Quinta e nada de notícias da Cleo. Realmente eu tomei um chute na bunda, acabei de ver que ela está "online", e nem se deu ao luxo de me dar um "oi".

Vou me concentrar no meu trabalho, é o melhor que faço. Enquanto eu fiquei aqui indo noite sim, noite não ao condomínio dela saber se ela já havia voltado, ela reapareceu e nem sequer respondeu as minhas mensagens.

Também eu estava parecendo uma adolescente desesperada, deixei várias mensagens pra ela, agora tô de novo aqui pensando um monte de merd*... Concentra Bárbara, dia cheio. Vários problemas pela frente e o pé na bunda que você levou da Clarice é o menor deles.

Aveee... enfim o expediente chegou ao final, pensei que nunca ia terminar esse projeto. Não vejo a hora do meu sócio voltar do exterior, a demanda de projetos do escritório tá muito grande e os profissionais que temos estão ficando sobrecarregados. Precisamos ajustar essa e mais algumas coisas pra podermos melhorar o nosso desempenho profissional.

Cheguei em casa e me joguei no sofá, a Anna disse que ia dormir na casa de uma amiga, que tinha um trabalho importante pra fazer, e por isso não viria pra casa esta noite.

Mais uma noite pensando bobagem. Chega disso. A Cleo deve ter voltado com a Andressa mesmo. Por isso o sumiço e a falta de comunicação. Eu a amo muito, mas não vou ficar correndo atrás não.

É como dizem por ai "quando um não quer dois nunca formam um casal", queria muito que tivesse dado certo. Mas se não deu, é porque ainda não era o momento de acontecer.

Levantei pra trocar de roupa e sair pra correr um pouco... sei lá, talvez respirar ar puro deixasse minha cabeça mais leve. Só consegui tirar os sapatos e abrir a blusa, até ser interrompida pelo toque da campainha.

Acabei nem me preocupando com a blusa aberta, quando abri a porta e vi a Cleo ali parada na minha frente a única reação que tive foi esticar as pontas da blusa pra cobrir meu corpo.

O que ela veio fazer aqui? Será que veio me contar pessoalmente da volta com a esposa?

Ela pediu pra entrar, disse que precisávamos conversar. Quando passou por mim na porta tive que me controlar muito pra não abraçá-la. Queria só senti-la perto mesmo, não ia forçar nada. Afinal de contas antes de tudo nós prometemos não deixar a nossa amizade ser abalada novamente.

Mas eu estava muito chateada com tudo. Ela sumiu, reapareceu e nem pra responder ao menos uma das minhas tentativas de contato. Agora aparece na minha casa dizendo que precisamos conversar. Ah sei lá o que devo pensar nesse momento, está tudo muito confuso pra mim.

Nem sei se queria conversar. Sentei no sofá e fiquei passeando pelo guia de programação da TV. A Cleo deu uma de impaciente, arrancou o controle da minha mão, desligou a TV, ajoelhou entre as minhas pernas, e fez questão de manter os nossos olhares conectados.

Os olhos dela traziam um peso, uma angústia... nossa. Era doloroso demais vê-la daquela forma.

Ah mais como eu sou uma anta... minha mulher passando por todo esse problema e eu aqui fantasiando que ela tinha reatado com a Andressa. Mas que merd*, porque ela não me procurou? Eu teria largado tudo aqui e ido com ela, deixava o Ju com a Anna ou os dois com o meu irmão, e ia com ela.

Tudo bem que a Andressa já sabia de tudo, conhecia toda a situação... mas, mesmo assim... nossa. Nem sei o que pensar. Entendi que ela só escondeu tudo isso pra proteger o Junior. Mas, e quem pensa nela? Ela ajuda e protege todo mundo, e quem faz isso por ela? Ela não me escolheu nem como opção para cuidar do filho, quanto mais me deixar cuidar deles.

Nossa... minha cabeça tá uma bagunça. Eu preciso pensar, eu preciso... sei lá. Porque ela fez isso? Me deixou oito dias pensando um monte de merd* e daí aparece me contando o que realmente aconteceu e eu simplesmente não sei o que fazer.

Gente...para... Não... ela só pode tá brincando comigo. Ela trouxe alianças pra oficializar a nossa relação... em qualquer outro momento eu teria aceitado sem nem pensar. Mas agora eu realmente não sei o que fazer...

