Voltei ao castelo faminta. O treino com o anão realmente me cansou, eu estava suja dos pés a cabeça. Nem parecia que eu era alguém da realeza.
- Nossa, o Scot pegou pesado com você. -Deric disse rindo da minha situação.
 Scot? Claro, só podia ter sido esse bastardo.
- Cale-se. É contra as regras fazer negócios com anões sabia? 
- Foi por um bem maior.. Mas pelo jeito irás continuar o treinamento com ele.
- Por um bem maior. - repeti suas palavras.
 Deric olhou para os lados, se aproximou mais de mim como se fosse contar um segredo.
- Ouça.. os corredores escolhidos estão previsto a chegarem esta semana, mas não podes correr antes que eu tenha algo em mãos.
 Eu sabia que aquele velho não estava fazendo aquilo só para proteger a arvore sagrada. Tiu Deric não era totalmente humano e poucos sabiam disso, Deric nasceu na família dos Gnomos, mas sua mãe, minha tia. Era humana. Quando meus tios perceberam que não podiam mas esconder ele na vila dos pequeninos resolveram traze-lo para nossa vila e foi tratado como um humano, até seus ''poderes'' começarem a aparecer, os cidadãos começaram a se assustar com sua presença, pois não é fácil de se ouvir de uma pessoa a data de sua morte, ou até mesmo os segredos mais obscuro de seus ancestrais, então eles o viam como louco.
 Enxuguei minhas mãos e o encarei.
- E o que seria isso exatamente ?
- O Livro Sagrado que está a seculos perdido. Bom.. não esta mais perdido.
 O livro sagrado? Ele pirou de vez, aquele livro foi levado a seculos pelos que chamamos de demônios. Como se lesse meu pensamento ele continuou.
- O livro esta nas mais sombrias cavernas do Reino Distante, quando a ultima batalha de Troilham foi finalizada, todos os demônios foram trancados ou mortos. Mas o seu Rei deixou um herdeiro como conta a história, e para que seu filho pudesse vingar a todos ele deixou esse livro. Que agora, esta na caverna do Reino Sombrio mas nem eles sabem disso. Por isso..
- Por isso meu pai aceitou que um deles lutasse na corrida..
- Isso.. eles nós levarão ao Livro.
 Meu tiu falava aquelas palavras com ambição nos olhos, se o livro é tão poderoso assim por que só ele sabe de sua localização? E se o livro cair nas mãos da pessoa errada? Qual é a sua real importância?
 Um grande barulho de cavalos que cavalgavam em direção ao reino nos chamou a atenção. Eram inúmeros cavaleiros, suas vestes eram pretas, usavam armas com chamas e mascaras de ossos, os animais ferozes que os guardas seguravam fortemente apenas confirmou. Eram os cavaleiros Sombrios. Nossos guardas começaram a se espalhar pelo reino, o coronel deu a ordem e abriram o portão principal. Uma grande trombeta foi tocada do lado de fora e um grande leão preto entrou pelo portão do castelo sendo seguido por um homem e dois guardas do nosso reino. Quando eu os perdi de vista, fui atrás.
 O castelo nunca esteve tão reforçado como esta hoje. Guardas andando de um lado para o outro,alguma coisa esta acontecendo. E eu irei descobrir o que. Cheguei em frente a sala do Trono do Rei. Ouvi umas vozes lá dentro, até tiu Deric estava lá e eu aqui fora? Inaceitável. Entrei sem bater chamando a atenção de todos que estavam ali. Meu pai estava sentado em seu trono, do seus lados dois guardas estavam parados imoveis e logo a sua frente o homem que eu tinha visto entrar logo atrás daquele enorme leão preto. Deric sumiu no instante em que entrei. 
- Perdoe entrar assim.
 Meu pai estava serio, nunca tinha o visto desse jeito. Aquilo me assustou.
- Amberle, se retire até seus aposentos, vista um traje decente de princesa e volte para cá.
 O homem que estava em sua frente se mantia sério e imóvel, me ignorando. Obedeci ao rei, voltei ao meu quarto, lavei meu corpo rapidamente e vesti um longo vestido preto de cetim, casual que adorava. 
 Estava parada de pé ao lado de meu pai apenas escutando os termos de acordo de paz entre os dois reinos até que os jogos acabassem. Foi então que percebi a ausência daquele grande leão preto.
- Onde esta o leão? - Perguntei diretamente ao Conselheiro Sombrio interrompendo novamente a conversa. 
