De fato, o lance da Fernanda tinha me tirado um pouco da paciência, mas nada que justificasse o meu afastamento brusco da Bah. Quem em sã consciência se afastaria de uma mulher incrível daquela? Morena, 1,60, cabelos curtos e cacheados, umas curvas que faziam eu me perder fácil demais, os seios, a bunda, era tudo, nossa... era só pensar que me pegava suspirando.

Vou contar pra vocês porque me afastei na semana seguinte e tudo o que ocorreu. Sei lá, eu não sabia o que fazer, só espero que compreendam e se coloquem no meu lugar.

Lembram que contei sobre a separação traumática dos meus pais... bem, eu omiti alguns fatos de vocês e da Bah. É que é um lance que eu não curto muito comentar, me fez sofrer demais no passado e eu tenho um pouco de vergonha.

Meus pais se divorciaram por conta da traição da minha mãe lembram? Depois disso ele sumiu e ela ficou bem doente. A doença da minha mãe eram as drogas.

Eu fiz tudo o que podia para ajudar, mas quando percebi que não seria capaz sozinha eu a internei numa clínica e assumi a guarda do meu irmão. Eu visitava minha mãe uma vez por mês e ela estava se recuperando bem.

Só pra vocês terem ideia, nós morávamos em cidades diferentes, numa distância de 4 horas de carro.

Nunca levava o Junior nas visitas, era um ambiente meio estranho e minha mãe também nunca fez questão. Era duro pra ela ver feliz um filho que ela não conseguiu criar.

A três anos minha mãe teve alta e estava aos poucos voltando ao convívio social. Só que depois da alta total ela sumiu no mundo. Perdi totalmente o contato. Minto, volta e meia ela me ligava de números desconhecidos, dizia que estava bem, mas que precisava refazer a vida dela sozinha.

Chegou a dizer que eu já estava criando um filho dela e que não precisaria estender a criação a ela também. Ouvir aquilo tudo me doeu muito, tudo o que eu fazia por eles era por amor, mas respeitei a decisão dela.

Isso até aquela semana. O clima já estava estranho entre mim e a Bah, os problemas do Junior na escola piorando, o serviço tenso demais e pra fechar recebo minha mãe na minha porta, dizendo que quer levar meu filho de mim.

– Oi mãe, tudo bem? Entra? – eu disse surpresa com a visita as 22 hrs da quinta-feira.

– Oi Clarice. Não vou entrar não. Vim só pegar o menino. Estou pronta pra cria-lo agora! – ela me disse com a voz firme.

– rs... só pode estar brincando né, mãe? Não é assim. A gente fez um acordo, assinou os papéis, o Jú não é um objeto que eu guardei pra que você pudesse pegar quando estivesse recuperada. E outra, ele tem a vida dele aqui, agora. – eu disse tentando manter a calma.

– Eu sabia que você tinha me trancado naquela clínica pra arrancar meu filho de mim, sua sapatão desgraçada. Como não pode ter seus próprios filhos, você decidiu roubar o meu. – minha mãe respondeu alterando o tom de voz.

– Primeiro, fale baixo que o MEU filho está dormindo. Segundo, posso e vou ter quantos filhos quiser. Terceiro não arranquei nada de você, você perdeu tudo quando optou pelas drogas. – disse me segurando pra não avançar nela.

– Olha aqui sua... – ela disse pegando no meu braço.

– Mãe... – interrompi soltando meu braço – ou você entra e a gente conversa civilizadamente ou vou pedir pra você ir embora e voltar quando tiver mais calma. Olha pra mim, você usou alguma coisa mãe?

– Fale com os meus advogados, Clarice. Quero e vou ter meu filho de volta, ele é a única coisa boa que me restou e vou tê-lo de volta.

– Mãe, não deixe as coisas mais difíceis do que já são. Vem morar com a gente? O que você acha?

– Nós e aquela sapatão que me detesta? Jamais! – ela disse se referindo a Andressa.

– Não estamos mais juntas e ela sempre respeitou você. – respondi perdendo a paciência.

– Mesmo assim. Aqui não é o meu lugar e eu quero meu filho pra mim agora. Esteja ciente.

Ela disse essas palavras e partiu.

Pensa no turbilhão que ficou a minha mente?

Eu não podia contar isso pra Bah pelo telefone, por isso a evitei a semana toda, a ideia era passar o final de semana lá com ela, com a Anna e o Ju, estava precisando demais da energia boa deles pra me reerguer. Mas nem deu tempo.

As 2:30 da manhã me ligaram da delegacia, era da cidade da minha mãe. Ela tinha sido presa por furto e estava totalmente drogada, merd*. Depois de tanto tempo uma recaída e parte da culpa era minha. Eu deveria ter falado com ela com mais jeito, ter convencido ela de ficar e agora, nossa.

Eu pensei em passar na Bah e deixar o Juninho lá antes de ir resolver os problemas da prisão da minha mãe. Mas eu não queria conversar com ela de qualquer jeito, ela ia ficar preocupada, não ia entender, sei lá eu também não estava pensando direito.

Decidi então apelar pra Andressa, ela sabia da história toda, além de conhecer a rotina do Juninho. Ela sempre foi muito parceira nesse lance da minha mãe. Eu não podia reclamar.

Pronto, Junior na Andressa, eu na estrada, agora era só pegar o celular pra avisar pra Bah "por cima" os fatos e... merd*... merd*... mil vezes merd*... esqueci a porr* do celular na outra bolsa.