– Clarice... – segurei cuidadosamente em seus braços para ajudá-la. – Levanta, por favor. Você teve dias exaustivos. Não tem necessidade, muito menos motivo pra ficar ajoelhada aos meus pés. Eu preciso... quer dizer eu... nossa. Eu estava indo... – ela me interrompeu.

– Você quer ir tomar banho, Bah. É isso que está tentando me dizer?

Apenas afirmei com a cabeça e ela continuou.

– Tudo bem Minha Pequena – ela sentou ao meu lado, fechou a caixinha com as alianças e colocou ao lado dela. Segurou minhas mãos e olhou no fundo dos meus olhos. – Eu entendi, eu não quero forçar nada. Eu só quero que saiba que mesmo longe eu estarei sempre perto de você. E quero que saiba também que eu te amo demais. Mais uma vez perdão pelo meu sumiço. Eu sei que não foi nada bom pra você, pra mim também não foi. E eu acabei judiando demais de você sem nem perceber nesses dias.

Ela levou a mão ao meu rosto num carinho leve e saudoso, a essa altura as minhas lágrimas já corriam livremente pelo meu rosto.

– Cleo... – minhas lágrimas insistiam em correr por minha face num ritmo acelerado, respirei fundo buscando forças pra continuar a conversa. – Eu te amo e sou louca por você. Mas não acho que esse seja o melhor momento para oficializarmos dessa forma – apontei para a caixinha ao lado dela – a nossa união. Vamos fazer as coisas da forma certa, sem atropelar nada, por favor.

Ela me envolveu num abraço muito, mas muito saudoso. Nossa... como é bom estar nos braços dela. Ficamos assim abraçadas sem falar uma palavra por cerca de uns 20 minutos. A gente precisava desse contato, dessa sintonia...

– Vem – peguei sua mão. – Sobe comigo, me acompanha no banho, dorme aqui mais eu, por favor. Eu preciso do teu carinho, do teu abraço. Eu quero te dar carinho, te encher de dengo, de beijo. Você passou por dias pesados demais, precisa de descanso físico e principalmente mental. Ah, amanhã a senhora está de folga.

– Mas amor eu ainda tenho várias reuniões amanhã e muitas coisas pra resolver na empresa.

– Ei dona Clarice, isso foi uma ordem e não uma consulta viu.

– Dengo o que vão pensar? Os acionistas vão pedir minha cabeça já já. Tenho uma reunião importantíssima com eles amanhã e já foi adiada na semana passada. Não posso adiar novamente.

– Não vão pedir nada, e você também não vai precisar pedir para adiar a reunião. Esqueceu que eu também sou acionista do grupo? – ela sorriu pra mim e me derreteu inteira. – Então, eu adiarei a reunião.

– Mas não tem cabimento amor, você se indispor com todos eles por minha causa.

– Que mulher difícil eu tenho, nossa. Me dá só um instante dengo.

Peguei o celular no bolso da calça e mandei uma mensagem no grupo dos acionistas. Cerca de alguns minutos depois todos eles já tinham respondido que não havia problema em remarcar a reunião para uma outra data.

– Pronto amor. Amanhã você está de folga e foi liberada da sua reunião inadiável com sucesso. – não resisti a carinha de boba que ela fez e dei um selinho em seus lábios.

– Mas... como você... o que... Amor.

– O que foi? – ela estava segurando o celular dela e me olhando com cara de poucos amigos. – Qual o problema?

– O que você aprontou?

– Eu aprontei? Oxi amor, aprontei nada não até onde eu saiba.

– Porque todos os acionistas estão me mandando mensagens Bárbara Pacheco?

– Peraê... Não foram todos. – digitei uma mensagem e enviei. – Agora sim, todos os acionistas te enviaram mensagens.

– Para de graça dengo, me diz o que você disse pra eles.

– Ah... então é isso! Disse a eles que a minha namorada precisou se ausentar da cidade na semana passada para resolver alguns problemas e que tinha retornado ontem. E que dessa forma passou o dia de hoje entrando e saindo de reuniões e que amanhã o dia prometia ser mais intenso que o de hoje. E por ter passado esse tempo longe da família, e por fazer um trabalho excepcional há tantos anos dentro da empresa, que seria mais do que justo dar a sexta-feira de folga a você para que pudesse descansar na companhia da sua mulher e dos seus filhos. – ela me olhava com cara de que não estava acreditando que eu tinha feito isso. – Você quer ver a mensagem amor?