 A cara de meu pai não podia ser pior, já a do homem em sua frente demonstrava.. nada. Parecia que ele conversava com paredes, pois nem piscava. Ele me olhou, estreitou os olhos.
- Que leão vossa alteza?
 Aquela pergunta me pegou de surpresa. Como assim ''que leão?'' todos viram aquele enorme leão preto entrar pelo portão do castelo, impossível não terem visto.
- Vocês viram aquele leão, não viram? - Me dirigi aos guardas da sala. Todos se olharam com um ponto de interrogação na cara, e mexeram a cabeça como se estivessem dizendo 'não'.. - Mas eu vi.. era real.. 
- Basta Amberle, me deixe a sós com o Conselheiro.
 Apenas assenti com a cabeça deixando aquela sala. Eu vi aquele leão, meus olhos não mentem. Com certeza os guardas também viram, uma fera grande daquelas e ninguém além de mim a viu? Isso deve ser coisa da minha cabeça.. estou ficando que não tiu Deric.. louca. Estava pensando comigo mesma e nem percebi quando esbarrei em uma imensa.. coisa, me fazendo cair no chão. Quando olho para cima o vejo. A fera, o leão preto estava ali na minha frente. Seus olhos eram vermelhos como a cor do sangue de uma criança, seus dentes eram enormes e afiados. Aproximei uma das minhas mãos para toca-lo, senti seu hálito quente nas pontas dos meus dedos. Meus ouvidos quase estouraram quando ele rugiu. O som do seu rugido era agudo, forte. Levantei rapidamente para fugir dali. Parecia uma perseguição de gato e rato, naquele castelo enorme e nenhum guarda para me ajudar? Se eu parasse de correr a fera me pegaria. Eu estava indo em direção a torre quando aquela enorme coisa me alcançou. Senti meu braço direito arder, sangrava muito, a fera fez um corte fundo no meu braço. Cheguei a um dos quartos e me tranquei lá dentro, encostei do lado da cama torcendo pra que alguém me ajudasse. Uma luz forte se acendeu do lado de fora do quarto, o silêncio tomou conta daquele lugar. Eu fiquei ali sentada e nem percebi a rapidez que cai no sono. 

 Quando acordei não estava no mesmo quarto, estava deitada em uma imensa cama de casal. Meu braço estava enfaixado e doía menos mas só confirmava meus pensamentos, eu não era louca e aquilo não foi um sonho. 

-Como você está? -Procurei a voz. Deric. Vinha até mim com um copo de água e um tipo de planta na outra mão.
- A fera.. ela é.. real.. 
- Sim. O Leão que fez isso não? .. - Fiz que sim com a cabeça - Eu sabia.. malditos guerreiros sombrios..
 Me sentei na cama, não sabia do que ele estava falando. 
- Do que esta falando? Como sabe do leão? Foi.. foi você? - Perguntei torcendo para que a resposta fosse contraria da que eu estava pensando.
- Claro que não Amberle! Nunca faria uma coisa dessas com você. Foi um recado da pessoa que ira correr do Reino Sombrio..
- Um recado? - Ainda estava confusa.
- Sim sobrinha. Esse leão foi mandado para matar o corredor do nosso reino, então uma certeza já temos. Você que ira correr pelo seu povo.
 Meu coração parou? Não sei, quase dei um pulo daquela cama de felicidade mas.. ainda tinha a questão do tal leão vim dar o recado, quem iria querer me matar, ninguém sabia que eu iria correr, nem mesma eu.
- Quem? Quem mandou aquela fera? -Perguntei já me levantando. Peguei o copo com água de sua mão e bebi.
- O corredor do Reino Sombrio.. que com certeza também é alguém da realeza.
 Quase engasguei quando ele terminou de falar. Logo cedo eles estavam fazendo um acordo de paz com nosso reino pra logo em seguida tentarem me matar?
- Meu pai irás saber disso.. - Chochichei mas pra mim mesma, só que Deric ouviu.
- Ele não pode saber. - Disse ele calmamente.
- Alguém tenta me matar, a princesa, e meu pai não pode saber? Não me faças rir.
- Escute. Quem seja que mandou aquele leão, foi para te assustar, para mostrar tamanha a força do adversário que iras enfrentar naquela corrida, se contar para seu pai ele não pensara duas vezes em formar um exercito e ir até o Reino Sombrio, causando outra guerra. Pense, estragara a unica chance de descobrir uma cura para a arvore sagrada..