Passei dias infernais sem comunicação nenhuma naquela cidadezinha infeliz onde fui criada. Fim de semana e muita burocracia até conseguir soltar a minha mãe e mais ainda de convencê-la a voltar pra clínica.

Na verdade, ela foi internada a força e me arrepiou só de olhar. Eu queria poder fazer mais por ela, mas não sou profissional e sendo assim posso só pagar o melhor tratamento.

Caramba, foram noites quase em claro, nem sei o que é comer, dormir, banho... tudo uma zona por aqui. Nem sei que dia é aqui, caramba, quarta, já! Mas acho que finalmente consegui resolver tudo por aqui.

Preciso voltar urgente, nossa. O Ju, meu trabalho, a Bah, todo mundo sem saber de mim, devem achar que eu morri. Bora voltar e arrumar a bagunça toda que eu deixei.

Passei na Andressa primeiro. Tudo certo com o Junior, na verdade quase tudo. Segundo a Andressa ele estava muito sensível. Que tentou contato comigo todos os dias e sentiu que eu o tinha abandonado.

Isso partiu meu coração profundamente, mas dava pra entender. A gente nunca ficou tanto tempo sem se comunicar. Eu ia precisar mimar muito o meu pequeno para que ele me perdoasse.

Agradeci muito a Andressa por ter ficado com ele sem nem me questionar. Ela ainda se ofereceu pra conversar, eu que disse que era melhor não, que já tinha dado trabalho demais pra ela e pra outra moça lá, a companheira dela que eu nunca lembrava o nome. Por mais que fosse uma barra pesada demais ela não era a pessoa mais certa pra dividir.

Cheguei em casa e tinha uma centena de ligações e e-mails dos mais variados tipos. A maioria do trabalho, alguns muito urgentes. Mas o que mais me preocupou foram as mensagens da Bah. As primeiras eram doces, carentes, saudosas. Entretanto, com o passar do tempo passaram a ser desesperadas, tristes, angustiadas, irritadas, enfim, eu fiz a minha Pequena surtar.

O porteiro do condomínio disse que ela havia vindo aqui algumas vezes também. Puxa, machuquei mesmo a Minha Pequena.

Decidi passar o resto do dia com o Ju e no dia seguinte teria uma série de reuniões remarcadas. Caramba! Mas mesmo assim já tinha decidido ir pra casa da Bah e contar tudo a ela. Eu não poderia correr o risco de perder a minha mulher pela segunda vez por um motivo desses.

Falei com Anna, meu anjo da guarda, ela viria aqui pra casa dormir com o Juninho e eu iria pra Bah conversar pessoalmente sobre tudo.

Quinta super corrida no trabalho e minha mente viajando. Sabe que ver a Bah "online" e não falar com ela era uma tortura pra mim e ela agora mesmo "online" também tinha desistido de tentar qualquer contato. Ela deveria estar puta da vida.

Fim do dia, sai voando, passei no shopping, em casa pra um banho rápido, beijo na Anna e no Ju e fui pra casa da Bah.

Ela me atendeu com a roupa do trabalho, blusa de botões aberta (que ela fez questão de fechar assim que me viu), calça social e os pés descalços. Cabelos num coque frouxo e um sorriso triste. Nossa!

A minha Bah estava muito abatida e talvez só ali eu tenha me dado conta do tamanho do mal que eu fiz a ela. Deveria ter mandado ao menos um e-mail, já que não sabia o telefone dela de cor, mas gente, eu não consegui pensar em nada na hora. Estava passando pelos piores dias da minha vida!

Ela ficou parada na porta me olhando e a minha vontade de abraça-la era enorme, mas me segurei.

– Eu, posso entrar? Tenho muita coisa pra te dizer.

– Veio terminar comigo pessoalmente? Relaxa, eu já entendi o recado.

– Dengo, você tem todos os motivos pra me tratar mal, pode só me escutar? Se depois do que eu disser você quiser que eu vá embora, eu juro que respeito a sua decisão.

Ela acenou com a cabeça e começou a zapear na TV, sentada no sofá e afastada de mim. Era nítido como aqueles dias tinham maltratado a nossa relação e a culpa era toda minha.

Peguei o controle da mão dela e desliguei a TV, me ajoelhei entre as pernas dela e fiz com que ela olhasse pra mim. Nossa eu estava exausta e tudo o que precisava era do colo dela pra me curar. Mas eu teria que reconquistá-lo primeiro.

Ali ajoelhada eu contei com detalhes tudo o que havia acontecido. Em um dado momento as lágrimas passaram a cair pela minha face.

A Bárbara ficou parada, me olhando, atenta. Não sei até quando aguentaria tê-la tão perto e tão longe.

– Enfim Bah, essa é a história da minha vida. Eu não contei antes porque morro de vergonha e é um assunto tão delicado. Eu morro de medo que essa merd* toda "espirre" no Juninho. Então eu tento protegê-lo de todas as formas. Mas na hora de abraçar tudo eu deixei a gente escapar por entre os dedos. Eu sinto tanto. – disse pegando as mãos dela.

– Clarice, eu... – ela disse com as mãos frias dela contrastando com o calor das minhas.

– Péra tem mais uma coisa – disse tirando a caixinha do bolso. – Eu quero dividir tudo com você, o meu pior e o meu melhor. Eu sou uma bagunça, Bah. Mas com você por perto eu sinto que pode dar certo, sabe? Você e a sua proteção me fizeram uma falta imensa nesses dias. Eu... comprei essas alianças pra deixar o que temos oficial, você aceita? Você me perdoa por toda a bagunça que eu fiz com a gente nos últimos dias?

Fim do capítulo