– Claro que quero.

A cara que ela fez foi muito hilária, era um misto de surpresa com vergonha, muito engraçada mesmo, rsrs.

– Você não existe, Bah.

– Existo sim. – dei um beijo estalado em sua bochecha. – Viu ai que não menti.

– Percebi amor. Todos vocês me enviaram mensagens dizendo que passo muito tempo naquela empresa. E que agora que estamos oficialmente namorando, esperam que você consiga me deixar passar menos tempo lá dentro.

– É muito difícil ser eu – ela deu um leve beliscão no meu braço. – Ai. Você tá muito malvada. Não posso nem brincar mais. Nossa. Que falta de humor. Vamos tomar banho. Você precisa descansar.

Tomamos banho, jantamos e deitamos. A Cleo dormiu em meus braços. A minha linda mulher estava muito cansada, adormeceu rapidamente. Que barra ela enfrentou sozinha nesses dias.

Mas passou, agora ela está aqui protegida por mim, jamais deixarei ela voltar sozinha pra visitar a mãe. Farei questão de acompanhá-la quantas vezes forem necessárias.

No outro dia acordamos um pouquinho mais tarde, mas mesmo assim fomos caminhar na orla. O tempo estava fresco. A conversa esclarecedora, a noite bem dormida, e meia hora de caminhada ajudaram muito a voltarmos ao nosso clima habitual de puro companheirismo e muito amor.

Tomamos banho e fomos pra casa dela, os nossos pequenos já tinham saído quando chegamos lá. Falaram conosco pelo Skype antes de saírem. Juntas decidimos que íamos passar o final de semana fora da cidade.

Um final de semana em família. E cá entre nós gente, foi perfeito. As crianças se divertiram bastante e nós duas mais ainda. Precisávamos daquela energia, sabe?

Daquele aconchego da nossa família. Foi um final de semana incrível aquele. Vamos repetir mais vezes essa fuga para a calmaria da natureza. Ouvir os pássaros, tomar banho de cachoeira, deixar a tecnologia de lado. Foi muito bom para recarregarmos nossas energias.

Dois meses depois e nós estamos mais apaixonadas do que antes, os nossos pequenos estão nos dando um pouquinho de dor de cabeça, mas fazemos questão de conversar sempre com eles.

A Anna entrou numa de "vida de balada", resultado disso: notas péssimas na faculdade. Quase perde o semestre, entrou em desespero. Doeu ver a minha pequena daquela forma. Mas deixei o meu coração de manteiga bem quietinho e fiz ela correr atrás do prejuízo. No final ela conseguiu recuperar as notas pra passar no semestre.

O Ju ainda tá dando problema na escola, a pressão dele aumentou depois que resolvemos contar a real situação que a mãe biológica estava passando. Daí a coisa ficou ruim, ele se fechou completamente na escola e o bullying que ele sofria aumentou. Mas faço questão de levar e buscar ele todos os dias no colégio pra diminuir um pouquinho dessa pressão que ele está passando.

Não é que a Cleo não possa fazer isso, mas pra ela já tá pesado demais toda a mudança pela qual ele está passando.  Estamos fazendo acompanhamento psicológico com ele e as coisas estão começando a melhorar. Ele já tá menos arredio quando o assunto é a mãe biológica.

As férias dele e da Anna estão chegando. A Cleo quer leva-lo para conhecer a neve. Estamos planejando uma viagem em família. Cada uma de nós vai tirar dez dias de folga no trabalho e vamos levar o nosso pequeno Ju pra conhecer a neve. Claro que a minha Aninha não abre mão de acompanhar o irmão nessa viagem também.

Ah sim, quanto ao pedido "oficial" da Cleo com as alianças, depois daquele dia na minha casa ela não tocou mais no assunto. Mas sabem de uma coisa, conhecendo a Cleo como eu conheço ela deve estar planejando algo bem charmoso para voltar a fazer o pedido. A minha noiva tem um charme do caramba.

Fim do capítulo