''Pelo menos matara o infeliz que me fez isso, ou a infeliz.''
- Não me venha com essa conversa pois você não se importa nem um pouco com a Ellcrys. - Dito isso lhe dei as costas e sai.
 Nos dias que se passaram eu continuei me encontrando com o Anão na mantiqueira para treinar. Eu estava me surpreendendo, tinha aprendido tanta coisa em tão pouco tempo, realmente aquela pequena criatura sabe ser mestres em ensinar, pelo menos é o que eu estou vendo. Eu conseguia ver os movimentos antes mesmo do adversário o colocar em pratica, e corria feito um leão correndo atrás de sua presa. 
 Depois de horas e horas correndo naquele imenso campo de orquídeas, meu corpo pediu por um pouco de descanso. 
 Voltei para o castelo e vi cavaleiros do Reino Vermelho entrarem pelo grande portão de entrada. Os corredores estavam chegando. Todos meus primos de primeiro grau foram chamados e testados para a grande corrida, mas nenhum conseguiu passar, um até chegou a quebrar a perna. Não sei como podiam ser tão inúteis, sorte a minha. Meu pai nunca falou comigo sobre o escolhido, e dessa vez eu nem tive curiosidade. Na hora que todos estivessem indo para a linha de partida eu estarei junto, Deric comprou alguns guardas que irão me ajudar a entrar naquele mundo, o mundo dos Games.
 Minha força estava ainda maior, só que eu não conseguia controla-la. Quando algo ou alguém me deixavam furiosa, eu tinha que ir para algum lugar e descontar minha raiva. As estatuas que ficavam no alto da montanha estavam todas quebradas, tamanha minha força. Eu não sabia da onde vinha, ou não queria saber. 
 Todos conselheiros de reinos diferentes estavam reunidos no grande salão do castelo, até mesmo os corredores escolhidos pelo Rei, meu pai, estavam lá. Eu me olhava no espelho, nervosa, ansiosa. Meu corpo suava dentro daquele imenso vestido azul marinho, feito de penas de pavão. Eu iria descobrir daqui a pouco, quem é o autor ou autora daquela mensagem que quase me custou a vida.
 Entrei no grande salão, os músicos tocavam seus violinos baixo deixando a musica apenas de fundo. No canto perto do Rei estavam reunidos todos os conselheiros, do outro de onde se ouvia um falatório, estavam os.. corredores! Uns fortes, baixos, altos, magros, mais gordinhos, e não para minha surpresa a maioria eram Elfos. Todos conversavam entre si, com a cara fechada e o tom mais rude e sério possível, na tentativa de um intimidar o outro. Eu fui até um canto mais afastado tentando não chamar atenção. Tentativa inútil. Senti a presença de alguém atrás de mim.
- Suas orelhas são pequenas.. e lindas! Interessante. 
 Me virei para observar bem quem falava comigo. Era um garoto da minha altura, mais fortinho e moreno com grandes orelhas pontudas. Usava vestes da cor da terra, e seu gorro o denunciava.
- Suponho que sejas o corredor do Reino da Floresta. 
- E eu suponho que sejas a princesa desse imenso castelo. -Disse isso me estendendo a mão pousando seus lábios sobre ela.- Prazer vossa alteza, Marcelo.
- Apenas Amberle, por favor. O prazer é meu, Marcelo. ''Ou não''
 Ficamos ali conversando sobre o castelo, nossos gostos, e.. sobre os diferentes tipos de terras. A porta do grande salão foi aberta, as velas que clareavam o salão se apagaram e a música que preenchia aquele lugar parou. Todos estavam com os olhares parados.. nela. Ela entrou e a grande fera estava ao seu lado, ela parecia observar o lugar.. entrou caminhando lentamente. Seus olhos procurvam algo e quando encontrou se fixaram nos meus que não conseguiam se desviar dos dela. Suas vestes eram escuras como a noite, seus olhos tinha tons avermelhados e verdes como a da fera e carregavam algo assustador neles, seus cabelos eram todos pretos e sua boca.. Calma! O que está acontecendo aqui? Ela desviou o olhar quando chegou até meu pai, e todos ficaram em silêncio quando ela se pronunciou.
-Sou a princesa do Reino Sombrio e venho em ordem de meu pai. Correrei nos jogos desse ano.

Fim do capítulo