meu amor, mas é preciso para que você amanhã já possa brincar com a sua bonequinha.
-- A Patricia?
Alisson deu uma risada.
-- A Patricia não é bem uma bonequinha, mas pode ser ela mesmo.
-- Estou feliz que tenha vindo -- Helena sentou na cama, nesse momento, mais relaxada -- Eu estava tão preocupada com ela.
-- É. Eu também, mãe -- Alisson retirou um bloco de receitas da valise e prescreveu a medicação -- Mãe, por favor, liga para a farmácia e pede para trazerem essas medicações?
-- Claro, filha. Imediatamente -- Helena passou os olhos rapidamente pelo papel -- Você vai ficar?
-- Vou descansar um pouco no meu antigo quarto, mais tarde vou me encontrar com a Lorraine em seu apartamento. Enquanto isso observo a Priscila.
-- Vai, minha filha. Um anjo da guarda também tem o direito de descansar alguns minutos.
Alisson pegou sua mochila que estava jogada no chão e ajeitou-a sobre o ombro.
-- Qualquer coisa, podem me chamar. Assim que ela tomar o antitérmico, o estado febril deverá ceder -- beijou a testa da criança, ajeitou os lençóis e saiu.
Assim que saiu do quarto, deu com Patricia parada no corredor e soltou um berro de susto:
-- JESUUUUSSS...
Segundos depois, passado o susto, ela caiu na gargalhada.
Em resposta, Patricia deu um puxão de orelha rápido em Alisson.
-- Aiiiiii... -- esfregou a orelha vermelha -- Doeu, sabia?
-- Era pra doer, mesmo. Isso foi pouco. Você merecia câmara de gás, pelotão de fuzilamento...
Alisson afastou-se. Parou no meio do corredor e sorriu para Patricia.
-- O que aconteceu?
-- Como você é dissimulada, sua banana-branca com fungo -- colocou o dedo na cara da pediatra -- Vai me dizer que não foi você quem incentivou a menina a me maquiar?
-- Eu, hein? Tenho culpa não, ô xente! Só dei o estojo de presente para ela -- Alisson deu um tapa de leve na mão dela -- Abaixa esse dedo antes que eu dê uma mordida.
Ao olhar irônico da pediatra, Patricia suspirou pesado.
-- Como ela está?
-- Garganta inflamada, febre... e outros brindes da virose. Vou aguardar o efeito da medicação, mas acredito que em pouco tempo ela estará melhor.
-- Graças a Deus! -- com um suspiro, Patricia encostou-se na parede.
Alisson assumiu seu melhor sorriso quando ela falou isso.
-- Que bom, Patricia, que você agora, exalta a Deus em agradecimento. É realmente a ele quem devemos agradecer. Devemos agradecer a Deus por tudo, pelas coisas boas e ruins...
Patricia levantou as sobrancelhas e ficou olhando Alisson afastar-se sorrindo.
Beca bateu à porta da sala de Nádia e entrou.
-- Com licença, sua secretária pediu que eu entrasse.
-- Entra, Beca. Algum problema? -- perguntou Nádia.
-- Alisson me pediu que viesse lhe avisar que Priscila está doente. Por isso teve que sair as pressas.
-- Meu Deus! -- Impaciente, Nádia pousou a caneta sobre a mesa e olhou fixamente para a técnica de enfermagem -- O que ela tem? O coração? Por quê ela não me chamou para ir junto?
-- Falei com a dona Helena por telefone, ela disse que a menina está com febre, vômito e diarreia.
-- Hum, tadinha da Priscila. Eu amo muito aquela criaturinha fofa -- Nádia foi até o frigobar, e pegou uma garrafa de suco. Ela despejou a bebida em dois copos e entregou um a Beca, com um olhar de alívio -- Com certeza a Alisson já deve tê-la medicado e tudo ficará bem.
-- Sei que você ama ela. Todos nós amamos a Priscila.
Beca não a conhecia muito bem, mas o bastante para perceber que a energia irrequieta era nervosismo.
-- Tem algo que queira me falar? -- perguntou a técnica.
-- É tão visível assim? -- o rubor do rosto a entregava.
-- Está estampado em seu rosto -- Beca sorriu.
Nádia deu um gole no suco e depois colocou o copo sobre a mesa.
-- Tenho algo muito triste para contar a Alisson e gostaria que você e o Fael estivessem presentes...
-- A temperatura diminuiu, não houve mais vômito e ela adormeceu, bem mais coradinha -- Helena disse com entusiasmo.
Alisson verificou outra vez a febre e alegrou-se por não a constatar elevada.
-- Graças a Deus, ela está bem melhor, fiquei muito preocupada -- Alisson sussurrou, para não acordar a menina.
Contente, Alisson sentou-se na cama e acariciou o rosto da pequena.
-- Eu vou me encontrar com a Lorraine, mãe. Qualquer alteração que houver, não se acanhe. Ligue-me imediatamente.
-- Pode deixar, filha. Eu ligo.
Alisson retornou ao quarto dando pulinhos de alegria. Estava feliz pela recuperação de sua menina e também porque não via a hora de estar novamente nos braços de sua amada.
Abriu a mochila pegou algumas peças de roupas e colocou em cima da cama. Algo flutuou até próximo do seu pé, chamando a atenção da loira.
-- Caramba! Havia me esquecido disso -- pegou o envelope marrom e abriu-o com cuidado retirando o que havia dentro.
Um calafrio percorreu sua espinha e ela caiu sentada na cama.
Fim do capítulo
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Mille
Em: 25/04/2017
Bom dia Vandinha
O Felipe deveria ter contado a verdade a Nádia sobre ela está sendo chantageada, mais acho que ela não iria acreditar.
Infelizmente ela soube da pior maneira, e espero que ela não sai do orfanato até a Lo, acalme o coração e esfrie a cabeça para não acontecer nenhum acidente.
Priscila tem um anjo mais acho que a Pri é um ser encantado.
Bjus e até o próximo
Resposta do autor:
Olá Mille!
O capítulo 38 já está aí. Vejamos o que está para acontecer...
Beijão!
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patty-321
Em: 25/04/2017
Começou o primeiro ataque a Alysson. Mas ela é forte e possui muitos amigos de luz encarnados e descarnados para ajuda-la. A luta tá só começando. Que vença o bem, sempre. Bjs de luz.
Resposta do autor:
Você tem razão. Quem tem amigos tem apoio, carinho e força. É muito bom ter com quem dividir os problemas, não é mesmo?
Beijão!
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NovaAqui
Em: 24/04/2017
Pelo menos ela está no orfanato e terá apoio dá mãe e Patrícia. Essa virose dá Priscila não foi ao acaso. Foram os superiores a Alisson que levaram-na para junto de sua mãe e da proteção do local. Ali ela não vai sucumbir.
Agora os amigos vão começar a ajudar Ali.
Mesmo tendo feito Lorraine ficar ao seu lado na marra, Acho que Andras vai se ferrar um pouco com a ajuda dos amigos de Ali
Boa noite procês!
Abraços fraternos, Meninas!
Resposta do autor:
Boa noite Nova Aqui.
Fica com Deus.
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